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Introdução
O projecto de lei cumpre o propósito de reapresentar, de forma condensada e coerente as principais orientações que o PCP propõe para o ensino superior e que se inserem no quadro mais geral dos princípios e objectivos de política educativa democrática consagrados na Constituição da República Portuguesa e na Lei de Bases do Sistema Educativo.
A complexidade de uma tal iniciativa legislativa, implicou uma ampla auscultação e um debate aprofundado no decurso da sua elaboração. A justeza dessas orientações consolidou-se e tornou pertinente a sua reapresentação.
Não é mais possível enfrentar a gravidade dos problemas e das contradições com que o ensino superior está confrontado através de medidas avulsas, sobretudo com um governo que insiste em orientações francamente neo-liberais.
A aprovação da Lei nº 26/2000, de 23 de Agosto que "Aprova a organização e ordenamento do ensino superior", não contribuíu para abrir perspectivas de uma nova política democrática para o ensino superior capaz de controlar e superar os factores de crise que continuaram a acumular-se, como se confirmou pela incapacidade de aprovação dos diplomas que a lei preconizava É esse o propósito fundamental do presente projecto de diploma do PCP.
O Ensino Superior é uma componente tendencialmente universal do sistema de ensino. O acesso a este nível de ensino abrange uma proporção crescente da população jovem na respectiva faixa etária e de outros segmentos da população activa que procuram a formação contínua ou permanente. Têm-se diversificado os domínios de conhecimento e de competências técnicas em que é oferecida formação a nível superior. E os estabelecimentos de ensino superior têm vindo a multiplicar-se cobrindo já de forma densa, embora com lacunas, o território nacional.
Do Ensino Superior a sociedade espera o desempenho eficaz de funções de educação dos jovens, de capacitação profissional, de investigação científica, de prestação de serviços especializados, e de criação e difusão de conhecimentos actuais e actuantes para a sociedade.
Na "sociedade do conhecimento" e na "sociedade da informação" as respostas às grandes questões que se colocam aos cidadãos devem ser esclarecidas pelo conhecimento face à ignorância ou à contra-informação manipulada por interesses , sejam eles políticos, ideológicos, económicos ou corporativos. As Escolas de Ensino Superior necessitam de acompanhar com atenção os problemas do mundo contemporâneo e da realidade nacional e de assumir uma postura actuante perante as questões da actualidade para informarem e enformarem as decisões dos cidadãos e dos órgãos do estado.
O Estado português desde sempre desempenhou um papel decisivo na criação e na definição de orientações para o ensino superior. O sistema público de Ensino Superior foi no passado protagonista primordial até que mais recentemente, na ausência de iniciativa necessária e oportuna por parte dos últimos Governos em nome do Estado, outras entidades vieram assumir a iniciativa de projectos próprios, movidas por interesses estritos -ideológicos ou comerciais -.
O sistema público de ensino superior deve continuar a desempenhar um papel central no sector do Ensino Superior, o que é indispensável:
À luz da Lei de Bases do Sistema Educativo, o sistema de ensino superior compreende uma componente universitária e outra politécnica. Esta diferenciação, sobretudo formal, tem sido causa de conflito de atribuições e de discriminação de recursos sem que corresponda a uma substancial diferenciação de missões. Quando hoje é clara a necessidade de o Ensino Superior dar resposta a uma multiplicidade de necessidades, para além das suas competências tradicionais de ensino e atribuição de graus académicos e de realização de investigação científica, extingue-se a necessidade de um subsistema autónomo de estabelecimentos de ensino que cumpram apenas algumas dessas atribuições, sobretudo quando tal existência autónoma surge associada a redução de recursos estruturais. Ao mesmo tempo, surge com crescente acuidade a necessidade de procurar a coerência da oferta de formações e a abrangência da cobertura territorial pelo ensino superior, ou seja, urge proceder a formas diversificadas de articulação dos estabelecimentos de ensino existentes. Estas duas linhas de argumentos suportam a integração dos actuais subsistemas num único sistema de ensino superior.
No quadro desse sistema único de ensino superior deverá haver lugar para soluções organizativas diferenciadas, conteúdos científicos e modelos pedagógicos muito diversos e modalidades distintas de formação - garantido que seja o respeito por regras gerais que assegurem a qualificação profissional e a comparabilidade académica a nível nacional e internacional.
Deverá ser consagrado um único grau de formação inicial de nível superior, independentemente da natureza da instituição que o confere, salvaguardados limiares universalmente aplicáveis. A atribuição de graus académicos dos diferentes níveis por qualquer escola do ensino superior, será apenas determinada pelos currículos, duração dos cursos, qualidade do corpo docente e avaliação do ensino. Os percursos escolares serão flexibilizados.
Deverão poder ser desenvolvidas articulações de âmbito geral (estruturas inter-institucionais de funcionamento democrático) ou entre escolas de natureza idêntica (escolas de engenharia, de formação de professores, etc.). O sistema de ensino superior deve ser territorializado, com funcionamento em rede de base regional, assente em processos de cooperação e de complementaridade entre as instituições.
O cumprimento das missões dos estabelecimentos de ensino superior - e tradicionalmente das Universidades - pressupõe a capacidade de exercício das autonomias científica e pedagógica, cujas competências residem nas próprias instituições.
O Estado tem o dever de atribuir aos estabelecimentos públicos de ensino superior os recursos necessários ao bom cumprimento das respectivas missões, de forma que a sociedade possa dispor de instrumentos de conhecimento, de verificação e de eventual inspecção desse cumprimento.
No plano interno, o exercício das autonomias exige que as competências científica e pedagógica existentes sejam actuantes e se traduzam no efectivo cumprimento das missões que a sociedade espera dos estabelecimentos de ensino. Para que tal seja conseguido, as instituições devem de ser dotadas dos recursos, e devem dotar-se elas próprias da organização e das normas funcionais adequadas.
A gratuitidade da formação inicial a nível superior, constitucionalmente justificada, deve ser respeitada.
Neste contexto a aplicação do chamado processo de Bolonha ao sistema do Ensino Superior em Portugal, não pode reger-se por critérios economicistas, donde decorra a diminuição de financiamento do Ensino Superior Público, em função da redução da duração dos cursos. Isto é a frequência dos cursos de formação avançada, na rede pública, deve ser comparticipada de forma significativa pelo Estado na proporção do crescente interesse social desses níveis de formação.
O contrato-programa acordado em 1993 entre o Governo de então e os representantes do sistema de ensino superior público bem como a Lei do Financiamento do Ensino Superior de 1997 consagram o princípio de uma fórmula para o cálculo do orçamento de funcionamento. Embora os propósitos enunciados não tenham sido cumpridos, o princípio mantém a sua validade e deve ser respeitado. Importa também que as manifestas insuficiências da fórmula sejam urgentemente rectificadas e que ela seja objecto de um dispositivo legal que a consagre.
A função de interesse público cometida aos estabelecimentos de ensino exige a gestão competente dos recursos afectados. A gestão financeira e administrativa, em particular, deve apoiar-se em estruturas internas de execução e controlo competentes, e estará sujeita à auditoria de órgãos externos independentes.
O ensino superior particular e cooperativo ocupa o espaço da livre iniciativa e da liberdade de ensino, em conformidade com preceitos constitucionais e demais leis da República. A instituição de estabelecimentos de ensino está reservada a entidades de idoneidade comprovável e previamente reconhecida pelo Estado para esse fim.
Os estabelecimentos de ensino particular ou cooperativo estão sujeitos, em pé de igualdade, à avaliação institucional no quadro da legislação e das estruturas de âmbito nacional, já criados ou a criar neste âmbito.
O sistema de ensino superior, no cumprimento da sua missão tradicional, ministra ensinos e confere os correspondentes graus, de validade nacional e internacionalmente enquadrados e confere, ainda, diplomas (não equiparados a grau académico) cuja validade é da responsabilidade individual dos respectivos estabelecimentos.
O governo deve velar pela contextualização internacional e pela legitimação e validade nacional dos graus conferidos pelos estabelecimentos oficialmente reconhecidos. As condições de atribuição dos graus académicos são regulamentadas para aplicação universal, por forma a garantir, em cada domínio do saber, o nível científico e a relevância cultural e profissional da formação adquirida.
Os regimes de acesso e ingresso no ensino superior público, particular e cooperativo ou outro, passarão a ser de aplicação universal.
O Estado assegurará a eliminação de restrições quantitativas de carácter global no acesso ao ensino superior público (numerus clausus) e criará as condições para que os cursos oferecidos assegurem a satisfação de aspirações e de necessidades da população e a elevação do seu nível educativo, cultural e científico.
O Estado criará, através da Acção Social Escolar, as condições que garantam a todos os cidadãos, que satisfaçam as condições de acesso, a possibilidade de frequentar o ensino superior independentemente da respectiva área de residência e do nível de rendimento pessoal ou familiar, por forma a impedir os efeitos discriminatórios decorrentes das assimetrias regionais e de desvantagens sociais prévias.
A acção social abrangerá toda a população escolar em formação inicial e passará a abranger também os estudantes em níveis de formação pós-graduada.
Os apoios gerais da acção social abrangerão igualmente todos os estudantes de todos os subsistemas de ensino superior. Os apoios específicos abrangerão os estudantes do subsistema público e são extensivos aos estudantes do subsistema particular e cooperativo enquanto subsistir o sistema de numerus clausus no sistema público.
O Estado garante o financiamento estável da acção social escolar com base em parâmetros e indicadores objectivos e de uma fórmula de cálculo acordada com o Conselho Nacional da Acção Social do Ensino Superior
Aos docentes e investigadores do ensino superior é exigível elevada responsabilidade social e ética nas funções que desempenham, elevado nível de qualificações, competência e dedicação. Em contrapartida, é-lhes reconhecida e protegida a liberdade intelectual, conferidos estatutos de carreira e de remuneração correspondentemente elevados, bem como o direito e o dever de participação ou de representação nos órgãos de governo e de coordenação científica ou pedagógica.
Cada estabelecimento de ensino disporá de quadros próprios de docentes, investigadores e outros funcionários, objectivamente dimensionados.
Os recrutamentos de docentes e investigadores serão regulamentados tendo em vista a aplicação de normas universais e objectivas de aferição de competências e a incentivação de oportunidades de progressão profissional e de mobilidade dos recursos humanos.
O regime de prestação de serviço de docentes e de investigadores compreende o cumprimento de funções docente, de investigação e de gestão, em proporções complementares. Ao cumprimento dessas funções, poderá ser acrescido o desempenho de outras funções de interesse institucional, pelas quais poderão ser remunerados adicionalmente em termos regulamentados.
O exercício de funções de um docente ou investigador vinculado ao quadro de um estabelecimento de ensino é incompatível com o exercício de funções noutra instituição, sem prejuízo da participação em projectos ou em equipas de ensino ou de investigação formalmente acordadas entre instituições.
É incentivada a cooperação inter-institucional na gestão dos respectivos recursos, no quadro das estruturas de articulação da rede de estabelecimentos de ensino superior público.
Capítulo I
Estrutura única do sistema público de ensino superior
Artigo 1º
Definição
O sistema público de ensino superior é único, sem prejuízo da diferenciação de soluções organizativas, de conteúdos científicos, de modelos pedagógicos e de modalidades de formação.
Artigo 2º
Princípios
1- Todos os estabelecimentos públicos de ensino superior estão sujeitos ao cumprimento e garantem o respeito por regras gerais, que assegurem a qualificação e a comparabilidade académicas a nível nacional e internacional.
2- A atribuição de graus académicos dos diferentes níveis, por qualquer escola de ensino superior, será determinada por critérios relativos a estruturas curriculares, duração dos cursos, composição do corpo docente e avaliação do ensino.
3- É favorecida a flexibilização e a mobilidade dos percursos escolares dos alunos dentro do sistema público.
Artigo 3º
Rede pública de ensino superior
1- Serão desenvolvidas e reconhecidas articulações de âmbito geral, através de estruturas inter-institucionais representativas e participadas, e de âmbito temático entre escolas de natureza idêntica.
2- O sistema de ensino superior é territorializado, com funcionamento em rede de base regional, assente em processos de cooperação e de complementaridade entre instituições, na utilização de recursos e na oferta de formações.
Artigo 4º
Convergência e transição
1- A convergência do sistema binário para o novo sistema único de ensino superior será regida por um enquadramento legislativo que assentará em metodologia e em critérios de base objectiva, compreendendo, nomeadamente:
a) a eliminação de critérios discriminatórios entre estabelecimentos dos dois actuais subsistemas;
b) a fixação de idênticos critérios científicos e pedagógicos para o exercício da competência de atribuição dos mesmos graus académicos;
c) a fixação de idênticos critérios para as carreiras docentes e para a constituição dos quadros dos estabelecimentos de ensino.
2- A referida reestruturação comportará um período e normas de transição.
