Uma ofensiva económica



Rui Vasco Silva
Membro da Comissão Política da JCP
Um dos mais salientes traços da acção governativa do PS ao longo destes quatro anos é a forma como tenta dissociar as políticas de direita, que no fundamental aplica, daquelas que afirma serem as suas opções ideológicas. Se impõe a quem trabalha a flexibilidade e a polivalência, se privatiza segundo os interesses dos grandes grupos económicos, se assina vergonhosos acordos salariais com os sindicatos amarelos na função pública, se faz duvidosas leituras da lei das 40 horas em benefício dos patrões, isso em nada se deve - segundo afirmam os ditos socialistas no Governo - a opções políticas com evidente carácter de classe mas antes «a circunstâncias específicas», à «necessidade de modernizar a economia», às «exigências dessa coisa que é a globalização»...
Actualmente, é através de um pacote laboral extremamente gravoso para os trabalhadores - e em especial para as novas e futuras gerações de trabalhadores - que concretiza mais algumas exigências das associações patronais. Contrariando a OIT e afirmando que, no nosso País, «se protege demais os trabalhadores», é pela mão de um Governo dito socialista que o patronato transforma em lei grande parte do seu caderno reivindicativo.
A resposta dos trabalhadores não se fez esperar e ao longo do último ano é ao intensificar da luta de classes que assistimos: luta política, económica e ideológica. Luta entre classes antagónicas com interesses e aspirações inconciliáveis. O Partido e a JCP, juntamente com a CGTP, avançam na primeira linha de combate ao pacote laboral. Mas qual é afinal o significado ideológico desta ofensiva?
Importa referir que este pacote não pode ser considerado separadamente de toda uma política nos mais diversos sectores da sociedade, da educação ao emprego, da defesa ao ambiente. Trata-se de eliminar todos os entraves à dominação do capitalismo monopolista e intensificar a exploração.
As propostas legislativas do Governo, autênticos textos de louvor ao capital, apresentam-nos as concepções do PS acerca do papel da mulher na sociedade - cuidar dos seus filhos e da casa, recebendo ainda assim a benesse de poder trabalhar a meio tempo -, sobre o trabalho e os trabalhadores, o fim do emprego e o início da era dos biscates, os seus planos de privatização da segurança social. Esta é, aliás, colocada ao dispor das grandes empresas através de isenções, benefícios e reduções contributivas.
O profundo desrespeito por quem produz toda a riqueza do nosso País, o deslumbramento perante a finança e as actividades parasitárias são importantes traços ideológicos que emolduram as alterações à lei das férias, ao conceito de retribuição, à lei do trabalho nocturno e ao lay-off, o trabalho a tempo parcial.
A participação do patronato na elaboração das leis do trabalho é inconstitucional. Todavia, o desrespeito pela Constituição já não é novidade para o PS, para a direita; as revisões a que a submetem eliminam gradualmente o seu conteúdo progressista. Princípios como a efectiva igualdade entre homem e mulher ou uma mais justa distribuição da riqueza, a submissão do económico ao político são esquecidos ou simplesmente liquidados.
Mas é na luta ideológica que os burgueses mais demonstram o medo que sentem daqueles que exploram. Pregam o fim da luta de classes, anunciando a sociedade capitalista como o estádio final de harmonia entre exploradores e explorados, a colaboração entre classes - ideias que se encontram na base do pacote.
Conhecem bem a força dos trabalhadores organizados, unidos e em luta; por isso desvalorizam a contratação colectiva, precarizam, afastam tantos e tantos jovens dos sindicatos de classe.
A «terceira via» parece afinal ser apenas mais uma faixa de rodagem da velha estrada capitalista. Como escreveram Marx e Engels no Manifesto há 150 anos atrás, o socialismo da burguesia é uma mera figura de retórica, continua a consistir na afirmação de que "os burgueses são burgueses - no interesse da classe trabalhadora". Todavia, os exploradores continuam hoje como então a produzir os seus coveiros e o seu declínio é tão certo quanto o é a construção do Socialismo e do Comunismo! Avante, a luta continua!


«O Militante» Nº 241 - Julho / Agosto - 1999