Parlamento Europeu
Em Junho há eleições


Ilda Figueiredo

Joaquim Miranda

Sérgio Ribeiro

Honório Novo

As eleições para o Parlamento Europeu são já em Junho próximo. Pareceu a O Militante que seria de interesse para os seus leitores a realização de uma mesa-redonda com a participação da camarada Ilda Figueiredo, cabeça de lista da CDU para aquelas eleições, e dos actuais três deputados eleitos pela CDU, os camaradas Joaquim Miranda, Sérgio Ribeiro e Honório Novo.

A mesa-redonda foi conduzida pelo camarada José Cavaco.

Quais são, Ilda, as questões mais importantes que se colocam nesta campanha eleitoral para o Parlamento Europeu?

IF - Essas questões são, fundamentalmente, quatro:

- a compreensão pelos cidadãos eleitores da importância do voto em 13 de Junho, dada a influência crescente das decisões europeias no dia-a-dia da vida das pessoas e o contributo que o resultado da CDU dá para fortalecer as condições que favoreçam o reforço da esquerda nas eleições legislativas de Outubro. Cada vez mais a vida política, económica, social e cultural do nosso País é condicionada por orientações e decisões tomadas nas instituições da União Europeia, pelo que importa ter no Parlamento Europeu quem defenda intransigentemente os interesses nacionais e populares e lute por um novo caminho para a construção europeia;

- o debate em torno das implicações das políticas europeias na economia portuguesa e nos vários sectores de actividade, dado que, apesar das transferências financeiras da União Europeia para Portugal envolverem montantes importantes e determinarem progressos significativos, nomeadamente na área das infra-estruturas, o tecido produtivo nacional passa por momentos difíceis e o nível de vida dos trabalhadores e da população em geral não beneficiou, como deveria, de algum crescimento económico que se registou no País. Áreas fundamentais da vida económica nacional, como a agricultura, os têxteis, as pescas, a construção naval, o sector mineiro, a siderurgia, o comércio tradicional, entre outras, revelam fragilidades crescentes;

- a divulgação do valioso e ímpar património de intervenção e de realização dos deputados do PCP no Parlamento Europeu, de ligação permanente ao País e às suas legítimas preocupações e aspirações, de defesa dos direitos e interesses de Portugal, de permanente potenciação da capacidade negocial portuguesa e de acção em prol das actividades produtivas e do progresso harmonioso do País, de afirmação e de salvaguarda dos anseios populares e dos trabalhadores. É de sublinhar que os três deputados comunistas foram responsáveis por um terço do conjunto das perguntas, intervenções, relatórios e pareceres apresentados pelos 25 deputados portugueses no Parlamento Europeu, o que, só por si, demonstra a importância do reforço da votação na CDU nas próximas eleições para o Parlamento Europeu;

- a promoção das propostas da CDU e da alternativa que defendemos, em defesa dos interesses nacionais e populares, por um novo rumo da construção europeia, por uma Europa de estreita cooperação democrática, solidária, de paz e de coesão. Impõe-se uma nova dimensão social que resolva o drama dos cerca de vinte milhões de desempregados e dos cinquenta milhões de pobres da União Europeia, que crie emprego de qualidade e promova uma reorientação das políticas sectoriais comunitárias que ignoram os atrasos e debilidades estruturais e sacrificam sectores de actividades fundamentais do País. É urgente dar particular destaque à necessidade de apoios à actividade comercial e ao sector industrial do País, nomeadamente dos têxteis e do calçado, à necessária profunda reforma da Política Agrícola Comum e à reorientação da Política Comum das Pescas, com vista a ultrapassar os actuais desequilíbrios na distribuição dos apoios e subsídios entre produtores, produções e países, de modo a permitir o crescimento da produção agro-alimentar nacional e garantir o desenvolvimento da actividade piscatória.


Miranda, qual a importância e significado da demissão da Comissão Europeia?

