UMA VITÓRIA A CONSOLIDAR
alargando o movimento unitário de massas
O 3º Congresso da Oposição Democrática foi um
acontecimento de grande importância na vida política nacional. Ele realizou-se no meio
de uma generalizada ofensiva repressiva fascista. Mesmo assim, ultrapassou as previsões
mais optimistas. A sua realização, e a força patenteada pelo Movimento Democrático
constituíram uma importante vitória das forças democráticas sobre o fascismo e foram a
confirmação da justeza da orientação dos que preconizam a linha unitária da
mobilização de massas.
O êxito do Congresso residiu na organização do Movimento
Democrático que nos meses antecedentes, e paralelamente à luta pelo recenseamento,
promoveu um trabalho de massas que se estendeu à principais regiões do país e no qual
participaram milhares de democratas de todas as tendências. As caravanas, comissões e
reuniões organizadas à volta do recenseamento, a afixação de cartazes e a
distribuição de dezenas de milhar de documentos, por variadas regiões do país, foram
um incentivo à acção aberta e legal com vista ao Congresso. As teses e comunicações
apresentadas ao Congresso (cerca de 200), metade das quais colectivas, foram o produto de
largos debates sobre diversos aspectos da situação económica, social, cultural e
política de certas regiões ou distritos, de classes sociais e profissionais. Apenas dois
exemplos: para a elaboração da tese colectiva de jovens trabalhadores do distrito de
Setúbal, realizou-se um inquérito ao qual responderam mais de 500 jovens, tese que foi
depois aprovada numa reunião com 150 jovens trabalhadores de toda a região. Para a
elaboração de uma outra tese colectiva, relativa a uma região camponesa, fizeram-se
várias reuniões com a participação de 60, 70, 80 democratas vindos de várias
localidades dessa região.
Vê-se assim que o grande êxito do Congresso residiu na
acção de massas previamente realizada pelo Movimento Democrático e pelas Comissões de
cada uma das suas frentes de luta, muito especialmente pelos trabalhadores e movimento
sindical, pelos movimentos de jovens trabalhadores, de estudantes, de solidariedade aos
presos, de mulheres, camponeses e intelectuais.
Era desejo do Governo que o Congresso fosse uma reunião
passiva de individualidades, para poder afirmar, ao país e ao estrangeiro, que a
Oposição podia reunir-se livremente. Mas à medida que crescia o interesse, o entusiasmo
e o movimento de massas gerado à volta do Congresso, assim ia subindo a escalada
repressiva. As variadas Notas Oficiosas, proibições e ameaças, repetidamente
transmitidas pela rádio, Televisão e jornais, visavam confinar o Congresso às salas
fechadas de um cinema, intimidar os congressistas e todos os que pensavam ir a Aveiro. O
governo só não impôs o encerramento do Congresso devido às suas contradições e
fraquezas, e aos efeitos políticos que isso teria, mesmo internacionalmente. Em
contrapartida, recorreu a uma campanha de intimidação e terror, visando dificultar ao
máximo os trabalhos do Congresso e impedir que milhares de pessoas acorressem a Aveiro.
As forças repressivas cercaram Aveiro
A ditadura fascista montou um dispositivo policial que se
estendeu a uma área de mais de 100 quilómetros à volta de Aveiro. Caravanas de
automóveis e autocarros que se dirigiam a Aveiro eram interceptados à saída de Lisboa,
Margem Sul, Vila Franca, Porto, Viseu, Castelo Branco. As pessoas eram aconselhadas a não
irem a Aveiro, propagando a polícia, a GNR e a PIDE, os mais vaiados boatos: que já
havia mortos; que ninguém podia entrar na cidade, por ordem da Com. Executiva do
Congresso, etc. Em CANTANHEDE, uma caravana de 20 carros é interceptada pela GNR que
apreende as cartas de condução. Todas as pessoas começam a protestar, os carros buzinam
fortemente, a população da vila começa também a juntar-se e a protestar contra a GNR,
a quem chamam "galegos". Outros gritam: "deixem passar as pessoas!".
Gera-se um engarrafamento de trânsito, os protestos aumentam e a GNR vê-se forçada a
devolver as cartas de condução e a deixar passar as pessoas.
Uma caravana de 3 camionetas, na portagem da auto-estrada
à saída de Lisboa, é interceptada e os motoristas intimidados a assinarem documentos de
responsabilização pelo que viesse a suceder. Todos os passageiros protestam, dizem que
os motoristas nada tinham a assinar, mas que assinavam eles, passageiros. À chegada a
Leiria, as mesmas camionetas são impedidas de seguir viagem. Todos os passageiros são
identificados. Muitas camionetas ficaram retidas mas algumas outras conseguiram recorrer a
estradas secundárias e chegar a Ílhavo. Daqui, só era possível continuar a pé, em
boleias ou de bicicleta. O rápido do Porto-Lisboa foi mandado parar em Avanca durante 2
horas. Todas as pessoas são identificadas, intimidadas e algumas impedidas de seguir
viagem.
