O PCP defendeu a consagração constitucional deste mecanismo, apresentando uma proposta nesse sentido no seu projecto de revisão constitucional. Consagrado como foi, importa agora concretizá-lo.
As soluções propostas pelo PCP visam facilitar o exercício deste direito, despindo-o de formalismos desnecessários.
Considera-se o número de cinco mil cidadãos eleitores como um número mínimo adequado. Na verdade, se cinco mil cidadãos podem fundar um partido, não se compreenderia que não pudessem suscitar a apreciação pela Assembleia de uma iniciativa legislativa.
Através de diferentes mecanismos, procura-se dar corpo a um princípio de aproveitamento útil da iniciativa, evitando burocratizá-la ou fazê-la precludir por razões que possam ser superadas. É isso que justifica os mecanismos previstos nos artigos 6º, nºs 3 e 4, 8º, nº 2, 9º, nº 2 e 13º, nºs 2 e 3.
Consagra-se o princípio da obrigatoriedade da apreciação e votação da iniciativa pela Assembleia da República, fixando-se nesse sentido regras e prazos de tramitação (artigos 10º, 11º e 12º).
Procura-se ainda garantir que os peticionários possam acompanhar todos os passos processuais da iniciativa, consagrando um princípio de notificação obrigatória (artigo 5º).
Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projecto de lei:
Artigo 1º
Direito de iniciativa legislativa
Os cidadãos eleitores gozam do direito de iniciativa legislativa junto da Assembleia da República, nos termos e condições do disposto na presente lei.
Artigo 2º
Titularidade
A iniciativa legislativa é exercida por um número mínimo de 5.000 cidadãos eleitores.
Artigo 3º
Iniciativa
1. A iniciativa legislativa é dirigida ao Presidente da Assembleia da República.
2. Os signatários devem ser identificados pelo nome completo, número de eleitor e residência.
Artigo 4º
Representantes
1. O primeiro signatário da iniciativa será, para todos os efeitos, o representante do grupo de cidadãos eleitores, a menos que outra indicação resulte do texto da petição.
2. A iniciativa pode conter a indicação expressa de um grupo promotor.
Artigo 5º
Notificação do representante
O representante do grupo de cidadãos eleitores será notificado de todos os actos do processo legislativo decorrente da iniciativa apresentada ou conexa com ela.
Artigo 6º
Forma
1. A iniciativa é apresentada por escrito e subscrita nos termos do artigo 3º.
2. A iniciativa deve definir concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa, e deve conter uma breve justificação ou exposição de motivos.
3. Se a iniciativa não estiver redigida sob a forma de artigos ou se não contiver a designação proposta, é submetida aos serviços de apoio jurídico da Assembleia da República.
4. Os serviços referidos no número anterior, no prazo de quinze dias, sugerem um título e um articulado para a iniciativa, sendo então notificado o representante do grupo de cidadãos eleitores, que aceita o texto proposto ou apresenta outro que considere coincidente com o conteúdo da iniciativa.
Artigo 7º
Objecto
Podem ser objecto de iniciativa legislativa popular todas as matérias sobre as quais a Assembleia da República pode legislar, com excepção das matérias em que a iniciativa é expressamente reservada a determinadas entidades.
Artigo 8º
Limite da iniciativa
1. Os grupos de cidadãos eleitores não podem apresentar iniciativas que, em violação do disposto no artigo 167º, nº 2 da Constituição, envolvam, no ano económico em curso, aumento das despesas ou diminuição das receitas do Estado previstas no Orçamento.
2. Verificando-se, em iniciativa apresentada por cidadãos eleitores, a situação referida no número anterior, o Presidente da Assembleia da República notifica o representante desse grupo, para que diga se mantém a iniciativa para vigorar somente a partir do ano económico seguinte, caso em que a iniciativa será admitida.
Artigo 9º
Admissão
1. A iniciativa legislativa popular só não será admitida nos seguintes casos:
a) se não estiver subscrita pelo número mínimo de cidadãos
eleitores identificados nos termos da presente lei;
b) se não for indicado concretamente o sentido das modificações
a introduzir na ordem legislativa;
c) se infringir a Constituição ou os princípios nela
consignados;
d) se não respeitar os limites do objecto definido no artigo 7º;
e) se, no caso do artigo 8º, não for aceite a vigência da
iniciativa para o ano económico seguinte.
2. O Presidente da Assembleia da República, antes do despacho de não admissão, deve notificar o representante, para suprir as deficiências encontradas.
3. A decisão do Presidente da República de não admissão é obrigatoriamente sujeita a ratificação do plenário.
Artigo 10º
Exame em Comissão
1. Admitida a iniciativa, o Presidente da Assembleia da República ordena que ela baixa à Comissão Especializada competente em razão de matéria, para emissão de parecer.
2. O parecer deve ser emitido no prazo de 20 dias.
3. A Comissão notifica o representante para expor a iniciativa e dar as explicações que lhe forem solicitadas.
Artigo 11º
Agendamento
1. Recebido o parecer da Comissão, ou esgotado o prazo referido no artigo anterior, a iniciativa legislativa é agendada para uma das dez reuniões plenárias seguintes.
2. A iniciativa é obrigatoriamente apreciada pelo Plenário.
Artigo 12º
Votação
A votação na generalidade e, sendo caso disso, a votação na especialidade e votação final global da iniciativa, devem estar concluídas no prazo de sessenta dias após o agendamento referido no artigo anterior.
Artigo 13º
Renovação e caducidade
1. As iniciativas legislativas populares definitivamente rejeitadas não podem ser renovadas na mesma sessão legislativa.
2. As iniciativas legislativas populares não votadas na sessão legislativa em que foram apresentadas não carecem de ser renovadas na sessão legislativa seguinte.
3. As iniciativas legislativas populares caducam no termo da legislatura, mas para a sua renovação pode ser usada a mesma lista de subscritores.
Assembleia da República, em 2 de Fevereiro de 2000
Os Deputados