Inicio
Intervenções e Artigos
Posições Políticas sobre IVG
PCP na AR sobre IVG
Tempos de Antena do PCP
Fotos da Campanha
Apelo do Comité Central do PCP
Questões Legais sobre Referendo
 Folheto IVG -2ª Fase
Folheto em PDF
Depoimentos em video



Início arrow PCP na AR sobre IVG
Questões do emprego e o ataque aos direitos dos trabalhadores - Intervenção de Francisco Lopes na AR
Questões do emprego e o ataque aos direitos dos trabalhadores - Intervenção de Francisco Lopes na AR
Quarta, 28 Junho 2006
Interpelação n.º 6/X, sobre as questões do emprego, a crescente precariedade e o ataque aos direitos dos trabalhadores

 

Senhor Presidente

Senhores membros do Governo

Senhores Deputados

Com esta interpelação confrontamos o Governo com os problemas do emprego, da precariedade, do trabalho ilegal, da violação dos direitos dos trabalhadores.São situações preocupantes que atingem os interesses, as aspirações, as condições de trabalho e de vida, a dignidade de milhões de trabalhadores e que ao mesmo tempo afectam o desenvolvimento e comprometem o futuro do país. Portugal está confrontado com sérias interrogações quanto ao seu futuro. Aparelho produtivo debilitado, baixo perfil produtivo, elevados índices de dependência em áreas estratégicas, gritantes injustiças e desigualdades sociais, uma grave situação de desemprego, uma crescente precariedade, trabalho ilegal, baixos salários e remunerações, níveis reduzidos de qualificação, condições de trabalho degradadas, uma sistemática violação dos direitos colectivos e individuais dos trabalhadores são traços marcantes da realidade actual.
A realidade da precariedade em Portugal nas suas várias expressões constitui um dos factores mais negativos no plano dos direitos, das condições de vida e do condicionamento do progresso do país.

Mais de 750 mil trabalhadores tinham no último trimestre de 2005 contratos não permanentes, representando 19,7% do total dos contratos, uma das taxas mais elevadas da União Europeia apenas superada pela Polónia e pela Espanha. Não se trata na esmagadora maioria dos casos de necessidades pontuais ou actividades sazonais que justifiquem celebrar um contracto a termo certo, mas de postos de trabalho permanentes ocupados sucessivamente mês após mês, ano após ano por trabalhadores no ciclo contracto a termo, desemprego, contracto a termo, um processo de precariedade infernal para a vida dos trabalhadores que atinge particularmente os jovens. No primeiro trimestre de 2006 mais de 46% dos jovens com menos de 25 anos tinha contratos precários.

Acrescentam-se a proliferação das empresas de trabalho temporário, alugadoras de mão-de-obra, cuja actividade se alarga sem controlo e sem lei e as centenas de milhares de trabalhadores por conta de outrem, obrigados a recorrer aos falsos recibos verdes para poderem trabalhar.

Junta-se o aumento do trabalho a tempo parcial que abrange quase 570 mil trabalhadores. O trabalho a tempo parcial em Portugal não é uma opção voluntária de compatibilização da vida pessoal e familiar com a vida profissional, mas uma realidade que é imposta como única alternativa de trabalho e que afectando assim o nível das remunerações, empurra quem o pratica para outros trabalhos a tempo parcial e para o trabalho não declarado como forma de obtenção dum mínimo de meios de subsistência, com consequências no plano da sobrecarga horária, da dificuldade de qualificação, da produtividade do trabalho e das condições de segurança em que realizam as actividades profissionais. Um caso significativo é o dos motoristas profissionais de transportes de mercadorias ou de passageiros. O Código do Trabalho admite o trabalho a tempo parcial o que pode permitir que haja trabalhadores que após uma noite de trabalho numa actividade qualquer peguem num autocarro para fazer várias horas de condução, sem possibilidades de fiscalização e criando reais problemas de segurança.

A realidade da precariedade está associada ao grave problema do trabalho não declarado e ilegal. O trabalho não declarado e ilegal, incluindo o trabalho infantil e o tráfico de mão de obra é uma realidade difícil de avaliar na sua verdadeira dimensão, tal como a economia subterrânea em que está inserido e que vários estudos situam entre 20 a 25% do PIB. Trata-se de um forte incentivo à precariedade, à baixa produtividade e à falta de formação, bem como uma forma de debilitar o financiamento da Segurança Social e de limitar as receitas do Estado.