Com todos estes meios repressivos, a que se juntam as
prisões de numerosas democratas que em várias localidades colavam cartazes do Congresso,
o corte sistemático de notícias pela censura, o encerramento do parque de campismo de
Aveiro para impossibilitar o alojamento de muitos trabalhadores e estudantes, o Governo
impediu que um número incalculável de pessoas tenha podido chegar a Aveiro. Mas mesmo
com todos esses meios repressivos, o Governo não foi capaz de impedir a presença
entusiástica de milhares de pessoas, vindas de todos os cantos do país.
Manifestação de rua de milhares de pessoas
Foi sob esse clima repressivo, com Aveiro cercada de
forças repressivas, com uma Nota oficiosa que proibia a anunciada romagem à campa do Dr.
Mário Sacramento, com o cemitério fechado e cercado pela polícia de choque, assim como
a Praça José Estevão (local anunciado para a concentração), com o parque da cidade
fechado (local aprazado para um piquenique dos congressistas), foi com os cafés e outros
estabelecimentos encerrados por ordem da polícia, foi com todo esse clima opressivo que
milhares de pessoas tiveram a coragem de se concentrar na Av. Peixinho. Aí, pelas 10,30
do dia 8 de Abril, umas 5 mil pessoas começaram a dar-se os braços, formaram filas e
começaram a avançar a caminho do Congresso.A juventude portuguesa está contra a guerra colonial".
Começa-se a cantar o hino nacional e grita-se: "Fim à guerra colonial" -
"Fora a PIDE" - "Amnistia". O primeiro slogan - "Fim à guerra
colonial" - é o mais gritado, chegando a formar-se um coro. Logo que a manifestação se inicia, surge
um cartaz que dizia: "
A polícia de choque, armada de metralhadoras, capacetes e
escudos de plástico especiais, acompanhada de cães, investe sobre os manifestantes com
grande ferocidade, agredindo todos os que aparecem à sua frente. Diversas pessoas, entre
as quais vários jornalistas estrangeiros, ficam bastante feridas. As pessoas resistem
como podem, e não são poucos os que atiram pedras ou lutam corpo a corpo com a polícia.
As portas das casas particulares abrem-se para abrigar os manifestantes, numa bela
manifestação de solidariedade. Nas casas, os feridos são tratados e as roupas
arranjadas. A ferocidade usada pelas forças repressivas causou a maior repulsa entre a
população de Aveiro.
O Congresso aprovou uma Declaração Final
Na sessão de encerramento do Congresso, com a presença de
umas 4.000 pessoas, numa sala com lotação oficial de apenas 1.700, foi aprovada, por
aclamação, uma "Declaração Final". Nela se diz que "os objectivos
imediatos, possíveis de atingir através da acção unida das forças democráticas,
são:
- fim da guerra colonial
- luta contra o poder absoluto do capital monopolista
- reconquista das liberdades democráticas."
A aprovação dessa Declaração, de grande número de
teses, e moções: a moção de condenação pelos crimes da guerra colonial; o minuto de
silêncio de protesto contra o assassinato de E. Mondlane e A. Cabral; a moção que exige
a libertação de todos os presos políticos; a moção sobre a extinção da PIDE/DGS,
aprovada aos gritos "Assassinos! Assassinos!"; a moção de saudação e
solidariedade para "com aqueles que na clandestinidade travam uma luta diária contra
o fascismo"; a calorosa e prolongada ovação quando, na sessão inaugural, foi
citado o nome do camarada Álvaro Cunhal, secretário-geral do PCP, tudo isso é a
demonstração bem palpável da crescente combatividade e maturidade do Movimento
Democrático.
É certo que também apareceram teses a defender posições
oportunistas sobre o problema colonial e até mesmo sobre os trabalhadores. Mas no seu
conjunto, o Congresso representou uma importante vitória política das forças
democráticas unitárias, soube traduzir os justos sentimentos das massas e repudiar
ideias e concepções aventureiristas ou oportunistas que nada têm a ver com a realidade
objectiva e com os interesses superiores da luta e da unidade anti-fascista.
O furor fascista de Caetano
Não foi somente através da senha repressiva, mas também
por outras formas, nomeadamente pela televisão ao serviço da Pide, que o Moreira
Baptista e outros destacados fascistas vomitaram todo o seu ódio às forças
democráticas e ao Congresso que eles desejavam tivesse sido diferente. M. Caetano foi
quem maior furor revelou com o discurso de encerramento das "Conferências"
ministeriais de Tomar a que eles chamaram "congresso". M. Caetano silenciou a
grave crise em que o país se debate, mas como mistificador declara-se "liberal"
e tem o descaramento de afirmar que procura praticar a "democracia" e garantir
as "liberdades fundamentais". O furor repressivo que rodeou o Congresso e
campeia no país, mostram o abismo que existe entre as palavras e os actos do fascista M.
Caetano. Ele foi realmente sincero e verdadeiro quando ameaçou recorrer mais e mais à
repressão para poder manter-se no poder. Essas e outras afirmações de M. Caetano são
uma demonstração das contradições e fraqueza crescentes do regime.
As variadas arbitrariedades cometidas durante a campanha de
recenseamento, as comissões dissolvidas, os postos encerrados, as prisões que se
fizeram, não se limitaram a confirmar a "alergia" do regime a qualquer tipo de
eleições honestas. Elas mostraram também o medo e a fraqueza do regime. Também por
medo dos protestos que já se vinham a manifestar: o Governo viu-se obrigado a recuar e
a adiar para melhor oportunidade a proposta de lei de aumento das rendas de casa, de 4 em
4 anos. Foi igualmente uma fraqueza do regime a mudança de Aveiro para Tomar do
chamado "congresso" da UN-ANP. Foi uma prudente mudança! O confronto tornaria
demasiado evidente que o "congresso" fascista foi uma caricatura do de Aveiro.
Consolidar a unidade democrática
Existe um ascenso da luta popular de massas, ascenso que a
ditadura fascista procura contrariar intensificando a repressão. As forças democráticas
não se devem deixar intimidar, mas para enfrentar a crescente repressão e fazê-la
recuar, é indispensável consolidar a unidade e contrariar as tendências que enfraquecem
o desenvolvimento da luta de massas, ou que propiciam pretextos para desencadear acções
repressivas.
No Encontro Nacional de 4 de Março, 13 Comissões
distritais do Movimento Democrático proclamaram a sua "determinação de intervir
desde já na luta eleitoral, e o seu propósito de apresentar candidatos democráticos,
escolhidos e apoiados pelas massas populares."
Esta importante decisão, aliada à plataforma unitária
aprovada nesse mesmo Encontro (luta pelas liberdades fundamentais; luta contra todas as
formas de repressão e pela libertação dos presos políticos; luta contra a guerra
colonial, exigindo o seu fim imediato e a abertura de negociações com os movimentos de
libertação; luta contra a carestia de vida e o congelamento de salários; luta contra o
domínio dos monopólios e a submissão ao imperialismo), coloca na ordem do dia a
tarefa de aproveitar as "eleições" para desencadear uma ampla campanha
política pelos objectivos fundamentais do Movimento Democrático.
O alargamento da unidade actuante, o reforço da
organização do Movimento Democrático, a criação de comissões nas freguesias,
concelhos e distritos onde elas ainda não existam, a imposição através da acção do
direito de organização, são tarefas que se colocam a todos os democratas.
O governo teme o Movimento Democrático e o seu
desenvolvimento. Por isso, a par da repressão que intensifica, ele esforça-se também
por dividir as forças democráticas. O discurso do Presidente da C. executiva da ANP na
abertura do seu "congresso", é bem elucidativo. Ele falou nos "democratas
sinceros", aludiu aos neo-colonialistas que ele designa como respeitadores da
"integridade nacional", tudo isso com o fim de tentar impedir o alargamento da
unidade democrática. Nisso, os fascista não estão sós.
Alguns que se proclamam liberais, defendem a criação do
que chamam uma 3ª força, mas parece que o objectivo deles não é a luta contra a
ditadura fascista e pelas liberdades democráticas, mas sim a divisão e o enfraquecimento
da oposição ao regime. Outros, que se dizem "anti-eleitoralistas", opõem-se
ao alargamento da unidade e esforçam-se por paralisar o Movimento Democrático tentando
transformá-lo num "clube" de discussão e não num movimento virado para a
acção de massas.
Unificar politicamente o Movimento Democrático na base da
plataforma aprovada no Encontro Nacional de Março e da Declaração Final do Congresso,
aceitando o trabalho de massas como direcção fundamental da acção, respeitando a
diversidade de soluções orgânicas e de métodos, dos vários distritos, é o caminho
que possibilitará alargar e consolidar a unidade democrática e desenvolver o movimento
de massas.
Tal como se afirma no documento de Março da Comissão
Política do PCP "Estão criadas as condições essenciais para reforçar
rapidamente as diversas formas de organização, para consolidar uma ampla e combativa
unidade anti-fascista, para multiplicar, em todas as frentes, as lutas por objectivos
concretos, para preparar, com tenacidade, determinação e confiança uma nova grande
ofensiva contra a ditadura fascista, pelo pão, pelo fim da guerra colonial, pela
liberdade."
|