Constata-se, com efeito, que Magistrados Judiciais, do Ministério Público e Funcionários Judiciais, passam longas horas do seu tempo de trabalho e do seu tempo de descanso, assoberbados com processos que, com toda a utilidade, poderiam ser submetidos a uma nova forma de administração da Justiça, por juizes não togados, em processo cujas formalidades sejam reduzidas ao mínimo. Uma nova forma de administração da Justiça que aproxime a justiça dos cidadãos.
Dessa forma, os Magistrados e os Funcionários judiciais ficarão libertos para os processos não remetidos para os julgados de paz.
Dessa forma se poderá impedir que a crise se vá avolumando.
Como a nossa experiência demonstra, o aumento da conflitualidade processa--se sempre a um ritmo superior ao aumento do número de magistrados e funcionários. A continuar imobilizada a organização judiciária, o número de Magistrados e de funcionários será sempre insuficiente, e cada vez mais insuficiente, para acudir á conflitualidade que resulta sobretudo de problemas sociais.
As medidas recentemente anunciadas como forma de superar a crise, são
manifestamente insuficientes, e por vezes, mesmo de objectivos duvidosos.
Faltam medidas de fundo, muito urgentes, que impeçam prescrições
de procedimentos criminais, que tornem a justiça pronta, que reconciliem
os cidadãos com a Justiça.
A confiança dos cidadãos na administração da Justiça está no próprio cerne da Democracia.
Salientava-se no preâmbulo do Decreto-lei 539/79 de 31 de Dezembro - que regulamentou a Lei Orgânica dos tribunais Judiciais de 1977 no que toca aos julgados de paz - a importância da intervenção directa e decisiva da comunidade na aplicação da justiça.
Tal intervenção teria vantagens " tanto no respeitante á superação dos conflitos, pacificação e reconciliação, como no que concerne à readaptação social, poupando as partes a certos efeitos negativos e estigmatizantes da justiça formal. "
O PCP considera da maior importância a criação dos julgados de paz, previstos na Constituição da República após a última revisão constitucional, como facultativos, mas que a lei deve tornar obrigatórios.
Por isso se apresenta este projecto de lei cujo conteúdo, resumidamente, a seguir se indica.
O Juiz de Paz. Quem é e onde está.
O Juiz de Paz é um magistrado não togado, eleito pela Assembleia Municipal, que administra a justiça nas causas da competência do Julgado de paz para o qual foi eleito. Administra a justiça, em princípio na área da freguesia, podendo, no entanto, ter competência sobre várias freguesias agregadas, que constituirão um único julgado.
A criação de um julgadopara uma única freguesia depende do preenchimento de um índice, que constará de diploma regulamentar, relativo a um mínimo de residentes e ao volume processual do Tribunal de Comarca relativo às matérias da competência do julgado.
Mas o julgado de paz pode ser desdobrado em mais do que um tribunal, por bairros, sempre que o volume processual o justifique, independentemente do critério do número de residentes.
Quem pode ser Juiz de Paz e como.
Só pode apresentar-se ao concurso curricular aberto pelo Conselho Superior da Magistratura quem reunir cumulativamente os seguintes requisitos:
a) Ter a cidadania portuguesa;
b) Ter mais de 25 anos;
c) Ter licenciatura em direito;
d) Estar no pleno gozo dos direitos civis e políticos;
e) Não ter sofrido condenação nem estar pronunciado por
crime doloso;
f) Ser cidadão eleitor.
O Conselho Superior da Magistratura analisará as candidaturas para apresentação à Assembleia Municipal dos candidatos aptos.
Mas, se de entre os candidatos , e ponderando a nota de curso, alguns tiverem prática judiciária por um período de, no mínimo, 5 anos, ou ainda forem eleitores inscritos pela respectiva freguesia ou por alguma das freguesias agrupadas, serão esses os candidatos aptos para se submeterem à eleição pela Assembleia Municipal.
O cargo de Juiz de Paz é exercido pelo período de 3 anos, renovável pelo Conselho Superior da Magistratura.
O Estatuto dos Juizes de Paz constará da regulamentação do diploma.
O que faz o Juiz de Paz
O Juiz de Paz, nos casos em que a lei não o impede, procurará sempre a composição das partes visando a resolução pacífica do conflito.
O Juiz de Paz tem competência em matéria cível e em matéria penal.
Em matéria cível:
O cidadão que até agora propunha acções nos tribunais de Comarca, ou em juízos de pequena instância cível, através de um processo burocratizado, para
As injunções retiraram-se da competência do Juiz de Paz.
Passam também a ser apresentadas ao Juiz de Paz, em processo desburocratizado, as causas relativas a "Direitos e deveres de condóminos sempre que a respectiva Assembleia não tenha deliberado sobre a obrigatoriedade de compromisso arbitral, para a resolução de litígios entre condóminos ou entre condóminos e o administrador ".
O cidadão pode ainda solicitar ao Juiz de Paz que proceda à conciliação em sede não contenciosa de litígio ( desde que se trate de " vizinhos") seja qual for o valor em causa.
E é também ao Juiz de Paz que passam a ser submetidos litígios entre proprietários de prédios confinantes relativos a passagem forçada momentânea, escoamento natural de águas, obras defensivas das águas, comunhão de valas, regueiras e valados, sebes vivas; abertura de janelas, portas, varandas e obras semelhantes; estilicídio, plantação de árvores e arbustos, paredes e muros divisórios.
E se o cidadão tiver que intimar qualquer órgão da freguesia ou do município para poder consultar documentos, ou para lhe serem passadas certidões, deixará de fazê-lo na longínqua justiça administrativa, para apresentar o pedido no Julgado de paz, perto de si.
Será ainda o Juiz de Paz a julgar os recursos das decisões das autoridades administrativas em processo de contra-ordenação, salvo o disposto nos artigos 87.º, 89.º e 90.º da Lei de Organização dos Tribunais Judiciais relativamente ás contraordenações laborais.
Deixa-se ao Governo a possibilidade de manter qualquer das competências nos juízos de pequena instância cível, se isso se justificar, ficando o Julgado de paz com a competência restante.
O Julgado de paz não tem competência em matérias reservadas a Tribunal arbitral.
E também não tem competência para acções de execução, mesmo que se trate de execução das suas próprias decisões. A lei de regulamentação deverá determinar qual o Tribunal que tem competência para aquelas acções.
O Julgado de paz só é competente para os processos instaurados depois da sua instalação.
E o que faz o Juiz de Paz em matéria penal?
Sempre que esteja em causa a aplicação de uma pena ou medida de segurança privativas da liberdade, não poderá o processo criminal ser submetido ao Juiz de Paz.
Mas se o crime, a julgar em processo comum, for punido com uma pena de multa, ou com uma pena de multa alternativa á pena de prisão até 3 anos, o julgamento será feito pelo Juiz de Paz, se o Ministério Público do tribunal de comarca entender que deve ser aplicada pena ou medida de segurança não privativas da liberdade.
Mas o Juiz de Paz julgará ainda as pessoas detidas em flagrante delito
por crime a que corresponda processo sumário, também se o Ministério
Público do Tribunal de Comarca entender que lhes deve ser aplicada não
à pena de prisão mas a pena de multa alternativa.
E o Juiz de Paz, para além de julgar contravenções e transgressões
residuais, fará ainda o julgamento dos arguidos a julgar em processo
abreviado, quando ao crime corresponda pena de multa ou quando o Ministério
Público entender que ao arguido deve ser aplicada pena ou medida de segurança
não privativas da liberdade.
E também fará o julgamento dos arguidos, quando se trate de processo sumaríssimo, quando se verifiquem as condições referidas na parte final do parágrafo anterior.
À semelhança do que se estabeleceu em matéria cível, deixa-se ao Governo a possibilidade de manter algumas das competências nos juízos de pequena instância criminal, ficando o Julgado de paz com a restante competência.
E de igual modo se estabelece que o Julgado de paz só é competente para os processos instaurados depois da sua instalação.
O cidadão perante o Juiz de Paz
Nas causas cíveis:
Estabelece-se um processo caracterizado pela simplicidade dos actos processuais.
Nele não poderá haver incidentes da instância que não sejam incidentes relativos à sua competência. Se for levantado qualquer outro incidente, o processo será remetido ao Tribunal de Comarca onde prosseguirá os seus termos.
A causa poderá ser apresentada por escrito em formulário a criar por Portaria, ou verbalmente.
Não é obrigatória a constituição de mandatário judicial, a não ser na fase de recurso e já no tribunal de comarca.
Não é obrigatória a apresentação de contestação escrita, podendo ser apresentada contestação oral no início da audiência. A contestação escrita deverá ser apresentada até ao início da audiência.
Apenas se admite a citação pessoal através de via postal
registada e a citação por éditos.
O não comparecimento do Réu e simultaneamente a não apresentação
da contestação determinam a condenação no pedido.
A citação por éditos - suprimem-se os éditos através de publicação em periódicos- determina a obrigatoriedade de realização da audiência.
Não haverá lugar a prova pericial, e se tal prova for requerida os autos são imediatamente remetidos ao Tribunal de Comarca onde prosseguirão os seus termos.
As testemunhas serão apresentadas pelas partes na audiência, não havendo lugar à sua notificação.
Não há produção de prova por carta rogatória ou precatória.
