Breves notas

sobre a Juventude nos Açores

Por José Decq Mota
Membro do Comité Central
e Coordenador da DORAA




1.
É objectivo destas notas trazer aos leitores algumas reflexões sobre a problemática juvenil na Região Autónoma dos Açores e sobre a intervenção e a acção do PCP/Açores e da JCP/Açores no que respeita aos problemas da juventude.

Interessa desde logo lembrar que as políticas que oficialmente são feitas para a juventude dependem dos órgãos regionais, cabendo à Direcção Regional de Juventude a maior parte dos recursos orçamentais para essa área.

Interessa também recordar que, tendo sido a Região Autónoma instituída em 1976, o PSD foi o partido governamental na Região até 1996 e, neste sector como em muitos outros, a governação regional foi sempre orientada no sentido de consolidar e manter domínios.

Hoje vive-se nos Açores um ambiente sócio-político diferente, próprio de uma Região onde faixas importantes da população perceberam que podem, querendo, influenciar os destinos colectivos.

Neste momento, em que é fundamental trabalhar-se para que à mudança de poder regional, que se verificou em 1996, venham a corresponder mudanças positivas nas políticas realizadas, é essencial dinamizar ainda mais a acção e a intervenção da juventude neste processo transformador.

2. O poder político regional procurou ao longo dos últimos 10 anos controlar a juventude açoriana, neutralizando, tanto quanto pôde, a capacidade inovadora e transformadora própria da juventude.

A afirmação precedente, por ser muito forte, carece de demonstração.

Basta olhar para toda a concepção e execução da política juvenil dos Governos do PSD para se perceber que tal política visava controlar e dominar, impedindo procedimentos onde a criatividade e a intervenção fossem as características principais.

A generalidade dos programas de apoio que ao longo dos anos se foram desenvolvendo e que, normalmente, visavam apoiar o associativismo juvenil, a intervenção cultural, a mobilidade juvenil, etc., foram programas sempre executados de forma partidarizada e sujeitos a regras de controle inaceitáveis.

Os Governos Regionais dos últimos 20 anos incentivaram a tese segundo a qual a juventude deve estudar ou trabalhar e "deixar a política para os que já têm a vida encarreirada". Foi sistematicamente feito o apelo à não intervenção, procurando assim atingir a neutralização.

A JSD/Açores assumiu neste processo um importante papel, quer participando directamente no dirigismo da execução dos programas governamentais juvenis, quer criando a imagem de que as organizações políticas juvenis "devem ser" uma cópia formal dos respectivos partidos.

A política juvenil dos Governos do PSD conseguiu, por muitos anos, neutralizar faixas importantes da juventude trabalhadora e estudantil dos Açores, mas não conseguiu, obviamente, neutralizar a globalidade das movimentações e expressões de diverso tipo do associativismo juvenil.

Toda a sociedade açoriana foi dominada, mas foi no seu seio que se encontraram as forças indispensáveis para que a evolução política se desse.

É neste contexto que a juventude contribuiu, quer para a criação do descontentamento social e político que se acentuou muito depois de 1988, quer para a derrota política do PSD que se verificou em 1996.

3. Apesar de todos os domínios e de muitas coacções, o associativismo juvenil livre existiu sempre, quer a nível das escolas, quer nos planos cultural e desportivo.

As benesses controleiristas atribuídas a uns geraram também acentuado descontentamento em faixas que viam que tudo devia ser bem diferente.

A acumulação dos problemas próprios da juventude, com a dificuldade crescente em ter acesso ao primeiro emprego e em ter acesso à universidade, foram gerando a necessidade de haver mais discussão e mais debate. Da discussão e do debate foi resultando a convicção de que as políticas praticadas não eram inevitáveis e que podia haver outras políticas bem mais justas.

Para que essa perspectiva de debate fosse ganhando a juventude teve grande importância a acção política geral do PCP e de outras forças e todo o apoio sempre dado às mais diversas formas de associativismo juvenil.

A criação, em 1989, do Conselho Consultivo Regional de Juventude, por proposta do PCP, foi um passo que o PSD não teve condições políticas para evitar e que contribuiu para que o associativismo juvenil melhor se organizasse e procurasse propostas de âmbito regional.

A luta desenvolvida num quadro de domínio foi uma luta com avanços e recuos mas com um saldo claramente positivo.

4. A JCP/Açores existe há largos anos, mas teve sempre sérias dificuldades em organizar-se como força política juvenil com dimensão, estrutura e intervenção regional.

A adversidade do ambiente político, associada à insularidade que separa fortemente todas as ilhas, foram, por muito tempo, os principais obstáculos à acção regional da JCP. Não obstante isso, existiram sempre núcleos da JCP em cinco ilhas, núcleos esses com níveis de intervenção diferentes entre si e variáveis ao longo dos anos, mas que contribuíram indesmentivelmente para contrapor o descontentamento ao domínio exercido pelo poder regional.

Os núcleos de ilha da JCP, quer actuando autonomamente, quer dinamizando a participação dos jovens nas diversas expressões do associativismo e da movimentação juvenil, foram sempre polos activos de resistência e núcleos coerentes de criação de força transformadora.

Hoje a JCP/Açores começa a ter uma estrutura regional, tendo sido eleito, em Junho passado, um Secretariado provisório que está a preparar um Encontro Regional da JCP/Açores, a realizar em 1998.

Nos últimos dois anos os núcleos da JCP em S. Miguel, Terceira, Flores, Faial e Pico alargaram-se substancialmente e incentivaram muito as respectivas actividades.

Para o PCP/Açores a luta transformadora que está em curso na Região necessita do profundo envolvimento da juventude no processo político, na luta social e na dinamização cultural. Só assim se poderá contrariar a tendência, instalada ao longo dos anos, para a paralisia e a estagnação.

5. O poder político regional mudou em Outubro de 1996, mas tal modificação não levou, por si só, à mudança substancial de políticas.

O novo poder regional do PS mostra uma séria tendência conservadora, mantendo o essencial das políticas económicas e sociais dsesenvolvidas pelo PSD.

A área da juventude carece de políticas governativas de emergência que possam estabelecer novos equilíbrios quebrados com a política do PSD. No entanto, o Governo Regional do PS limita-se a gerir o que vem de trás.

O reforço orgânico da JCP/Açores e uma maior intervenção do PCP nas questões da política de juventude são necessidades objectivas às quais se procura dar resposta.

No actual quadro económico e social regional profundamente negativo mas que se desenvolve num quadro político muito mais descomprimido, há possibilidades concretas de serem dados novos e importantes passos na mobilização da juventude açoriana.

O caminho está a ser trilhado.


«O Militante» Nº 230 de Setembro/Outubro de 1997