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Projecto de Lei n° 28/VII
Sobre o regime de competências e meios financeiros das freguesias, com vista à sua dignificação e fortalecimento

Situação


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De acordo com os compromissos assumidos pelo PCP no seu programa eleitoral, o Grupo Parlamentar do PCP reapresenta o Projecto de Lei de reforço das competências e meios financeiros das Freguesias.

Foi em 27 de Junho de 1989 que o Grupo Parlamentar do PCP apresentou o Projecto de Lei n° 417/V "sobre o regime de competências e meios financeiros das freguesias, com vista à sua dignificação e fortalecimento". Era então a primeira iniciativa legislativa a dar entrada na Assembleia da República visando contribuir decisivamento para a dignificação e reforço das freguesias, essencialmente na zona das suas competências e meios financeiros, dando continuidade às posições que o PCP sempre defendeu sobre o importante papel desta autarquia no processo de descentralização democrática do Estado.

Era ainda mais um contributo para o processo de renascimento da freguesia de que significativamente se tinha falado no debate público promovido pela ANAFRE em 8 de Abril de 1989, em Lisboa, subordinado ao tema "O papel das Freguesias na Administração Portuguesa". O consenso obtido entre os participantes no debate (provenientes de forças políticas de quadrantes muito diferenciados) foi particularmente significativo quanto à saliência do papel da freguesia e quanto à necessidade do reforço desse papel. A própria constituição da ANAFRE, Associação Nacional de Freguesias, é expressão desse processo de renascimento. Contrariando o definhamento e apagamento que alguns arautos da desgraça já anunciavam, foram os próprios eleitos das freguesias a dar corpo à reivindicação do "lugar ao sol" a que sem sombra de dúvida as freguesias têm direito.

Com a realização do II Congresso da ANAFRE em Braga, em 5 de Maio de 1990, foi reafirmado por unanimidade dos autarcas das freguesias de todos os quadrantes político partidários que "o reforço da capacidade financeira e administrativa das freguesias, a dignificação do seu papel e das condições de exercício do mandato dos respectivos eleitos, são condições indispensáveis à satisfação dos interesses das populações que representam e constituem exigência de um Estado democrático que se pretende eficaz".

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Culminando todo um processo de intensos debates, por marcação do Grupo Parlamentar do PCP para a ordem do dia de 8 de Maio de 1990, foi agendado o debate em plenário do Projecto de Lei n° 417/V do PCP sobre "regime de competências e meios financeiros das freguesias, com vista à sua dignificação e fortalecimento".

Em debate estiveram igualmente outras iniciativas legislativas surgidas posteriormente na sequência daquele Projecto de Lei. O debate parlamentar foi esclarecedor. O PSD não quis aproveitar o debate para descentralizar, fortalecer o Poder Local e melhorar a capacidade de resposta aos problemas das populações. Preferiu manter-se surdo às reivindicações das freguesias e longe das realidades do país. E ficou isolado na votação que impediu o reforço das competências e meios financeiros das Freguesias. A VI legislatura, e apesar das iniciativas e esforços do Grupo Parlamentar do PCP, não veio alterar a situação.

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Ao retomar agora esta iniciativa legislativa, no quadro de uma nova legislatura, enriquecida pelo intenso debate entretanto realizado, que conduziu, aliás, a uma alteração do texto que está contida no artigo 3°, alínea g), o PCP procura criar as condições para que a curto prazo a Assembleia da República, nesta legislatura que agora se inicia, faça justiça às freguesias, às populações que aí residem e aos autarcas que elegeram.

A freguesia é o primeiro degrau do edifício do Poder Local e não a autarquia "de segunda" a que alguns a querem remeter. Nunca é demais salientar o papel privilegiado da freguesia resultante da sua maior proximidade das populações e da sua directa apreciação dos problemas e intervenção na sua solução.

Com o presente projecto de lei, o PCP visa contribuir para a dignificação e reforço das freguesias essencialmente na zona das suas competências e meios financeiros. Mas, impõe-se sublinhá-lo, esse reforço e fortalecimento das freguesias é proposto com o sentido claro de reforço e fortalecimento de todo o edifício do Poder Local. Assim como o Poder Local ganhará com a criação das Regiões Administrativas, assim como será robustecido com o aprofundamento das garantias da autonomia financeira e técnica dos Municípios, assim sairá reforçado com a dignificação e fortalecimento das Freguesias.

O processo de fortalecimento das Freguesias não é feito contra nenhuma das estruturas democráticas do Estado. É feito a favor da descentralização e democratização das estruturas do Estado e da vida política, é feito a favor dos interesses populares e do direito de participação das populações. Se é feito contra alguém, é feito contra os adversários do Poder Local, contra os defensores dos processos da centralização e da ingerência na vida das autarquias locais.

