Índice Cronológico Índice Remissivo
Projecto de Lei nº 165/VII
Cria o Observatório dos Mercados Agrícolas
e das Importações Agro-Alimentares
A liberalização imprimida
ao comércio internacional nos últimos anos com a
eliminação das barreiras aduaneiras e do respectivo
sistema de controlos tem levado ao afundamento da agricultura
nacional com um crescente volume de importações
e à multiplicação de problemas de ordem higio-sanitário
devido à desregulamentação dos mercados e
à ausência de mecanismos de fiscalização.
Os números são elucidativos:
a taxa de cobertura do comércio agro-alimentar de Portugal
passou de 51% em 1986 para cerca de 35% em 1995 traduzindo um
preocupante agravamento do próprio nível de segurança
alimentar do País com a cada vez maior substituição
da produção nacional por produções
importadas.
A fruta e os produtos hortícolas,
os lacticínios, a carne e os cereais são os produtos
onde estes factos assumem uma maior dimensão.
De Espanha, de França, de Marrocos,
do Egipto, da Argentina, do Chile, da Nova Zelândia, da
China e de tantos outros países chegam-nos diariamente
toneladas de gado vivo, de carne, de leite, de laranja, de batatas,
de manteiga enquanto a produção nacional não
é escoada nem tem preços compensadores, milhares
de hectares de terras produtivas estão em pousio subsidiado
e milhares de explorações agrícolas são
abandonadas, no mundo rural prossegue a desertificação.
Por outro lado não tem havido
sequer vontade política para criar mecanismos de controlo
e fiscalização, designadamente higio-sanitária
dos produtos importados.
As estruturas aduaneiras foram desmanteladas
e milhares de trabalhadores aduaneiros, com experiência,
alta qualificação e conhecimento do comércio
que atravessa as fronteiras estão no desemprego, desperdiçados,
sem profissão. As brigadas fiscais não têm
nem pessoal nem meios suficientes. A Inspecção Geral
das Actividades Económicas não tem intervenção
visível.
As consequências estão
à vista de todos, são alvo diário de notícia
e fonte de preocupação para todos os consumidores:
é gado infectado, bovino e ovino que vem de Espanha; é
vinho que devia ter sido "queimado" mas que entra nos
circuitos nacionais e é aqui vendido como vinho de qualidade;
é leite importado em condições de qualidade
duvidosa; é batata proveniente de países com problemas
de sanidade; são produtos diversos embalados e vendidos
pelas grandes superfícies a título de "marcas
brancas" sem indicação da origem e da composição,
etc..
Mas esta desregulamentação
e ultra-liberalização dos mercados não é
resultado inevitável do chamado processo de mundialização
da economia.
É uma opção política estratégica comandada pelos grandes países exportadores, pelas transnacionais do sector agro-alimentar e pelos grupos económicos ligados ao comércio internacional no quadro de uma nova divisão internacional do trabalho com a criação de novas relações de dominação e de dependência no mundo favorável à acumulação e reprodução do capital. A Organização Mundial do Comércio, recentemente criada em resultado dos acordos do GATT, e os sucessivos acordos da União Europeia com países terceiros, são instrumentos desta política de abolição artificial de fronteiras que leva à desestabilização e retracção do crescimento económico dos países menos desenvolvidos, com abandono da produção própria, défices comerciais crescentes, perda de valor das respectivas moedas, desemprego, pobreza.
É uma estratégia que remete
agriculturas, como a portuguesa, para a condição
de agricultura não produtivas e os agricultores para a
de cidadãos excluídos do processo produtivo, que
não são remunerados pela valorização
do seu trabalho mas por uma política assistencial do Estado,
o que leva em pouco tempo, como tem levado, ao despovoamento e
desertificação do mundo rural.
E é um processo que nem sequer serve aos consumidores que não beneficiam de preços mais baixos e são levados a adquirir produtos cuja origem é muitas vezes desconhecida e de qualidade duvidosa. Mais do que isso, exige-se aos produtores nacionais normas de qualidade que muitas vezes não são cumpridas pelos países de origem dos produtos importados.
Sem prejuízo de uma modificação
global das orientações e das políticas que
sustentam este processo de abolição de fronteiras
impõem-se medidas que, no mínimo, contribuam
para que se conheça melhor a situação dos
mercados agro-alimentares, as condições higio-sanitárias
dos produtos importados e consumidos e permitam preparar propostas
de políticas que permitam o controlo das importações,
o combate à fraude fiscal e a defesa e promoção
da produção nacional.
