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A Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos é uma lagoa costeira que resulta da confluência das águas da Ribeira de Rio Maior (a norte) e da Ribeira da Maceda (a sul), ambas fortemente poluídas por efluentes domésticos e industriais. Situa-se a norte do Distrito de Aveiro, tem uma forma grosseiramente triangular e ocupa uma área com cerca de 396 hectares.
A primeira referência à sua existência é do ano 897, sendo então designada como Lagoa de Ovil, tendo servido de coutada no século XII devido à abundância em caça e pesca.
Nos terrenos adjacentes apresenta, a sul e sul-oeste, uma zona de dunas fixas com vegetação arbórea e arbustiva, por vezes muito densa, fortemente degradada pelo avanço da frente urbana; a oeste situa-se a praia e o cordão dunar litoral, cujo estado de degradação é preocupante, em especial na sua parte mais a norte; a frente este é constituída essencialmente por terrenos agrícolas, enquanto que a parte norte da lagoa é limitada por antigos fundos com vegetação rasteira, onde estão implantadas instalações militares e um aeródromo.
As lagunas costeiras representam, pelas suas características de zonas de transição entre o meio terrestre e marítimo, ecossistemas de grande riqueza e biodiversidade. Podem observar-se, em função dos gradientes de salinidade, meios diversos com tipos particulares de vegetação que albergam toda uma teia alimentar composta por insectos, anfíbios, repteis, mamíferos e aves.
A situação geográfica da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos, precisamente na zona fronteira entre os Concelhos de Espinho e de Ovar tem ocasionado indefinições e confusões quanto às entidades que devem assumir a administração e a responsabilidade pelas acções de recuperação e preservação desta laguna costeira.
Esta indefinição é agravada pelo facto daqueles dois Concelhos pertencerem a regiões-plano diferentes e, consequentemente, a responsabilização pela Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos poder ser imputável a diferentes organismos desconcentrados da Administração Central, sejam as Direcções Regionais do Ambiente do Norte e do Centro, sejam as Comissões de Coordenação Regional do Norte e do Centro.
Esta situação provoca e potencia situações pouco claras quanto à assunção de competências e de responsabilidades o que, na prática, tem gerado uma evidente desresponsabilização quanto à resolução integrada dos problemas colocados pela recuperação e preservação dos incalculáveis valores de biodiversidade que esta lagoa encerra.
Na verdade, a Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos constitui a única “laguna costeira” a norte do país e da costa ocidental de Espanha, estando classificada como prioritária na Directiva Habitat. Alberga inúmeras espécies de grande importância, muitas das quais protegidas, como é o caso do abetouro galego. Apresenta igualmente outros habitats prioritários, merecendo destaque a existência da jasione lusitanica, cuja população é considerada única na região mediterrânica.
No que diz respeito ao Anexo I da Directiva Habitat, (Directiva 92/43/CEE transposta pelo DL 226/97, de 27 de Agosto), a Barrinha de Esmoriz contabiliza no seu seio 11 habitats protegidos: lagunas costeiras, vegetação anual das zonas de acumulação de detritos pela maré, prados de Spartina (Spartinion maritimae), dunas móveis embrionária, dunas móveis do cordão litoral com Ammophila (“dunas brancas”), dunas fixas com vegetação herbácea (“dunas cinzentas), dunas fixas descalcificadas atlânticas (Calluno-Ulicetea), dunas com Salix repens ssp, Argêntea (Salicion arenariae), comunidades de ervas altas higrófilas das orlas basais e dos picos montano a alpino, e florestas aluviais de Alnus glutinosa excelsior (Alno-Padion, Alnon incanae, Salicion albae).
Quanto a espécies de aves de interesse ecológico foram já contabilizadas na Barrinha de Esmoriz cerca de 190 espécies de aves, com destaque para o já referido abetouro galego, a garça real, a cegonha negra, o maçarico, a andorinha do mar, o milhafre preto, o pato real, o pato marreco, o mergulhão, a galinha de água e muitas mais espécies, na sua esmagadora maioria parte integrante do anexo A1 do DL nº 140/99, referente a espécies de aves de interesse comunitário, cuja conservação requer a designação de zonas de protecção especial.
Sublinhe-se que a Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos constitui uma das últimas zonas húmidas da costa litoral norte que as aves migratórias, nomeadamente limícolas, marinhas e passeriformes, têm como ponto de escala dos seus trajectos migratórios. São elas, de entre toda a fauna e flora existente, que justificam com maior premência o interesse ecológico deste raro habitat.
Reforçando a necessidade da protecção e reposição da dinâmica natural desta zona, lembrar-se-á que num passado recente a Lagoa foi zona com influência de maré, riqueza adicional para o ecossistema lacustre e marinho ao permitir que várias espécies piscícolas a utilizem para desova.
As principais ameaças que pairam hoje sobre a Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos são, por ordem de importância, a poluição a montante das ribeiras de Rio Maior e de Maceda, a falta de ordenamento do território e, finalmente, o assoreamento da lagoa.
A poluição deriva do facto de ambas as ribeiras percorrerem zonas de grande densidade populacional e com presença assinalável de indústrias fortemente poluidoras (papel, cortiça).
O caos urbanístico presente, quer a sul, na freguesia de Esmoriz, quer a norte, na freguesia de Paramos, aliado ao uso indevido e descontrolado de todo aquele meio (depósitos de lixo, passeios de jipes nas dunas, etc…) têm também provocado fortes estragos naquela área. O assoreamento da Barrinha representa uma consequência natural de deposição de areias arrastadas pelas ribeiras, agravado pelo facto da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos ser artificialmente tapada no Verão para preservar a qualidade das águas balneares.
Infelizmente, e apesar de constar da Lista Nacional de Sítios através da Resolução do Conselho de Ministros nº 76/2000, este ecossistema não tem merecido a necessária atenção, facto para o qual, como já foi referido, não será alheia a localização da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos entre dois Concelhos, duas Direcções Regionais do Ambiente e duas CCRs. Acresce também que o Estatuto de Reserva de Interesse Regional ou Local (de acordo com o POOC Ovar-Marinha Grande) não tem permitido uma real e ampla abordagem dos complexos problemas ligados a esta laguna costeira, sendo que no concreto não existe, neste momento, nenhuma entidade responsável pela gestão deste património ambiental.
Refira-se que a concessão do processo de despoluição da Barrinha de Esmoriz à empresa SIMRIA representa um passo importante na recuperação daquele meio, mas continua a deixar em aberto a questão de se saber qual o organismo ou entidade que vai preservar, valorizar e potencializar aquele espaço e com que meios.
Face à dimensão do problema, e perante o conjunto de entidades envolvidas na área geográfica de localização da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos, tem o PCP defendido que o Governo deveria criar um Programa de Requalificação Ambiental da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos. Este Programa deveria articular investimentos e coordenar a intervenção dos vários níveis da Administração, potenciando a concretização de um conjunto de medidas destinadas à resolução dos problemas de poluição existentes e a implementação de soluções de descontaminação de solos e de águas subterrâneas.
Foi exactamente com o objectivo de vincular o Governo à criação de um Programa dessa natureza que o Grupo Parlamentar do PCP apresentou, já na anterior Legislatura, o Projecto de Resolução 166/VIII.
Se a despoluição é um objectivo que constitui uma condição necessária para a sua existência, a verdade é que há que ir bem mais além para preservar o ecossistema ambiental de valor incalculável da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos.
O facto, evidentemente positivo, da lagoa pertencer à Rede Natura 2000 exige dos responsáveis políticos, e sobretudo do Governo, uma responsabilidade acrescida em relação à forma como deve ser encarada a recuperação e preservação desta zona tão sensível mas igualmente tão rica do ponto de vista ecológico e ambiental.
De acordo com o processo de criação da Rede Natura 2000, cabe aos países comunitários que tenham proposto Listas Nacionais de Sítios a elaboração de planos de recuperação e valorização desses sítios, num horizonte que se esgota já em 2004. A resolução nº 66/2001 do Conselho de Ministros determinou, de resto, a elaboração destes Planos ao Instituto de Conservação da Natureza, fixando um prazo de um ano para a sua conclusão. O que, até hoje, ainda não aconteceu.
Neste contexto é urgente avançar com soluções que do ponto de vista institucional possam criar condições para uma acção concertada entre as diversas entidades envolvidas.
O Grupo Parlamentar do PCP decidiu, por isso, assumir a responsabilidade política de avançar com as soluções institucionais que entende serem adequadas para resolver a situação da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos. Tendo em conta que a lagoa constitui um ecossistema de enorme valor, o Partido Comunista Português considera que se justifica criar aí uma área protegida de interesse nacional com o modelo de gestão de Reserva Natural.
Assim, e tendo em atenção o Decreto-lei 19/93, de 23 de Janeiro,
os Deputados do PCP abaixo assinados apresentam o seguinte projecto de lei:
Artigo 1º
Criação
É criada a Área de Paisagem Protegida de interesse nacional da Barrinha de Esmoriz / Lagoa de Paramos.
Artigo 2º
Classificação
Propõe-se a classificação da Área Protegida como Reserva Natural a ratificar nos termos do nº 3 do Art. 13º da Lei 19/93, de 23 de Janeiro.
Artigo 3º
Limites
A Área Protegida tem os limites que correspondem aos definidos pela Resolução do Conselho de Ministros nº 76/2000, de 15 de Junho, publicada no Diário da República nº 153, I-Série B, de 5 de Julho de 2000.
Artigo 4º
Objectivos
Sem prejuízo do disposto no artigo 3º do Decreto-lei nº19/93 de 23 de Janeiro, constituem objectivos específicos da criação da Área Protegida:
a) A recuperação e preservação de valores naturais
e culturais através da conservação dos seus aspectos paisagísticos,
florestais e faunísticos;
b) A conservação e melhoria de aptidões para a educação
ambiental e o lazer, para a defesa da diversidade ecológica, e para a
valorização do património histórico e cultural;
c) A promoção da melhoria da qualidade de vida das populações,
compatibilizando-a com um desenvolvimento sustentável.
Artigo 5º
Regulamentação
Cabe ao Governo regulamentar a criação e gestão da Reserva Natural da Barrinha de Esmoriz / Lagoa de Paramos, sem prejuízo do disposto no nº 1 do Artº 4º do Decreto-lei 19/93, de 23 de Janeiro.
Artigo 6º
Comissão Instaladora
1. O Governo nomeará uma Comissão Instaladora que deverá integrar um representante de cada uma das seguintes entidades:
a) O Instituto de Conservação da Natureza;
b) as Câmaras Municipais de Ovar e Espinho;
c) as Juntas de Freguesia de Esmoriz e Paramos;
d) a Comissão de Coordenação Regional do Centro;
e) a Comissão de Coordenação Regional do Norte;
f) a Universidade de Aveiro;
g) associações de conservação da natureza com actividade
local.
2. A Comissão Instaladora será presidida pelo representante do Instituto de Conservação da Natureza.
Artigo 7º
Competência da Comissão Instaladora
Compete à Comissão Instaladora elaborar a proposta de regulamento da área de paisagem protegida, a aprovar pelo Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente.
Artigo 8º
Plano de Ordenamento
1. A Área de Paisagem Protegida disporá, no prazo máximo de 1 ano após a sua criação, de um plano de ordenamento que definirá a utilização diversificada do território da Reserva Natural.
2. A elaboração e aprovação deste plano de ordenamento deve ser feito em colaboração com as CCR’s Norte e Centro, as autarquias locais e as associações locais de natureza ambiental.
3. A aprovação final deste plano de ordenamento terá que ser obrigatoriamente precedida de um período de discussão pública não inferior a 30 dias.
Artigo 9º
Disposições finais e transitórias
Até à aprovação do regulamento previsto no artigo 7º ficam interditas as seguintes acções:
a) Alterações do relevo natural ou no uso do solo;
b) Operações de loteamento e de urbanização sem
prejuízo da aplicação dos PDMs respectivos;
c) Depósitos de lixos ou entulhos;
d) Extracção e recolha de areias;
e) O derrube de árvores em maciço e a recolha de espécies
vegetais que não sejam provenientes de explorações agrícolas
ou florestais permitidas;
f) A caça e outras actividades que possam constituir ameaça à
avifauna;
g) A plantação de novas espécies florestais;
h) Demolições ou novas construções com excepção
das que forem determinadas em execução estrita dos PDM’s
de Espinho e de Ovar;
i) Circulação de veículos.
Assembleia da República, em 20 de Fevereiro
de 2003