Um novo ano de luta
pelos valores de Abril

Achamada globalização neoliberal não está vivendo num mar de rosas. Foi o grande desenvolvimento realizado nos sistemas de informação e na rapidez da sua transmissão à escala mundial que conduziram à ideia de globalização. Ela aplica-se fundamentalmente aos mercados financeiros e monetários cuja importância é essencial na actual economia capitalista neoliberal.

Na verdade, o que se vive neste globo, habitado pela humanidade, é uma situação de crise. Crise com actual expressão mais aguda no Japão e outros países do extremo oriente e grande parte da América Latina. Crise financeira e económica em que, como sempre, são as camadas trabalhadoras e desfavorecidas que mais sofrem. Crises provocadas pela avidez dos lucros e o choque de interesses entre os grandes grupos capitalistas. A crise na Rússia é mais complexa. Tem uma vertente social ainda mais profunda.

Na União Europeia também as dificuldades vão crescendo. O caminho que se tem seguido para a sua formação, com as limitações impostas pela introdução da moeda única e o chamado "Pacto de Estabilidade", não facilita a tomada de medidas contra o desemprego, pela elevação do nível de vida do mundo do trabalho, pela resolução de outras dificuldades sofridas pelas populações. O neoliberalismo, aliás, é inimigo de qualquer Estado preocupado com os problemas sociais.

Erguem-se cada vez mais vozes contra a manutenção, pelo menos, do "Pacto de Estabilidade", o que, evidentemente, contraria os fundamentalistas do euro e da União Europeia.

Por outro lado, a participação de Portugal na UE continua a ter grandes dissabores. Às recentes medidas tomadas pela Comissão da UE contra a carne de vaca produzida em Portugal (os governos de Cavaco Silva e de Guterres têm particulares responsabilidades também) soma-se, agora, o facto de Portugal correr o risco de ser o país mais prejudicado com a Agenda 2000. A posição de aluno "bem comportado" que os governos do PSD e do PS sempre têm tido ante os verdadeiros dirigentes da UE levaram à destruição de grande parte da nossa agricultura, das pescas e de importantes sectores industriais. Olhando para o passado não é possível esquecer que foi o PCP o único partido que muitas vezes alertou para tais consequências e lutou quanto pôde contra elas.

A apresentação, discussão e aprovação do Orçamento de Estado, apesar da aceitação de emendas do PCP que favorecem mais de 95% das famílias portuguesas, é ainda uma repetição do que se passou nos anos anteriores. Guterres entra no último ano do seu mandato sem ter levado a cabo qualquer reforma substancial ou estruturante.

O sistema fiscal mantém-se profundamente inaceitável, os doentes continuam a sofrer tormentos para conseguirem mesmo simples cuidados de saúde, o ensino deixou completamente de ser uma paixão do Governo, mais parece um ódio, na justiça não se sentem quaisquer melhorias, pelo contrário, defesa avança para o fim do serviço militar obrigatório e para uma preparação dos militares principalmente ao serviço dos objectivos da NATO, isto é, dos EUA.

A característica mais marcante deste Governo está nas provas que deu de servir ainda melhor que o PSD os interesses do grande capital. As privatizações atingiram valores mais altos, os benefícios fiscais concedidos aos grupos económicos chegaram neste último orçamento a quase 300 milhões de contos. Os bancos e as outras grandes empresas vêem os seus lucros a subir em flecha. O preço dos telefones é o mais elevado na UE, três vezes superior ao da Suécia. A tarifa de electricidade vai descer mas podia descer mais e continuaria a ser das mais elevadas da UE.

É cada vez mais clara e explícita a satisfação dos maiores empresários do País com o Governo do PS, um partido que se diz "socialista". Embora possam fazer algumas críticas, para esconder o domínio determinante do seu poder económico e porque desejam sempre mais, já auguram que o PS vai ganhar as eleições legislativas deste ano.

