1998, um ano de combate sindical
com resultados positivos

Carvalho da Silva
Coordenador da CGTP-IN


No contexto de uma situação política e social muito complexa, 1998 foi um ano em que alcançámos resultados altamente positivos no plano da acção sindical.


Legislação do trabalho

É de registar, desde logo, o que conseguimos no que se refere à legislação do trabalho e sobre isso convém sublinhar que a revisão das leis laborais - daquelas que contestámos ao longo do tempo - não constitui uma ofensiva de há meia dúzia de meses, mas antes um compromisso assumido pelo primeiro ministro com sectores patronais conservadores, visando apoios eleitorais para as legislativas de 1995.
Não se trata de um processo qualquer, mas sim de um processo de grande envergadura em que o capital e, em particular, sectores conservadores, com forte influência, apostaram e até fizeram dele arma no jogo político antecedente à ida do Engº Guterres para primeiro ministro. É disto que se trata, não estamos a falar de coisa de somenos importância, e foi esse compromisso que desencadeou o conteúdo e o percurso, que conhecemos, do chamado acordo de concertação estratégica de 1997.
Já agora lembro que, naquela altura, houve quem dissesse: “está bem, a CGTP-IN até vai estar contra, mas isto vai ser o caminhar das coisas e depois eles intervêm no terreno e logo se verá; mas com a CGTP-IN contra ou não, isto tem de andar”. Enganaram-se, como se veio a ver com o extraordinário processo de mobilização dos trabalhadores contra o pacote laboral e com os efeitos que essa luta desenvolvida durante 1998 produziu.
Já no decorrer deste ano, a luta contra o pacote laboral continuou a ter grande destaque no contexto da nossa actividade, perante a insistência do Governo em continuar esta ofensiva contra os direitos dos trabalhadores.
Foi assim que levámos a efeito a acção nacional “Por Abril, defender os direitos dos trabalhadores contra o pacote laboral”, no dia 25 de Março, em Lisboa, iniciativa precedida por milhares de plenários e acções de esclarecimento e mobilização dos trabalhadores, que veio a constituir a maior manifestação realizada nos últimos anos e a demonstração clara da sua frontal oposição à revisão gravosa da legislação do trabalho.
Na sequência desta acção e no dia em que subiu ao Plenário da Assembleia da República a discussão do projecto sobre trabalho a tempo parcial, teve lugar em Lisboa, no Pavilhão Carlos Lopes, uma reunião do Plenário da CGTP-IN, aberto a activistas sindicais que, mais uma vez, demonstrou a indignação dos trabalhadores pelas cedências do Governo às ilegítimas pretensões do patronato de agravar, ainda mais, a já precárias condições de prestação de trabalho.
A luta contra o pacote laboral já teve, pois, importantes resultados:

- inviabilizámos a passagem imediata desses projectos de lei no contexto do “Acordo Estratégico da Concertação Social”;

- conseguimos que a discussão de importantes projectos legislativos tivesse lugar em sede da Assembleia da República e que o pronunciamento das organizações de trabalhadores não ocorresse em pleno período de férias de 1998, como se pretendeu, para os fazer passar nas costas dos trabalhadores;

- já derrotámos o projecto que visava agravar a lei dos contratos a prazo;

- obtivemos importantes alterações pontuais positivas no texto de alguns projectos legislativos;

- suscitámos, na opinião pública, fortes reservas e mesmo a condenação de conteúdos mais gravosos da revisão legislativa pretendida, ouvindo-se críticas de sectores da sociedade distantes dos problemas sindicais sobre a aleivosidade de alguns projectos legislativos, como é o caso da pretendida alteração do regime de férias.

Tudo isto é, inegavelmente, o resultado da luta dos trabalhadores e da acção daqueles que, no plano político, consequentemente os apoiam, daquilo que realizámos em termos de dimensão colectiva na sociedade e também da capacidade de influenciar a acção das instituições e do próprio Governo.
Tivemos, em 1998, melhores resultados no que se refere aos salários e, em relação à contratação colectiva, é de longe o ano em que se verificaram avanços negociais mais significativos, com bons resultados para os trabalhadores, em sectores importantes da indústria, dos serviços, como é o caso da hotelaria, mas também dos enfermeiros e dos professores, entre outros.


