Completam-se hoje 30 anos da assinatura do Tratado de Adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia (CEE). Trinta anos passados não faltam os balanços, nomeadamente daqueles que numa, visão paradisíaca da realidade, tentam apagar o rasto de condicionamentos e desastrosas consequências que dela resulta.
Trinta anos depois a vida deu e dá razão ao PCP. Razão sobre a operação política que esteve associada à adesão, buscando nesse processo factores de pressão externa para justificar a recuperação capitalista e o ataque às conquistas de Abril. Razão sobre o que essa adesão significaria no plano económico enquanto factor de destruição da produção nacional e de agravamento da dependência. Razão sobre a denúncia que fizemos quanto a uma prometida e não realizada “coesão social”.
A adesão de Portugal à CEE e, posteriormente, os passos dados na integração capitalista europeia, foram acompanhados de grandes manobras de propaganda. Para a história ficam os discursos do “acesso ao mercado de 250 milhões de pessoas” e da “aproximação aos padrões de vida da Europa”. O tempo das tiradas da entrada de Portugal no “clube dos ricos” e no “pelotão da frente” (já aquando da adesão ao Euro), dos “estímulos e ajudas necessárias” que não faltariam a Portugal - tal como afirmou Mário Soares, então primeiro-ministro do Governo PS/PSD, no seu discurso de 12 de Junho de 1985.
Hoje, passados 30 anos, a realidade encarrega-se de demonstrar que tais discursos não tinham base de sustentação e ignoraram deliberadamente muitas das contradições de partida que se colocavam à adesão de Portugal ao Mercado Comum e, posteriormente, à União Europeia e ao Euro, entre outros aspectos da integração capitalista.
Tal como previmos, a soberania foi gravemente mutilada. Questões centrais da vida do País são decididas, ou fortemente condicionadas, pelos órgãos e instâncias da União Europeia e em particular pelo directório de potências comandado pela Alemanha.
O que a revolução de Abril tinha aberto de Portugal ao Mundo e afirmado de paz e cooperação, como a Constituição da República Portuguesa consagrou, foi abandonada e substituída por uma lógica de subordinação aos interesses das grandes potências europeias e de submissão à estratégia agressiva dos EUA e da NATO.
Tal como afirmámos há 30 anos, a adesão à CEE/UE não foi feita para servir os interesses dos trabalhadores e do povo mas sim os interesses dos grupos económicos e financeiros, nacionais e estrangeiros. Nestes 30 anos os grupos monopolistas recuperaram quase todo o seu poder. Ao mesmo tempo que multinacionais se instalaram em Portugal contando com significativas contrapartidas e tendo em vista a exploração de uma mão-de-obra barata, o Sector Empresarial do Estado foi sendo desmantelado e sectores estratégicos da nossa economia alienados e entregues ao estrangeiro, como aliás acaba de ser mais uma vez demonstrado com a decisão da entrega da TAP.
O tecido produtivo português foi gravemente enfraquecido. Os sectores da indústria, pescas e agricultura representavam 38,4% do PIB em 1985. Em 2014 representavam uns meros 15,9%. A frota pesqueira nacional foi reduzida em 50% e o emprego neste sector sofreu uma redução drástica. No País com a maior Zona Económica Exclusiva da Europa importamos hoje cerca de 70% do pescado que consumimos. Na Agricultura assistiu-se à tendência paulatina do afunilamento e concentração da produção agrícola. Em 30 anos perderam-se 300.000 explorações agrícolas e cerca de 500.000 hectares de Superfície Agrícola Útil.
A entrada na CEE não significou de facto um “pujante desenvolvimento”. Sobretudo depois da entrada no Euro, o País entrou num círculo vicioso de estagnação económica, empobrecimento e endividamento. Aprofundaram-se os défices estruturais, como o produtivo, energético ou tecnológico, e a dívida portuguesa, que no momento da adesão era de 52%, aumentou exponencialmente situando-se hoje nos 132% do PIB.
Trinta anos depois, a realidade que emerge da vida dos portugueses não é a de uma tão apregoada União Europeia de “coesão económica e social” nem a de uma aproximação “aos níveis de vida da Europa”, mas sim a perda do poder de compra dos salários, reformas e pensões que são hoje dos mais baixos da União Europeia. Desde 1985, e em particular desde a entrada no Euro, o fosso entre os rendimentos do capital e do trabalho não tem parado de aumentar. Portugal é hoje um dos países mais desiguais e com uma das mais altas taxas de desemprego de toda a UE, um País em que um quarto dos seus cidadãos vive na pobreza.
Contrariamente às promessas de há 30 anos o povo português não foi beneficiado com a adesão à CEE. Mais acutilante se torna esta constatação quando olhamos para os últimos quinze anos com a entrada no Euro. Naquele que já é o mais longo ciclo de estagnação económica do País, marcado por agudos períodos recessivos não recuperados, os portugueses foram vítimas de um ataque sem paralelo aos rendimentos do trabalho, aos seus direitos laborais e sociais. O Estado foi sendo esvaziado das suas funções sociais com o ataque aos serviços públicos e a entrega ao grande capital de sectores altamente rentáveis como a Saúde.