Ao mesmo tempo que os favores para o poder económico são cada vez maiores, os trabalhadores estão sob uma ofensiva que pretende retirar-lhes direitos há muito conquistados. Por isso a luta contra o Pacote Laboral intensifica-se. A grande manifestação da função pública em 25 de Novembro ("como já não se via há muito") mostrou grande determinação. Mas é indispensável continuar a esclarecer os trabalhadores em geral sobre o que o Governo pretende com aquele pacote e, particularmente, com o tempo parcial. É uma forma de acabar com o salário mínimo, conquistado em 1974, e que elevou notavelmente os salários de mais de metade dos trabalhadores de então. Hoje "oferecem-se" já empregos a tempo parcial, em troca de 30 contos, sem pagamento de horas extraordinárias e com horários variáveis impostos pelo patrão. É a desregulação completa dos direitos dos trabalhadores, é a exploração levada ao cúmulo.

Neste ano terão lugar duas eleições, as eleições para o Parlamento Europeu (primeira quinzena de Junho) e as legislativas, que devem ser em Outubro.

É necessário que os membros do Partido compreendam a importância desses actos eleitorais e em especial do segundo. É indispensável, para obter um bom resultado, que se vençam as principais dificuldades e deficiências que existem nas diversas organizações do Partido, que se procure elevar mais a influência de cada uma delas na área da sua actividade, atraindo muitos mais trabalhadores e democratas em geral a uma posição de esquerda, à compreensão de que o voto na CDU e a elevação dos seus resultados são determinantes para modificações na política de direita que desde 1976 tem dominado em Portugal, para que o Governo passe a ter mais em conta os valores de Abril.

É preciso ganhar para o voto na CDU muitos dos que votaram no PS pensando que assim se conseguiria uma orientação do Governo diferente e melhor do que a que o PSD defendeu.

É preciso ganhar para o voto na CDU muitos e muitos trabalhadores que apoiam as lutas pelas suas reivindicações e que melhor podem compreender que é estranho votar no mesmo partido em que votam os grandes exploradores do trabalho.

É preciso contrariar a ideia de que há o "perigo" do PSD, ou da AD, ganhar as eleições. Tudo aponta para essa impossibilidade. A AD não atrai mais votos que os do PSD e do PP. O dirigente do PSD é olhado como um "político sem convicções" e o do PP um "demagogo autoritário", com muitas dificuldades no interior do próprio partido.

Há que ter em conta que a actividade política que o PCP e a CDU têm realizado tem modificado a ideia que o fascismo inculcou e que muita da comunicação social continua a vincular, ignorando a existência do Partido, ou denegrindo a sua acção.

São inúmeros os exemplos de pessoas que não são comunistas nem seus simpatizantes, alguns mesmo muito distantes politicamente, que hoje têm uma positiva apreciação do PCP. (*)

Comemoram-se este ano 25 anos da revolução portuguesa, da revolução dos cravos. No 25 de Abril teve lugar um acontecimento de muito grande importância histórica para o povo português. Há que lembrar para sempre o papel decisivo que os militares democratas tiveram nessa revolução e também a actividade de vanguarda, repleta de sacrifícios, desenvolvida, ao longo de largas dezenas de anos, pelos comunistas e o seu Partido juntamente com muitos outros antifascistas.

O Militante, em todos os seus números deste ano, publicará artigos, depoimentos, entrevistas com muito variadas personalidades que viveram a revolução e procurará apresentar nas suas capas quadros de pintores progressistas.

Seis dias depois do 25 de Abril, o 1º de Maio foi celebrado de forma extraordinária. Nunca se viu uma tão grande necessidade de comunicar com os outros e de festejar a muito recente grande vitória da democracia sobre o fascismo. É natural que os vinte e cinco anos destes acontecimentos tenham repercussão na comemoração do próximo 1º de Maio.

Já em Março, o PCP faz 78 anos. Todos as iniciativas que se levem a cabo para lembrar esse aniversário deverão ter a preocupação de salientar a importância das lutas reivindicativas que se desenvolvem no País e que mobilizam os trabalhadores mas também outras camadas laboriosas e sociais muito diversas e de esclarecer a importância do reforço do Partido e de uma sua maior influência na sociedade portuguesa.

O Comité Central realizou uma reunião no dia 14 de Novembro passado. Foi aprovado um comunicado, que in-cluímos nos documentos, para a leitura do qual chamamos a melhor atenção dos nossos leitores. Incluímos também a Resolução de um importante Encontro Nacional de Quadros do PCP sobre o sector público, efectuado em 12/12/98.

(*) ver Notas e Comentários
«O Militante» Nº 238 - Janeiro / Fevereiro - 1999