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Projecto de Lei nº 247/VII
Reforça os direitos dos trabalhadores-estudantes


Preâmbulo

As dificuldades sociais existentes no nosso País com evidentes reflexos no abandono precoce da formação escolar, o agravamento dos problemas relacionados com o emprego, nomeadamente a sua precaridade e as condições em que é exercido, colocam em primeiro plano a necessidade de dar atenção à questão dos trabalhadores-estudantes.

Por outro lado, e se para os apenas estudantes as condições de acesso e frequência do ensino são difíceis e injustas, no caso dos trabalhadores-estudantes as dificuldades e injustiças agravam-se, justificando medidas específicas que permitam minorar esta desvantagem.

As especificidades na integração dos trabalhadores-estudantes e na garantia do seu acesso à educação justificaram a existência do Estatuto legal do trabalhador-estudante, consagrando direitos importantes e fundamentais. Tendo sido um passo determinante, é notório que se impõem melhoramentos e alterações já que, pela sua aplicação prática se pode concluir que é possível avançar nos direitos concedidos aos trabalhadores-estudantes e também que em muitos casos certas disposições foram utilizadas de forma distorcida para negar os mesmos direitos pelo que urge clarificá-las para que tal não aconteça.

Os direitos dos trabalhadores-estudantes e a aplicação do seu estatuto foram alvo ao longo dos últimos anos de inúmeras reivindicações das organizações representativas desta área bem como dos estudantes em geral.

As insuficiências apontadas passam em muitos casos pela falta ou para errada regulamentação do Estatuto do Trabalhador-Estudante, traduzindo o abandono a que sucessivos governos votaram esta matéria.

Passam também pela sucessiva violação do Estatuto pelas entidades empregadoras escudando-se em insuficiências da lei e sobretudo na falta de fiscalização e na impunidade com que se praticam estes atropelos.

Mesmo nas escolas de onde não se esperariam grandes obstáculos existiram diversas condicionantes, quer pela falta de uniformidade dos procedimentos adoptados e dos requisitos exigidos, mercê de uma deficiente regulamentação neste campo.

Visa-se igualmente limitar a discricionaridade na aplicação do estatuto por parte das entidades empregadoras, combatendo as possibilidades de distorção ou não aplicação ilegítima deste diploma. Também nos estabelecimentos de ensino, e não dispensando regulamentação adequada, caminha-se no sentido da clarificação e uniformização dos procedimentos bem como do incentivo à desburocratização do processo.

Avança-se na caracterização do organismo previsto desde início pela Lei e nunca criado, definindo as suas competências e a sua composição.

Finalmente, garante-se a existência de condições materiais, humanas e pedagógicas para os trabalhadores-estudantes, nomeadamente criando um contingente especial no acesso ao ensino superior, clarificando o direito à acção social e exigindo o alargamento do ensino pós-laboral dando resposta às necessidades da população, especialmente dos jovens e do país.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo-assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1º

Os artigos 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 9º, 10º e 12º da Lei nº 26/81 de 21 de Agosto passam a ter a seguinte redacção:

Artigo 1º

(Objecto do diploma)

1 - (...)

2 - O presente diploma aplica-se a todos os níveis de ensino, público, particular ou cooperativo, incluindo a frequência de cursos de pós-graduação, de mestrados e doutoramentos.

Artigo 2º

(Qualificação do trabalhador-estudante)

1 - Para efeitos de aplicação deste diploma consideram-se trabalhadores-estudantes todos os estudantes que, frequentando qualquer nível de ensino, preencham uma das seguintes condições:

  1. Estejam ao serviço de uma entidade empregadora pública ou privada;
  2. Exerçam actividade profissional por conta própria;
  3. Frequentem programas de ocupação temporária de jovens;
  4. Frequentem cursos de formação profissional;
  5. Estejam inscritos como desempregados num centro de emprego;
  6. Estejam a cumprir serviço militar.

2 - (...)

Artigo 3º

(Facilidades para frequência das aulas)

1 - As empresas ou serviços terão que elaborar horários de trabalho específicos para os trabalhadores-estudantes, com flexibilidade ajustável à frequência das aulas e à inerente deslocação para os respectivos estabelecimentos de ensino.

