Que o Alentejo vive
hoje uma das suas mais profundas crises económicas e sociais é
coisa que ninguém ousa contestar. A crise é reconhecida por todos.
O Alentejo envelhece e desertifica-se; o desemprego estrutural atinge
mais de 40 mil trabalhadores, 18%, a mais elevada taxa do País; mais
de um terço da população vive na pobreza; aprofunda-se o fosso
que separa o Alentejo das outras regiões da Europa sendo hoje o
Alentejo a mais atrasada de todas elas. Em 10 anos tivemos uma
quebra de 6% no rendimento «per capita» em termos de paridade
com a média europeia descendo de 48% para 42%. Uma leitura
atenta do Orçamento do Estado para 1987 confirma mais uma vez a
penalização e marginalização do Alentejo. A CCRA, num recente
estudo, afirma que, a manter-se a política actual, o Alentejo
perderá, nos próximos 15 anos, mais 87 500 habitantes da sua
já tão reduzida população.
Quais as causas desta dramática situação que atinge tão
profundamente a região? A ausência de recursos? o clima? a
pobreza dos solos? a ausência de alternativas? a influência dos
comunistas na região como afirmam desavergonhadamente o PS, o
PSD e o PP?
Com quase metade — cerca de 47% — da superfície
agrícola útil do País; dispondo de importantes recursos
mineiros — cobre, zinco, estanho, mármore, granito, xisto,
etc., — e de condições excepcionais para o desenvolvimento
do turismo — património natural, histórico, cultural e ambiental
diversificado e riquíssimo —, entre outras potencialidades,
o Alentejo foi e é antes de mais uma região predominantemente
agrícola.
Com condições excepcionais para a plantação da vinha, da
oliveira, do sobreiro e frutos secos culturas ricas e geradoras
de emprego; podendo intensificar particularmente a criação de
ovinos, caprinos e bovinos de qualidade; situado entre dois dos
mais importantes rios que atravessam o País, o Tejo e o Guadiana
e dispondo de outros importantes cursos de água como o Mira ou o
Sado que poderiam irrigar no seu conjunto mais de 200 mil
hectares de terras com boa aptidão para o regadio, condição
essencial à diversificação e intensificação cultural —
beterraba, arroz, milho, tomate, tabaco, horto-frutículas, etc.
— e consequente industrialização; dispondo em suma o
Alentejo de três elementos fundamentais a uma agricultura
moderna, próspera e desenvolvida — Sol, terra e água
— dois deles escassos, estratégicos e vitais para qualquer
política de desenvolvimento: a terra e a água, porque razão é
a agricultura alentejana pobre, extensiva e fundamentalmente
cerealífera e de sequeiro? Porque razão continuam centenas de
milhares de hectares de terra subaproveitados ou simplesmente
incultos? Porque razão o Plano de Rega do Alentejo acabado de
elaborar nos anos de 1955/58, há mais de 40 anos, e que tinha como
fundamental o Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva, ainda hoje
não está implementado? Porque razão os poucos perímetros de
rega existentes nunca foram convenientemente aproveitados?
Marcelo Caetano, que em 1959 reconhecia ser a irrigação do
Alentejo mencionada desde um passado muito remoto em todos os
estudos económicos e até nos programas políticos como a
condição essencial de transformação das condições de vida
nacionais, confessa nas suas memórias que tal não foi possível
pois «a resistência dos interesses era superior ao impulso do
poder».
Que interesses podem justificar ainda hoje o não
aproveitamento das enormes potencialidades agrícolas do Alentejo
num País cada vez mais dependente das importações estrangeiras
no campo agro-alimentar? Que podem justificar a condenação ao
envelhecimento, à desertificação, à estagnação e ao
abandono de uma região que representa um terço do território
nacional e que tanto pode e deve dar aos portugueses?
Para não citar Álvaro Cunhal, Carlos Carvalhas ou um dos
inúmeros documentos do nosso Partido que têm respondido a estas
perguntas, cito Castro Caldas que afirma «...a hidráulica
agrícola determinava fortes reacções de oposição por parte
dos proprietários de terras a submeter ao regadio, especialmente
os que usufruíam das vantagens do latifúndio dominante nos
sequeiros a regar no Sul.»
Latifúndio que PS,PSD e PP reconstituíram com a destruição
de uma das mais belas conquistas de Abril, a Reforma Agrária,
liquidando mais de 50 mil postos de trabalho e concentrando na
mão de 1% das explorações 80% do total da superfície
agrícola útil do Alentejo. Latifúndio premiado escandalosamente
com mais 60 milhões de contos pelo PS enquanto barragens há
muito inventariadas e necessárias ao desenvolvimento ficam por
construir. Latifúndio que, para ser reconstituído, levou à
suspensão do E.F.M. de Alqueva no final dos anos 70 como
confirmaram o mês passado, o ex-Secretário de Estado do PSD,
António Taveira e o Presidente do Instituto Nacional da Água ao
afirmarem que« o investimento foi suspenso por razões
políticas» pois com a construção de Alqueva «temia-se contribuir
para a consolidação da Reforma Agrária, impedindo a retoma dos
grandes agrários alentejanos».
Os resultados de uma tal política estão à vista no
Alentejo.
É pois justa a afirmação contida no projecto de resolução
política de que«Hoje como ontem, a estrutura latifundista surge
como o mais pesado factor de bloqueamento do desenvolvimento da
região e do progresso social das populações do Alentejo».
Como é justo afirmar que, com características e com critérios
inseridos na realidade actual do País e da região, a resposta
necessária à degradação económica e social do Alentejo,
gerada pela contra reforma agrária e agudizada pela PAC, o melhor
caminho para uma nova agricultura, assente no racional aproveitamento
da terra e da água, será a realização de Uma nova reforma agrária
nos campos do Alentejo.