A sentença será resumidamente ditada para a acta - apenas a parte decisória - imediatamente a seguir ao termo das alegações; só excepcionalmente, quando a dificuldade da matéria o justifique, pode ser relegada para momento posterior, em prazo que não exceda os 10 dias.
Da sentença não poderá haver reclamação, mas da mesma cabe sempre recurso para o tribunal de Comarca.
A conciliação em sede não contenciosa, de litígio de natureza cível ainda não pendente em Tribunal, pode ser requerida verbalmente ao Juiz de Paz por uma ou por ambas as partes, desde que tenham domicílio na área da competência territorial do Julgado de paz, valendo como título executivo o acordo obtido quando a causa seja da competência do Julgado de paz. No caso contrário, o acordo lavrado em acta será como documento particular, equivalendo, a intervenção do Juiz de Paz, à intervenção notarial.
Na competência administrativa do Juiz de Paz seguem-se as regras do processo administrativo
O cidadão perante o Juiz de Paz
Em processo penal
Só o julgamento cujas formalidades são reduzidas ao mínimo, corre perante o Juiz de Paz.
A instrução, quando requerida corre perante o tribunal de Comarca. O pedido cível é apresentado antes de os autos serem remetidos ao Julgado de paz.
As testemunhas são indicadas antes dessa remessa.
Nas participações apresentadas perante o Ministério Público do tribunal de Comarca, não há lugar a realização do inquérito, mas apenas à indicação da prova.
Da sentença há recurso para o tribunal de Comarca.
No Julgado de paz poderá haver um representante do Ministério Público a nomear pelo Procurador Geral da República, aplicando-se-lhe, na parte compatível, o Estatuto dos Magistrados do Ministério Público.
O cidadão e os encargos da Justiça de Paz
No Julgado de paz não há lugar ao pagamento de preparos, sendo as custas pagas a final.
O cidadão pode requerer, tal como nos outros tribunais, o apoio judiciário.
Havendo recurso, as custas são pagas no Tribunal de Comarca.É
conhecida a experiência de vários países ( Itália,
Espanha, Inglaterra, Bélgica, por exemplo), nesta matéria.
Nalguns é já uma longa experiência.
Peca por muito tardia a introdução na nossa orgânica judiciária.
A lentidão da Justiça, enredada em múltiplos problemas, coincidiu com a falta de arrojo nas soluções, que tem caracterizado o poder político.
É tempo de operar a mudança.
Assim, os Deputados abaixo-assinados do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte projecto de lei:
Capítulo I
(Disposições Gerais)
Artigo 1º
(Âmbito)
1. O presente diploma regula a competência e o funcionamento dos julgados
de paz, a tramitação processual dos processos da sua competência,
os requisitos para a eleição como Juiz de Paz, o Estatuto dos
Representantes do Ministério Público e a intervenção
dos Mandatários Judiciais no Julgado de paz.
2. O Governo regulamentará a presente Lei no prazo de 90 dias a contar
da sua publicação
Capítulo II
Competência e Funcionamento
Artigo 2º
(Julgados de paz)
1. Haverá um Julgado de paz nas freguesias que obedeçam simultaneamente
ao índice , que constará da regulamentação do presente
diploma, de um mínimo de residentes e de volume processual do Tribunal
de Comarca relativo às matérias da competência do julgado,
2. A lei de regulamentação procederá ao agrupamento de
freguesias que constituirão um único Julgado, quando tal for necessário
para preenchimento dos índices atrás referidos, sem prejuízo
do critério de aproximação da Justiça relativamente
aos cidadãos.
3. Sempre que o volume processual o aconselhe, e independentemente do critério
de número de residentes, o Julgado de uma Freguesia poderá ser
desdobrado em vários Tribunais sediados em Bairros, abrangendo um ou
vários Bairros.
Artigo 3º
(Sede do Julgado de paz)
1. O Julgado de paz terá a sua sede, consoante os casos, na Freguesia,
numa das freguesias agregadas, e no Bairro ou num dos Bairros em caso de agrupamento
destes.
2. O Juiz de Paz poderá determinar que a audiência se realize fora
da sede do Julgado.
Artigo 4º
(Competência territorial)
A competência territorial do Julgado de paz será a da freguesia, agrupamento de freguesias , bairro, ou agrupamento de Bairros, consoante os casos.