JM - A demissão da Comissão constitui um acto de inegável alcance político.
Porque foi a primeira vez que um colégio de comissários se viu forçado a demitir-se, mas também e fundamentalmente pelas razões que determinaram que assim tivesse acontecido.
Como causas próximas de uma tal demissão, encontramos, como é sabido, comprovadas situações de irregularidade, fraude e nepotismo. Situações que levaram uma maioria do Parlamento Europeu - em que se incluíram os três deputados do PCP - a negar a quitação (encerramento das contas) à Comissão, relativamente ao respectivo exercício orçamental de 1996 e à apresentação posterior de uma moção de censura, cuja votação alcançaria um número de votos favoráveis nunca antes alcançado em votações similares (mais de duzentos, entre os quais, e uma vez mais, se encontraram os dos deputados comunistas portugueses).
Dois aspectos importará referir, neste âmbito e ainda relativamente a este episódio. Em primeiro lugar, o facto de os deputados dos restantes partidos portugueses com representação no Parlamento Europeu (PS, PSD e PP), apesar da gravidade das acusações e provas reunidas contra a Comissão, terem votado contra a censura e insistido na continuidade daquela. Ao ponto de o terem chegado a fazer, de forma absurda, em nome da "salvaguarda dos interesses nacionais"!
Em segundo lugar, o criticável comportamento do Governo português, o qual, manifestando um total alheamento do processo e uma completa incapacidade de prever e reagir perante uma evolução que se tornava manifestamente irreversível, se amarrou igualmente - e amarrou o País - a uma Comissão politicamente desacreditada e moribunda.
De sublinhar, entretanto, que uma tal demissão só foi possível dado o profundo isolamento político da Comissão, nomeadamente em relação à generalidade dos cidadãos e como resultado das erradas políticas que têm vindo a ser desenvolvidas e da manifesta falta de transparência e de controlo de que enfermam os processos de decisão ao nível comunitário.
Donde não basta agora substituir os comissários, nomeadamente o presidente da Comissão. É fundamental que, mudando estes, se alterem igualmente práticas inaceitáveis e políticas erradas.
Pelo que a indigitação de Prodi para presidente do futuro colégio de comissários, efectuada pelo recente Conselho Europeu de Berlim, não suscita, naturalmente, qualquer entusiasmo. O seu apego às teses e práticas neoliberais vigentes, bem evidenciado, de resto, no desempenho que teve à frente do Governo italiano, não deixam antever mudanças significativas.
O Governo do Engº Guterres, comprometido que ficou com o executivo de Santer, esse perdeu obviamente margem de manobra relativamente à composição e à definição das linhas de rumo do futuro executivo comunitário.
Veremos se, ao menos, conseguirá colocar os interesses do País acima dos interesses dos boys, de forma a assegurar um pelouro importante na Comissão que se seguirá.


Sérgio, gostaríamos que nos dissesses alguma coisa actual sobre o euro.

SR - Que mais dizer sobre o euro? Quase tudo... ou, pelo menos, muito.
Haverá quem pense que não vale a pena insistir na argumentação usada na luta contra a introdução do euro uma vez que ele está introduzido. Mas essa recordação é sempre útil. Primeiro, porque as razões eram razões de princípio, e os princípios não caducam; depois, porque temos de combater as memó- rias curtas para que não se lembre as previsões quando as realidades comprovam que estavam certas.
Aliás, o que nos levou a “estar contra a moeda única” eram razões de posicionamento político, de classe, e são as mesmas que nos devem escorar no acompanhamento da transição para o euro, moeda única para 11 Estados-membros de uma União Europeia que é formada por 15 Estados-membros.
A transição para a moeda única, como a sua criação, não é mais do que a introdução de um instrumento ao serviço de interesses. Em si mesmo, o instrumento não é nem bom nem mau, e até pode ser - ou vir a ser - útil para aqueles a quem hoje é muito prejudicial. Depende.
Coloco a questão em dois planos e dois tempos. Desde 1 de Janeiro que o euro está na nossa vida como moeda escritural, e vai estar a partir de 2002 como moeda plena a substituir o escudo. Enquanto moeda escritural, a disposição desse instrumento pelas grandes empresas é feita ao serviço dos seus interesses, não coincidentes e até antagónicos com os interesses das pequenas e médias empresas e dos trabalhadores, ao lado de quem essa moeda passa. Porque alguns dos benefícios anunciados como era o da redução das despesas bancárias, por anulação de taxas cambiais, não se viram e até já há relatórios do Parlamento Europeu a perguntar onde é que estão essas tais reduções de despesas que iriam beneficiar os “pequeninos”. Entretanto, os bancos vão aproveitando...
Por outro lado, já alguém dos que andam a espalhar a fé no euro se lembrou de preparar os cidadãos para o facto de, em breve, em vez das 6 moedas em escudos - 5, 10, 20, 50, 100 e 200 - passarem a ter curso obrigatório 88 moedas em euros: 1, 2, 5, 10, 20, 50 cêntimos, 1 e 2 euros, a multiplicar por 11 que tantos são os países que têm direito a uma face - cara ou coroa... - nacional de cada moeda?
Passemos a outro plano, ao dito macroeconómico. O euro iria ser o grande concorrente do dólar, a moeda internacional que iria equilibrar as coisas tirando o domínio à moeda norte-americana. E começou a cantar de galo. Arrancou em “euforia”, com uma relação de 1/1,20 para o dólar. Depois... tem vindo a cair do poleiro. Está a 1/1,06, desceu mais de 11% num trimestre, o que, se para a chamada globalização funcionasse o Sistema Monetário Europeu e as suas bandas de flutuação, teria atirado borda fora a moeda da estabilidade, o tal euro. Quanto ao futuro, se a economia e a moeda europeias continuarem assim e a economia americana a aproveitar-se dela para afirmar ainda mais a sua hegemonia, esta moeda não tem... grande futuro. O grave é que esse será o futuro que serve as transnacionais e quem não tem futuro são as economias como as portuguesas. E as actividades produtivas e os trabalhadores.
Mas tudo isto funciona numa lógica que tem a sua expressão no Banco Central Europeu (BCE). Ele, lá de Frankfurt, é que decide o que é bom para quem. E tem de ser, estatutariamente - segundo Maastricht -, indiferente às consequências nacionais e sociais das decisões que tomar em favor da estabilidade de preços e do que sirva as transnacionais.
No BCE é que está a chave do funcionamento do instrumento e do sistema monetário e não existe controlo de qualquer instância democrática que seja consentida. Mas tem de ser conquistado. A não ser assim, a não o conseguirmos, estamos aqui estamos a ser governados por instâncias sem legitimidade democrática, por ditaduras eurobanqueirocratas.


