Intervenção de Carlos Carvalhas, Secretário-Geral

Encontro sobre «Imigração»

As questões da imigração não são simples e as respostas têm que ter em conta a sua complexidade.

Os populistas de vários matizes têm um campo mais facilitado para a difusão das suas propostas demagógicas racistas e xenófobas num quadro de recessão económica e de aumento do desemprego. Os imigrantes são muitas vezes o alvo a quem se atribui as causas e as responsabilidades pelo agravamento da situação social, pela falta de empregos e pela insegurança.

O Governo de direita, por exemplo, com discursos do Ministro de Estado de recorte xenófobo diz que Portugal não pode viver de portas escancaradas, mas é uma evidência que a situação dos milhares de imigrantes ilegais com que o país está confrontado não resulta de uma política de portas escancaradas, mas sim de uma política que dificulta ao máximo a legalização de imigrantes.

O combate deve ser direccionado aos traficantes de mão de obra ilegal e àqueles que são coniventes com estes, e desde logo, àqueles que estão interessados na ilegalidade dos trabalhadores para lhes impôr uma situação de sobre-exploração muito próxima da escravatura.

A demagogia das leis de “portas fechadas” está nisto: a actual lei é a quarta versão de um Diploma de 1998 e esta instabilidade é sintomática do falhanço das leis de estrangeiros, como afirmou António Filipe na Assembleia da República, que têm vindo a ser publicadas desde 1993, isto é, desde que o governo de Cavaco Silva adoptou uma política de “portas fechadas”.

O resultado tem sido o aumento dos trabalhadores ilegais em Portugal, com todas as consequências humanas e sociais conhecidas e também, com todos os proveitos daqueles que os exploram e utilizam para fazer pressão sobre os salários e direitos dos trabalhadores em geral.

As pseudo políticas de “imigração zero” não eliminam nem reduzem os fluxos migratórios, aumentam e fomentam sim é o número de trabalhadores ilegais.

O País necessita de olhar para esta questão com justiça e realismo e de avançar uma política razoável de legalização dos imigrantes que vivem e trabalham honestamente em Portugal, primeiro passo para combater, com eficácia, o flagelo social da imigração ilegal e os ganhos sórdidos e ilegítimos obtidos à sua custa.

Esta questão é de grande importância, pois Portugal está crescentemente confrontado com esta realidade que é a de ser um país de imigrantes. O seu número oficial cifra-se já nos 400 mil legais e outros milhares de ilegais.

O PCP tem-se manifestado contra a actual lei e ao seu carácter repressivo, injusto e ineficaz e tem defendido que na Assembleia da República se abra um espaço de reflexão sereno sobre os problemas da imigração de modo a que se encontre uma situação legislativa que encare com realismo as necessidades de mão de obra estrangeira, o seu acolhimento e a sua inserção no nosso País. Como afirmou António Filipe na Assembleia da República, “ao acabar com as autorizações de permanência, sem adoptar soluções destinadas a garantir a autorização de residência e a inserção social dos imigrantes autorizados a permanecer entre nós, o Governo vai reconduzi-los à ilegalidade, colocando muitos milhares de cidadãos sob a ameaça de serem pura e simplesmente expulsos do território nacional. Só que como não é viável nem concebível levar a cabo uma política de deportações massivas, a consequência óbvia a breve prazo será o aumento do número de estrangeiros indocumentados a viver entre nós em condições infra-humanas, sem direitos enquanto cidadãos ou trabalhadores e inteiramente à mercê da falta de escrúpulos de quem pretende beneficiar com essa fragilidade”.

O Alto Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas referia que os imigrantes contribuíram em 2000, com cerca de 311 milhões de euros para os cofres do Estado, mas não reconhece a legalidade da sua permanência.

Na verdade, a política que está a ser posta em marcha é a de transformar Portugal numa placa giratória dos movimentos migratórios inserida na estratégia da mobilidade e livre circulação, em que se usa a mão-de-obra imigrante para se impôr baixos salários e pressionar por esta via todos os trabalhadores portugueses.

Naturalmente que o PCP rejeita o uso instrumental dos homens e mulheres imigrantes para impor uma política de trabalho sem direitos e de baixos salários, porque é socialmente injusto e prejudicial para o país no plano económico. A política de baixos salários conduz-nos a um modelo de desenvolvimento periférico desvalorizado e de baixa produtividade.

Nós opusemo-nos às alterações legislativas que o Governo agora pretende implementar e decidimos chamar a ratificação o diploma governamental, visando introduzir um conjunto de alterações que respondessem às reclamações das comunidades imigrantes. A maioria de direita chumbou as alterações, mas o PCP prosseguirá a luta por uma outra política de imigração. Para nós, impõe-se proceder à regularização dos imigrantes a trabalhar em Portugal até à entrada deste novo diploma. É necessária uma lei que não crie novas categorias de imigrantes, com direitos mais condicionados mas que aceite corajosamente estabelecer um quadro legal permanente de regularização dos que vivendo e trabalhando cá, aqui sofrem os dramas da ilegalidade.

Impõe-se uma verdadeira política de integração, desde logo acarinhando e enquadrando o reagrupamento familiar. Impõe-se uma política de não discriminação salarial e de trabalho com direitos.

Impõe-se uma política de combate às máfias, desde logo às empresas que recrutam trabalhadores nas redes organizadas.

Impõe-se a adopção de medidas legislativas que permitam aos trabalhadores imigrantes, no âmbito da segurança social, a contabilização nos respectivos países de origem, dos descontos feitos em Portugal para efeitos da sua reforma. Impõem-se medidas expeditas mas rigorosas de validação de cursos. Impõe-se também desmistificar a ideia propalada pela direita de que, na origem da insegurança e da criminalidade estão os imigrantes. Ainda recentemente, um estudo financiado pela União Europeia afirma que não há qualquer prova de que a imigração conduza a um aumento da criminalidade. Impõem-se ainda medidas ao nível do ensino da língua portuguesa, incluindo apoio especial para os filhos dos imigrantes.

O PCP encara também propor alterações à lei da nacionalidade, no sentido de os filhos de imigrantes nascidos em Portugal poderem adquirir a nacionalidade portuguesa.

Todos estes aspectos, necessitam de respostas urgentes com vista a uma política de imigração integradora, humana, solidaria.

E toda a problemática das migrações reclama uma cultura de tolerância, de combate à xenofobia e ao racismo.

O PCP e a JCP, que têm tido desde a primeira hora posições claras sobre a realidade imigrante no nosso país, reafirmam o seu combate às visões securitárias com que a direita pretende tratar o problema da imigração e tudo continuarão a fazer para que Portugal, até pela sua experiência como país de emigrantes, saiba afirmar os valores da dignidade humana, continuando a lutar por um Portugal de progresso e justiça numa Europa de paz e cooperação.

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