A juventude
contra a ideologia do capital

Gustavo Carneiro
Membro da Comissão Política
da Direcção Nacional da JCP

Já estamos fartos de ler nos jornais sobre o «Livro Negro do Comunismo», a “morte do comunismo”, ou sobre o “apoio incondicional do PCP aos crimes do socialismo real”. E fartos estamos da comparação de Fidel a Pinochet. Para estes “artistas da mentira” Pinochet “é mau, cometeu alguns excessos, mas ao menos promoveu a democracia e acabou com o comunismo no seu país”. Fidel, que promoveu a qualidade de vida e tornou o povo cubano num povo orgulhoso e com valores, esse, sim, é o “Diabo”.

Por outro lado, não há dia em que não se mencionem as virtudes do sistema “democrático” (é assim que se chama actualmente ao capitalismo) e de como as suas insuficiências não são mais do que o preço a pagar por um futuro radioso, que não dizem do que consta ou quando chegamos lá. Mas aquilo que eles não dizem mas não conseguem esconder é que, para lá das “virtudes” desse sistema dito democrático, há milhões de pessoas sem emprego, sem abrigo e, pior que tudo, sem dignidade. Nós sabemos disso e eles também.

Uma grande ofensiva ideológica

Da mesma forma que todos sabemos que este sistema não é assim “tão” democrático pois são esses mesmos fazedores de opinião que condicionam o que deveria ser, de facto, a vontade popular ao agitarem fantasmas e ao pregarem a ideologia da... ausência de ideologia. Pretendem com isto criar uma legião de homens e mulheres acomodados com o actual estado das coisas, pois isto tornaria mais fácil a tarefa da exploração.

Mas esta grande ofensiva ideológica tem uma razão de ser. Se os capitalistas acreditassem no que pregam os seus jornais não gastariam tantos milhões em mentiras. Esta ofensiva tem por trás de si uma enorme crise com que se debate, hoje, o sistema capitalista. Com as bolsas em colapso, o desemprego a aumentar, a economia em recessão, o descontentamento tende a intensificar-se e os burgueses sentem-se ameaçados nos seus interesses. Por isso levam a cabo, aproveitando o colapso do Bloco Socialista, a maior “operação de cosmética” do sistema capitalista e a maior campanha de mentiras contra o socialismo, a alternativa ao capitalismo.

Voltada sobretudo aos jovens

E apontam-na sobretudo aos jovens pois consideram-nos os mais vulneráveis a todas essas campanhas e, sobretudo, porque somos os “homens de amanhã”. Fazem-no não apenas por intermédio de artigos de jornal ou “notícias” de telejornal, mas utilizando todos os meios de passar valores.

Nas escolas é imposta uma política de competição feroz em que apenas os (poucos) melhores, com todas as arbitrariedades inerentes, conseguem vingar. No acesso ao emprego a mesma coisa, pois há um emprego para um sem-número de candidatos. Nas universidades o ensino é elitista e altamente ideológico, embora não pareça...

Resumindo, é um eterno cada um por si. Tentam destruir os valores da solidariedade e passar os da “sã” competitividade. Querem à força que os jovens se virem uns contra os outros, se considerem inimigos e não compreendam quem é o verdadeiro inimigo. Isto percebe-se, por exemplo, quando se chega ao fim do 12º ano e se começa a pensar em prosseguir os estudos na Faculdade, logo começa a pesar sobre os estudantes a competição.

A juventude sabe resistir

Mas se se notam comportamentos competitivos e desonestos para com os colegas, que por vezes ocorrem, o mais frequente não é isto. O mais habitual é, para grande irritação do poder instituído, o espírito de cooperação e ajuda. Isto mostra que a juventude sabe resistir, embora muitas das vezes não perceba que, no fim de contas, está a resistir ao individualismo e aos demais “valores” do capitalismo. E fá-lo porque não partilha dessa ideologia individualista. Fá-lo porque uma das características da juventude é a sua enorme generosidade e solidariedade. É por essa razão que muitos jovens se unem em torno de causas que não sendo, à primeira vista, políticas mostram uma grande consciência do mundo que os rodeia. É o caso das associações ambientalistas, de solidariedade e outras que, nos dias de hoje, são na sua maioria dinamizadas por jovens.