Será legítimo cantar vitória com o acordo sobre a Agenda 2000? Que achas, Miranda?

JM - Os deputados do PCP no Parlamento Europeu acompanharam a par e passo, de forma interveniente e quantas vezes marcante, todo o processo que conduziu à definição pelo Conselho Europeu de Berlim do quadro financeiro de médio prazo da União Europria (Agenda 2000).
Foi sua primeira preocupação contribuir para que Portugal pudesse assegurar um nível de transferências comunitárias no período 2000-2006 concordante com o objectivo da coesão económica e social e, simultaneamente, que se procedesse a alterações significativas em algumas políticas fundamentais, de forma a melhor as adequar aos interesses sectoriais respectivos do País. Particularmente ao nível da Política Agrícola Comum.
Com tais objectivos multiplicaram-se em iniciativas.
No Parlamento Europeu, desde logo, com a elaboração de relatórios e pareceres, intervindo nas comissões especializadas e, em plenário, formulando alterações a relatórios ou questionando a Comissão e o Conselho. Fazendo esforços de cooperação com outros deputados portugueses, nem sempre atendidos, ou procurando aliados.
Insistindo permanentemente na necessidade de potenciar ao máximo a capacidade negocial do País. Estabelecendo vias de informação com todos quantos estavam, de uma ou outra forma, envolvidos nas negociações, nomeadamente com representantes governamentais.
Contactando, ao nível interno, com organizações diversas, fomentando formas de diálogo permanente e profícuo, alertando para dificuldades, incentivando a participação dos agentes económicos e sociais no processo.
Tratou-se, durante vários meses, de uma intensa actividade.
Quanto aos resultados: se é um facto que eles não terão sido tão negativos quanto se chegou a temer, particularmente em matéria de transferências financeiras, é igualmente inquestionável que eles não são razão para as euforias de que o Governo deu sinais.
A PAC, por exemplo, manteve as suas características essenciais. Manifestamente prejudiciais para a agricultura nacional.
Também as regras que passarão a presidir às transferências no domínio dos fundos estruturais se apresentam bastante mais restritivas.
O quadro global financeiro adoptado inviabiliza, de facto, qualquer alargamento da União Europeia, pelo que, a inscrever-se este na ordem do dia nos próximos tempos, não será de excluir a abertura de novas negociações... Como restringe drasticamente as despesas em domínios importantes, como o do combate ao desemprego.
Ou seja: é necessário dar continuidade ao trabalho desenvolvido e não cair em miragens que pouco terão a ver com a realidade.


Honório, como a reforma da PAC era uma questão central no quadro das decisões do Conselho Europeu de Berlim, podes debruçar-te mais sobre as decisões tomadas?

