«O Militante» Nº 227 de Março/Abril de 1997 - O trabalho de autarquias no Concelho de Coimbra

O trabalho de autarquias
no Concelho de Coimbra

Jorge Gouveia Monteiro
Membro do Comité Central




As condições em que realizamos o trabalho

As eleições autárquicas de 1993 alteraram profundamente as condições em que se realiza o nosso trabalho de autarquias. A consolidação de maiorias absolutas PS nos órgãos municipais e em 24 das 31 Freguesias, acompanhada da redução de eleitos da CDU e do PSD, traduziu-se num grande empobrecimento da vida democrátrica nas autarquias. O executivo municipal (7PS, 3PSD, 1CDU) presidencializou-se até aos limites do absurdo, a Assembleia Municipal foi quase transformada em “posta restante” da Câmara, a esmagada maioria das Freguesias seguiu o mesmo rumo e debate-se com enormes dificuldades financeiras.

Em resultado deste estado de coisas, o Poder Local afastou-se das populações, é exercido em círculo muito fechado onde o que conta é o que pode ser notícia e as reivindicações dos moradores são olhadas com grande desconfiança. Até as sessões públicas da Câmara passaram a ser filtradas por um serviço de inscrição prévia, cujo objectivo é dissuadir qualquer cidadão de aí tomar a palavra.

Esta situação tem grandes repercussões no trabalho do PCP e da CDU, desde logo na Câmara Municipal. Ao nosso vereador foi retirado o Pelouro que exercia com reconhecida competência, as ordens de trabalhos são distribuídas ao sábado para a sessão de segunda à tarde, onde o contacto com a comunicação social é assegurado em exclusivo pelo Presidente da Câmara em adequados “intervalos para café”.

E também na Assembleia Municipal, onde a CDU dispõe de um combativo grupo de 4 eleitos e 3 Presidentes de Junta, mas as possibilidades de agendamento e os prazos de convocação e distribuição prévia de documentos foram moldados ao interesse da força maioritária com o objectivo principal de não estorvar a Câmara e o seu Presidente.

Na maioria das Freguesias, os executivos trabalham como entendem e as Assembleias funcionam ao mínimo ou nem sequer reunem. As transferências de capital para as freguesias por parte do Município foram anuladas e substituídas por protocolos com a Câmara, o que as impede de terem planos de investimento próprios, mas permite isso sim à Câmara “ter as Juntas na mão” e só transferir dinheiro contra a apresentação de provas da despesa.

Nas três Freguesias de presidência CDU, há a distinguir entre as duas que se mantiveram e reforçaram o trabalho e o prestígio que vinha dos mandatos anteriores (Arzila e Torres do Mondego) e a que ganhamos de novo em 93 (Souselas). Nas duas primeiras, a ausência de investimento camarário tem sido compensada pela grande experiência e capacidade de execução dos eleitos CDU e pelo apoio popular que granjearam. Em Torres do Mondego, avançou-se mesmo neste mandato com a aquisição de uma cisterna de limpeza de fossas (oferta da AECOD) e com a construção de uma praia fluvial que ficará pronta neste Verão e corresponde a uma velha aspiração da po-pulação das duas margens do Mondego.

Em Souselas, a enorme dedicação dos eleitos está a virar a Freguesia do avesso quanto à construção e reparação de arruamentos, com a preciosa ajuda de um pequeno cilindro oferecido pela AECOD; mas avançam também grandes projectos há muito adiados: o Pavilhão gimno-desportivo, o alargamento do cemitério.

Importa referir que as Freguesias de maioria CDU têm recorrido frequentemente à intervenção na opinião pública e mesmo à luta de massas para ver desbloqueadas as soluções de problemas emperrados na Câmara e que, de outra forma, não dariam um passo.

Neste quadro de grandes dificuldades para o Poder Local, resulta muito clarificadora a opinião do Primeiro-Ministro, emitida quando de uma visita recente a Coimbra, e segundo a qual a “gestão municipal em Coimbra constitui um exemplo daquilo que o PS gostaria de ver feito em todo o País”.

A dinamização da luta nos locais de residência

As actuais condições de trabalho nas Autarquias do Concelho tornam ainda mais imperiosa a concretização de uma nossa linha orientadora desde sempre: não reduzir o trabalho autárquico aos eleitos e aos órgãos, antes fazer toda a dinamização possível das lutas de populações pela resolução dos seus problemas .

É aqui que a CDU tem dado alguns passos significativos. Movimentos de opinião, abaixo-assinados, idas colectivas a sessões da Junta ou da Câmara, ajuntamentos populares, são as formas dominantes de luta por objectivos tão diversos como: recuperação de um velho teatro no coração da Cidade, criação de um parque infantil numa zona muito populosa da Cidade, reparação de uma estrada, construção de uma escola pré-primária, extensão de uma linha de autocarros municipais.

Importa também dizer que, para além daquelas que criamos ou animamos mais directamente, em muitos locais surgem lutas de moradores descontentes e receptivos à articulação com a acção do PCP e da CDU nas instituições. E que nem sempre as organizações locais do PCP têm estado suficientemente atentas a estas lutas, para nelas se integrarem e desenvolverem a sua acção.

A intervenção cívica e o debate

Outra frente de combate que tem conhecido desenvolvimentos interessantes é a da intervenção na opinião pública e o debate sobre grandes problemas do concelho.

Estamos a fazer um grande esforço para multiplicar a tiragem e distribuição de boletins e comunicados do PCP e da CDU sobre matéria local, criar equipas especialmente dedicadas a esse objectivo. Dois boletins têm já periodicidade assegurada, estamos a revitalizar outros dois e há mais dois em fase de discussão.

Para além disso, começa a generalizar-se o bom hábito de a seguir a qualquer reunião de Comissão de Freguesia do PCP, ser emitida uma nota à comunicação social regional sobre um ou mais assuntos de interesse da população. Por vezes, é esta mesma nota transformada em comunicado e distribuída aos moradores. Também a Comissão Concelhia tem assegurado tomadas de posição regulares sobre problemas maiores do concelho, suprindo de alguma forma o bloqueio à divulgação das intervenções dos nossos eleitos municipais.

Constata-se na Cidade de Coimbra um enorme défice de debate democrático sobre assuntos do município. O Partido tem procurado intervir neste domínio - veja-se os debates sobre “Espaços Urbanos e qualidade de vida” e sobre “o Plano Estratégico para a Cidade de Coimbra”. Mas há várias associações a promover interessantes iniciativas de discussão alargada e a própria Câmara viu-se já obrigada a fazer duas sessões abertas ao público para discutir dois projectos que, apesar de limitados, possibilitaram a intervenção dos munícipes. Esta é uma linha de trabalho que muito se pode desenvolver, se mais membros do Partido e outros companheiros nossos se dispuserem a vencer a resistência inicial e a intervir em espaços mais alargados, com as suas opiniões e as posições justas de quem defende acima de tudo o interesse público.

Experiências de organização para o trabalho de autarquias

Em Janeiro de 1995, face à necessidade de cruzar experiências e informações entre os mais de 50 eleitos da CDU no concelho, criámos o espaço autárquico: uma tarde de sábado por mês, para onde eram todos convocados a fim de discutir o que se estava a fazer nas várias autarquias. O começo foi auspicioso, mas a experiência não resultou. Fosse pelo volume de reuniões a que os quadros eleitos já estão sujeitos, fosse pelos hábitos de muitos anos de ser o responsável (leia-se o funcionário) a ir dar a orientação “ao domicílio”, fosse pelo dia escolhido não ser o melhor, o certo é que ao fim de 8 meses tivemos de cancelar a experiência.

Os problemas subsistem: é necessário um apoio muito mais efectivo aos eleitos municipais, em particular ao Vereador com as dificuldades que foram descritas. A componente política dessa discussão deve passar pela Comissão Concelhia, que entretanto não consegue reunir com a cadência a que tal obrigaria. A discussão sobre o trabalho dos eleitos das Freguesias tem que passar pelas respectivas Comissões de Freguesia, sob pena de estas estarem em grande medida desprovidas de um importante conteúdo do seu trabalho. Só que muitas delas têm um funcionamento muito irregular, incluindo algumas onde há vários eleitos.

No próximo dia 8 de Março, vamos realizar a quarta Assembleia da Organização Concelhia de Coimbra. A proposta de Resolução que está já à discussão aponta para uma Comissão Concelhia mais alargada e com renovada capacidade de discussão política sobre os grandes problemas do concelho. Simultaneamente, trabalhamos na constituição de um Executivo mais alargado e mais operativo, com novos responsáveis por importantes Freguesias e com funções de dinamizar o seu funcionamento. Em relação ao trabalho autárquico municipal, propomo-nos criar um grupo de trabalho específico e regular, que integre os eleitos municipais e outros quadros experimentados, onde se fará a discussão mais frequente do trabalho nestes órgãos, das propostas a apresentar e das iniciativas políticas a propor à Comissão Concelhia.

Não é fácil. Mas este ano de grande dinamização do contacto com os membros do Partido (na esteira do trabalho para o XV Congresso) e com muitos cidadãos sem partido com vista à formação das listas, é propício ao avanço da organização. Vamos a isso!


«O Militante» Nº 227 de Março/Abril de 1997