2 - Quando não seja possível a aplicação do regime previsto no número anterior o trabalhador-estudante será dispensado até oito horas semanais, sem perda de qualquer outra regalia, tendo em conta o respectivo horário escolar.

3 - (...)

4 - A dispensa de serviço para frequência de aulas prevista no nº 2 deste artigo poderá ser utilizada de uma só vez ou fraccionadamente e depende do período de trabalho semanal nos seguintes termos:

  1. Duração de trabalho até trinta e seis horas - dispensa até seis horas;
  2. Duração de trabalho de trinta e seis até trinta e nove horas - dispensa até sete horas;
  3. Duração de trabalho superior a trinta e nove horas - dispensa até oito horas.


Artigo 4º

(Regime de turnos)

1 - O trabalhador-estudante que preste serviço em regime de turnos tem os direitos conferidos no artigo anterior, devendo as entidades empregadoras proceder ao ajustamento dos horários ou dos períodos de trabalho.

2 - (...)

Artigo 5º

(Suspensão e cessação das facilidades

para frequência das aulas)

1 - Os direitos do trabalhador-estudante consignados nos números 2 e 4 do artigo 3º podem ser suspensos até ao final do ano lectivo quando comprovadamente tenham sido utilizados voluntariamente para fins alheios à actividade escolar.

2 - Os direitos referidos nos números 2 e 4 do artigo 3º podem cessar durante o ano lectivo seguinte se o trabalhador-estudante não tiver aproveitamento em três anos consecutivos ou quatro interpolados, nos termos do número dois do artigo 10º, ou reincidir em utilização abusiva dos direitos previstos no artigo 3º.

Artigo 6º

(Prestação de exames ou provas de avaliação)

1 - O trabalhador-estudante tem direito a ausentar-se, sem perda de remuneração, subsídio de refeição ou de qualquer outro direito para a prestação de exames ou provas de avaliação nos seguintes termos:

  1. Por cada disciplina três dias para a prova escrita final ou intercalar, mais dois dias para a respectiva prova oral, sendo um o da realização da prova e os outros os imediatamente anteriores, incluindo Sábados, Domingos e feriados;
  2. (...)
  3. Nos casos em que os exames finais tenham sido substituídos por testes ou provas de avaliação de conhecimentos, as ausências referidas poderão verificar-se desde que não seja ultrapassado o limite máximo de cinco dias por disciplina, observando-se em tudo o mais o disposto nas alíneas anteriores;

2 - (...)

3 - (...)

4 - Os exames e provas de avaliação deverão funcionar também em horário pós-laboral.

5 - Os trabalhadores-estudantes têm direito à realização de qualquer número de exames na época de recurso, bem como à realização de um exame em época especial em cada ano lectivo.

Artigo 7º

(Férias e licenças)

1 - (...)

2 - Os trabalhadores-estudantes têm direito ao gozo interpolado de quinze dias úteis de férias à sua livre escolha, salvo no caso de incompatibilidade resultante do encerramento para férias do estabelecimento ou serviço.

3 - Em cada ano civil os trabalhadores-estudantes podem gozar, seguida ou interpoladamente, até dez dias úteis de licença, com desconto no vencimento, mas sem perda de qualquer outra regalia, desde que o requeiram nos seguintes termos:

  1. Com quarenta e oito horas de antecedência, no caso de se pretender utilizar até três dias de licença;
  2. Com um mês de antecedência nos restantes casos.


Artigo 9º

(Isenções e regalias nos

estabelecimentos de ensino)

1 - (...)

2 - (...)

3 - Sem prejuízo dos números anteriores, nos estabelecimentos de ensino serão estabelecidas formas de avaliação adaptadas às necessidades específicas dos trabalhadores-estudantes.

4 - Os trabalhadores-estudantes não estão obrigados a executar testes ou quaisquer outras provas de avaliação, ficando automaticamente admitidos a exame final.

5 - Nos casos em que a avaliação não seja feita por exame final terá de ser facultada aos trabalhadores-estudantes a realização de uma prova final.

6 - As isenções e direitos estabelecidos nos números anteriores serão regulamentadas de forma uniforme respeitando a diversidade dos vários níveis e estabelecimentos de ensino.

Artigo 10º

(Requisitos para a fruição de direitos)

1 - (...)

