O PS e os direitos democráticos
Vão-se perdendo a pouco e pouco os direitos democráticos
conquistados com a Revolução dos Cravos. Que o digam os
trabalhadores de muitas e muitas empresas que passaram a esconder
a sua posição política de esquerda para não perderem o
emprego. Que o digam os eleitores de muitas zonas do País que
temem represálias por aceitarem ser candidatos de forças de
esquerda. Que o digam todos aqueles que podem comparar as
esperanças que Abril abriu com a situação actual no emprego,
nos salários, na comunicação social, na vida quotidiana, na
repartição da riqueza produzida. A parte que vai para o
trabalho consegue, hoje, ainda ser menor do que no tempo do
fascismo...
É o resultado normal da continuação de governos que impõem
uma política de direita. É o resultado esperado pela
recuperação dos monopólios e latifúndios, pela restauração
de um capitalismo monopolista de Estado, pela crescente
dominação do poder económico sobre o poder político, pela
desforra dos que perderam com o 25 de Abril.
Está nessa linha a aprovação na generalidade, em 23 de Outubro
passado, na Assembleia da República, de uma proposta do Governo
para criminalizar os cortes de estradas. O direito ao protesto
foi submetido ao direito à circulação.
É certo que o PS, na oposição, estava de acordo com o
primeiro. Agora mudou, como em relação a tantas outras
coisas...
O Diário de Notícias (24/10/97) fez uma pergunta -
Concorda com as penalizações para os cortes de
estrada?" - e obteve cinco respostas. Vale a pena
referi-las:
Mário David Soares (Sindicato Professores do Norte):
Não. Normalmente quem o faz não encontrou outro modo de
defender os seus direitos. É hipócrita penalizar os mais fracos
(sem acesso à TV para amplificarem o seu discurso) e deixar
impune quem não paga salários ou leva fraudulentamente a
empresa à falência. Não defendo os cortes de estrada mas os
mais desfavorecidos não são criminosos.
Vítor Ranita (sindicalista): Não concordo. O que
interessa é procurar resolver os problemas sociais que estão na
origem destas manifestações, que são a única forma de
sensibilizar a opinião pública. A penalização é uma marca da
classe que cala, condiciona e limita as formas de luta de
trabalhadores que, muitas vezes, estão sujeitos a ilegalidades
por parte dos empregadores.
Feliciano Duarte (Pres. da com. contra as portagens):
Não é prioritário para o País aprovar legislação a
criminalizar os cortes de estrada. Há coisas mais importantes a
decidir no Parlamento e é grave que um Governo que se diz de
diálogo tema o direito à indignação e ao protesto. A imagem
que fica deste Governo é a do casse-tête e da pistola e sabemos
que há dois anos os seus membros não pensavam assim.
José Viola (Presidente da Câmara de Silves):
Não. Uma das conquistas do 25 de Abril foi a possibilidade
de as pessoas expressarem livremente as sua opiniões. O corte de
estradas acontece depois de esgotadas as tentativas para que os
problemas sejam resolvidos.
Também a Câmara de Silves está a pensar cortar o IP-1, em São
Marcos da Serra, se o Governo não aprovar o projecto do Rio
Arade.
Finalmente o quinto diz: A nossa liberdade tem de respeitar
a liberdade dos outros. O direito à indignação poderá
implicar acções simbólicas devidamente mediatizadas. Não
podemos aceitar cortes de estradas que ponham em causa a
segurança dos cidadãos, que só se justificam em regimes
autoritários e nunca num regime democrático. O autor
desta resposta é João Proença (Secretário-geral da
UGT).
Tudo muito claro!