O País perdeu peso na União Europeia, o endividamento disparou, a terciarização e financerização da economia aprofundaram-se. Portugal, privado dos instrumentos de política monetária, sem poder dispor de alavancas económicas estratégicas, amarrado aos critérios do Pacto de Estabilidade e seus sucedâneos, com uma economia cada vez mais dependente do estrangeiro, vítima de uma política do BCE vinculada aos interesses da banca e das grandes potências como a Alemanha, foi transformado, com a conivência e participação activa dos governos do PS e PSD/CDS, num “exemplo” sim, mas de retrocesso, empobrecimento e submissão a interesses que não os do povo português.
A política de direita que há quase quatro décadas tem sido praticada por PS, PSD e CDS é inseparável do processo de integração capitalista europeu. Uma e outro são faces de uma mesma opção de classe, contrária aos interesses e aspirações do povo português, e alimentam-se mutuamente. As forças políticas portuguesas que suportaram e suportam o processo de integração capitalista são as mesmas que desde 1976 procuram reverter muitas das conquistas económicas, sociais e políticas da Revolução de Abril.
Não é um acaso que PS, PSD e CDS se tenham unido em defesa da CEE, da União Europeia e dos seus pilares neoliberal, federalista e militarista; não é um acaso que há três anos se tenham unido para assinar o Pacto de Agressão; não é um acaso que tenham convergido na aprovação do Tratado Orçamental e que convirjam agora nas linhas essenciais do aprofundamento da UEM, da União Bancária e Financeira e na criação do chamado Fundo Monetário Europeu. Não espanta portanto, e não é também uma coincidência, que estes mesmos partidos estejam agora na prática unidos pelos seus programas eleitorais em torno de uma mesma política que defende e aprofunda o Euro, aceita e aplica o Tratado Orçamental, e se submete às regras da dita Governação Económica.
Se há balanço certo e certeiro destes 30 anos esse é o de que a política de direita, na sua vertente interna e externa, não serve os interesses dos trabalhadores e do povo.
Mas, para lá de políticas esgotadas e contrárias ao interesse nacional, há um outro balanço a fazer. Um balanço que não cabe nas estatísticas. Um balanço que nos faz olhar com profunda confiança para o futuro de Portugal porque, nestes 30 anos, apesar das injustiças, dos condicionalismos, das adversidades e dos apelos ao conformismo e à desistência, o povo português nunca desistiu de lutar pelas suas condições de vida, pela sua dignidade, pelo desenvolvimento do seu País e pela defesa da independência e soberania nacionais.
O que, 30 anos depois do Tratado de Adesão, emerge da realidade que vivemos é a tomada de consciência por parte de cada vez mais largos sectores da população que o rumo que foi imposto a Portugal e à Europa não é uma inevitabilidade. O que emerge da realidade nacional e internacional é que é possível outro caminho que garanta desenvolvimento, progresso e justiça social, caminho que assente no respeito pela soberania, independência, identidade e direitos dos povos, aposte na cooperação entre iguais, na convergência social, na real entreajuda e em relações mutuamente vantajosas e de paz.
O PCP continuará a dar firme combate a todas as imposições supranacionais e para fazer prevalecer os interesses dos trabalhadores e do povo.
O PCP reafirma o inalienável direito do povo português de decidir do seu próprio destino e escolher o caminho que assegure o seu direito a um desenvolvimento soberano. Direito que nenhuma integração, por mais adiantada que esteja o seu estado de desenvolvimento, pode expropriar. Direito indissociável da ruptura com a política de direita e do processo de integração capitalista europeu.
Para o PCP, não há hesitação. É dos lado dos trabalhadores e do povo que se coloca. Não, como fazem PS, PSD e CDS, do lado dos que impõem exploração, empobrecimento e uma política de subordinação e submissão ao processo de integração da União Europeia, aos interesses dos monopólios e ao directório de potências que os serve.
Trinta anos passados o que emerge como factor de confiança no futuro de Portugal é a Força do seu Povo. Uma força que, resultante das vontades, acções e lutas de cada vez mais patriotas e democratas, quer romper com o empobrecimento, o retrocesso e a submissão, e construir o caminho para uma alternativa política patriótica e de esquerda que recupere para os portugueses o que é seu por direito - direitos sociais e laborais, direito ao desenvolvimento económico e instrumentos de soberania nacional - e que, simultaneamente, contribua para a construção de uma Europa de paz e cooperação entre Estados soberanos e iguais em direitos, de uma Europa dos trabalhadores e dos povos. Força, alternativa e esperança que ecoaram no passado dia 6 nas ruas de Lisboa e que confirmam a CDU como a Força do Povo, força que, com trabalho, honestidade e competência, está em condições de assumir todas as responsabilidades que o povo lhe quiser atribuir e que está pronta para as difíceis e complexas batalhas que Portugal tem pela frente.