Artigo 5º
(Competência do Juiz de Paz em matéria cível e administrativa)
1. Compete ao Juiz de Paz, em matéria cível, conhecer das questões relativas a:
a) Cumprimento de obrigações pecuniárias
que não excedam a alçada do Tribunal de Comarca;
b) indemnizações por dano cujo montante não exceda a alçada
do Tribunal de Comarca;
c) Entrega de coisas móveis cujo valor não exceda a alçada
do Tribunal de Comarca;
d) Direitos e deveres de condóminos sempre que a respectiva Assembleia
não tenha deliberado sobre a obrigatoriedade de compromisso arbitral,
para a resolução de litígios entre condóminos ou
entre condóminos e o administrador;
e) Conciliação em sede não contenciosa de litígios
entre vizinhos, seja qual for o valor em causa;
f) Resolução de litígios entre proprietários de
prédios confinantes relativos a passagem forçada momentânea,
escoamento natural de águas, obras defensivas das águas, comunhão
de valas, regueiras e valados, sebes vivas; abertura de janelas, portas, varandas
e obras semelhantes; estilicídio, plantação de árvores
e arbustos, paredes e muros divisórios;
g) Intimação para consulta de documentos e passagem de certidões
quando a entidade a intimar for qualquer dos órgãos da freguesia
ou do município;
h) julgamento dos recursos das decisões das autoridades administrativas
em processo de contra-ordenação, salvo o disposto nos artigos
87.º, 89.º e 90.º da Lei de Organização dos Tribunais
Judiciais.
2. O Julgado de paz não tem competência para as acções
de execução ainda que de títulos executivos de matérias
da sua competência.
3. No Julgado de paz só é admitido incidente relativo à
sua competência.
4. Suscitado qualquer outro incidente , o Juiz de Paz remeterá os autos
ao Tribunal de Comarca competente onde se seguirão os termos subsequentes
do processo.
5. Quando na área de competência territorial do Julgado de paz
couber a Tribunal de competência específica a resolução
das questões mencionadas nas alíneas a) b) c) e h) do número
1, o diploma que crie o Julgado de paz determinará se se mantém
a competência daquele Tribunal, caso em que o Julgado de paz terá
apenas competência para a resolução dos restantes litígios
mencionados no número 1.
6. Os Tribunais competentes para a resolução dos litígios
que passaram a ser da competência dos Julgados de Paz, manterão
a competência para as causas já interpostas na data da instalação
dos Julgados.
7. O Juiz de Paz não tem competência em matérias reservadas
a Tribunal Arbitral
Artigo 6º
(Competência do Juiz de Paz em matéria criminal)
1.-Em matéria criminal o Juiz de Paz é competente:
a) para o julgamento dos crimes a que corresponda processo sumário quando
o Ministério Público entenda que no caso é apenas de aplicar
a pena de multa alternativa;
b) para o julgamento dos crimes puníveis com pena de multa ou concretamente
puníveis apenas com pena ou medida de segurança não privativas
da liberdade a que corresponda processo abreviado;
c) para o julgamento dos crimes concretamente puníveis apenas com pena
ou medida de segurança não privativas da liberdade a que corresponda
processo sumaríssimo;
d) para o julgamento dos crimes punidos com pena de multa, ou com pena de multa
alternativa à pena de prisão até 3 anos , a que corresponda
processo comum, desde que o Ministério Público do Tribunal de
Comarca entenda que ao caso concreto deve ser aplicada pena ou medida de segurança
não privativas da liberdade;
e) para o julgamento de contravenções e transgressões
3. Quando na área de competência territorial do Julgado de paz
couber a Tribunal de competência específica o julgamento dos crimes
previstos nas alíneas a) b) c) do número anterior, e ainda para
o julgamento previsto na alínea e) do mesmo número , o diploma
que crie o Julgado de paz determinará se se mantém a competência
daquele Tribunal, e para que processos, caso em que o Julgado de paz terá
apenas competência para os restantes.
4. Os Tribunais competentes para o julgamento de crimes que passam a ser da
competência dos Julgados de Paz, manterão a competência para
os processos pendentes na data da instalação dos Julgados.
Capítulo III
(Dos Juizes de Paz)
Artigo 7º
(Eleição)
1. O Juiz de Paz será eleito por voto secreto pela Assembleia Municipal
, de entre os candidatos considerados aptos pelo Conselho Superior da Magistratura
em concurso curricular aberto para o efeito.
2. É razão de preferência na selecção a realizar
pelo Conselho a que se refere o número anterior, para além da
consideração da nota de curso, o preenchimento de alguma das seguintes
condições:
a) Prática judiciária por um período de,
no mínimo, 5 anos;
b) Ser eleitor inscrito na respectiva freguesia ou em alguma das freguesias
agrupadas.
Artigo 8º
(Período do exercício de funções)
O Juiz de Paz é eleito para um período de 3 anos, renovável pelo Conselho Superior da Magistratura.
Artigo 9º
(Requisitos)
Só pode ser eleito Juiz de Paz quem reuna cumulativamente os seguintes requisitos:
a) Ter a cidadania portuguesa;
b) ter mais de 25 anos;
c) ter licenciatura em direito;
d) estar no pleno gozo dos direitos civis e políticos;
e) não ter sofrido condenação nem estar pronunciado por
crime doloso;
f) ser cidadão eleitor.
