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1. A dupla condição de
Portugal como país de emigração e de imigração,
que constitui também um sinal da sua especificidade na União
Europeia, deveria justificar de modo reforçado uma orientação
política de acolhimento e integração dos
imigrantes na sociedade portuguesa marcada pelo respeito pelos seus
direitos cívicos, sociais e culturais, de apoio à sua
integração harmoniosa, de valorização do
seu contributo para o desenvolvimento do País.
Não
é essa a principal característica da política
adoptada pelo actual Governo quanto aos imigrantes e em geral quanto
aos estrangeiros. Adepto e cúmplice das políticas
dominantes da União Europeia que, invocando a inclusão
no Tratado de Amesterdão da política quanto às
migrações como uma área comum, favorecem o
fechamento do espaço europeu e o levantamento de muralhas
contra o diálogo com os povos do chamado "Terceiro
Mundo", propondo normativos restritivos e limitativos como o da
convenção em exame sobre a entrada de cidadãos
de países terceiros no espaço europeu. Não
descolando decididamente da orientação autoritária
contra os imigrantes que caracterizou o anterior Governo do PSD,
antes prosseguindo em aspectos essenciais as mesmas opções
e praticando nesta matéria a política "do pau e da
cenoura". Realizando um discurso de boas palavras dirigidas às
comunidades imigrantes instaladas em Portugal contrastante com a
evidente falta de meios e de poderes que caracteriza o órgão
existente para esta área -o Alto Comissariado para a Imigração
e as Minorias Étnicas. Acentuando iniciativas e actos
marcadamente repressivos e discriminatórios que ferem
negativamente o quotidiano dos imigrantes, para os quais invoca como
fundamento a nova lei de estrangeiros e usando como alibi um processo
extraordinário de regularização de imigrantes
ilegais cujo prazo fechou há 2 anos, mas que se arrasta
penosamente sem ter ainda concluído a apreciação
de milhares de casos. Penalizando sobretudo os que demandam Portugal
em busca de uma vida melhor, mas deixando na prática incólumes
os grandes interesses económicos e empresariais que se
alimentam das redes de imigração ilegal e do trabalho
clandestino.
2. A nova lei que regulamenta a entrada,
permanência, saída e afastamento de estrangeiros de
território nacional (Decreto-Lei 244/98, de 8 Agosto) é
um exemplo desta política negativa em relação ao
imigrante e ao estrangeiro. Inspirada por uma atitude geral de
desconfiança e de fechamento de Portugal em relação
aos cidadãos oriundos de países que não sejam
membros da União Europeia. Por uma submissa aceitação
pelo Governo dos compromissos com a União Europeia e o Sistema
Schengen para a construção de uma Europa fechada com os
pobres à porta, usados só quando der jeito. Não
valorizando a especificidade da relação de Portugal com
os países de língua portuguesa. Tratando como
potenciais delinquentes todos os imigrantes que demandem o nosso
País. Esquecendo que a fusão de povos e culturas faz
parte da génese do povo português e foi e é um
factor de enriquecimento e vitalidade da sociedade portuguesa.
Entre
outros aspectos negativos que caracterizam este Decreto-Lei do
Governo, aprovado na sequência de uma autorização
legislativa votada pelos deputados do PS e do PSD, com a oposição
do PCP, destacamos:
- mantém a atribuição
de poderes de decisão discricionários e excessivos às
autoridades administrativas, especialmente ao Serviço de
Estrangeiros e Fronteiras;
- recusa o efeito suspensivo a todo
e qualquer recurso que seja apresentado relativamente a decisões
de expulsão;
- torna quase impossível, se
aplicada à letra, a entrada de imigrantes para trabalhar
legalmente em Portugal, assim estimulando as redes de imigração
ilegal e de trabalho clandestino;
- introduz a possibilidade
de anulação administrativa de autorizações
de residência permanentes, através do sistema
estabelecido de renovação dos respectivos títulos;
-
regula a aplicação da pena acessória de expulsão
a estrangeiros, após o cumprimento de penas de prisão,
em moldes semelhantes aos praticados pelos EUA ou Canadá
relativamente a emigrantes de origem portuguesa e que temos
justamente criticado pela sua desumanidade e por esses Estados não
assumirem o ónus da resolução de problemas
gerados pelas respectivas sociedades;
- prevê a
proibição da entrada em Portugal de cidadãos que
tenham o seu nome inscrito na lista nacional de pessoas não
admissíveis ou na lista do Sistema Schengen mas não
regula a possibilidade de recurso dessa inclusão, nem as
condições e os prazos da sua retirada das listas;
-
possibilita a interdição da entrada em Portugal e a
expulsão de estrangeiros de território nacional com
base em razões excessivamente vagas e genéricas;
-
não enquadra uma política de resolução
legal e humanitária dos imigrantes que vivem e trabalham em
Portugal, mas se encontram em situação irregular,
oferecendo apenas como falsa saída para estes casos a
fundamentação de medidas repressivas.
É
uma lei globalmente negativa. É uma oportunidade
perdida pelo Governo do PS para, no ano em que se celebra o
cinquentenário da Declaração Universal dos
Direitos do Homem e através de uma lei essencial nesta área,
dar sinal de um novo rumo na política de imigração
e de estrangeiros, passando das palavras aos actos.
Preferiu
o Governo, apesar de algumas melhorias secundárias
introduzidas comparativamente com a lei anterior, assumir a posição
de zeloso guardião das fronteiras externas da União
Europeia e prosseguir uma política de raiz autoritária
e privilegiando, não a garantia legal dos direitos dos
cidadãos, mas a decisão administrativa.
Por isso
decidiu o PCP, com o seu Grupo Parlamentar, tomar a iniciativa de
chamar a apreciação parlamentar este Decreto-Lei do
Governo, o que sucederá com o respectivo debate em plenário
da Assembleia da República no próximo dia 18. Para
dar ainda a oportunidade ao Governo, ao PS e às demais forças
políticas, de uma reflexão responsável e séria
que abra caminho ao aperfeiçoamento desta lei determinante na
definição da política de imigração
e de estrangeiros do Estado português. De modo a que seja mais
conforme com os valores democráticos e com o fortalecimento
dos direitos dos cidadãos tal como a nossa Constituição
os consagra. Também para que seja mais coerente, e portanto
reforçada, a defesa dos direitos dos emigrantes portugueses no
mundo com a política praticada em Portugal em relação
aos imigrantes.
Com esse objectivo, vai o PCP apresentar no
debate parlamentar um conjunto de propostas que visam, não
só retirar do Decreto-Lei 244/98 os aspectos mais negativos já
referenciados, mas aperfeiçoar o regime de direitos dos
imigrantes e demais estrangeiros que entrem ou residam em Portugal,
de que destacamos:
- a admissão nos processos de
reagrupamento familiar do cônjuge em uniões de facto;
-
a regra de que o título de residência permanente deve
ser renovado segundo o regime aplicável à renovação
do bilhete de identidade de cidadão nacional, pois que
legalmente lhe é atribuído esse valor, a garantia de
que a sua renovação não pode ser recusada e a
atribuição de autorizações de residência
permanente a partir de 6 anos de residência consecutiva em
Portugal (e não de 10 como define a lei);
- a exigência
de acompanhamento e parecer por parte do Conselho Consultivo para os
Assuntos da Imigração quanto ao tratamento dos pedidos
de autorização de residência formulados ao abrigo
do regime excepcional previsto no Art. 88º;
- a
eliminação da obrigação de entrega dos
boletins de alojamento de cidadãos estrangeiros ao SEF por
parte das entidades que cedam tal alojamento a título
oneroso;
- a eliminação da pena acessória
de expulsão para estrangeiros com autorização de
residência permanente e garantias de processos de reavaliação
da possibilidade da sua aplicação nos restantes casos,
tendo em conta também as implicações sociais e
humanas;
- o reforço da eficácia dos recursos
judiciais das decisões de proibição de entrada
ou de expulsão por parte do SEF.
Finalmente sublinhamos
a proposta de inclusão na lei de estrangeiros de um regime que
possibilite a legalização da permanência em
Portugal por parte de cidadãos estrangeiros que, estando em
situação irregular, comprovadamente aqui residam com o
respectivo agregado familiar e aqui trabalhem e que declarem a
vontade de regularizar a sua situação. Trata-se de
uma proposta que visa enquadrar a solução de numerosas
situações existentes, não através de
processos extraordinários e temporários de
regularização, mas por via da natural distinção
entre a situação de proibição da entrada
ilegal no nosso País e a situação dos que,
embora em situação irregular, aqui estão já
instalados do ponto de vista profissional e familiar, sendo nestes
casos indispensável que a resposta do Estado português
seja integradora e não repressiva.
3. Culminando um
prolongado processo de reflexão próprio e de diálogo
com as comunidades imigrantes, as suas associações e o
movimento anti-racista, o PCP elaborou 4 projectos de lei:
-
Um projecto de lei visando prevenir, combater e sancionar as
discriminações de carácter racista e xenófobo
sob todas as suas formas, cuja actualidade e necessidade são
reforçadas num momento em que actos condenáveis de
carácter racista, embora claramente minoritários,
exprimem nova tentativa de forças da extrema-direita de
utilizarem o imigrante, o estrangeiro, as minorias étnicas,
como bode expiatório das desigualdades e injustiças
sociais geradas por um sistema económico e uma política
que penalizam a maioria em nome do enriquecimento dalguns.
-
Um projecto de lei de apoio às associações de
imigrantes, cuja especificidade nos problemas e nas necessidades
de apoio e cuja actividade de reconhecido mérito justifica
legislação própria, desde que, como propõe
o PCP, se assegure a sua inteira autonomia e se contrariem por parte
do Governo tentativas de controlo e instrumentalização.
De entre as propostas contidas no nosso projecto, destacam-se a
definição de formas de apoio técnico e
financeiro, da atribuição dos direitos legalmente
concedidos às associações detentoras do estatuto
de utilidade pública e de um conjunto relevante de direitos de
participação e de intervenção social,
incluindo nos processos legislativos e nas políticas para esta
área. Destacamos ainda, como medidas inovadoras propostas, a
criação de um Fundo de Apoio às Associações
de Imigrantes com verbas próprias a inscrever no Orçamento
de Estado e a criação de um Conselho para os
Assuntos da Imigração, em substituição
do actual Conselho Consultivo, dotado de maiores e reais poderes e
participação.
- Um projecto de lei de
alteração ao regime jurídico das Federações
desportivas, para reforço do direito de acesso dos cidadãos
estrangeiros residentes em Portugal à prática
desportiva, porque o Desporto constitui um importante factor de
participação e integração social e
comunitária e existe um elevado número de jovens no
seio das comunidades imigrantes cujo acesso pleno ao exercício
deste direito não é ainda reconhecido. Nesse sentido, e
sem prejuízo da natural autonomia da Federação
responsável por cada modalidade desportiva no estabelecimento
da regulamentação específica das respectivas
competições, a alteração legislativa
proposta pretende garantir o direito de acesso de todos os
cidadãos residentes em Portugal, nacionais e estrangeiros,
à disputa das competições desportivas federadas
e dos respectivos títulos nacionais, reservando entretanto às
Federações desportivas a definição dos
termos e das condições de atribuição do
título de campeão nacional.
- Um projecto de
alteração à Lei 50/96, de 4 Setembro, para
desburocratizar e simplificar o processo de certificação
do tempo mínimo de residência dos cidadãos
estrangeiros para efeitos eleitorais.
De facto, tendo
aquela Lei, com o apoio e a contribuição do PCP,
consagrado a atribuição da capacidade eleitoral activa
e passiva para a eleição das autarquias locais a
cidadãos estrangeiros residentes, em condições
de reciprocidade e desde que seja comprovado um período mínimo
de residência em Portugal (no caso de cidadãos não
nacionais de países da União Europeia), não se
justifica porém a exigência absurda e excessiva da
apresentação como prova obrigatória, além
do bilhete de identidade de cidadão estrangeiro ou da
autorização de residência, também de um
documento emitido pelo SEF.
Propõe-se, portanto, em
consonância até, neste caso, com a nova Lei de
Estrangeiros, que se reconheça como elemento de
identificação suficiente para este fim a apresentação
da autorização de residência ou, apenas na sua
falta, de documento para o efeito emitido pelo SEF.
4. O
conjunto de iniciativas do PCP agora divulgadas é coerente com
a posição desde sempre adoptada pelo PCP de firme
empenhamento, tanto na defesa dos direitos dos emigrantes portugueses
no estrangeiro como dos imigrantes e das minorias étnicas em
Portugal, de combate ao racismo e à xenofobia, de assumida
convicção de que é pelo reconhecimento dos
direitos de cidadania dos imigrantes, pelo diálogo
intercultural, pela união de todos os trabalhadores sem
distinção de raças, etnias ou origens nacionais,
que é possível construir em Portugal uma sociedade mais
democrática, justa e solidária.
É um
contributo aberto ainda às sugestões das comunidades
imigrantes e do movimento anti-racista, de todos quantos connosco
convergem neste combate, que aperfeiçoem e enriqueçam
estas propostas.
É uma contribuição para
que cada vez mais em Portugal os imigrantes, os estrangeiros, sejam
respeitados como cidadãos de corpo inteiro, com direitos e
deveres, e não como indivíduos indesejados, sujeitos a
um controlo excessivo e quotidianamente violador do seu direito à
privacidade no trabalho, na casa, na deslocação e na
família.
O Grupo de Trabalho do PCP para a Imigração
e as Minorias Étnicas
Sobre a política para a
imigração e as iniciativas e propostas do PCP em defesa
dos direitos dos imigrantes
Conferência de Imprensa
15
de Dezembro de 1998
1. A dupla condição de
Portugal como país de emigração e de imigração,
que constitui também um sinal da sua especificidade na União
Europeia, deveria justificar de modo reforçado uma orientação
política de acolhimento e integração dos
imigrantes na sociedade portuguesa marcada pelo respeito pelos seus
direitos cívicos, sociais e culturais, de apoio à sua
integração harmoniosa, de valorização do
seu contributo para o desenvolvimento do País.
Não
é essa a principal característica da política
adoptada pelo actual Governo quanto aos imigrantes e em geral quanto
aos estrangeiros. Adepto e cúmplice das políticas
dominantes da União Europeia que, invocando a inclusão
no Tratado de Amesterdão da política quanto às
migrações como uma área comum, favorecem o
fechamento do espaço europeu e o levantamento de muralhas
contra o diálogo com os povos do chamado "Terceiro
Mundo", propondo normativos restritivos e limitativos como o da
convenção em exame sobre a entrada de cidadãos
de países terceiros no espaço europeu. Não
descolando decididamente da orientação autoritária
contra os imigrantes que caracterizou o anterior Governo do PSD,
antes prosseguindo em aspectos essenciais as mesmas opções
e praticando nesta matéria a política "do pau e da
cenoura". Realizando um discurso de boas palavras dirigidas às
comunidades imigrantes instaladas em Portugal contrastante com a
evidente falta de meios e de poderes que caracteriza o órgão
existente para esta área -o Alto Comissariado para a Imigração
e as Minorias Étnicas. Acentuando iniciativas e actos
marcadamente repressivos e discriminatórios que ferem
negativamente o quotidiano dos imigrantes, para os quais invoca como
fundamento a nova lei de estrangeiros e usando como alibi um processo
extraordinário de regularização de imigrantes
ilegais cujo prazo fechou há 2 anos, mas que se arrasta
penosamente sem ter ainda concluído a apreciação
de milhares de casos. Penalizando sobretudo os que demandam Portugal
em busca de uma vida melhor, mas deixando na prática incólumes
os grandes interesses económicos e empresariais que se
alimentam das redes de imigração ilegal e do trabalho
clandestino.
2. A nova lei que regulamenta a entrada,
permanência, saída e afastamento de estrangeiros de
território nacional (Decreto-Lei 244/98, de 8 Agosto) é
um exemplo desta política negativa em relação ao
imigrante e ao estrangeiro. Inspirada por uma atitude geral de
desconfiança e de fechamento de Portugal em relação
aos cidadãos oriundos de países que não sejam
membros da União Europeia. Por uma submissa aceitação
pelo Governo dos compromissos com a União Europeia e o Sistema
Schengen para a construção de uma Europa fechada com os
pobres à porta, usados só quando der jeito. Não
valorizando a especificidade da relação de Portugal com
os países de língua portuguesa. Tratando como
potenciais delinquentes todos os imigrantes que demandem o nosso
País. Esquecendo que a fusão de povos e culturas faz
parte da génese do povo português e foi e é um
factor de enriquecimento e vitalidade da sociedade portuguesa.
Entre
outros aspectos negativos que caracterizam este Decreto-Lei do
Governo, aprovado na sequência de uma autorização
legislativa votada pelos deputados do PS e do PSD, com a oposição
do PCP, destacamos:
- mantém a atribuição
de poderes de decisão discricionários e excessivos às
autoridades administrativas, especialmente ao Serviço de
Estrangeiros e Fronteiras;
- recusa o efeito suspensivo a todo
e qualquer recurso que seja apresentado relativamente a decisões
de expulsão;
- torna quase impossível, se
aplicada à letra, a entrada de imigrantes para trabalhar
legalmente em Portugal, assim estimulando as redes de imigração
ilegal e de trabalho clandestino;
- introduz a possibilidade
de anulação administrativa de autorizações
de residência permanentes, através do sistema
estabelecido de renovação dos respectivos títulos;
-
regula a aplicação da pena acessória de expulsão
a estrangeiros, após o cumprimento de penas de prisão,
em moldes semelhantes aos praticados pelos EUA ou Canadá
relativamente a emigrantes de origem portuguesa e que temos
justamente criticado pela sua desumanidade e por esses Estados não
assumirem o ónus da resolução de problemas
gerados pelas respectivas sociedades;
- prevê a
proibição da entrada em Portugal de cidadãos que
tenham o seu nome inscrito na lista nacional de pessoas não
admissíveis ou na lista do Sistema Schengen mas não
regula a possibilidade de recurso dessa inclusão, nem as
condições e os prazos da sua retirada das listas;
-
possibilita a interdição da entrada em Portugal e a
expulsão de estrangeiros de território nacional com
base em razões excessivamente vagas e genéricas;
-
não enquadra uma política de resolução
legal e humanitária dos imigrantes que vivem e trabalham em
Portugal, mas se encontram em situação irregular,
oferecendo apenas como falsa saída para estes casos a
fundamentação de medidas repressivas.
É
uma lei globalmente negativa. É uma oportunidade
perdida pelo Governo do PS para, no ano em que se celebra o
cinquentenário da Declaração Universal dos
Direitos do Homem e através de uma lei essencial nesta área,
dar sinal de um novo rumo na política de imigração
e de estrangeiros, passando das palavras aos actos.
Preferiu
o Governo, apesar de algumas melhorias secundárias
introduzidas comparativamente com a lei anterior, assumir a posição
de zeloso guardião das fronteiras externas da União
Europeia e prosseguir uma política de raiz autoritária
e privilegiando, não a garantia legal dos direitos dos
cidadãos, mas a decisão administrativa.
Por isso
decidiu o PCP, com o seu Grupo Parlamentar, tomar a iniciativa de
chamar a apreciação parlamentar este Decreto-Lei do
Governo, o que sucederá com o respectivo debate em plenário
da Assembleia da República no próximo dia 18. Para
dar ainda a oportunidade ao Governo, ao PS e às demais forças
políticas, de uma reflexão responsável e séria
que abra caminho ao aperfeiçoamento desta lei determinante na
definição da política de imigração
e de estrangeiros do Estado português. De modo a que seja mais
conforme com os valores democráticos e com o fortalecimento
dos direitos dos cidadãos tal como a nossa Constituição
os consagra. Também para que seja mais coerente, e portanto
reforçada, a defesa dos direitos dos emigrantes portugueses no
mundo com a política praticada em Portugal em relação
aos imigrantes.
Com esse objectivo, vai o PCP apresentar no
debate parlamentar um conjunto de propostas que visam, não
só retirar do Decreto-Lei 244/98 os aspectos mais negativos já
referenciados, mas aperfeiçoar o regime de direitos dos
imigrantes e demais estrangeiros que entrem ou residam em Portugal,
de que destacamos:
- a admissão nos processos de
reagrupamento familiar do cônjuge em uniões de facto;
-
a regra de que o título de residência permanente deve
ser renovado segundo o regime aplicável à renovação
do bilhete de identidade de cidadão nacional, pois que
legalmente lhe é atribuído esse valor, a garantia de
que a sua renovação não pode ser recusada e a
atribuição de autorizações de residência
permanente a partir de 6 anos de residência consecutiva em
Portugal (e não de 10 como define a lei);
- a exigência
de acompanhamento e parecer por parte do Conselho Consultivo para os
Assuntos da Imigração quanto ao tratamento dos pedidos
de autorização de residência formulados ao abrigo
do regime excepcional previsto no Art. 88º;
- a
eliminação da obrigação de entrega dos
boletins de alojamento de cidadãos estrangeiros ao SEF por
parte das entidades que cedam tal alojamento a título
oneroso;
- a eliminação da pena acessória
de expulsão para estrangeiros com autorização de
residência permanente e garantias de processos de reavaliação
da possibilidade da sua aplicação nos restantes casos,
tendo em conta também as implicações sociais e
humanas;
- o reforço da eficácia dos recursos
judiciais das decisões de proibição de entrada
ou de expulsão por parte do SEF.
Finalmente sublinhamos
a proposta de inclusão na lei de estrangeiros de um regime que
possibilite a legalização da permanência em
Portugal por parte de cidadãos estrangeiros que, estando em
situação irregular, comprovadamente aqui residam com o
respectivo agregado familiar e aqui trabalhem e que declarem a
vontade de regularizar a sua situação. Trata-se de
uma proposta que visa enquadrar a solução de numerosas
situações existentes, não através de
processos extraordinários e temporários de
regularização, mas por via da natural distinção
entre a situação de proibição da entrada
ilegal no nosso País e a situação dos que,
embora em situação irregular, aqui estão já
instalados do ponto de vista profissional e familiar, sendo nestes
casos indispensável que a resposta do Estado português
seja integradora e não repressiva.
3. Culminando um
prolongado processo de reflexão próprio e de diálogo
com as comunidades imigrantes, as suas associações e o
movimento anti-racista, o PCP elaborou 4 projectos de lei:
-
Um projecto de lei visando prevenir, combater e sancionar as
discriminações de carácter racista e xenófobo
sob todas as suas formas, cuja actualidade e necessidade são
reforçadas num momento em que actos condenáveis de
carácter racista, embora claramente minoritários,
exprimem nova tentativa de forças da extrema-direita de
utilizarem o imigrante, o estrangeiro, as minorias étnicas,
como bode expiatório das desigualdades e injustiças
sociais geradas por um sistema económico e uma política
que penalizam a maioria em nome do enriquecimento dalguns.
-
Um projecto de lei de apoio às associações de
imigrantes, cuja especificidade nos problemas e nas necessidades
de apoio e cuja actividade de reconhecido mérito justifica
legislação própria, desde que, como propõe
o PCP, se assegure a sua inteira autonomia e se contrariem por parte
do Governo tentativas de controlo e instrumentalização.
De entre as propostas contidas no nosso projecto, destacam-se a
definição de formas de apoio técnico e
financeiro, da atribuição dos direitos legalmente
concedidos às associações detentoras do estatuto
de utilidade pública e de um conjunto relevante de direitos de
participação e de intervenção social,
incluindo nos processos legislativos e nas políticas para esta
área. Destacamos ainda, como medidas inovadoras propostas, a
criação de um Fundo de Apoio às Associações
de Imigrantes com verbas próprias a inscrever no Orçamento
de Estado e a criação de um Conselho para os
Assuntos da Imigração, em substituição
do actual Conselho Consultivo, dotado de maiores e reais poderes e
participação.
- Um projecto de lei de
alteração ao regime jurídico das Federações
desportivas, para reforço do direito de acesso dos cidadãos
estrangeiros residentes em Portugal à prática
desportiva, porque o Desporto constitui um importante factor de
participação e integração social e
comunitária e existe um elevado número de jovens no
seio das comunidades imigrantes cujo acesso pleno ao exercício
deste direito não é ainda reconhecido. Nesse sentido, e
sem prejuízo da natural autonomia da Federação
responsável por cada modalidade desportiva no estabelecimento
da regulamentação específica das respectivas
competições, a alteração legislativa
proposta pretende garantir o direito de acesso de todos os
cidadãos residentes em Portugal, nacionais e estrangeiros,
à disputa das competições desportivas federadas
e dos respectivos títulos nacionais, reservando entretanto às
Federações desportivas a definição dos
termos e das condições de atribuição do
título de campeão nacional.
- Um projecto de
alteração à Lei 50/96, de 4 Setembro, para
desburocratizar e simplificar o processo de certificação
do tempo mínimo de residência dos cidadãos
estrangeiros para efeitos eleitorais.
De facto, tendo
aquela Lei, com o apoio e a contribuição do PCP,
consagrado a atribuição da capacidade eleitoral activa
e passiva para a eleição das autarquias locais a
cidadãos estrangeiros residentes, em condições
de reciprocidade e desde que seja comprovado um período mínimo
de residência em Portugal (no caso de cidadãos não
nacionais de países da União Europeia), não se
justifica porém a exigência absurda e excessiva da
apresentação como prova obrigatória, além
do bilhete de identidade de cidadão estrangeiro ou da
autorização de residência, também de um
documento emitido pelo SEF.
Propõe-se, portanto, em
consonância até, neste caso, com a nova Lei de
Estrangeiros, que se reconheça como elemento de
identificação suficiente para este fim a apresentação
da autorização de residência ou, apenas na sua
falta, de documento para o efeito emitido pelo SEF.
4. O
conjunto de iniciativas do PCP agora divulgadas é coerente com
a posição desde sempre adoptada pelo PCP de firme
empenhamento, tanto na defesa dos direitos dos emigrantes portugueses
no estrangeiro como dos imigrantes e das minorias étnicas em
Portugal, de combate ao racismo e à xenofobia, de assumida
convicção de que é pelo reconhecimento dos
direitos de cidadania dos imigrantes, pelo diálogo
intercultural, pela união de todos os trabalhadores sem
distinção de raças, etnias ou origens nacionais,
que é possível construir em Portugal uma sociedade mais
democrática, justa e solidária.
É um
contributo aberto ainda às sugestões das comunidades
imigrantes e do movimento anti-racista, de todos quantos connosco
convergem neste combate, que aperfeiçoem e enriqueçam
estas propostas.
É uma contribuição para
que cada vez mais em Portugal os imigrantes, os estrangeiros, sejam
respeitados como cidadãos de corpo inteiro, com direitos e
deveres, e não como indivíduos indesejados, sujeitos a
um controlo excessivo e quotidianamente violador do seu direito à
privacidade no trabalho, na casa, na deslocação e na
família.
O Grupo de Trabalho do PCP para a Imigração
e as Minorias Étnicas
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