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A vida já demonstrou que é urgente a reforma legislativa da Freguesia. As freguesias constituem a maior rede do sistema de descentralização democrática do Estado e a mais próxima das populações. A reforma legislativa necessária deverá potenciar e desenvolver as virtualidades dessa rede de freguesias, e que resultam das suas características próprias: proximidade das populações, proximidade e conhecimento directo dos problemas, flexibilidade na resposta às questões.

É à Assembleia da República que cabe o papel de concretizar a reforma legislativa da freguesia, por força da repartição de competências entre os órgãos de soberania tal como está constitucionalmente consagrada.

Os principais bloqueios a vencer, nessa reforma legislativa, são os seguintes:

Falta de possibilidade legal de nomear eleitos a tempo inteiro;

Necessidade de levar mais longe a participação das freguesias nas receitas municipais;

Necessidade de as atribuições e competências das freguesias não serem delegadas por cada município, antes decorrerem directamente da lei, sem prejuízo de os municípios poderem levar mais longe o mínimo estabelecido por lei.

Quanto ao primeiro desses bloqueios, o PCPreapresenta hoje um Projecto de Lei autónomo, sobre o regime de permanência dos membros das Juntas de Freguesia, que reconhece esse direito a todas as Juntas com mais de quinhentos eleitores.

O presente Projecto de Lei do PCP visa responder ao segundo e terceiro bloqueios.

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O essencial das soluções preconizadas no Projecto de Lei que o PCP agora reapresenta resultam mais claramente do seu articulado do que de qualquer explicação suplementar.

Importará contudo sublinhar, em primeiro lugar, que, ao configurar no artigo 3° um elenco de competências próprias, o Projecto de Lei do PCP propõe a introdução no regime jurídico das freguesias de uma solução altamente inovatória. que representa uma verdadeira alteração qualitativa desse regime.

Sendo novidade, procurou-se definir um elenco equilibrado de competências, sobre as quais existia já experiência, e teve-se em conta o conjunto de sugestões dos debates realizados com centenas de autarcas, designadamente o debate promovido pelo PCP em 14 de Março de 1990, bem como as conclusões dos Congressos da ANAFRE. Por outro lado, acautelaram-se outras competências próprias (artigo 3°, n° 2) e definiu-se a competência quanto as actividades culturais. desportivas e recreativas (artigo 4°). Finalmente, faz-se a caracterização das competências próprias como competências atribuídas a todas as freguesias com carácter geral e universal e de exercício obrigatório (artigo 2°).

A segunda grande novidade do Proiecto de Lei do PCP é a de consagrar a existência de protocolos de transferência de competências dos Municípios para as Freguesias (artigo 5°, n° 1), que permitirão o exercício de quaisquer outras competências municípais (para além das próprias das freguesias), designadamente das referidas com caráctér exemplificativo no artigo 5° n° 3. O Projecto de Lei, no n° 2 do mesmo artigo 5°, define a forma de aprovação dos protocolos.

É de sublinhar entretanto que a novidade está só na consagração legal desta possibilidade, já que ela já foi experimentada e posta em prática em alguns municípíos.

Novidade é também a consagração legal da possibilidade de constituição de associações públicas de freguesia, nos mesmos termos em que o podem fazer os municípios (artigo 8°). Esta possibilidade de as freguesias poderem colaborar entre si no exercício das suas competências, constituindo para o efeito associações de natureza pública, revestirá o maior interesse para a dinamização do trabalho das freguesias e para a satisfação dos interesses das populações.

Em quarto lugar, o Projecto de Lei garante a elevação significativa do financiamento das freguesias, quer pela duplicação do mínimo de transferência do Orçamento do Estado (artigo 10°), quer pela afectação de novas receitas (artigo 9°).

Também aqui a novidade está na consagração legal, isto porque muitos municípios já vinham praticando valores mais altos de transferência do que os 10% previstos hoje na Lei de Finanças Locais.

Finalmente, quinto traço a salientar, o Projecto de Lei do PCP inova mais uma vez quando define que a transferência de competências (por protocolo) implica obrigatoriamente a trasferência dos meios financeiros necessários e suficientes.

A última anotação refere-se à disposição do artigo 13°, que prevê o destacamento e transferência dos trabalhadores, acautelando a vontade, os interesses e os direitos adquiridos de todas as partes (municípios, freguesias e trabalhadores).

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A concretização do programa legislativo contido no presente Projecto de Lei depende fundamentalmente de haver vontade política para o concretizar.

É com expectativa que as Freguesias aguardam a manifestação desta vontade.

É com este sentido que os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam, ao abrigo da Constituição da República Portuguesa e do Regimento da Assembleia da República, o seguinte Projecto de Lei:

Capítulo I

DAS COMPETÊNCIAS

Artigo 1°

(Áreas de Competências)

As freguesias detêm competências próprias e podem ainda exercer facultativamente outras competências, nos termos da presente lei.