Artigo 10º
(Estatuto do Juiz de Paz)
O Estatuto do Juiz de Paz constará do diploma que regulamentar a presente
lei.
Capítulo IV
(Dos representantes do Ministério Público)
Artigo 11º
(Nomeação)
A Procuradoria Geral da República poderá nomear um representante, que não seja magistrado de carreira, para intervenção em processo criminal.
Artigo 12º
( Estatuto)
Aos representantes do Ministério Público nomeados aplica-se, na parte compatível, o Estatuto dos Magistrados do Ministério Público.
Capítulo V
Mandatários Judiciais
Artigo 13º
(Processo Cível)
1. Nas causas cíveis as partes podem pleitear por si mesmas ou constituir
advogado ou solicitador.
2. Se a parte requerer a nomeação de advogado, provando através
de atestado da Junta de Freguesia a sua insuficiência económica,
o Juiz de Paz nomeia-lhe um patrono de entre os constantes de escalas organizadas
pela Ordem dos Advogados e pela Câmara dos Solicitadores.
Artigo 14º
(Processo Criminal)
1. Em processo criminal o arguido será obrigatoriamente assistido por
defensor, que lhe será nomeado quando não tiver constituído
advogado.
2. A nomeação recairá em advogado ou advogado estagiário
constante de escala organizada pela Ordem dos Advogados
3. Na fase conciliatória a defesa poderá ser assegurada pelo próprio
arguido.
Artigo 15º
(Patrocínio jurídico gratuito e defesa oficiosa)
Observar-se-á, com as necessárias adaptações, o regime geral do apoio judiciário e o sistema de remuneração previsto para os defensores oficiosamente nomeados.
Capítulo VI
(Secretaria do Julgado de paz)
Artigo 16º
(Serviços de Secretaria)
Os Julgados de Paz dispõem de serviços de Secretaria próprios, cuja dotação será fixada por Portaria do Ministério da Justiça, ouvidos os Conselhos Superiores da Magistratura Judicial, do Ministério Público e dos Oficiais de Justiça.
Artigo 17º
(Funcionários)
O regime de constituição, modificação e extinção da relação jurídica dos funcionários da Secretaria constará da regulamentação do presente diploma.
Capítulo VII
Processo Cível
Secção I
Regras Gerais
Artigo 18º
(Simplicidade dos actos processuais )
O processo caracteriza-se pela simplicidade, limitando-se ao mínimo o registo dos actos.
Artigo 19º
(Citações e notificações)
1.A citação só poderá ser pessoal por via postal
registada, por mandatário judicial ou edital.
2. Se não for possível citar o Réu através de citação
pessoal, será citado por éditos de 15 dias a afixar na sede da
Junta de Freguesia da sua residência, e no local onde funcionar o Tribunal
3. As notificações das partes que não tenham mandatário
constituído, serão efectuadas nos termos previstos no Código
do Processo Civil
4. As notificações aos mandatários judiciais serão
efectuadas nos termos previstos no Código do Processo Civil.
Artigo 20º
(Tramitação processual)
O processo cível conterá as seguintes fases:
a) A apresentação da demanda, verbalmente , ou
por escrito, em formulário a criar no diploma regulamentador da presente
lei;
b) conferência a realizar imediatamente a seguir à apresentação
da demanda com a parte apresentante, com vista à prolação
imediata do despacho inicial, e à realização da tentativa
de conciliação das partes, se ambas se encontrarem presentes.
c) despacho inicial de deferimento ou indeferimento da demanda, e para marcação
do dia para a realização da audiência de discussão
e julgamento.
d) audiência de discussão e julgamento.
Artigo 21º
(Contestação)
1. O Réu pode apresentar contestação escrita até
à audiência ou verbalmente, no seu início.
2. Quando o Réu , tendo sido citado pessoalmente, não comparecer
nem apresentar contestação escrita, será, de imediato,
condenado no pedido.
3. Tendo sido o Réu citado por éditos, haverá obrigatoriamente
julgamento, sendo o Réu representado por defensor nomeado pelo Juiz de
Paz, de escala organizada pela Ordem dos Advogados, e pela Câmara dos
Solicitadores.
Artigo 22º
(Produção de prova)
1. As testemunhas, em número não superior a três por cada
parte, serão indicadas, respectivamente, na apresentação
da demanda ou na contestação, ou verbalmente no início
da audiência.
2. A prova documental deverá ser apresentada no momento da apresentação
da demanda, podendo, no entanto, ser produzida no início da audiência,
desde que a parte apresentante da mesma, prove que deu conhecimento da prova
a produzir à parte contrária até 5 dias antes do dia da
audiência, ou desde que não haja oposição da parte
contrária.