E o Governo, que devia cumprir a lei, dá, nesta como em outras matérias, o pior exemplo com a manutenção e promoção dos recibos verdes e de muitas outras situações precárias na Administração Pública ocupando postos de trabalho permanentes, situação que se agrava agora com a grande operação em curso de privatização, despedimentos e ataque ao vinculo publico.

O trabalho precário significa saltar de actividade em actividade sem estímulo à formação e à qualificação, sem possibilidade de verdadeiras especializações. O trabalho precário não atinge apenas os trabalhadores com pouca formação, afecta profundamente os licenciados e outros trabalhadores qualificados. O trabalho precário, significa a permanente alternância entre períodos de emprego e períodos de desemprego, reduzindo a protecção no desemprego e criando sérios prejuízos nas carreiras contributivas que vão afectar as pensões de reforma dos trabalhadores.

A precariedade dos contratos de trabalho e dos vínculos, é a precariedade da família, é a precariedade da vida, mas é igualmente a precariedade da formação, das qualificações e da experiência profissional, é a precariedade do perfil produtivo e da produtividade do trabalho. A precariedade é assim um factor de instabilidade e injustiça social e um factor de comprometimento do desenvolvimento do país.


Senhores membros do Governo
Senhores Deputados


O direito à negociação e à contratação colectiva está a ser posto em causa pela acção das associações patronais. Mas no tempo em que vivemos é verdadeiramente chocante que o Governo esteja ele próprio a assumir os piores tiques patronais. O Governo faz tábua rasa do direito de negociação na Administração Pública, e pretende destruir os acordos de grandes empresa como a Carris e o Metro, e como já tentou nos CTT e foi derrotado pela luta dos trabalhadores.

A realidade do nosso país é marcada por graves violações dos direitos dos trabalhadores.
Este é o país em que numa empresa, a Lusosider, com três dirigentes sindicais a administração na base da ameaça e da chantagem obrigou um a rescindir o contracto, conduziu outro à baixa por desestabilização emocional e o terceiro foi já alvo de dois processos de suspensão, visando assim eliminar a organização e a liberdade de acção sindical na empresa.

Este é o país em que a GNR, transformada em milícia patronal, a pedido da administração da mesma Lusosider, é chamada, interrompe uma reunião sindical e identifica dois dirigentes que ajuda a colocar fora das instalações, em clara violação da Constituição e da Lei, como o tribunal posteriormente reconheceu. Dezenas de outras situações se verificam, na REPSOL, nos hotéis Tivoli e Marriot, mas nada acontece, a impunidade é a regra, a insensibilidade do Governo é total, a legitimar as próximas iniciativas repressivas.

Este é o país em que dirigentes, delegados sindicais, membros de comissões de trabalhadores, trabalhadores em geral, são alvo de processos de despedimento e de processos de suspensão que lhes retiram o salário durante meses, enquanto as contestações se arrastam nos tribunais.

Perante estas grosseiras violações de direitos, o Governo lava as mãos e não garante a eficácia da Inspecção Geral do Trabalho. Segundo um levantamento feito pela União dos Sindicatos de Lisboa desde 1999 ficaram sem resposta 554 solicitações de intervenção. Entre os casos não respondidos estão 46 situações de não pagamento de salários, 8 encerramentos de empresas, 86 violações de horários de trabalho e 25 casos de violação do direito de greve.

E quanto à justiça, o Governo remete tudo para os tribunais, mas não lhes dá os meios necessários para uma justiça célere, mantêm custas judiciais e da acção executiva a valores proibitivas e apoios judiciários irrisórios que impedem em muitos casos o acesso à justiça.

A realidade das empresas e locais de trabalho é difícil para muitos trabalhadores. Ainda recentemente recebemos uma carta de uma trabalhadora a informar da situação da empresa onde trabalha.

Dizia: “Trabalhamos sábados, domingos e feriados. Trabalhámos no dia 10 de Junho. As horas são pagas sempre a 2,25 euros de noite, dia ou feriado. As minhas colegas de uma secção próxima da minha, foram trabalhar um Domingo das 21horas às 3 horas de Segunda e às 8horas da manhã já lá estavam novamente.
Prometeram-lhes que lhes davam uma tarde livre e pagavam, agora negam. Nós mães temos dias que nem os filhos vimos.
Será isto normal.
E termina dizendo
“Não me identifico com medo.”

