Os primeiros comícios do PCP
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Aurélio Santos
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"Chovia. Chovia sempre.
Toda a multidão era uma explosão de guarda-chuvas. Minuto a
minuto, a água foi ensopando a arena - e quem na arena se
encontrava ficou com os sapatos enterrados na lama. Só que a
lama do Campo Pequeno era maravilhosa: era o alicerce, a
argamassa do alicerce, do país novo que temos todos de construir
para que o sol brilhe para todos nós".
"Quarenta mil pessoas, dentro e fora do recinto. Quarenta
mil pessoas à chuva, ombro a ombro, mão na mão. Uma noite de
intempérie destruída pelo entusiasmo de toda uma grande
consciência política."
... Assim relatava o Avante! o grandioso comício que na
noite de 28 de Junho de 1974 afirmou definitivamente o PCP como
uma força imprescindível no novo Portugal do 25 de Abril.
No dia seguinte, os títulos dos jornais e as fotografias
confirmavam o impacto político desse comício, cujo eco chegou
ao I Governo Provisório, em S. Bento, e ao Palácio de Belém,
onde Spínola preparava o chamado "golpe Palma Carlos",
para assumir plenos poderes. Mas o golpe viria a fracassar, com a
demissão, na semana seguinte, de Palma Carlos e do seu Governo.
O comício do Campo Pequeno foi um momento culminante na rápida
implantação e ligação com as massas populares iniciadas pelo
PCP logo a seguir ao 25 de Abril, no processo da sua
transformação de partido clandestino num grande partido de
massas.
Numa fase em que Spínola ainda pretendia não permitir a livre
actuação de partidos políticos, limitando-se a admitir a
formação de "associações cívicas", a convocação
desses comícios do PCP foi uma das expressões do processo de
conquista das liberdades exercendo-as, que marcou as primeiras
semanas após o 25 de Abril.
Logo em Maio, além de grandes manifestações de homenagem a
vítimas do fascismo (Catarina Eufémia, a 19 de Maio, em
Baleizão, Alex, a 4 de Junho, em Almada, Alfredo Lima, a 2 de
Junho, em Alpiarça), surgem os primeiros comícios convocados
pelo PCP: a 19 de Maio, em Alhandra, Aveiras, Benfica, no fim de
semana de 24-26 de Maio em Santarém, Alcanena, Couço, Torres
Vedras, Marinha Grande, Moura, Montemor-o-Novo, Mora, Ermidas,
Alvalade, Fafe, Riba d'Ave.
Em 31 de Maio um avanço qualitativo é dado com a realização,
em Lisboa, do primeiro comício convocado pela DORL, com o
Pavilhão dos Desportos completamente cheio. A 8 de Julho a
bandeira do PCP enche o primeiro comício do Barreiro,
erguendo-se também, nesse mês, em Alhos Vedros, Seixal, Vila Franca
de Xira, Coimbra, Faro, Setúbal, Grândola, Sacavém, Braga e
muitas outras localidades, numa maré em que ganha particular
relevo o comício do Palácio de Cristal, no Porto, em 22 de
Junho.
A par desta ampla movimentação de massas, cresce e estrutura-se
a organização do Partido, traduzida, de certa maneira, na
abertura de Centros de Trabalho: de oito,
apresentados no primeiro número do Avante! legal, para 18 na
semana seguinte e 44 na primeira semana de Junho.
Foi nesta ampla movimentação que o comício do Campo Pequeno se
enquadrou, permitindo ao Avante! dizer: "Foi o
triunfo de um Partido, a adesão triunfal de milhares de pessoas
à sua política e a fé triunfante nas palavras de ordem que
circularam clandestinamente durante tantos e tantos anos".
"Todos saíram cantando "Avante!, camarada,
Avante!" - e a noite sem estrelas era um afago de chuva no
rosto revolucionário de quem lá foi, esteve, e para sempre
ergueu uma barreira ao aventureirismo fácil e às tentativas da
reacção em levantar a cabeça contra o Portugal que se pretende
construir".
«O Militante» Nº 240 - Maio / Junho - 1999