Movimento associativo estudantil - uma prioridade




Ricardo Oliveira
Membro da Comissão Política e do Secretariado da JCP


Com um passado de irreverência, reivindicativo, solidário e fortemente interventivo, o movimento associativo estudantil assumiu, em vários momentos, um papel importante na luta pela democratização do ensino e do País.
Já recentemente e após vários anos de alguma letargia e reformismo - durante os anos da chamada onda laranja em que o PSD desenvolveu uma instrumentalização das associações -, o associativismo estudantil como que "renasceu" e assumiu posições importantes na defesa dos interesses e anseios estudantis.
Ainda está fresco na memória de todos o papel dos estudantes e das suas associações na luta contra o aumento das propinas dos Governos PSD-Cavaco Silva e o seu contributo para a derrota da direita nas Legislativas de 95.
Este foi um período interessante, em que as eleições associativas foram marcadas por importantes debates políticos, em que as listas instrumentalizadas pela direita sofreram grandes derrotas. Ao ponto de ainda hoje na Associação mais emblemática do movimento associativo estudantil - a Associação Académica de Coimbra - a tradicional disputa entre a JSD e a JS ter dado lugar a uma luta entre as listas partidárias - leia-se apoiadas pela JSD e/ou pela JS - e listas independentes, algumas delas caracterizadas por uma ampla unidade estudantil com a presença de comunistas, em que a vitória sorriu sempre a estas.

Últimos anos

No entanto a capacidade mobilizadora das chamadas listas independentes e de unidade estudantil diminuiu grandemente nos últimos anos, coincidindo com um período de alguma ilusão com o Governo PS de Guterres. Neste período, a JSD e, em parte, sectores próximos do Governo PS, desenvolveram uma importante ofensiva nos vários actos eleitorais, sendo bem sucedidos em muitos dos casos.
Alguns factores devem ser tidos em conta. Uma menor atenção à intervenção dos comunistas no movimento associativo, a fragilidade da organização da JCP nalgumas escolas e o facto de, a partir das eleições legislativas de 95, alguns dos nossos "aliados" passarem a adversários.
Todos estes factores somados conduziram a um reforço da influência da direita no movimento associativo no ensino superior, principalmente naquelas escolas onde tradicionalmente já detinham forte influência.

Orientações claras

Por isso, no seu V Congresso e mais recentemente na sua 8ª Conferência Nacional do Ensino Superior, em Abril deste ano, a JCP traçou orientações claras no sentido de reforçar a intervenção dos estudantes comunistas na dinamização de processos unitários concorrentes às eleições associativas.
Essa intervenção deve ser caracterizada pela abertura e pelo debate de ideias orientados para a defesa dos direitos e interesses do estudante. Os problemas específicos das escolas, as questões da política do Governo para o ensino superior, a par dos próprios conteúdos programáticos dos cursos leccionados e a participação dos estudantes na vida e gestão da escola, são áreas e temas que os estudantes comunistas devem estar sempre atentos e abertos à discussão e ao debate.
A intervenção associativa dos estudantes comunistas não se esgota na sua participação na associação de estudantes. Em muitos casos não existem condições objectivas para a nossa intervenção na associação, por não estarmos suficientemente organizados, porque a nossa influência ainda é reduzida, porque estamos a iniciar o nosso trabalho na escola. No entanto, tal não significa que os estudantes comunistas não tenham uma palavra a dizer.
Nestas situações - que ainda são muitas - os estudantes comunistas devem procurar dinamizar movimentos, grupos de intervenção na escola, abertos a outros colegas. Existem casos em que as próprias associações contêm núcleos de ambiente, teatro, cinema, tunas, desporto, etc.. Estes núcleos também podem e devem servir de base à intervenção dos comunistas.


Abertura e empenho

É através do reconhecimento do trabalho e empenho dos comunistas que se abrem portas para a intervenção dos comunistas nas direcções das associações de estudantes. Por isso, o nosso trabalho nas escolas, nos núcleos, nas nossas turmas, com os nossos colegas, assume uma grande importância e deve ser sempre caracterizado pelo empenho, pela abertura.
Nas associações de estudantes podemos desenvolver um importante trabalho na dinamização da discussão de ideias, no debate, no aprofundamento da consciência estudantil, da mobilização e intervenção dos estudantes na defesa dos seus interesses. Mas, outras áreas de interesse, outras aspirações devem estar presentes na nossa intervenção na associação.


Espaço privilegiado

Não faltam exemplos de escolas em que os comunistas desenvolveram um importante trabalho na mobilização dos estudantes para a luta e que nos processos eleitorais sofreram derrotas. Isto deveu-se ao esquecimento destas outras áreas de interesse estudantil.
Os comunistas devem entender o movimento associativo no ensino superior como um espaço privilegiado para a defesa, promoção e satisfação dos vários interesses estudantis. Nesse sentido a dinamização da luta a par da satisfação dos interesses culturais, desportivos e lúdicos, são as metas primárias da nossa intervenção nas associações.

Escolas para a democracia

No entanto, estas também são e devem ser encaradas como escolas para a democracia, como berços da participação dos estudantes na sociedade e como tal devemos promover a sua independência de partidos, de credos e outras opções religiosas. Devemos promover valores como a tolerância, a democracia e a abertura crítica a novas realidades.
Por isso combatemos contra a instrumentalização do associativismo estudantil, contra o seu aproveitamento oportunista e demagogo que a direita e o actual Governo tentam fazer.
Por isso a intervenção dos comunistas no movimento associativo estudantil no ensino superior é no sentido do seu reforço, da sua capacidade de iniciativa, reivindicativa e de mobilização dos estudantes. Intervimos na construção de um movimento associativo cada vez mais forte, independente e democrático.

Em jeito de conclusão é necessário referir o momento que actualmente se vive no ensino superior. A tentativa da imposição do aumento das propinas com a aprovação da nova lei de financiamento do Ensino Superior, a par do papel que os comunistas têm assumido, juntamente com outros colegas, no esclarecimento e mobilização estudantis para a sua luta, começa a dar mostras de que poderemos estar perante um momento de reforço da nossa influência no movimento associativo.
Para concretizar e efectivar uma verdadeira mudança - para melhor, é claro! - no movimento associativo é necessário o empenho de todos os estudantes comunistas, de todos os colectivos e organismos da JCP e do próprio Partido.


«O Militante» Nº 232 - Janeiro / Fevereiro - 1998