Neste sentido, o Grupo Parlamentar do
PCP propõe a criação do "Observatório
dos Mercados Agrícolas e das Importações
Agro-Alimentares", órgão constituídos
por representantes de organizações dos agricultores,
sindicais, de defesa dos consumidores, de instituições
técnico-profissionais e organismos do Estado com funções
na área da produção e comércio agro-alimentar,
da inspecção económica e da estatística.
A este novo órgão, dotado
de meios humanos (designadamente aproveitando o conhecimento e
experiência dos trabalhadores aduaneiros actualmente sem
profissão e no desemprego) e financeiros adequados à
prossecução das funções que lhe são
cometidas, serão atribuídas as seguintes funções
específicas:
- o acompanhamento e elaboração
de informações referentes ao funcionamento dos mercados
e da balança comercial de produtos agro-alimentares;
- a recolha e tratamento de informação
referente ao controlo de qualidade e das condições
higio-sanitárias das produções importadas;
- a formulação de propostas
de políticas de controlo e fiscalização das
importações e de promoção da produção
nacional;
- a apresentação anual,
à Assembleia da República e ao Governo, de um "Relatório
sobre a Situação dos Mercados Agrícolas e
das Importações Agro-Alimentares".
Nestes termos os Deputados abaixo-assinados
do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projecto de
Lei:
É criado, o "Observatório
dos Mercados Agrícolas e das Importações
Agro-Alimentares", a seguir designado por Observatório.
O "Observatório tem os seguintes
objectivos e funções:
a) Acompanhar e elaborar informação
periódica referente ao funcionamento dos mercados e à
evolução da balança comercial agro-alimentar;
b) Recolher, tratar e produzir informação
referente ao controlo de qualidade e das normas higio-sanitária
das importações agro-alimentares;
c) Publicar informações,
estudos e relatórios que permitam analisar a situação
e evolução dos Mercados Agrícolas e da Balança
Comercial Agro-Alimentar, nomeadamente resultantes dos fluxos
de importações;
d) Formular propostas a apresentar
ao Governo de políticas de controlo e fiscalização
das importações e de promoção da produção
nacional;
e) Apresentar, anualmente, até
31 de Dezembro, à Assembleia da República e ao Governo
de um "Relatório sobre a Situação dos
Mercados Agrícolas e das Importações Agro-Alimentares".
O Observatório é dirigido
por um Conselho de Administração constituído
pelas seguintes entidades:
a) um representante de cada uma das
Confederações Agrícolas e dos Jovens Agricultores;
b) um representante de cada uma das
Confederações Sindicais;
c) um representante das Associações
de Defesa do Consumidor;
d) um representante da Ordem dos Médicos;
e) um representante da Ordem dos Médicos
Veterinários;
f) um representante da Secção
Agronómica da Ordem dos Engenheiros;
g) um representante do Instituto Nacional
de Estatística;
h) um representante do Instituto de
Protecção à Produção Agro-Alimentar;
i) um representante do Instituto do
Consumidor;
j) um representante da Inspecção
Geral das Actividades Económicas;
l) um representante da Direcção
Geral das Alfândegas;
m) três personalidades de reconhecido
mérito eleitas pelos restantes membros.
1 - Ao Conselho de Administração
cabe dinamizar o funcionamento do Observatório, promover
a produção e divulgação de estudos,
relatórios e pareceres, estabelecer contactos interministeriais
com instituições de investigação,
organizações de produtores e associações
representativas dos vários sectores da produção
e do comércio, bem como adoptar todas as iniciativas necessárias
à prossecução dos respectivos objectivos
e funções.
2 - O Conselho de Administração
elege de entre os seus elementos um Presidente e dois Vice-Presidentes
e elabora, em prazo de três meses após a sua instalação
os respectivo regulamento interno a ser aprovado pelo Ministro
da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas e publicado em
Diário da República.
O Observatório funciona no âmbito
do Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas
que lhe deverá atribuir, os meios físicos, humanos
e financeiros necessários ao seu funcionamento e incluí-lo
no respectivo Orçamento.
O Observatório será instalado
no prazo de três meses após a entrada em vigor da
presente lei.
A presente lei entra em vigor com a
primeira Lei do Orçamento subsequente à sua aprovação.