CAPÍTULO II
AUTONOMIAS DO ENSINO SUPERIOR PÚBLICO
Artigo 5º
Princípios
1- São reconhecidos aos estabelecimentos de ensino superior a capacidade de exercício e o respeito pelo exercício das autonomias estatutária, científica e pedagógica e das autonomias administrativa, financeira e patrimonial e da autonomia disciplinar.
2- Os estabelecimentos de ensino superior assumem perante a sociedade a obrigação do efectivo cumprimento das respectivas missões.
Artigo 6º
Disposições estatutárias
No exercício das suas autonomias e para o cumprimento das suas missões, os estabelecimentos de ensino superior elaboram os respectivos Estatutos, os quais obedecerão aos seguintes princípios:
a) organização hierárquica e colegial que assegure o funcionamento democrático dos órgãos de governo, de gestão e de coordenação científico-pedagógica.
b) participação de todos os corpos docente, investigador, discente e outros funcionários no governo, na gestão e na coordenação dos projectos científicos e pedagógicos da instituição, de harmonia com os respectivos interesses no âmbito de atribuições de cada órgão;
c) gestão, planeamento e avaliação transparentes e eficazes, sujeitos a controlo interno democrático;
d) organização e normas funcionais internas adequadas ao cumprimento dos objectivos institucionais e das normas legais aplicáveis;
e) divulgação dos relatórios de actividade e dos planos de actividade anuais e dos respectivos relatórios orçamentais.
Artigo 7º
Responsabilidades do Estado
1- O Estado assegura que as instituições se possam dotar de recursos humanos, e sejam dotadas de recursos materiais e financeiros necessários ao cumprimento das missões das instituições, designadamente:
a) corpos docente e investigador qualificados e com condições dignas de carreira;
b) instalações e equipamentos actualizados e adequados aos objectivos dos projectos científicos ou pedagógicos;
c) financiamento suficiente para o funcionamento estável e o exercício da iniciativa própria por parte da instituição, seguindo critérios objectivos.
2- O estado deve dispor de instrumentos de conhecimento, de verificação e de controlo do cumprimento das normas legais aplicáveis.
Artigo 8º
Rede pública de ensino superior
As autonomias do sistema público de ensino superior compreendem a possibilidade da sua estruturação, designadamente:
a) articulação dos estabelecimentos de ensino em redes permanentes, temáticas e de base territorial;
b) a organização dessas redes em estruturas deve conduzir ao seu reconhecimento como parceiros na definição de políticas e na gestão do próprio sistema;
c) a concertação com associações sociais e profissionais e outras instituições e sociedades científicas ou pedagógicas.
CAPÍTULO III
FINANCIAMENTO
Artigo 9º
Financiamento público
1- Os estabelecimentos de ensino superior público disporão dos recursos humanos, físicos e financeiros, necessários e suficientes à prossecução das suas missões, providenciados pelo Estado.
2- O financiamento público através do orçamento do Estado será calculado em termos de proporcionar condições de:
a) ensino de qualidade e gratuito a nível de licenciatura;
b) ensino pós-graduado de qualidade, suportado pelo Estado numa parcela significativa, na proporção da crescente necessidade social desses níveis de formação;
c) investigação científica e desenvolvimento experimental da iniciativa dos próprios estabelecimentos de ensino.
3- O Orçamento do Estado assegurará integralmente o orçamento de funcionamento dos estabelecimentos públicos de ensino superior, ao nível objectivamente calculado por uma fórmula que tomará em devida consideração os parâmetros seguintes:
a) números de alunos ingressados, diplomados e inscritos;
b) números de docentes e investigadores vinculados;
c) domínios científicos dos cursos oferecidos e níveis dos graus e diplomas atribuídos;
d) modalidades de ensino e formação e tipologias curriculares ministradas, nomeadamente regimes pós-laborais, experiências de inovação pedagógica, ensino tutorial e a dimensão da componente laboratorial;
e) domínios científicos dos programas de pós-graduação e de investigação prosseguidos;
f) capitações de despesas com pessoal docente, de investigação e outros funcionários;
g) capitações de despesas de ensino de qualidade por estudante a níveis de licenciatura e de pós-graduação;
h) funcionamento físico, manutenção e amortização de patrimónios edificado, documental, laboratorial e outros equipamentos;
i) estruturas centrais e comuns do estabelecimento de ensino;
j) estruturas especializadas integradas ou anexas, de valor cultural, científico ou histórico.
Artigo 10º
Orçamentos e gestão orçamental
1- A formação inicial a nível superior, constitucionalmente protegida, é gratuita, pelo que propinas de formação inicial não podem ser cobradas nem inscritas nos orçamentos dos estabelecimentos de ensino.
2- Os estabelecimentos de ensino superior arrecadam e gerem livremente, em orçamento privativo, as receitas próprias geradas por cursos ou acções de ensino ou formação, bem como por contratos de investigação ou de prestação de serviços.
3- Os estabelecimentos de ensino superior disporão livremente, no âmbito das suas competências, dos saldos de exercício e das receitas próprias por eles geradas.
4- Os orçamentos dos estabelecimentos de ensino superior e a respectiva execução estão sujeitos às normas da Administração Pública geralmente aplicáveis, em todos os aspectos não directamente considerados de outro modo no presente diploma, e subordinam-se ao controlo pelos órgãos competentes do Estado.
Artigo 11º
Organização e gestão
1- No plano interno de cada estabelecimento de ensino, estes obrigam-se à gestão competente e eficaz dos recursos afectados.
2- A elaboração pelos estabelecimentos de ensino de orçamentos previsionais, bem como dos planos de actividade e correspondentes orçamentos, será suportada nos programas e nas propostas aprovados nos órgãos de governo e de coordenação científica e pedagógica respectivos.
3- A gestão financeira e administrativa será apoiada em estruturas internas de execução e controlo e estará sujeita à auditoria de órgãos externos independentes.
Artigo 12º
Contratos-programa
Para além do orçamento de funcionamento, calculado e aplicado em consonância com os princípios enunciados, o Estado poderá propor e estabelecer contratos-programa para o cumprimento de novos objectivos ou mesmo de novas missões.
Artigo 13º
Investimento
1- O orçamento de investimento plurianual será estabelecido através de contratos de desenvolvimento, baseados em planos de desenvolvimento estratégico, aprovados nos órgãos de governo e de coordenação científico e pedagógica.
2- Em relação ao orçamento de investimento, o Estado assegurará financiamento necessário e suficiente para que os estabelecimentos de ensino possam atingir indicadores, quantitativos e qualitativos, de espaços e de equipamentos, adequados às exigências dos domínios de ensino e investigação prosseguidos.
CAPÍTULO IV
ENSINO SUPERIOR PRIVADO
Artigo 14º
Princípios
A instituição de estabelecimentos de ensino está reservada a entidades de idoneidade comprovável e previamente reconhecida pelo Estado para esse fim.
Artigo 15º
Organização e funcionamento
A estruturação interna e o funcionamento dos estabelecimentos de ensino deverão garantir os seguintes princípios, em harmonia com os preceitos que também regem o ensino superior público:
a) existência de órgãos que assegurem o funcionamento autónomo do estabelecimento de ensino nas suas vertentes científica e pedagógica;
b) requisitos de capacidades científica e pedagógica instaladas - corpo docente, instalações gerais e especiais, equipamentos e condições de trabalho - equiparados aos exigidos para o ensino público;
c) garantias de independência intelectual dos docentes, de sua participação activa nos órgãos de governo e de coordenação científica e pedagógica, e de oportunidade de formação e de progressão profissional;
d) produção e divulgação de relatórios de actividade e de planos de actividade anuais e dos respectivos relatórios orçamentais.
Artigo 16º
Avaliação
Os estabelecimentos de ensino particular ou cooperativo estão sujeitos, em pé de igualdade com o ensino superior público, à avaliação institucional no quadro da legislação e das estruturas de âmbito nacional, já criados ou a criar neste âmbito.
CAPÍTULO V
GRAUS E DIPLOMAS DO ENSINO SUPERIOR
Artigo 17º
Princípios
1- Ao Estado compete velar pela contextualização e comparabilidade internacional e pela legitimação e acreditação nacional dos graus conferidos pelos estabelecimentos oficialmente reconhecidos.
2- Ao Estado compete promover estudos de prospectiva e fornecer orientações e facultar meios que alarguem a frequência do ensino superior público e a pertinência da sua oferta, tanto no que respeita à democratização da formação inicial como à democratização da aprendizagem ao longo da vida.
Artigo 18º
Nível de formação inicial
É consagrado um único grau de formação inicial de nível superior, designado licenciatura, independentemente da natureza da instituição que o confere e do domínio científico em que é conferido, salvaguardados limiares universalmente aplicáveis.
Artigo 19º
Condições e modalidades de atribuição de graus académicos
1- Os graus de nível superior são conferidos mediante cursos com estrutura curricular e com duração normal adequadas aos objectivos da formação e ao domínio do saber.
2- As condições de atribuição dos graus académicos, nomeadamente quanto a qualificação do corpo docente, aos equipamentos e instalações, às tipologias das unidades curriculares e ao número de unidades de crédito, são objecto, em cada domínio do saber, de regulamentação de aplicação universal a todo o sistema de ensino superior.
3- Os cursos conferentes de grau académico funcionarão quer presencialmente quer à distância e em modalidades e horários diversificados, que deverão ser oferecidos seja por conveniência pedagógica, seja por conveniência da população escolar, seja por conveniência de utilização das infra-estruturas e dos outros meios de ensino.
Artigo 20º
Flexibilidade curricular e mobilidade
São reconhecidos para que sejam promovidos os princípios da flexibilidade e da mobilidade:
a) a flexibilidade de percurso escolar dentro de cada estabelecimento de ensino, na base da flexibilidade dos planos de estudo e do reconhecimento de aprendizagens adquiridas;
b) a mobilidade entre estabelecimentos de ensino superior, facilitada por formas de cooperação inter-institucional, na base do reconhecimento de formações adquiridas nas mesmas áreas científicas ou em áreas afins e em igual número de unidades de crédito.
Artigo 21º
Gratuitidade da formação inicial
A frequência dos cursos de formação inicial de nível superior, na rede pública, está isenta do pagamento de taxas ou propinas de matrícula ou de inscrição.
Artigo 22º
Níveis de formação avançada
1- Aos detentores de grau de licenciado podem ser conferidos, mediante programas de formação específica, os graus de mestre e de doutor.
2- A frequência dos cursos de formação avançada, na rede pública, é comparticipada de forma significativa pelo Estado na proporção do crescente interesse social desses níveis de formação.
Artigo 23º
Diplomas
Os estabelecimentos de ensino superior organizarão, em modalidades e horários adequados, cursos não conducentes à obtenção de grau académico, cuja conclusão com aproveitamento conduz à atribuição de um diploma.
CAPÍTULO VI
ACESSO AO ENSINO SUPERIOR
Artigo 24º
Princípios
O Estado assegurará a eliminação de restrições quantitativas de carácter global no acesso ao ensino superior (numerus clausus) e criará as condições para que os cursos existentes ou a criar correspondam às necessidades identificadas de formação de quadros qualificados e à manifestação de vocações.
Artigo 25º
Condições de acesso, ingresso e frequência
1- Têm oportunidade de acesso ao ensino superior todos os indivíduos habilitados com um curso secundário que façam prova de aptidão para a frequência dos cursos a que se candidatam.
2- Têm igualmente acesso ao ensino superior os indivíduos maiores de 25 anos que, não estando habilitados com um curso do ensino secundário, façam prova especialmente adequada de capacitação para a sua frequência.
3- Para os trabalhadores estudantes serão considerados regimes especiais de acesso e ingresso e de frequência do ensino superior, que garantam o princípio da aprendizagem ao longo da vida ou da formação permanente.
Artigo 26º
Critérios de selecção e seriação
Os regimes de acesso e ingresso no ensino superior público, particular e cooperativo ou outro, são regulamentados em obediência aos seguintes critérios:
a) igualdade de oportunidades para todos os candidatos;
b) rigor, objectividade e universalidade das regras e critérios aplicados na selecção e seriação dos candidatos a cada curso e na sua colocação;
c) valorização do percurso educativo dos candidatos no ensino secundário entre os critério de seriação;
d) exigência de pré-requisitos ou comprovação de aptidão vocacional, naqueles domínios científicos para os quais eles sejam aconselháveis;
e) consideração de quotas de preferência regional para os cursos relevantes para o desenvolvimento regional;
f) concertação e coordenação de todos os estabelecimentos de ensino superior na definição das condições de acesso e de colocação, por domínio científico, e na realização de avaliações;
g) carácter nacional do processo de candidatura, do concurso de acesso e da colocação nos estabelecimentos de ensino, para todos os cursos e todos os estabelecimentos de ensino, sem prejuízo da realização adicional, em domínios do saber devidamente fundamentados, de provas vocacionais;
h) intervenção dos serviços da administração central e regional de educação em suporte à realização das operações de candidatura e de concurso.
CAPÍTULO VII
DEMOCRATIZAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR E ACÇÃO SOCIAL
ESCOLAR
Artigo 27º
Princípio
O Estado criará as condições que garantam a todos os cidadãos, que satisfaçam as condições de acesso, a possibilidade de frequentar o ensino superior, independentemente da respectiva área de residência e do nível de rendimento pessoal ou familiar.
Artigo 28º
Tipificação dos apoios
1- Para o efeito o Estado providenciará os apoios necessários através do sistema de acção social escolar.
2- A acção social escolar comporta as seguintes modalidades de apoio ou tipologias de medidas:
a) apoios gerais: alimentação, alojamento, cuidados de saúde, apoios psicológicos, facilidades para obtenção de materiais didáctico e de trabalho escolar, serviços de informação e procuradoria;
b) apoios específicos: bolsas de estudo a estudantes economicamente carenciados e apoio logístico assegurado ou subsídio de alojamento para estudantes deslocados da respectiva área de residência.
Artigo 29º
Âmbito de aplicação
1- A acção social abrangerá toda a população escolar em formação inicial e, ainda, os estudantes em níveis de formação pós-graduada.
2- Os apoios gerais da acção social abrangerão todos os estudantes de todos os subsistemas de ensino superior.
3- Os apoios específicos abrangerão os estudantes do subsistema público e são extensivos aos estudantes do subsistema particular e cooperativo enquanto subsistir o sistema de numerus clausus no sistema público.
Artigo 30º
Financiamento
1- O Estado garante o financiamento estável da acção social escolar com base em parâmetros e indicadores objectivos e de uma fórmula de cálculo acordada com o Conselho Nacional da Acção Social do Ensino Superior.
2- O orçamento de funcionamento a atribuir às estruturas que executam a acção social deverá ponderar:
a) o número de estudantes inscritos;
b) indicadores globais de rendimentos familiares e de estudantes deslocados;
c) o salário mínimo nacional;
d) o custo comercial de alojamento na área do estabelecimento de ensino.
3- Em relação ao orçamento de investimento, o Estado assegurará financiamento necessário e suficiente para que as estruturas de apoio e os apoios prestados possam atingir indicadores, qualitativos e quantitativos, consentâneos com a elevação dos padrões de vida e de trabalho da população portuguesa.
Artigo 31º
Organização e gestão
1- A gestão da acção social escolar é feita: ou por estruturas especializadas, integradas nos estabelecimentos de ensino ou então por estruturas autónomas não integradas, mas criadas e geridas por estabelecimentos de ensino para esse propósito associados.
2- Estas estruturas são dotadas de autonomia administrativa e financeira e de órgãos de orientação e acompanhamento colegiais, participados por estudantes e por responsáveis dos estabelecimentos de ensino.
Artigo 32º
Ensino privado
1- Enquanto persistir o sistema de numerus clausus, os estudantes inscritos em estabelecimentos de ensino particular ou cooperativo gozam de idênticos direitos a apoios da acção social escolar que os restantes estudantes do ensino público.
2- A criação das correspondentes estruturas de acção social é da responsabilidade da entidade que institui o estabelecimento de ensino, bem como o financiamento do respectivo funcionamento.
3- A prestação de serviços de acção social para estudantes do ensino particular ou cooperativo poderá ser assegurado pelos serviços dos estabelecimentos públicos, ao abrigo de convénios e contratos celebrados entre essas instituições.
CAPÍTULO VIII
RECURSOS HUMANOS DO ENSINO SUPERIOR
Artigo 33º
Princípios
1- Aos docentes e investigadores do ensino superior são exigidos elevada responsabilidade social e sentido ético nas funções que desempenham, para além de elevados níveis de qualificações, competência e dedicação.
2- Aos docentes e investigadores é reconhecida e protegida a liberdade intelectual, conferidos estatutos de carreira e de remuneração correspondentes às elevadas qualificações, bem como o direito e o dever de participação ou de representação nos órgãos de governo e de coordenação científica ou pedagógica das respectivas instituições.
Artigo 34º
Quadros de pessoal
1- Cada estabelecimento de ensino disporá de quadros próprios de dotação global para docentes, investigadores e outros funcionários, dimensionados, tomando em consideração os seguintes parâmetros:
a) dimensão e tipificação do corpo discente;
b) nível de qualificação dos corpos docente e investigador;
c) domínios científicos dos cursos ministrados;
d) tipologias curriculares e modalidades de ensino e de formação;
e) programas de investigação que prossegue;
f) estruturas gerais e especiais de funcionamento e estruturas anexas.
2- Os rácios e indicadores a aplicar no cálculo do dimensionamento dos quadros serão fixados ouvidas as entidades coordenadoras dos estabelecimentos de ensino e as estruturas profissionais representativas de docentes e investigadores.
Artigo 35º
Carreiras docente e de investigação
1- O doutoramento é o nível de formação científica tomado como referência para a construção das carreiras docente e de investigação no ensino superior.
2- As carreiras docente e de investigação compreendem níveis de exercício de funções que são, simultaneamente, etapas de formação científica e pedagógica.
3- Os estabelecimentos de ensino a que os docentes e investigadores se encontram vinculados assumem os encargos com a sua formação científica e pedagógica, designadamente os que se referem à frequência de cursos ou acções de pós-graduação ou de formação específica, relevantes para o seu desempenho profissional e a progressão na carreira.
4- Os mecanismos de provimento de lugares do quadro de docentes e de investigadores serão regulamentados tendo em vista a aplicação de normas objectivas e universais de aferição de competências científicas e pedagógicas.
5- Serão incentivadas oportunidades quer de progressão profissional por mérito absoluto quer de mobilidade inter-institucional dos recursos humanos.
6- O recrutamento de docentes e de investigadores é feito mediante concurso de âmbito nacional quer quanto aos candidatos quer quanto aos júris.
Artigo 36º
Desempenho de funções
1- O regime de prestação de serviço de docentes e de investigadores compreende o cumprimento de funções docente, de investigação e de gestão, em proporções complementares.
2- Ao cumprimento dessas funções poderá ser acrescido o desempenho de outras funções de interesse institucional, seja por nomeação seja por iniciativa própria autorizada, funções pelas quais docentes e investigadores poderão ser remunerados adicionalmente, em termos institucionalmente regulamentados.
3- A vinculação de um docente ou investigador ao quadro de um estabelecimento de ensino é incompatível com o exercício de funções noutra instituição, sem prejuízo da participação em projectos de ensino ou investigação formalmente acordados entre instituições, mas excluindo-se explicitamente o exercício de funções de gestão ou de coordenação noutra instituição.
4- É incentivada a cooperação inter-institucional na gestão dos respectivos recursos, no quadro das estruturas de articulação da rede de estabelecimentos de ensino superior público.
CAPÍTULO IX
ORGANIZAÇÃO, GESTÃO, PLANEAMENTO E AVALIAÇÃO
DO ENSINO SUPERIOR
Artigo 37º
Organização e gestão
A estrutura orgânica estatutária e as normas de funcionamento dos estabelecimentos de ensino superior, públicos ou privados, satisfarão os seguintes princípios:
a) a definição clara de missões, de objectivos e de meios; a assunção de programas de acção e de iniciativas suportados na sua tramitação e apreciação internas; a assunção e o cumprimento de compromissos pelos órgãos e a solidariedade institucional;
b) a assunção de códigos de ética profissional e de ética institucional associados com ou explícitos nos estatutos de carreira de docentes e investigadores e nos estatutos da instituição de ensino;
c) a constituição e o regular funcionamento dos órgãos personalizados e colegiais estatutários; a clara assunção de decisões, o acompanhamento da sua execução e a sua oportuna avaliação; a participação e o controle democrático do desempenho dos órgãos;
d) a existência de instrumentos de gestão competentes; a recolha de dados e seu arquivo; a divulgação de informação e a acessibilidade dos dados; a monitorização contínua e a avaliação periódica de execução de programas e de cumprimento de objectivos; o reajustamento periódico de meios e de programas suportado nos resultados do seu controlo de execução; a abertura a auditorias por entidades externas independentes;
e) a existência de instrumentos e a prática corrente de consulta, de comunicação e de cooperação com entidades externas; a incorporação desses instrumentos e métodos na definição dos objectivos e na execução dos programas e na sua avaliação e reajustamento.
Artigo 38º
Avaliação
Todas as instituições de ensino superior estão sujeitas a um processo permanente de avaliação e acompanhamento, conduzido pelo Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior que deve manter independência face ao governo e a quaisquer grupos de interesses particulares, garantindo objectividade, rigor, e isenção das suas apreciações.
Artigo 39º
Planeamento
Compete à administração central do Estado promover levantamentos estatísticos e realizar estudos prospectivos que fundamentem as opções, os planos de desenvolvimento e as acções do sistema de ensino superior público a todos os seus níveis de organização.
Assembleia da República, em 20 de
Junho de 2002