Como exemplo do que acabo de dizer, posso referir a batalha que trava a população do Barreiro contra a instalação de uma incineradora de resíduos industriais naquela cidade. Esta luta tem à sua frente a população mais jovem do Barreiro e, como seria de esperar, tem sido em grande parte dinamizada pela JCP local. Outra prova da imensa generosidade da juventude portuguesa é a enorme participação juvenil na manifestação de solidariedade com Cuba, realizada na cidade do Porto em Outubro. Esta manifestação, embora com carácter mais político, não foi participada apenas por jovens comunistas. Muitos outros, movidos por sentimentos solidários com a luta do povo cubano contra o bloqueio americano, ou por simples fascínio pela resistência de tão pequeno país a tão imenso inimigo, participaram naquele momento de amizade internacionalista. Portanto, no que se refere ao pretenso individualismo dos jovens, o capitalismo perde a batalha. Porque os jovens têm mostrado grande capacidade de reunião, solidariedade e entreajuda.

Necessário desmascarar o capitalismo

Como neste campo estão a sair derrotados, logo se metem por outros. Com a habitual e preciosa ajuda de intelectuais “reputados”, de jornalistas e outros que tais, pretendem criar a imagem que os jovens são amorfos e que aceitam o que lhes é dado sem desconfiar nem contestar. Ora isto não é, de forma nenhuma, verdade. Quando os estudantes foram confrontados com a progressiva elitização e privatização do ensino superior, onde está em causa muito mais do que o acto de pagar propinas, ao invés de se resignarem a pagar, lutam e resistem. A prová-lo está, por exemplo, a grande manifestação de 25 de Março em que estiveram em frente à Assembleia da República mais de dez mil estudantes que disseram bem alto “Não” às propinas e ao roubo de um direito que têm, o direito a uma educação pública, gratuita e de qualidade. E, quando se convoca uma greve de estudantes e esta se pauta por uma adesão da ordem dos 90%, que outra conclusão tirar que não a de que os estudantes estão conscientes e lutam por um direito?

O que, na minha opinião, os jovens não estão ainda a conseguir fazer e cabe-nos a nós, JCP, lutar por isto, é perceber que todas estas questões, do ambiente às propinas, das sanções a Cuba ao Pacote Laboral, estão interligadas e relacionadas com um sistema político-económico que dá pelo nome de capitalismo e que não se preocupa com a juventude, nem com os trabalhadores e que só quer aumentar os lucros dos grandes capitalistas à custa de não importa o quê.

Essa é uma tarefa que a JCP tem que assumir como prioritária pois é necessário acabar com os fantasmas sobre o comunismo e sobre o PCP. Temos que mostrar aos jovens portugueses que, não só não somos autores de nenhum “livro negro”, mas que fomos, somos e seremos sempre nós, os comunistas, a estar ao seu lado na luta pelos seus direitos e mais profundas aspirações.

Esta luta ideológica, sabendo nós que o acesso aos media nos é dificultado, trava-se sobretudo na prática diária de todos os militantes comunistas na defesa dos interesses da juventude e dos portugueses em geral. É indispensável que os jovens portugueses saibam que podem contar com a JCP e que saibam que nós somos diferentes, que nos movemos por dedicação à causa que defendemos e que não nos interessam honrarias, nem protagonismos, nem dinheiro. É essa autoridade moral que nos permite continuar a lutar contra um sistema que puxa pelo que há de pior nas pessoas e que nos permite continuar a criticá-lo.

Temos que continuar intransigentes na defesa dos jovens.

Cabe à JCP continuar a defender os seus interesses. E, sobretudo, há que integrá-los na luta pelos interesses que, afinal, são os seus. Há que canalizar toda a rebeldia da juventude e toda a sua generosidade no abraçar de grandes causas para a tarefa, difícil mas apaixonante, da transformação revolucionária da sociedade.
«O Militante» Nº 238 - Janeiro / Fevereiro - 1999