Índice Cronológico Índice Remissivo
Projecto de Lei nº 309/VII
Altera o regime de exercício de direitos
pelos militares (alteração do
artigo 31º da Lei de Defesa Nacional)
O regime de restrição
de direitos dos militares contido no artigo 31º da Lei de
Defesa Nacional foi aprovado em 1982, vigorando assim há
perto de quinze anos. O decurso do tempo tornou esse artigo
31º definitivamente desactualizado, carecendo de reformulações
urgentes.
Na verdade, a Lei de Defesa Nacional
foi aprovada em 1982, logo a seguir à primeira revisão
constitucional, num contexto político marcado no plano
das Forças Armadas pela extinção do Conselho
da Revolução. O regime de restrição
de direitos dos militares foi portanto influenciado por uma conjuntura
muito complexa e particularmente adversa a um reconhecimento aberto
dos direitos fundamentais dos membros das Forças Armadas.
Foi assim que os direitos de associação, expressão,
reunião, manifestação, petição
colectiva e capacidade eleitoral passiva sofreram restrições
que vão muito além dos limites constitucionais da
necessidade, adequação e proporcionalidade. Por
exemplo, o direito de petição colectiva está
pura e simplesmente proibido. O direito de associação
profissional é restringido a associações
profissionais de natureza deontológica. O direito
de expressão sofre restrições tais que praticamente
impediriam os militares de se expressarem publicamente, particularmente
sobre as questões que lhes dizem respeito.
Este regime legal aparece hoje, quinze
anos decorridos, como obsoleto, excessivo e desajustado, face
à evolução histórica entretanto verificada
não só no plano internacional e nacional, como no
plano específico das Forças Armadas Portuguesas.
Sucedeu ao artigo 31º o que sempre
sucede às leis excessivas: foram sendo feitas interpretações
"tolerantes", para tentar enquadrar uma dinâmica
que na sua prática não se conforma com as regras
da lei.
Mas, o exercício de direitos
fundamentais não pode estar dependente de conjunturas,
nem da maior ou menor "tolerância" de responsáveis
políticos. O regime jurídico deve corresponder à
evolução entretanto verificada, e deve fixar as
"regras do jogo" de forma clara, objectiva e segura.
O PCP propõe assim a alteração
do artigo 31º da Lei de Defesa Nacional, num espírito
de modernização e abertura. As soluções
propostas não pretendem ser soluções definitivas,
mas sim abrir um debate na Assembleia da República necessário
e urgente, tendo em vista a efectiva alteração daquele
artigo 31º num sentido de progresso.
Importa particularmente ter em atenção
o direito de associação, designadamente o direito
de constituição de associações sócio-profissionais.
A evolução verificada nos últimos anos nos
países da União Europeia foi no sentido do seu progressivo
reconhecimento.
Em 1984, o Parlamento Europeu aprovou
o relatório PETER, que "convida os Estados membros
a concederem, em tempo de paz, aos membros das Forças Armadas
o direito de criarem, para defesa dos seus interesses sociais,
associações profissionais". Em 1988, foi
a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa que aprovou o relatório
APENES, que "convida todos os Estados membros do Conselho
da Europa a concederem, em circunstâncias normais, aos membros
profissionais das forças armadas, o direito de criarem
associações específicas, formadas para protegerem
os seus interesses profissionais no quadro das instituições
democráticas".
Esta tendência do moderno direito
europeu corresponde à crescente afirmação
do carácter inalienável dos direitos fundamentais
de cidadania. Hoje, na maioria dos países da União
Europeia, já existem associações profissionais
de militares que cooperam no âmbito da EUROMIL.
O PCP propõe que o artigo 31º seja alterado nesta parte, por forma a dar pleno assento legal a este tipo de associações. Não se trata de sindicatos com os poderes que a Constituição prevê (embora a questão do sindicalismo militar não seja nenhum tabu). Trata-se de legalizar aquilo que é uma realidade implícita e socialmente reconhecida, que é a existência de associações profissionais representativas de militares.
Também na área dos direitos
de expressão, reunião, manifestação,
petição colectiva e quanto à capacidade eleitoral
passiva, o PCP propõe significativas alterações,
conforme decorre do seguinte quadro comparativo do texto actual
do artigo 31º da Lei de Defesa Nacional e do texto proposto
pelo PCP.