3. Não é possível a produção de prova por
carta rogatória ou precatória.
4. As testemunhas serão apresentadas pelas partes na audiência
de discussão e julgamento.
5. Requerida prova pericial, cessa a competência do Julgado de paz, remetendo-se
os autos ao Tribunal de Comarca para aí prosseguirem , nos termos do
Código do Processo Civil, com aproveitamento dos actos já praticados.
Artigo 23º
(Audiência)
1. A audiência não poderá ser adiada.
2. O Juiz de Paz, no início da audiência, procurará conciliar
as partes quando se encontrarem presentes ou representadas, com vista à
solução amigável do litígio.
3. O acordo, quando o houver, será ditado para a acta que servirá
de título executivo.
4. Frustrada a conciliação, seguir-se-à de imediato a produção
de prova.
Artigo 24º
(Resolução de litígios entre proprietários de prédios
confinantes)
O Julgamento dos litígios entre proprietários de prédios confinantes será, em regra, realizado no local da localização dos prédios.
Artigo 25º
(Alegações)
As partes, ou os seus mandatários, quando os houver, alegarão resumidamente, sobre a matéria de facto e de direito, imediatamente a seguir à produção da prova.
Artigo 26º
(Sentença)
No termo da audiência, ou nos dez dias seguintes quando a dificuldade do caso o justifique, o Juiz de Paz ditará para a acta, na presença das partes sempre que possível, apenas a decisão resumidamente fundamentada.
Artigo 27º
(Acta da audiência)
Da audiência lavrar-se-à uma acta resumida, da qual constarão as ocorrências mais importantes e os principais meios de prova produzidos com registo sumário dos depoimentos.
Artigo 28º
(Recurso)
1. Da decisão final, relativamente à qual não poderá
haver reclamação, haverá recurso para o Tribunal de Comarca,
com efeito suspensivo
2. O prazo de recurso de sentença proferida à revelia do Réu
conta-se a partir da notificação na pessoa do defensor.
3. Não há recurso, nem reclamação de quaisquer outras
decisões.
Artigo 29º
(Interposição do recurso)
1. O recurso interpõe-se mediante declaração na acta,
da qual constem sucintamente a motivação e as conclusões,
imediatamente após a leitura da sentença.
2. A resposta será também ditada para a acta, sendo a motivação
também apresentada de uma forma sucinta.
3. O Juiz de Paz só poderá rejeitar o recurso se faltarem totalmente
a motivação e as conclusões.
4. Admitido o recurso, o Juiz de Paz remeterá os autos para o Tribunal
de Comarca.
Artigo 30º
(Recurso no Tribunal de Comarca)
1. Recebidos os autos no Tribunal de Comarca, a Secretaria notificará
as partes que não tenham advogado constituído para, querendo,
constituírem mandatário no prazo de 10 dias.
2. Os mandatários constituídos poderão, no prazo da constituição,
suprir omissões ou deficiências das motivações e
conclusões já apresentadas.
Secção II
Conciliação em sede não contenciosa
Artigo 31º
(Objecto)
1. Em caso de litígio de natureza cível ainda não pendente
em Tribunal entre pessoas que residam ambas ou tenham domicílio na área
da competência territorial do julgado de paz , uma ou ambas as partes
podem requerer verbalmente ao Juiz de Paz que realize tentativa de conciliação,
com vista à composição não litigiosa do conflito.
2. Estando ambas as partes presentes na altura da apresentação
do requerimento, proceder-se-á de imediato à diligência.
3. Sendo requerida a diligência apenas por uma das partes, será
de imediato designado dia para a diligência, notificando-se a outra para
comparecer no dia designado .
Artigo 32º
(Título executivo e valor probatório do acordo)
1. Caso o julgado de paz seja competente em razão da matéria
para a decisão da causa, o acordo lavrado em acta servirá de título
executivo.
2. Em matérias cíveis cuja competência não pertença
aos julgados de paz, o acordo lavrado em acta valerá como documento particular,
equivalendo a intervenção do Juiz de Paz à intervenção
notarial.
Artigo 33º
(Tramitação processual)
Os processos relativos à intimação para consulta de documentos ou passagem de certidões da competência do Juiz de Paz seguem os termos previstos na lei de processo dos Tribunais Administrativos
Capítulo IX
Processo Penal
Artigo 34º
(Processo sumário)
1. Sempre que se verifiquem as condições para que um arguido
seja julgadoem processo sumário, quando o Ministério Público
entenda que no caso é apenas de aplicar a pena de multa alternativa,
o arguido será apresentado ao Juiz de Paz para proceder ao julgamento.