HN - A reforma da PAC era uma das três principais vertentes a que as decisões de Berlim sobre o futuro orçamento comunitário pretendiam dar resposta.
O contexto restritivo do euro e do Pacto de Estabilidade não foi alterado no Conselho Europeu de Berlim e, assim, não constituem surpresa as grandes limitações aprovadas, também nas despesas agrícolas. O que esteve em discussão em Berlim não foi a possível melhoria e defesa da agricultura, mas a forma de gastar menos com este sector.
Berlim foi também “condicionado” pelas novas negociações da Organização Mundial do Comércio nas quais se pretendem diminuir apoios à agricultura e abrir as fronteiras comunitárias à entrada de produtos agrícolas americanos (e não só). Embora a agricultura americana seja muito mais apoiada que a europeia (por vias directas e indirectas) e alguns esqueçam isso, passando a ideia de que a agricultura comunitária é “cara” e gasta 50% do orçamento comunitário...
A conjugação deste dois aspectos “justificam” as decisões de Berlim, de diminuição, entre 15% e 20%, dos preços garantidos para os cereais, a carne e o leite.
Mas a questão essencial, aliás anunciada como central pelo Governo para se concretizar uma reforma profunda da PAC, tinha a ver com a alteração de orientações que permitissem distribuir melhor os apoios. A reforma de 92 - coordenada pelo antigo Ministro e actual eurodeputado do PSD Arlindo Cunha, e aprovada durante a presidência portuguesa da UE - havia acentuado os desequilíbrios e as discriminações da PAC: entre produções e países - apoiando os produtos típicos do Norte em detrimento dos produtos mediterrânicos; entre agricultores - a parte de leão dos apoios para os grandes agricultores e explorações agro-alimentares, o desprezo para os pequenos agricultores e a agricultura familiar. Isto é, a PAC não era uma política de coesão, era uma política de discriminação que havia conduzido Portugal a uma crescente dependência alimentar, a uma profunda pauperização da lavoura - entre 96 e 98, o rendimento dos agricultores diminuiu mais de 40% - e originando uma crescente desertificação e envelhecimento do mundo rural.
Promover o reequilíbrio da PAC era, pois, a questão decisiva e consensual que se colocava.
Daí o fracasso evidente da posição portuguesa no Conselho de Berlim. As discriminações e desequilíbrios vão prosseguir. Não foi aprovado qualquer plafonamento, isto é, a criação de limites que impedissem apoios acima de certos níveis, nem foi decidida qualquer modulação, isto é, a criação de apoios superiores para os pequenos agricultores e as explorações agrícolas familiares.
O foguetório governamental que encerrou Berlim não pode fazer esquecer a profunda derrota das alterações que interessavam a Portugal.
Neste contexto, a discussão relativa aos montantes financeiros que poderão ser transferidos para o País nos próximos sete anos reveste importância menor. Mesmo que venham a ser superiores aos anteriores (e era quase impossível que não o fossem, caso contrário manteriam a agricultura mais pobre da UE como contribuinte líquida da PAC); mesmo que os acréscimos anunciados não estejam garantidos pois dependem de um plano de desenvolvimento rural que não existe, e que, quando e se existir, carecerá da análise e da decisão "superior" positiva da Comissão Europeia. Independentemente do valor real dessas transferências, a ausência de decisões para reequilibrar e tornar mais justa a PAC, farão com que dezenas de milhar de pequenos e médios agricultores continuem a receber menos de 10% das ajudas, isto é, que continuem a receber migalhas, porventura menos migalhas.


A diferença entre o que foi anunciado pelo Governo e o que poderá ser a realidade limita-se ao futuro da PAC? É que no caso dos Fundos Estruturais e do Fundo de Coesão também foram anunciados aumentos de transferências financeiras para Portugal...