| nº 1 -- O exercício dos direitos de expressão, reunião, manifestação, associação e petição colectiva e a capacidade eleitoral passiva dos militares e agentes militarizados dos quadros permanentes e contratados em serviço efectivo será objecto das restrições constantes dos números seguintes. | nº 1 -- Os militares gozam dos direitos, liberdades e garantias constitucionalmente estabelecidos, mas o exercício dos direitos de associação, expressão, reunião, manifestação e petição colectiva, sofre as restrições constantes dos números seguintes. |
| nº 6 -- Os cidadãos referidos no nº 1 não podem ser filiados em associações de natureza política, partidária ou sindical, nem participar em quaisquer actividades por elas desenvolvidas, com excepção da filiação em associações profissionais com competência deontológica e no âmbito exclusivo dessa competência. | nº 2 -- Os militares gozam da liberdade de associação, nos termos gerais, não podendo contudo ser filiados em partidos e associações políticas constituídas nos termos da Lei dos Partidos Políticos (Decreto-Lei nº 595/74), nem em associações sindicais constituídas nos termos do disposto no Decreto-Lei nº 215-B/75. |
| nº 2 -- Os cidadãos referidos no nº 1 não podem fazer declarações públicas de carácter político ou quaisquer outras que ponham em risco a coesão e a disciplina das Forças Armadas ou desrespeitem o dever de isenção política e apartidarismo dos seus elementos.
nº 3 -- Os cidadãos referidos no nº 1 não podem, sem autorização superior, fazer declarações públicas que abordem assuntos respeitantes às Forças Armadas, excepto se se tratar de artigos de natureza exclusivamente técnica inseridos em publicações editadas pelas Forças Armadas e da autoria de militares que desempenhem funções permanentes na respectiva direcção ou redacção. | nº 3 -- Os militares gozam de liberdade de expressão e informação, nos termos gerais, não podendo contudo fazer declarações públicas que violem o dever de apartidarismo ou que forneçam dados classificados que ponham em risco a Defesa Nacional. |
| nº 4 -- Os cidadãos referidos no nº 1 não podem convocar ou participar em qualquer reunião de carácter político, partidário ou sindical, excepto se trajarem civilmente e sem usar da palavra nem fazer parte da mesa ou exercer qualquer outra função. | nº 4 -- Os militares gozam do direito de reunião, mas não podem convocar ou participar em qualquer reunião de carácter partidário ou sindical, excepto se trajarem civilmente e sem usar da palavra nem fazer parte da mesa ou exercer qualquer outra função. |
| nº 5 -- Os cidadãos referidos no nº 1 não podem convocar ou participar em qualquer manifestação de carácter político, partidário ou sindical. | nº 5 -- Os militares não podem convocar ou participar em manifestações de carácter partidário ou sindical. |
| nº 8 -- Os cidadãos referidos no nº 1 não podem promover ou apresentar petições colectivas dirigidas aos órgãos de soberania ou aos respectivos superiores hierárquicos sobre assuntos de carácter político ou respeitantes às Forças Armadas.
| nº 6-- Os militares podem promover ou apresentar petições colectivas dirigidas aos órgãos de soberania ou aos respectivos superiores hierárquicos, excepto sobre assuntos de carácter político-partidário ou respeitantes à actividade operacional das Forças Armadas.
|
| nº 9 -- Os cidadãos referidos no nº 1 são inelegíveis para a Presidência da República, para a Assembleia da República, para as Assembleias Regionais dos Açores e da Madeira, para a Assembleia Legislativa de Macau e para as assembleias e órgãos executivos das autarquias locais e das organizações populares de base territorial.
nº 10 -- Não pode ser recusado, em tempo de paz, o pedido de passagem à reserva apresentado com o fim de possibilitar a candidatura a eleições para qualquer dos cargos referidos no número anterior. | nº 7 -- Os militares são elegíveis para os órgãos de soberania e órgãos de poder regional e local electivos, mas, para o efeito têm de pedir a passagem à reserva ou requerer a licença sem vencimento, as quais, em tempo de paz, não podem ser recusadas, iniciando-se a reserva ou a licença com a apresentação da candidatura e terminando, no caso de licença, com a não eleição ou com a cessação do mandato.
|
| nº 11 -- Aos cidadãos mencionados no nº 1 não são aplicáveis as normas constitucionais referentes aos direitos dos trabalhadores. | nº 8 -- Aos militares não é reconhecido o direito de greve. |
| nº 7 -- O disposto nos nºs. 4, 5 e 6 deste artigo não é aplicável à participação em cerimónias oficiais, nem em conferências ou debates promovidos por institutos ou associações sem natureza de partido político. | nº 9 -- As restrições acima referidas não são aplicáveis à participação dos militares em cerimónias oficiais ou em conferências ou debates promovidos por entidades ou associações sem natureza de partido político. |
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nº 12 -- Os cidadãos que se encontrem a prestar serviço militar obrigatório ficam sujeitos ao dever de isenção política, partidária e sindical. | nº 10 -- No exercício das suas funções, os cidadãos que se encontram a prestar serviço militar obrigatório estão exclusivamente ao serviço do interesse público, estando sujeitos ao dever de isenção partidária. |
Assim, ao abrigo das disposições
constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados
abaixo-assinados apresentam o seguinte projecto de lei:
O artigo 31º da Lei da Defesa Nacional
(Lei nº 29/82, de 11 de Dezembro) passa a ter a seguinte
redacção: