Sobre a demissão da Comissão Europeia

Nota do Gabinete de Imprensa
dos Deputados do PCP no Parlamento Europeu

Bruxelas, 16 de Março de 1999




1. Os Deputados do PCP no Parlamento Europeu consideram que a demissão do colégio de comissários anunciada esta madrugada pelo presidente Jacques Santer constituiu a única saída possível e previsível para a presente crise, tendo em conta os resultados contundentes e inequívocos do relatório dos peritos que analisaram as situações de fraude, irregularidade e nepotismo no seio do executivo comunitário.
Com efeito, o referido relatório, ao confirmar e clarificar acusações que vinham sendo dirigidas a comissários e à Comissão, assumiu foros de verdadeira certidão de óbito para uma Comissão que, como os Deputados do PCP vinham afirmando, estava já politicamente moribunda.
Por outro lado, é flagrante que um tal pedido de renúncia é igualmente indissociável dum claro isolamento político desta Comissão relativamente aos cidadãos, por força das orientações anti-democráticas e anti-sociais que a mesma, em consonância com a generalidade dos governos dos Estados-membros da União Europeia, vem imprimindo à construção europeia.

2. Os Deputados do PCP, face aos resultados do referido relatório, não podem deixar de referir a justeza da sua conduta e das suas previsões em todo este processo, particularmente desde a fase de discussão e votação da moção de censura à Comissão, no passado mês de Janeiro em que, recorda-se, foram a única força política a votá-la favoravelmente.

3. Conduta essa que, sublinhe-se, contrasta com a atitude assumida pelos restantes deputados das outras forças políticas portuguesas representadas no Parlamento Europeu, os quais, tomados pela sua habitual atitude de completa subserviência, não só se mostraram insensíveis e incapazes de prever a dimensão e gravidade da situação, como foram ao ponto de confundir a defesa dos interesses nacionais com a defesa de uma Comissão corroída pela corrupção.
A tal ponto que, apesar de já em presença do relatório dos peritos, os deputados do PS e do PSD continuaram ainda a negar o seu alcance e a afirmar solidariedade para com essa mesma Comissão.

4. Neste contexto, os Deputados do PCP referem também o comportamento inqualificável e irresponsável do Secretário de Estado Seixas da Costa que, ontem mesmo e apesar de no desconhecimento do relatório dos peritos, afirmava ainda uma completa e cega solidariedade do governo português para com a Comissão, amarrando negativamente e por esta forma o país a um colégio totalmente desprestigiado e em queda.

5. Os Deputados do PCP, a propósito dos comportamentos dos deputados do PS, PSD e PP e do Governo - em tudo idênticos - entendem dever sublinhar dois aspectos:
a) Não há momentos bons e maus para combater firmemente a corrupção e a fraude; tão pouco os interesses nacionais alguma vez se poderão defender com base na tolerância ou conivência com aquelas;
b) Esta Comissão em nenhum momento revelou uma particular preocupação com Portugal. Bem pelo contrário. Recorda-se que a proposta de quadro financeiro que formulou, a Agenda 2000, prejudicaria fundamentalmente, a ser concretizada, o nosso país; também Portugal foi igualmente o único país (além do Reino Unido) a ser atingido por um embargo à carne de vaca decretado por esta Comissão, apesar de se verificarem situações passíveis de igual tratamento noutros países da UE.

6. Os Deputados do PCP no Parlamento Europeu consideram também ser de reter o facto de no relatório dos peritos serem feitas referências explícitas não abonatórias quer ao actual comissário, Prof. Deus Pinheiro, quer ao anterior comissário português, Eng. Cardoso e Cunha. No caso do Prof. Deus Pinheiro, com uma sua clara condenação no plano ético e, relativamente ao ex-comissário Cardoso e Cunha referindo sérias irregularidade na gestão do dossier ? Turismo?.

7. Os Deputados do PCP no Parlamento Europeu consideram finalmente que um novo presidente da Comissão deve ser rapidamente indigitado pelos Chefes de Estado e de Governo com vista a iniciar o processo que deverá conduzir à constituição de um novo executivo comunitário.
Mais entendem que duas orientações essenciais deverão presidir à escolha do próximo colégio de comissários: uma urgente e profunda alteração das condutas que determinaram a presente renúncia e uma significativa mudança nas políticas comunitárias.
Só assim se evitarão situações similares no futuro e se conseguirá um efectivo envolvimento e uma cabal motivação dos cidadãos relativamente às instituições comunitárias.