  1. (...)
  2. Junto do estabelecimento de ensino comprovar a sua inclusão numa das categorias previstas no artigo 1º.

2 - Para poder continuar a usufruir dos direitos previstos neste diploma, deve o trabalhador-estudante obter aproveitamento escolar, transitando de ano ou obtendo aprovação em pelo menos metade das disciplinas em que o trabalhador-estudante estiver matriculado, arredondando-se por defeito este número quando necessário.

3 - Considera-se falta de aproveitamento escolar a desistência voluntária de qualquer disciplina excepto se justificada por doença, gravidez ou impedimento legal.


Artigo 2º

São aditados à Lei nº 26/81, de 21 de Agosto os seguintes artigos:

Artigo 11º-A

(Condições pedagógicas)

1 - O Governo deve fomentar urgentemente a criação de ensino pós-laboral em todos os níveis de ensino, assegurando a cobertura integral do território nacional e as diversas áreas do conhecimento.

2 - Serão criados nos estabelecimentos de ensino mecanismos de acompanhamento pedagógico ao trabalhador-estudante.

3 - Serão adaptados os conteúdos programáticos à realidade do ensino pós-laboral, com a consequente formação dos docentes.

Artigo 11º-B

(Contingente especial)

Enquanto existirem restrições quantitativas globais no acesso ao ensino superior público, existirá um contigente especial no sistema de acesso para os trabalhadores-estudantes a definir pelo Ministério da Educação.

Artigo 11º-C

(Acção social escolar)

Os trabalhadores-estudantes ficam abrangidos pelo sistema de acção social escolar existente em condições de igualdade com os restantes estudantes.

Artigo 11º-D

(Serviços de apoio)

É garantido o funcionamento, nos horários pós-laborais, dos serviços de apoio aos estudantes existentes nos estabelecimentos de ensino.

Artigo 11º-E

(Participação dos trabalhadores-estudantes)

É garantida a participação dos trabalhadores-estudantes e das suas Associações na gestão escolar e na definição da política educativa.

Artigo 11º-F

(Divulgação do estatuto)

O presente estatuto será de divulgação obrigatória em todos os estabelecimentos de ensino.

Artigo 11º-G

(Organismo para os trabalhadores-estudantes)

1 - O Governo promoverá, no prazo de 90 dias a partir da entrada em vigor da presente lei, a instalação de um organismo encarregado do tratamento das questões específicas dos trabalhadores-estudantes.

2 - O organismo referido no número anterior funcionará junto do Ministério da Educação e será composto por representantes desse Ministério, do Ministério da Qualificação e Emprego, das centrais sindicais, das Associações de Estudantes do Ensino Secundário e Superior e da Federação Nacional das Associações de Trabalhadores-estudantes.

3 - O número de representantes governamentais não pode ser superior aos restantes.

Artigo 11º-H

(Competências do organismo)

Compete ao organismo referido no artigo anterior:

  1. Propor ao Governo as medidas administrativas e legislativas que considerar necessárias para o cumprimento do estatuto ou para o seu aperfeiçoamento;
  2. Obter do Governo e de quaisquer entidades públicas as informações necessárias para a prossecução das suas atribuições;
  3. Diligenciar junto do Governo ou de quaisquer entidades públicas ou privadas a remoção de eventuais obstáculos à aplicação do estatuto do trabalhador-estudante;
  4. Comunicar à Inspecção Geral do Trabalho e à Inspecção Geral de Educação os casos de incumprimento do estatuto de que tenha conhecimento;
  5. Promover as iniciativas que considerar convenientes para o acompanhamento dos problemas específicos dos trabalhadores-estudantes;
    1. Elaborar um relatório anual sobre o cumprimento do Estatuto do trabalhador-estudante a publicar na II série do Diário da República, no quarto trimestre de cada ano civil.


Artigo 3º

(Norma revogatória)

É revogado o artigo 12º da Lei nº 26/81, de 21 de Agosto.

Assembleia da República, 29 de Novembro de 1996

Os Deputados,

Memorando

PJL - "Reforça os direitos dos Trabalhadores-Estudantes

Pretende-se a alteração do estatuto do Trabalhador Estudante no sentido do reforço dos direitos aí expressos e da ampliação do seu elenco.

As principais alterações são: