Notas e Comentários
Saramago e o Nobel


A atribuição do Prémio Nobel de literatura ao escritor português José Saramago deu azo a muito diferentes reacções, algumas das quais ajudam a clarificar as próprias pessoas.
Em termos gerais podem considerar-se três tipos de reacção:
1) os que não só acharam bem como ficaram satisfeitos e a satisfação pode ter muito diferentes graus.
2) os que acharam mal e não gostaram e disseram-no e
3) os que acharam mal mas disseram que achavam bem.

"Obrigado por sermos campeões do mundo de Literatura, José Saramago! Talvez os portugueses agora falem disso nas ruas, nos restaurantes e nas livrarias." - António Rego Chaves (DN, 9/10/98).

"Alegro-me e orgulho-me. Parabéns ao escritor, ao povo português e aos que cultivam a língua portuguesa" - D. Ximenes Belo (DN, 9/10/98).

«Na edição de ontem, o Observatore Romano lamentava a atribuição do Nobel a um "comunista inveterado", um escritor que tem uma "visão substancialmente anti-religiosa" do mundo» (DN, 9/10/98).

"É um autor de leitura difícil e pesada, que insulta abertamenteos sentimentos cristãos. Duvido que os membros do júri tenhamlido os seus livros." - D. Duarte (DN, 9/10/98).

Sousa Lara, subsecretário de Estado do Governo Cavaco Silva, directo responsável da «excomunhão» de «O Evangelho segundo Jeus Cristo»: congratulo-me com a escolha de Saramago, mas acuso o escritor de ter "um enorme 'lobby' internacional a seu favor". "O prémio da academia tem a ver com o partido comunista, com a sua mulher, que é uma jornalista muito famosa em Espanha, e outras questões". (Expresso, 10/10/98).

Na Assembleia da República no dia 10/10/98
"Se há momentos particularesem que o sentimento de unidade deve prevalecer, este é um deles" (Carlos Encarnação, vice-presidente do Grupo Parlamentar do PSD). Muito aplaudido pela sua bancada com excepção de Falcão e Cunha, ex-ministro de Cavaco. "(...) era visível o desconforto de alguns dos escassos parlamentares do PP (...)" (Jorge Ferreira, Manuel Monteiro, Maria José Nogueira Pinto e Nuno Abecassis optaram por ficar fora do hemiciclo). "(...) só Francisco Peixoto, deputado por Viseu, aplaudiu com aparente convicção o 'nosso' Nobel" (DN, 11/10/98).

A Câmara Municipal de Mafra, dominada pelo PSD e dirigida por Ministro dos Santos, vice-presidente da distrital do PSD, votou sempre, maioritariamente, contra a proposta do Conselho directivo da Escola Secundária local para ser baptizada com o nome de José Saramago. (Expresso, 10/10/98). Agora, por decisão do ministro da Educação, a escola passou a chamar-se Escola Secundária José Saramago (DN, 13/10/98).

Rádio Renascença e José Saramago (carta ao DN de José Manuel Janela - DN, 15/10/98) "A Rádio Renascença, no dia da atribuição do Prémio Nobel da Literatura a José Saramago, começou por abordar um escândalo de corrupção na JAE. Depois falou-se da doença das vacas loucas. A seguir a um intervalo publicitário abordou o sistema de saúde. Foi assim deixada para o fim a notícia mais importante do dia.
E o que foi dito? Não foi dada a notícia. Referiram que a figura de José Saramago não é consensual, e reproduziram as palavras do jornal oficial do Vaticano, que não ficou satisfeito com a atribuição do mais importante prémio literário aum «anti-religioso» (...)"

"Comparam-no com Eça ou com Camilo! E, então, ficam a saber que ele teve o Nobel não por escrever bem". A Academia Sueca "analisou o pensador e não a qualidade da obra: vejam como ele faz a pontuação" - D. António José Rafael, bispo de Bragança (DN, 3/11/98).
«O Militante» Nº 238 - Janeiro / Fevereiro - 1999