Notas e Comentários
Timor e Pinochet
As responsabilidades dos EUA
Quando se toma conhecimento que em Timor continuam (em Novembro passado) a efectuar-se massacres contra a sua população, vem naturalmente à lembrança que foi logo a seguir à estadia do Presidente dos EUA, Gerald Ford, na Indonésia, que as tropas deste país invadiram, em 1975, a parte daquela ilha que pertencia, então, a Portugal. Não pode haver qualquer dúvida de que os Estados Unidos da América tinham dado carta branca para aquela terrível ocupação. Em Portugal tinha-se conquistado a democracia e em Timor Leste o seu povo lutava pela independência. Democracia e Independência são ideias perigosas para o imperialismo. A derrota do fascismo já causara grandes preocupações e, agora, ainda aparecia uma parte da ilha de Timor com veleidades de uma independência, para mais com alguma influência de esquerda. Suharto era, evidentemente - tal como Salazar ou Marcelo Caetano tinham sido também - muito mais seguro...
E foi assim que centenas de milhares de habitantes de Timor Leste, pelo menos um terço do seu povo, foram cruelmente dizimados. Nunca os dirigentes dos EUA levantaram um dedo para contrariar um tão grande crime. Nunca, enquanto Suharto dominou com mão de ferro a Indonésia, os chefes da grande nação americana defenderam os seres humanos (mais de meio milhão de comunistas indonésios foram mortos, logo que Suharto tomou conta do poder). Eram muito mais importantes os lucros que se obtinham através das boas relações com a ditadura de Suharto. Só depois que este estava a ser apeado em virtude da luta popular que se desenvolveu na Indonésia, foram aprovadas pela Câmara dos Representantes algumas limitações para o uso das armas que os EUA têm sempre fornecido em grandes quantidades àquele regime ditatorial.
Pinochet continua ainda na Inglaterra, após a decisão da mais alta instância da justiça inglesa - cinco juízes membros da Câmara dos Lords - de não aceitar a sua imunidade e da decisão do ministro do Interior inglês de o pedido de extradição dever ser considerado pelos tribunais.
Com bom conhecimento de causa, o Diário de Notícias (19/11/98) chamava a Pinochet o "ex-cúmplice" dos EUA na destruição do regime democrático que, em virtude de eleições, tinha sido conseguido no Chile. O ex-cúmplice mostrou-se um ditador articularmente tenebroso. Não foi somente Allende que foi morto quando do golpe militar preparado pela CIA, embaixador dos EUA no Chile e outros. As prisões, as torturas e os assassinatos marcaram os tristes e longos anos em que Pinochet ditava tudo no Chile.
Sobre esses tempos, o correspondente do Diário de Notícias em Buenos Aires, Manuel Alves Rodrigues, conta (18/11/98) que foram os serviços secretos chilenos, conhecidos por DINA, superiormente dirigidos por Pinochet, que idealizaram a Operação Condor, que tinha como objectivo uma estreita colaboração entre os serviços secretos do Chile, Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai para a captura dos que se opunham às ditaduras que detinham o poder nesses países. Desde 1975 foram realizados muitos atentados na Europa e nos EUA. Entre os mais conhecidos, destaca-se o assassínio de Orlando Letelier, ministro dos Negócios Estrangeiros do Governo de Allende, e da sua secretária, a americana Ronnie Moffit, em Washington.
Em relação ao golpe comandado por Pinochet, a CIA deliniou um plano (nome de código “Projecto Fubelt”) para responder a um pedido do presidente Richard Nixon. Este autorizou uma verba de dez milhões de dólares para financiamento do plano.
Recentemente (Público, 8/12/98), um antigo embaixador dos EUA no Chile (entre 1967 e 1971) afirmou que “o derrube do Presidente Salvador Allende estava claramente nos planos de Washington e Nixon apoiou o golpe «quaisquer que fossemas consequências».” O diplomata , que considerou Pinochet como "uma criação da CIA", recordou uma audiência com Nixon em que este explicou como ia derrubar Allende, “esse porcalhão”.
«O Militante» Nº 238 - Janeiro / Fevereiro - 1999