Sobre a remodelação do Governo




Quando se fala na semelhança entre o Governo de Cavaco Silva e o de António Guterres talvez se deva também incluir o que haverá de parecido na sua história.
Vale a pena trancrever parte de um comentário de J. A. L. no Expresso (29/11/97) a propósito da remodelação efectuada em Novembro passado.
Há quatro anos, Guterres, a propósito de uma das remodelações dos governos de Cavaco Silva, dizia que a remodelação “vem reforçar a ideia de que as eleições são um teste à governação”, “uma confissão de profundo desgaste” político. Revela que “quando não se tem melhor, vai-se buscar alguém que está no aparelho do partido ou recorre-se a um amigo pessoal. É a reacção típica de alguém que está sem norte e que não tem capacidade de recrutamento dos quadros com capacidade política e técnica para darem um novo «elan» ao Governo”. Ou seja, “esta tem todo o aspecto de ser a última remodelação do último Governo”, o qual pode ser classificado como “o Governo da oportunidade perdida”.

Parece, na verdade, que estava a antever o que lhe sucederia...

Fomos buscar ainda dois outros comentários ao Diário de Notícias, ambos de António Ribeiro Ferreira (24 e 27/11/97).

1. «A remodelação provocada pela demissão de Vitorino revela a verdadeira natureza de Guterres. Os tão falados Estados Gerais para uma nova maioria foram, acima de tudo, uma armadilha para atrair independentes. Na primeira oportunidade, Guterres afasta dois independentes de peso e rodeia-se dos homens-fortes do aparelho socialista. A caricata nomeação de Veiga Simão para a pasta da Defesa não chega para disfarçar uma coisa óbvia: o primeiro-ministro fez uma remodelação à força para satisfazer a clientela partidária. Chegaram dois anos de Poder para o chefe do Governo imitar o pior de Cavaco Silva. Guterres, a partir de agora, perdeu definitivamente a graça. Resta-lhe a desgraça.” (Desconfiamos que só uma pequena parte da clientela terá ficado satisfeita).

2. «O novo membro do Executivo socialista tem falado de tudo um pouco. Menos de militares e de Defesa. Percebe-se o cuidado. O pior é faltar à verdade quando fala do que sabe. Veiga Simão sabe de educação. Fez uma reforma e foi ministro de Marcelo Caetano. No seu tempo, a Academia de Lisboa viveu momentos de terror. No Técnico, por exemplo, a polícia de choque estava dentro do Instituto e controlava a entrada dos estudantes. Sabendo-se tudo isto, como é possível que o novo ministro venha dizer que criou os “gorilas” para evitar a entrada da polícia de choque nas universidades? Como é possível que afirme ter sido contra a PIDE? Como é possível que tenha o desplante de dizer que não podia evitar a prisão de estudantes? A única verdade é que não se demitiu. Ficou lá. E teve a arte e o engenho de viver o 25 de Abril no seu gabinete da 5 de Outubro, de ter sido eleito deputado nas listas do PS em 83, ministro do bloco central e agora titular da Defesa. Parabéns. Mas, por favor, não minta.»


«O Militante» Nº 232 - Janeiro / Fevereiro - 1998