Intervenção de Bruno Dias na Assembleia de República

«Os CTT são um instrumento insubstituível para a coesão social, económica e territorial»

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Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

Como o PCP tem reiteradamente afirmado, os Correios são um instrumento insubstituível para a coesão social, económica e territorial do nosso país.
Mais do que uma empresa que garanta lucros e dividendos, os Correios devem ser o garante de um serviço público efectivamente ao serviço do país e das populações, ao serviço da economia nacional e do desenvolvimento, com uma gestão que vise o equilíbrio económico-financeiro e o investimento na melhoria da qualidade.

No entanto, a verdade é que, com o caminho da privatização dos CTT, todos esses objectivos deram lugar à degradação e ao desmantelamento do serviço público, em nome dos milhões para os accionistas.

Em 2013, o governo PSD/CDS concretizou uma velha aspiração do capital monopolista e que vinha sendo preparada por sucessivos governos, incluindo do PS, e assim se fez a privatização dos CTT.

Os resultados estão à vista e são verdadeiramente desastrosos, aprofundando o caminho de destruição que prossegue há anos a fio.
Já nas contas dos CTT do primeiro semestre do ano passado, as últimas disponíveis, os números evidenciavam a dimensão da ofensiva que a gestão privada está a levar a cabo: menos estações de correios, menos 169 trabalhadores, quando comparados com a mesma data do ano anterior.

Neste período, os CTT distribuíram 57 milhões de euros pelos seus accionistas – como a família Champalimaud, grandes bancos europeus ou o fundo abutre Blackrock –, um valor que ultrapassa o dobro dos lucros do ano passado.

Os salários dos trabalhadores desceram em termos reais e prosseguiu a destruição de postos de trabalho, que é uma constante desde 2012.
Mesmo para a imprensa local e regional, tal como o PCP já alertou nesta Assembleia, as medidas impostas pelos CTT na recolha e distribuição postal estão a criar problemas graves de condicionamento, risco de perda de assinantes, condições de distribuição cada vez piores.

A situação revela-se ainda mais gravosa face ao quadro que está descrito e retratado na importante publicação da ANACOM do passado dia 10 sobre a densidade da rede postal e ofertas mínimas de serviços.

Em 2013, ano da privatização dos CTT, em todos os 308 concelhos do país existia pelo menos uma estação de correios. Nesse ano, pela primeira vez, começou a haver concelhos sem qualquer estação: Gavião e Pedrogão Grande.

Em 2018, arrancou uma nova ofensiva, e o número de concelhos sem qualquer estação de correios passou de dois para 33. E de acordo com a ANACOM, é expectável que esse número possa, a curto prazo, atingir os 48 concelhos – mais de quinze por cento da totalidade dos concelhos do país.

A ANACOM refere as denúncias e alertas, das organizações dos trabalhadores dos CTT, de autarquias locais, das regiões autónomas, de todos os partidos ou grupos parlamentares, sobre a situação escandalosa que se está a verificar. E identifica os problemas que estão em causa, em matérias que vão desde o sigilo e a protecção da vida privada à deficiente prestação de serviços postais, passando por irregularidades nos horários de funcionamento ou mesmo a inexistência de prévio entendimento com as autarquias no encerramento abrupto de serviços.

Esta situação revela as consequências trágicas da privatização dos CTT inscrita no Pacto de Agressão assinado por PS, PSD e CDS com a troica estrangeira e depois concretizada pelo Governo PSD/CDS. Trágica para o país que perdeu o serviço púbico postal e trágica para as populações – em particular do interior – que ficaram entregues à sua própria sorte perante uma empresa privada que atende apenas aos seus lucros sem preocupação com as consequências das decisões que toma.

Não é admissível que o Governo faça declarações proclamatórias sobre o desenvolvimento do interior e do mundo rural e depois assista impávido e sereno à destruição do serviço postal, ao abandono das populações, tudo em nome do lucro dos grupos económicos que tomaram conta dos CTT.

Não é admissível e exige-se que o Governo assuma as suas responsabilidades, trave este processo, inverta o caminho de degradação do serviço postal prestado pelos CTT e assegure o investimento no serviço público postal correspondente à sua consideração como alavanca de desenvolvimento, designadamente retomando o controlo público dos CTT.

É para abordar estas matérias com o Governo que o PCP vai requerer a chamada do Ministro do Planeamento e das Infraestruturas à Comissão Parlamentar – porque este é acima de tudo um problema de responsabilidade política e de opções políticas. Opções políticas que têm de ser colocadas no plano do regresso dos CTT à condição de empresa pública nacional. Nesse sentido o PCP irá também apresentar uma nova iniciativa, um projecto de lei, pela gestão pública da empresa.

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados,

Os Correios, ao longo de mais de cinco séculos, asseguraram a prestação dos serviços postais em condições que lhe permitiram granjear o apreço da generalidade dos cidadãos e todas as entidades que eles recorreram.

Vai longínquo o ano de 1606, quando o rei Filipe II, terceiro de Castela, vendeu o cargo de Correio-Mor do Reino por 70 mil cruzados. Ficaram os Correios submetidos, durante quase 200 anos, aos interesses de um fidalgo que pôs e dispôs do título – até que novo decreto real finalmente reintegrou o serviço postal no Estado.

A nova fidalguia que neste século XXI comprou os nossos Correios – não por 70 mil cruzados, mas por 909 milhões de euros – lançou uma nova vaga de assalto ao serviço público, tentando reduzir os CTT a uma licença bancária.

Hoje como há 400 anos, há quem aproveite a maré da ingerência e da agressão ao povo, e da traição ao interesse nacional, para amassar milhões com os sacrifícios do país. Continuam a viver acima das nossas possibilidades. Por mais que lhes dermos, dirão sempre que não chega. Mas hoje como sempre, há quem não desista de lutar e de defender os direitos das populações e dos trabalhadores, o interesse nacional, a coesão territorial, a própria soberania do nosso país.

Inevitável é a luta, senhores deputados. Os correios hão de voltar a ser do Povo. E é na primeira linha dessa luta que está e continuará a estar o Partido Comunista Português.

Disse.

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