Intervenção de Rita Rato na Assembleia de República

"O compromisso do PCP é para com as crianças e os seus direitos fundamentais"

Debate de urgência sobre a situação das comissões de proteção de crianças e jovens

Sr.ª Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:
As declarações que o Sr. Ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social aqui fez, e que ouvimos agora da parte do CDS, porque o PSD teve um pouco mais de contenção na afirmação de que está tudo bem e o Governo tem feito cada vez mais, são um profundo desrespeito por todos os técnicos das CPCJ que têm alertado para a gravidade da situação.
Quem não quer ouvir a gravidade da situação é quem convive com a responsabilidade pela violação de direitos fundamentais na vida de crianças no nosso País.
O Sr. Ministro e este Governo se não reforçam, imediatamente, o número de técnicos das CPCJ, são responsáveis pela violação de direitos fundamentais de crianças no nosso país.
Sr. Ministro, ou ouve o que as CPCJ dizem ou vai ser responsável pela continuação de situações dramáticas que todos os dias acontecem na vida de milhares de famílias no nosso País.
O Sr. Ministro devia ter vergonha de dizer que tem 289 técnicos.
Protestos do Deputado do CDS-PP Artur Rêgo.
Há 275 CPCJ, há milhares de crianças, 69 000 processos, e o Sr. Ministro diz que tem 289 técnicos?! Isso não é de quem quer resolver o problema, isso é de quem quer desresponsabilizar o Estado na garantia daquilo que é a sua obrigação.
O Sr. Ministro não faz favor nenhum às CPCJ em garantir-lhes condições de funcionamento. O Sr. Ministro é obrigado a garantir isso, porque só isso é que garante a proteção dos direitos das crianças. E não venha aqui fazer a chantagem de dizer: «ou deixam de funcionar ou são as IPSS.» Não! As CPCJ têm de funcionar e o senhor é obrigado a garantir o número de técnicos adequado.
Também não é sério, Sr. Ministro — repito, não é sério —, vir aqui dizer que estão a ser alocados de acordo com os critérios.
Os critérios são do ano 2000, quando não existia a maior parte das CPCJ; os critérios estão profundamente desatualizados — foi o Presidente da Comissão Nacional que o assumiu, aqui, na Assembleia da República — e o Sr. Ministro, de forma ardilosa, está a utilizar esses critérios para impedir a colocação dos técnicos responsáveis.
O Sr. Ministro, por ter enviado dezenas — na segurança social, centenas! — de trabalhadores para a requalificação, que não podiam depois ser substituídos porque foram enviados para a requalificação, substituiu-os e, em alguns casos, há CPCJ que nem sequer têm um técnico a tempo interior, no nosso país.
Isto não é de quem quer resolver o problema, isto é de quem convive bem com a violação de direitos fundamentais.
Por isso, Sr. Ministro, da nossa parte, entendemos que é preciso, urgentemente, garantir os técnicos adequados da segurança social.
Da parte do PCP, continuaremos sempre — mas sempre! — a defender a composição multidisciplinar das comissões. Não venha com aquela ladainha de que «o que querem é só a segurança social». Não é verdade, mas a segurança social tem um papel insubstituível. Não venha aqui confundir Ministério da Educação com Ministério da Saúde!
Só 53 comissões é que têm as cinco valências, a nível nacional, e isso devia envergonhá-lo, Sr. Ministro. Isso devia envergonhá-lo! Só 53 comissões é que têm as cinco valências, na comissão restrita, e nós entendemos que isso é inaceitável, isso não é de quem quer resolver o problema.
Lá vai o tempo em que o Sr. Ministro da Solidariedade era Deputado do CDS. Quando era Deputado do CDS, fazia perguntas ao Governo PS sobre o plano em curso para o despedimento de 75 000 trabalhadores na Administração Pública, que o anterior Governo do PS fez, perguntando, nomeadamente, desse despedimento que o PS ia fazer quando era Governo e que concretizou, quantos desses iam ser técnicos das CPCJ.
Lá vai o tempo, infelizmente, Sr. Ministro, porque o seu tempo já lá vai mas o tempo da vida das crianças e das famílias continua e o compromisso do PCP não é com o seu Governo, como não foi com o Governo anterior, é com as crianças e com os seus direitos fundamentais, Sr. Ministro.
(…)
Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados,
Sr. Ministro:
Para este ser um debate sério é preciso que o Sr. Ministro assuma as consequências das medidas que está a tomar.
E para este ser um debate sério é preciso que PS, PSD e CDS assumam que se deve exigir, no imediato, o reforço do número de técnicos da segurança social nas comissões ou este Governo vai ser sempre responsabilizado pela violação de direitos fundamentais.
Lembramo-nos de quando o Sr. Ministro era Deputado e acusava o Partido Socialista de dizer que, face à falta de técnicos, isto iria lá com parcerias locais. Nós lembramo-nos disso, e é exatamente por nos lembrarmos disso que, desde 2011, andamos a apresentar propostas nesta Casa para o reforço do número de técnicos, exatamente porque o problema não começou agora. Naturalmente que é pelo envio de técnicos para a requalificação que este processo veio a ser agravado. O Sr. Ministro é responsável por ter enviado para a requalificação a presidente de uma CPCJ que acumulava trabalho noutra CPCJ. Por isso, também não é novidade nenhuma que venha dizer que os processos vão estar em conjunto. Há técnicos da segurança social que acompanham várias CPCJ, não estão apenas a tempo inteiro numa única CPCJ.
Portanto, Sr. Ministro, entendemos que é inaceitável continuar este caminho de desresponsabilização da segurança social e de atirar esta responsabilidade para as IPSS. Isso coloca em causa um modelo único, nacional e uniforme na proteção de crianças.
Isso coloca em causa um sistema público da proteção dos direitos da criança, e nós nunca poderemos aceitar essa solução.
O Sr. Ministro nada disse e esse é um sinal da sua conivência com o e-mail que o Conselho Diretivo da Segurança Social enviou aos representantes da segurança social nas comissões, impedindo a sua participação numa reunião. Que raio de democracia é a sua, Sr. Ministro, que impede, através do Conselho Diretivo do ISS (Instituto da Segurança Social), a participação dos representantes? Do que é que tem medo, Sr. Ministro? Por que é que tem medo que as pessoas discutam e falem dos seus problemas?
Quem tem medo é porque teme as consequências do que anda a fazer e da redução que anda a promover dos técnicos da segurança social.
Por isso, entendemos, de facto, que na conclusão deste debate fica mais uma vez assumido que o Governo não quer resolver o problema, porque um Governo que despede técnicos da segurança social não pode depois vir dizer que a solução é a de que, com o dinheiro que vier da União Europeia, quando vier e se vier, as IPSS se desenrasquem a contratar técnicos. Isto não é solução.
Exatamente porque este é um debate sério e estamos a falar de direitos fundamentais das crianças é que não pode ser essa a solução. Só um sistema público, com os técnicos da segurança social adequados, com equipas multidisciplinares, poderá assegurar a proteção cabal dos direitos da criança. É exatamente porque este é um assunto sério e é uma matéria de direitos constitucionais que o Governo tem a obrigação de cumprir o que está na lei e de assegurar os técnicos adequados.
É exatamente por isso que entendemos que o Governo fala do futuro dos jovens porque está já a destruir o seu presente. Quem fala do futuro, invocando o futuro como o amanhã que virá, é aquele Governo que está hoje a destruir as condições de funcionamento das CPCJ, e o PCP nunca poderá acompanhar essas medidas.
Por isso, Sr. Presidente, termino, dizendo o seguinte: atirar as responsabilidades para as IPSS, ao mesmo tempo que despede técnicos e destrói a segurança social pública, vai obrigar o Governo a assumir as consequências da violação de direitos fundamentais das crianças, colocando em causa a sua dignidade e a dignidade na vida das famílias.
É por isso que este Governo já tem de ser derrotado.
(…)
Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, faço uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos, no sentido de a Mesa diligenciar junto do Sr. Ministro que o relatório sobre a Agenda da Criança, que o PCP já lhe pediu há três anos (pedido esse que nunca obteve qualquer resposta) e que hoje tem sido várias vezes invocado, possa ser distribuído aos grupos parlamentares, porque utilizar argumentos que não conhecemos é, no mínimo, pouco sério.

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