As 40 horas de trabalho semanal

1998 é, sobretudo, o ano da confirmação das 40 horas como limite máximo da duração semanal do tempo de trabalho, apesar deste processo não estar ainda resolvido em definitivo.
Haverá ainda cerca de 150 mil trabalhadores que continuam a lutar pelo reconhecimento do direito às pausas decorrentes da contratação colectiva ou das práticas reiteradas nas empresas, mas o processo das 40 horas é já irreversível, cumprindo-se assim a leitura que sempre fizemos do conceito de tempo de trabalho. Dissemos que não nos vergariam pelo cansaço e podemos hoje dizer que as 40 horas serão uma realidade para todas as trabalhadoras e trabalhadores do nosso País.
Isto é o desfecho da grande luta que se fez durante 17 meses, em torno dos intervalos de turnos, em particular na região do Vale do Ave e que nos dá força e confiança para avançarmos com a concretização do compromisso assumido por todo o movimento sindical no objectivo das 35 horas semanais.
A defesa do emprego e a viabilização de empresas foi, igualmente, uma frente de luta em que nos empenhámos com muita firmeza e perseverança. Foi uma luta conduzida com grandes sacrifícios dos trabalhadores, mas que valeu a defesa, em dezenas de empresas, de muitos milhares de postos de trabalho.


Segurança social, saúde, organização sindical

No que se refere à reforma da segurança social, que vai ser um grande tema de discusssão na sociedade nos próximos tempos, influenciámos a condução do processo e mantivemos uma intervenção permanente a vários níveis, bem sustentados pelas decisões tomadas no nosso último Congresso, conseguindo impedir que se desembocasse, pura e simplesmente, numa via de destruição do sistema público da segurança social. O combate vai continuar porque a ofensiva não desarmou, mas estamos em condições de continuar a lutar por um sistema público melhor, universal e verdadeiramente solidário.
Além disso, em relação às pensões de reforma, conseguimos ver concretizada uma pretensão pela qual nos batíamos há alguns anos no sentido de se relacionar o valor dos aumentos aos períodos de contribuições entradas, ou seja, a aceitação de conceitos e mecanismos que fazem a valorização do trabalho para o percurso de toda a vida dos trabalhadores, mesmo quando estão na reforma.
Também no que concerne à política da saúde, o nosso trabalho tem sido muito frutuoso. Em conjunto com os sindicatos do sector da saúde, desenvolvemos uma análise aprofundada dos problemas existentes, a vários níveis, e assumimos um papel determinante na denúncia do projecto de destruição do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e de colocar a saúde debaixo da alçada do lucro, avançando com importantes reivindicações, e tivemos uma intervenção activa no plano institucional com resultados positivos.
Construímos argumentos que podem dar um contributo excepcional para as acções de defesa do SNS que é necessário estimular, através da participação das pessoas, porque a posição dos cidadãos será determinante para a evolução de todo este processo.
A par de muitas outras iniciativas que promovemos em 1998 para abordar temas específicos da nossa actividade, teve lugar em Novembro a Conferência de Organização Sindical que, para além de confirmar evoluções positivas na sindicalização e no processo de reestruturação, deixou importantes orientações, designadamente em relação à organização de base, ao reforço do quadro de delegados sindicais e ao rejuvenescimento do movimento sindical.


Compra da sede da CGTP-IN

Quero, por fim, realçar a importância do que foi feito, no plano interno, em termos de salvaguarda da independência e autonomia da CGTP-IN.
Confirmando o acerto de uma estratégia delineada há alguns anos atrás, resolvemos as situações passíveis de criar focos de instabilidade financeira que inevitavelmente se reflectiriam negativamente no desenvolvimento da acção sindical e hoje temos pela frente o grande desafio da campanha nacional de fundos para a compra da sede da CGTP-IN que, pela forma como está a decorrer, constituirá um importante acto de valorização do sindicalismo junto da opinião pública e a constatação de que a independência e autonomia da CGTP-IN é um facto incontestável.

Vamos continuar a nossa luta para travar a ofensiva legislativa contra os direitos dos trabalhadores, exigindo o abandono dos projectos legislativos sobre o trabalho a tempo parcial, regime das férias e conceito de retribuição.

Vamos continuar a lutar pelos nossos direitos, por melhores condições de vida e de trabalho, pela criação de mais emprego, de emprego com qualidade e direitos, por melhores salários, pela justiça fiscal, pela melhoria do ensino e da formação profissional, da protecção social e do sistema de saúde.

O 1º de Maio será, como sempre, a ocasião privilegiada para afirmarmos a voz dos trabalhadores na justa reclamação de uma sociedade mais livre, igualitária e com efectiva justiça social.

«O Militante» Nº 240 - Maio / Junho - 1999