2. Ao processo sumário que corra seus termos no Julgado de paz são
aplicáveis as disposições do Código do Processo
Penal com as seguintes alterações:
a) A audiência não poderá ser adiada, e,
se houver lugar a adiamento nos termos do artigo 386º do Código
do Processo Penal , os autos serão imediatamente remetidos ao Tribunal
de Comarca onde prosseguirão nos termos aí previstos;
b) A apresentação da acusação é substituída
pela leitura do auto de notícia pelo representante do Ministério
Público, se estiver presente, ou quando tal se não verifique,
pelo funcionário que assiste o Juiz.
Artigo 35º
(Processo abreviado)
1. Encerrada a instrução ou decorrido o prazo sem que a mesma
tenha sido requerida, os autos serão remetidos ao Julgado de paz para
julgamento nos termos previstos no Código do Processo Penal, se o crime
for punível com pena de multa ou se o Ministério Público
entender que ao arguido deve ser aplicada pena ou medida de segurança
não privativas da liberdade.
2. A documentação dos actos da audiência será efectuada
por súmula.
3. A sentença é proferida verbalmente de imediato, sendo ditada
para a acta.
Artigo 36º
(Processo sumaríssimo)
1. Rejeitado o requerimento do Ministério Público do Tribunal
de Comarca para que os autos se processem na forma sumaríssima, ou opondo-se
o arguido ao requerimento, se o crime for punível com pena de multa ou
se o Ministério Público tiver proposto pena ou medida de segurança
não privativas da liberdade, os autos prosseguirão seus termos
no Tribunal de Comarca para prática dos actos que aí devam ser
praticados até à remessa ao Julgado de paz.
2. O Julgamento seguirá, com as devidas adaptações, os
termos previstos para o Processo Penal.
Artigo 37º
(Processo comum)
1. Antes de autuada qualquer participação criminal, esta será
apresentada ao Ministério Público do Tribunal de Comarca competente,
o qual, se entender que ao arguido deve aplicar-se pena de multa ou qualquer
outra pena ou medida de segurança não privativa da liberdade,
ordenará a sua remessa ao Julgado de paz, após os actos que devam
ser praticados no Tribunal de Comarca.
2. O Juiz de Paz, verificando a probabilidade séria da existência
de qualquer circunstância, ainda não considerada, que possa determinar
a aplicação de pena privativa da liberdade, declarar-se-á
incompetente para apreciação da causa, remetendo os autos ao Tribunal
de Comarca, onde os autos seguirão definitivamente os seus termos.
3. O despacho do Juiz de Paz não impede que ao arguido, em caso de condenação,
possa ser aplicada pena não privativa da liberdade.
Artigo 38º
(Acusação)
1. No despacho referido no nº 1 do artigo anterior, o Ministério
Público indicará os factos a provar na audiência de discussão
e julgamento, e as normas jurídicas violadas pelo comportamento do arguido,
indicando a prova a produzir na audiência de discussão e julgamento
2. Caso se mostre necessária a realização de qualquer diligência
de prova, que não seja a prova testemunhal ,o Ministério Público
ordenará a realização da mesma antes de proferir o despacho
referido no número anterior.
3. A prova testemunhal da acusação, que não conste do inquérito
realizado pelos órgãos de polícia criminal e por estes
remetido ao Ministério Público, será apenas produzida na
audiência de discussão e julgamento, ou, caso seja requerida, na
instrução.
4. Apresentada qualquer participação criminal nos serviços
do Ministério Público e após notificação
ao participante para indicação dos meios de prova, sendo caso
disso, seguir-se-á de imediato a prolação do despacho referido
no nº1 do artigo anterior.
Artigo 39º
(Pedido Cível)
1. O despacho e a acusação serão notificados ao ofendido
e ao arguido.
2. O ofendido será notificado para se constituir assistente, querendo,
e apresentar o pedido cível, no prazo de 10 dias.
Artigo 40º
(Instrução e Contestação)
O arguido será notificado para, querendo, requerer a abertura de instrução, ou apresentar a contestação e os meios de prova a produzir, e para contestar o pedido cível, no prazo de 20 dias.
Artigo 41º
(Remessa dos autos ao Julgado de paz)
1. Decorrido o prazo para a abertura de instrução sem que a mesma
tenha sido requerida, ou proferido despacho de pronúncia, se, neste último
caso, o Ministério Público continuar a entender que ao crime deve
ser aplicada pena ou medida de segurança não privativas da liberdade,
o que deverá declarar no debate instrutório, os autos serão
remetidos para julgamento, ao Julgado de paz competente.
2. O arguido indicará a prova a produzir na audiência de discussão
e julgamento no prazo de 10 dias a contar do despacho de pronúncia.
