«O Militante» Nº 227 de Março/Abril de 1997 - Poder Local, Associativismo, eleições autárquicas

Poder Local, Associativismo,
eleições autárquicas

Por Carlos Rabaçal
Membro do Comité Central




Quando falamos de Poder Local estamos, em geral, a pensar nas autarquias locais existentes, isto é, nas freguesias e nos municípios e, ainda, nalguns casos, na autarquia que falta na arquitectura da administração pública portuguesa, a região.

No entanto, há outras formas de exercício de poder local efectivo por parte das populações organizadas, com o objectivo de resolver problemas concretos e imediatos, de suprir lacunas na vida das populações, de responder a aspirações de participação, de realização colectiva e individual. Estamos a falar das mais diversas expressões que o movimento associativo de raiz popular assume a nível local.

O Movimento Associativo, uma poderosa realidade no nosso país

Todos conhecemos a importância económica, social, cultural, política e ideológica da acção do movimento associativo nas respectivas localidades. A importância das Colectividades de Cultura e Recreio, dos Clubes e Associações Desportivas, das Associações de Bombeiros, dos cineclubes, das Instituições Particulares de Solidariedade Social, das Associações de Desenvolvimento Local, das associações ambientalistas e de defesa do património, do Movimento Associativo de Pais, das Associações de Juventude e de muitas e muitas outras formas de associação pelos mais diversos objectivos.

Trata-se duma gigantesca rede social de milhares de associações, de centenas de milhares de dirigentes activistas, de milhões de associados, de muitos milhões de contos movimentados de receitas próprias ou outras, resultantes de apoios do Estado, da União Europeia ou de privados. Em muitos casos verifica-se que uma associação tem orçamentos muito superiores ao da freguesia em que se insere e grupos de associações têm orçamentos largamente superiores ao do Município onde desenvolvem a sua actividade, somando a esta força económica um peso social e político por vezes decisivo, a nível local.

Ignorar esta forma de exercício de poder a nível local, não participar nem intervir nele, não o conhecer nem acompanhar de perto o seu desenvolvimento pode ser fatal para qualquer projecto que tenha como objectivo a solução dos problemas das populações através do exercício do poder local, agora entendido enquanto autarquia.

Uma atenção continuada do Partido

Nas conclusões do Encontro Nacional de Quadros do PCP sobre o Movimento Associativo, realizado em Maio de 1996, pode ler-se: “A participação dos militantes comunistas no Movimento Associativo pode significar, entre outros aspectos: novas oportunidades de ligação às populações e aos seus problemas; acesso a mecanismos de concretização de políticas progressistas nas áreas sociais, da cultura e do desporto; um forte envolvimento nas políticas de desenvolvimento local; participação activa num importante espaço de debate ideológico e político; um entusiasmante contacto com a ‘militância associativa’ e a desprendida vontade de participar de milhares de portuguesas e portugueses; a possibilidade de contribuir para a prestação de serviços às populações; um contributo fundamental para a integração social, os sentimentos de pertença e a identificação das populações com o seu território; o relacionamento natural com diferentes sectores sociais, num espaço que se caracteriza pela ampla unidade do movimento; intervir num espaço de luta e de reclamação por objectivos concretos e imediatos; dar expressão a formas concretas de mobilização da juventude e da mulher”. Concluindo que “é destas enormes possibilidades de servir o povo e o país que se trata, quando se aborda a relação do Partido com o Movimento Associativo Popular, surgindo clara a importância e a necessidade de melhorar, nas condições actuais, a acção do Partido nesta área”.

É no sentido de responder a estas preocupações que a Resolução Política do XV Congresso aponta como objectivos melhorar o acompanhamento das organizações do Partido a esta área e aos membros do Partido que nela intervêm; o incentivo às formas de cooperação e coordeação associativa, o contributo para potenciar as novas condições existentes, nos dias de hoje, nesta área de actividade e, no que respeita ao tema que estamos a abordar, “analisar, aprofundar e prosseguir o desenvolvimento dos exemplos positivos de colaboração e cooperação, mutuamente vantajosos, entre as autarquias locais e o movimento associativo”.

Eleições, democracia e participação popular

É conhecido que por incúria e até por desprezo do poder central, o Movimento Associativo Popular tem tido, ao nível do Estado, as autarquias como parceiros privilegiados, que resolvem problemas de apoios e outros, muito para além das suas competências.

No entanto, ainda é comum o estabelecimento de relações de dependência e mesmo de subserviência das associações com as suas autarquias. Demasiadas vezes mais que o valor e a importância da actividade das associações, são apoiados os amigos, os apaniguados políticos e é alimentada a troca de favores políticos e outros.

Na relação entre autarquias e Movimento Associativo Popular a transparência de processos e a imparcialidade, a análise comum dos problemas, o envolvimento comum em projectos de desenvolvimento económico, social, cultural, desportivo e outros, com o respeito pela autonomia de cada uma das entidades é a tónica indispensável.

No que respeita à CDU, com larga experiência de exercício da democracia participativa nas autarquias, é reconhecido, mesmo pelos adversários políticos, a forma superior e correcta como é estabelecida, em geral, esta relação, com o Movimento Associativo.

É, entretanto, indispensável analisar a nossa actividade nesta área, aprofundar um estilo de trabalho que tem dado resultados positivos para as associações e para as populações e, na medida do possível, ir mais longe, para, mais do que os apoios (de nível inigualável no que respeita a outras autarquias), partir decididamente para um maior envolvimento participativo das associações e da população em toda a vida local, e na gestão dos destinos das populações.

Nas próximas eleições autárquicas, o julgamento popular, traduzido em votos também depende e muito, do papel que irá desempenhar a rede social associativa, a avaliação positiva ou negativa que faça da gestão autárquica neste mandato, influenciando de forma significativa os muitos milhares de associados (eleitores) com quem se relacionam.

No que respeita ainda à CDU e ao Partido em particular, trata-se de, nos casos em que houve menor atenção, recuperar o tempo perdido nesta área e, nos casos em que houve um trabalho continuado ao longo destes mandatos, procurar que o reconhecimento popular se transforme em votos, mobilizando todos aqueles quantos connosco têm trabalhado e dado o seu melhor em prol das populações.

Todas as forças políticas estão no terreno, procurando recolher louros do trabalho feito pelos homens e mulheres no movimento associativo popular. Particularmente o PS que, a nível nacional, aparece com a orientação geral de conquista de posições no movimento associativo. São visitas, contactos e diálogos, encontros e congressos, convites para listas, aliciamentos diversos, promessas de cargos futuros em troca de apoios, etc., associados a uma roda viva de cheques de governadores civis e outros governantes. Iniciativas de quem, tal como o PSD, estando no governo nada faz em favor do movimento associativo.

O Partido tem procurado intervir a nível local, em apoio e dinamização da vida associativa, e, ao mesmo tempo, intervir ao nível legislativo, no sentido de assegurar um correcto enquadramento legal dos apoios e do relacionamento do Estado com o movimento associativo. É uma actividade que é reconhecida e pode e deve ser tornada mais visível e devidamente valorizada e capitalizada.

As eleições autárquicas são um momento particular da vida local. E, no que respeita à relação do Partido com o movimento associativo, um momento privilegiado para o aprofundamento do conhecimento desta realidade por parte das organizações, da criação de novos contactos e novas pontes, de auscultação de opiniões, de recolha de contributos para programas eleitorais, de envolvimento de homens e mulheres dedicados ao seu povo na batalha autárquica com a CDU em todas as tarefas eleitorais, na campanha e naturalmente nas listas da força que com eles, de braço dado, tem lutado pelo movimento associativo, pelo desenvolvimento local e pelo bem-estar das populações.

Toda a actividade em torno das eleições autárquicas, ligando de uma forma justa a consigna de trabalho, honestidade e competência à ideia forte e à prática de participação popular, poderá criar novas condições para a ulterior acção e para o reforço da influência política, social, ideológica e eleitoral do Partido e podendo contribuir ainda para uma nova dimensão da actividade associativa no nosso país.

Da Resolução Política do XV Congresso do PCP

Apesar da intervenção de um número significativo de membros do Partido, é ainda em geral insuficiente a atenção que as organizações partidárias dão a esta frente de trabalho. Para a afirmação do movimento associativo, a intervenção dos membros do Partido desenvolve-se com os seguintes objectivos:

a) melhorar o nível de acompanhamento por parte das organizações partidárias dos problemas do movimento associativo, definir responsáveis aos diversos níveis e adoptar outras medidas orgânicas para ajuda e coordenação da actividade dos membros do Partido que actuam nesta frente;

b) analisar, aprofundar e prosseguir o desenvolvimento dos exemplos positivos de colaboração e cooperação, mutuamente vantajosos, entre as autarquias locais e o movimento associativo;

c) incentivar e aprofundar formas de cooperação e coordenação associativas e acção de intercâmbio a nível local, nacional e internacional;

d) potenciar o gosto pelo convívio e pela vida colectiva, contribuir para uma ampla participação de jovens e de mulheres nas associações populares, designadamente em tarefas de responsabilidade dirigente, criando novas condições para o rejuvenescimento, a renovação e a inovação na vida associativa.


«O Militante» Nº 227 de Março/Abril de 1997