Artigo 2°

(Regime das Competências Próprias)

As competências próprias são atribuidas a todas as freguesias com carácter geral e universal e o seu exercício é obrigatório.

Artigo 3°

(Competências Próprias)

1- São competências próprias das freguesias as seguintes:

a) Conservação, limpeza e gestão de balneários, lavadouros e sanitários;

b) Manutenção e gestão de parques infantis;

c) Conservação, limpeza e gestão de cemitérios fora das sedes do município;

d) Reparação e conservação de chafarizes e fontanários;

e) Material de limpeza e de expediente das escolas primárias e pré-primárias;

f) Conservação de abrigos de passageiros não concessionados a empresas;

g) Passagem de licenças de canídeos, bicicletas e veículos de tracção animal.

2- Ás competências próprias constantes do número anterior acrescem as que noutras áreas de actividade são hoje atribuidas às freguesias pela legislação em vigor.

Artigo 4°

(Actividades culturais, desportivas e recreativas)

A freguesia participa no desenvolvimento das actividades culturais, desportivas e recreativas da sua área, competindo-lhe a definição de medidas de apoio, dinamização e incentivo que sejam da sua esfera de acção.

Artigo 5

(Competências delegadas)

1- Por protocolo celebrado entre a Camara Municipal e a Junta, a Freguesia pode assumir outras competências que lhe sejam transferidas pelas Câmaras.

2- Os protocolos referidos no número anterior são obrigatoriamente ratificados pelas respectivas Assembleia Municipal e Assembleia de Freguesia.

3- Pode ser objecto de protocolo de delegação, nos termos dos números anteriores, qualquer das competências dos Municípios, designadamente as seguintes:

a) Limpeza e conservação de valetas, bermas e caminhos;

b) Reparação e conservação de calcetamentos em ruas e passeios;

c) Manutenção e gestão de jardins e outros espaços ajardinados;

d) Colocação e manutenção da sinalização toponimica;

e) Reparação, conservação, limpeza e gestão de mercados retalhistas e de levante;

f) Reparação, conservação e gestão de equipamentos desportivos e sociais;

g) Reparação e conservação de escolas primárias e pré-primárias.

Artigo 6°

(Competência para a prática de actos administrativos)

1- As freguesias têm competência para a prática dos actos administrativos necessários ao exercício das suas competências.

2- Por protocolo, podem ser atribuidas às freguesias competências para a prática de outros actos administrativos, incluindo para a passagem de licenças em matéria da competência das Câmaras Municipais.

Artigo 7°

(Competência regulamentar)

1- As freguesias exercem competência regulamentar na área das competências que exercerem.

2- A competência regulamentar cabe á Assembleia de Freguesia.

Capítulo II

DAS ASSOCIAÇÕES DE FREGUESIAS

Artigo 8°

(Associações de freguesias)

1- As freguesias podem associar-se para o exercício das respectivas competências e para a prossecução de objectivos comuns.

2- Às associações de freguesias é aplicável, com as necessárias adaptações, a legislação sobre associações de municípios.

Capítulo III

DO REGIME FINANCEIRO

Artigo 9°

(Receitas das freguesias)

Às receitas das freguesias previstas no artigo 18° da Lei de Finanças Locais acresce a receita proveniente dos preços, tarifas, taxas ou licenças que resultem das novas actividades das freguesias, decorrentes do alargamento das suas competências.

Artigo 10°

(Participação das freguesias nas receitas municipais)

É elevada para o mínimo de 20% da verba proveniente do Fundo de Equilíbrio Financeiro para as despesas correntes a percentagem a transferir para as freguesias nos termos do artigo 20° da Lei de Finanças Locais.

Artigo 11°

(Financiamento das competências delegadas)

1- A assunção de competências delegadas implica a transferência pelo município dos meios financeiros necessários e suficientes para o respectivo exercício.

2- Os protocolos de transferência de competências incluirão a previsão da correspondente transferência financeira.

3- As transferências financeiras referidas nos números anteriores acrescem aos meios financeiros que decorrem dos artigos 9° e 10°.

Capítulo IV

DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS

Artigo 12°

(Aplicação do novo regime)

O regime de competências próprias e respectivos meios financeiros tem aplicação a partir de 1 de Janeiro do ano seguinte ao da publicação da presente lei.

Artigo 13°

(Pessoal)

1- Por protocolo celebrado entre a Câmara e a Junta e ratificado pelas respectivas Assembleias, podem ser destacados ou transferidos trabalhadores do Município afectos às áreas de competência assumidos pelas freguesias.

2- A transferência só pode efectivar-se com o acordo do trabalhador.

3- Em caso algum, poderá resultar da transferência ou destacamento a afectação dos direitos adquiridos e regalias dos trabalhadores.

 

Assembleia da República, 24 de Novembro de 1995

Os Deputados,