3. Caso seja requerida prova pericial, os autos só serão remetidos
ao Julgado de paz após a produção da mesma.
Artigo 42º
(Crimes particulares)
1. Tratando-se de crime particular, antes do despacho referido no nº 1
do artigo 37º, o Ministério Público ordenará a notificação
do queixoso para deduzir acusação e apresentar, querendo, o pedido
cível, e para se pronunciar sobre se ao arguido deve ser aplicada pena
ou medida de segurança privativas da liberdade.
2. Se o Ministério Público acompanhar a acusação
particular, ordenará a notificação ao arguido da mesma
e do pedido cível para que este requeira, querendo, a abertura de instrução
ou apresente a contestação com os meios de prova a produzir, e
deduza oposição ao pedido.
3. Não sendo requerida abertura da instrução, os autos
serão remetidos ao Julgado de paz, se o Ministério Público
entender que deve ser aplicada só pena de multa ou outra pena ou medida
de segurança não privativas da liberdade.
4. Requerida a abertura de instrução, seguir-se-ão os termos
previstos no número 1 do artigo anterior.
Artigo 43º
(Abertura de instrução em caso de arquivamento do inquérito)
1. No processo comum cujo julgamento possa vir a ser da competência do
Julgado de paz, sempre que a instrução tenha sido requerida visando
a comprovação judicial da decisão de arquivar o inquérito,
o assistente deduzirá pedido cível no requerimento da abertura
da instrução.
2. O arguido será notificado para se opor, querendo, devendo indicar,
desde logo, os meios de prova a produzir em audiência de discussão
e julgamento.
3. No debate instrutório o Ministério Público deverá
pronunciar-se sobre a natureza da pena a aplicar ao arguido, no caso de ser
proferido despacho de pronúncia.
4. Caso o Ministério Público se tenha pronunciado no sentido de
ao arguido ser aplicada pena de multa ou qualquer outra pena não privativa
da liberdade, se for proferido despacho de pronúncia os autos serão
remetidos ao Julgado de paz competente para aí prosseguirem seus trâmites.
Artigo 44º
(Designação de dia para a audiência)
1. Recebidos os autos , o Juiz de Paz designará dia para a audiência
de discussão e julgamento, no prazo de 5 dias.
2. O ofendido e o arguido podem aditar ou alterar a prova já oferecida
no prazo de 5 dias após a notificação para comparecimento
na audiência.
Artigo 45º
(Testemunhas)
1. A acusação e a defesa não podem indicar mais do que
5 testemunhas.
2. Não há lugar à audição de testemunhas
por carta rogatória ou precatória
Artigo 46º
(Audiência de discussão e julgamento)
1. No início da audiência, tratando-se de crime público
ou semi-público, o Juiz de Paz procurará a composição
das partes, e, se obtida, os autos serão arquivados sem qualquer encargo
para o ofendido ou o arguido.
2. Gorada a conciliação, seguir-se-á a produção
de prova nos termos aplicáveis do Código do Processo Penal.
3. A documentação dos actos da audiência, se requerida,
será efectuada por súmula.
Artigo 47º
(Sentença)
A sentença será ditada para a acta imediatamente a seguir às alegações, ou, quando a dificuldade do caso o justifique, em prazo não superior a 10 dias.
Artigo 48º
(Recurso)
Ao recurso aplicam-se, com as devidas adaptações, as disposições sobre recurso em processo penal.
Artigo 49º
(Suspensão da prescrição do procedimento criminal)
O prazo de prescrição do procedimento criminal suspende-se com o despacho que ordenar a remessa dos autos ao Julgado de paz, e só volta de novo a correr na data em que naquele Tribunal for distribuído.
Capítulo X
(Encargos)
Artigo 50º
(Custas)
1. No Julgados de Paz não há lugar ao pagamento de preparos
sendo as custas pagas a final.
2. Estão isentos de custas os processos de natureza cível ou penal
sempre que terminem por acordo ou por desistência de queixa.
3. Havendo recurso as custas do processo serão liquidadas a final pelo
Tribunal de Comarca.
Capítulo XI
Artigo 51º
(Disposições finais)
Aos processos regulados no presente diploma, e em tudo o que não colida com as especialidades dele constantes, aplicam-se subsidiariamente, consoante a natureza do processo, as disposições do processo civil, do processo penal ou do processo administrativo.
Artigo 52º
(Entrada em vigor)
Sem prejuízo da sua entrada em vigor nos termos gerais, a aplicação da presente lei fica dependentes da entrada em vigor do diploma que a regulamente.
Artigo 53º
(Efeitos financeiros)
A presente lei só produz efeitos financeiros com a entrada em vigor da Lei do Orçamento de Estado posterior à sua aprovação.
Assembleia da República, em 20 de Janeiro de 2000
Os Deputados