HN - Para já soube-se, menos de quinze dias após Berlim, que o aumento anunciado sofreu uma primeira redução de cerca de 18 milhões de contos no Fundo de Coesão, decorrente de um compromisso entre a Presidência e o governo de Aznar que fez “voar” essa verba para Espanha.
Mas, independentemente desta e de outras eventuais correcções em baixa, e mesmo que não valorizemos muito o facto dos valores anunciados representarem cerca de 3,3% do PIB nacional enquanto os valores recebidos no actual Quadro Comunitário de Apoio (QCA) terem representado perto de 4% desse PIB, uma coisa é o que foi divulgado, e que a concretizar-se poderia até ser considerado razoável face ao contexto restritivo do Pacto de Estabilidade, outra bem diferente poderá ser a realidade.
De facto, avaliações à execução dos fundos estruturais poderão determinar o reenvio para o orçamento comunitário de verbas afectas a projectos e programas que as não tenham absorvido nos prazos inicialmente previstos. As verbas que foram aprovadas em Berlim não estarão, como até agora, vinculadas a Portugal e, caso se verifiquem execuções insuficientes e/ou atrasadas, deixarão de ser gastas no nosso País. A reprogramação dos meios financeiros estruturais será muito dificultada, impedindo a reafectação entre programas e planos que a realidade aconselhasse. A reorçamentação de verbas poderá também ser muito limitada, impedindo aquilo que o governo está hoje a fazer com o actual QCA (e que foi também feito com o anterior), estendendo a respectiva execução para os anos de 2000 e 2001 (num total que vai atingir 340 milhões de contos de ajudas comunitárias).
Estas novas regras levam a poder dizer que os meios distribuídos em Berlim para as acções estruturais não vão constituir objectivo de despesa (como até agora acontecia), passíveis de serem geridos ao longo de todo o período de vigência do QCA - e mesmo para além dele - de acordo com as prioridades e os ritmos adequados ou decorrentes da realidade nacional. Esse meios vão tão somente constituir limite de despesa e, em função das dificuldades de gestão introduzidas pelas novas regras, serão presumível e provavelmente diminuídos ao longo do próximo QCA.
Esta é uma possibilidade muito forte, que comprovaremos ao longo dos próximos sete anos, e que, a confirmar-se, se traduzirá numa diminuição significativa dos meios estruturais que o País irá de facto receber.


Diz-nos, Sérgio, algo sobre o Pacto de Estabilidade e as suas implicações para Portugal.

SR - O Pacto de Estabilidade (que tem a pouca vergonha de também se chamar de Crescimento) é a continuidade da aplicação dos critérios de convergência nominal que estão no processo de criação da moeda única. Assim como esses critérios serviram para impor uma política, este Pacto, ainda mais rigoroso, ainda mais exigente, serve para continuar a mesma política, de ataque a conquistas sociais, de privatizações, de desmantelamento dos serviços públicos, sempre com o pretexto/argumento da estabilidade monetária, do equilíbrio orçamental e finanças públicas.
Pelo Pacto, a que o Governo se obrigou, o Estado português tem de cumprir draconianas medidas, tomadas na frieza quentinha de gabinetes em Frankfurt e Bruxelas, quanto ao nível do seu défice orçamental e como o conseguir. Se o não fizer, há castigos, como no jogo do monopólio. Quer dizer, se uma Assembleia da República, com os seus deputados eleitos e com o governo que dela sair, resolver tomar determinadas medidas no que entenda ser o melhor para os portugueses, está condicionada ou condenada a ter de desistir de determinadas ajudas ou até a pagar multas. E não por haver uma posição de uma outra instância democrática que se lhe sobreponha. São os tais eurobanqueirocratas que definem critérios, fixam objectivos e avaliam resultados.
Contra este estado de coisas temos lutado e temos de continuar a lutar. Também na instituição comunitária que tem estrutura e fundamento democráticos.


Ilda, como vês a participação das mulheres na política em Portugal?

IF - A participação das mulheres na política em Portugal é, ainda, muito insuficiente, sobretudo nos órgãos de poder político. Embora, após a revolução do 25 de Abril, a Constituição da República tenha consagrado um novo estatuto da mulher na vida nacional, que reconheceu no plano institucional a plena igualdade de direitos e obrigou à alteração de todas as leis que discriminavam a mulher, abrindo novas possibilidades para o acesso das mulheres a todas as formas de actividade social e laboral, persistem ainda discriminações que resultam da estrutura da sociedade e das mentalidades.
Sendo certo que há uma participação crescente das mulheres na actividade económica, com taxas de actividade feminina que são das mais elevadas da Europa, que nas universidades as raparigas já são mais de metade dos estudantes universitários, que crescem as percentagens de mulheres em lugares de responsabilidade nos mais diversos sectores de actividade, embora ainda longe das médias masculinas, é no acesso aos órgãos de poder político que se mantêm as mais baixas taxas de participação das mulheres. Por exemplo, na Assembleia da República, nas últimas eleições legislativas, apenas foram eleitas 28 mulheres dos 230 deputados, tendo a CDU a maior participação, com 26,7% de mulheres, enquanto o PS elegeu apenas 12,5%, o PSD 8% e o CDS/PP 20%. Impõe-se, pois, aumentar a participação das mulheres na vida política, preocupação a que o PCP está a dar uma resposta positiva.
«O Militante» Nº 240 - Maio / Junho - 1999