É uma carta entre muitos milhares de outras.
Este é o quadro, de precariedade, de arbitrariedade, de violação de direitos elementares, que impõe reforço das garantias legais, mecanismos efectivos de aplicação dos princípios constitucionais, esquemas de apoio às vítimas destas violações.
Pois bem, o que é que o Governo faz, exactamente o contrário. Vai fugindo ao compromisso de alterar os aspectos mais negativos do Código do Trabalho, designadamente quanto à contratação colectiva.
Mas, como se isso já não fosse suficientemente grave, contra todas as evidências, procura passar a imagem que em Portugal a legislação de trabalho é aquela que mais protege os trabalhadores contra o despedimento individual. Esta tese falsa não é mais do que a preparação do Governo PS para introduzir alterações ao Código do Trabalho no sentido de facilitar os despedimentos individuais sem justa causa o que é de todo inaceitável.

Essa é a concepção que em vez de olhar o futuro pretende restaurar os critérios das relações laborais do Século XIX e adoptar modelos ultrapassados de mais de um século.

Pela parte do PCP, aqui estamos a afirmar o caminho que Portugal precisa, baseado no desenvolvimento, numa perspectiva da economia ao serviço do ser humano, no valor intrínseco do trabalho com direitos.

Afirmamos a necessidade de uma política que aposte no desenvolvimento económico e no combate ao desemprego.
Afirmamos a necessidade da aplicação do principio que a um posto de trabalho permanente deve corresponder um vinculo de trabalho permanente, da alteração das malfeitorias do Código do Trabalho, nomeadamente da revogação das normas que penalizam os jovens e os desempregados de longa duração nos contratos a prazo.
Afirmamos a necessidade da eliminação das formas de trabalho não declarado e ilegal, incluindo o trabalho infantil e o tráfico de mão-de-obra. Afirmamos a necessidade do estabelecimento de vínculos efectivos para os trabalhadores que falsamente estão a recibos verdes, do combate ao incentivo do trabalho a tempo parcial sem alternativa, do combate à praga do trabalho temporário.
Afirmamos a necessidade do respeito pelos direitos individuais e colectivos dos trabalhadores.
Afirmamos a necessidade do agravamento das coimas e de outras penalizações pela violação dos direitos dos trabalhadores, do reforço dos meios e da eficácia da Inspecção Geral do Trabalho, da acção de outras estruturas de inspecção e da adopção de medidas que permitam de facto o acesso dos trabalhadores à justiça.

Com estes objectivos o Grupo Parlamentar do PCP apresentou e apresentará novas iniciativas legislativas.


Senhores membros do Governo
Senhores Deputados


O combate à precariedade, ao trabalho não declarado e ilegal deve constituir uma política do Estado, como constitui o combate ao trabalho infantil, que não tendo sido eliminado foi claramente reduzido.

Uma política de Estado que abranja as mais diversas áreas e estruturas, mas que aconselha e justifica a criação de uma Comissão Nacional contra a precariedade e o trabalho não declarado e ilegal, que acompanhe a realidade, centralize informação e dinamize a criação de uma forte sensibilização social para enfrentar a praga da precariedade e do trabalho não declarado e ilegal.

Uma flagelo que mina os direitos democráticos, as condições e a dignidade no trabalho, a vida pessoal e familiar e compromete a qualificação, a valorização da experiência, a elevação do perfil produtivo do país, as receitas públicas, o futuro da segurança social. Uma praga que tem como principais promotores aqueles que tudo sacrificam ao lucro e aqueles que erradamente confundem precariedade com eficiência económica e produtividade e que por isso a defendem ou toleram.

O caminho da política das últimas décadas falhou. É preciso uma ruptura com essa política, um novo rumo para o país que dê resposta aos problemas, afirme a esperança e concretize um futuro de democracia, desenvolvimento, justiça social e qualidade de vida. É isso que defendemos e propomos.

(…)

Sr. Presidente,
Sr. Ministro,

Expusemos aqui uma situação particularmente grave, que tem a ver com as características do mercado de trabalho, com as características do emprego em Portugal e com o grau extremamente elevado de precariedade dos vários níveis de trabalho não declarado e ilegal. Este é um grande problema social e económico para o futuro do País.

O Sr. Ministro, na intervenção que fez, fugiu, no essencial, a este tema.
 
Relativamente à acção do Governo, neste ano e meio, não há registo de qualquer conjunto de medidas significativas que permitam enfrentar este flagelo.

Mas, para além do que não está feito — e devia estar, para quem invocou uma preocupação social à cabeça da sua política —, as medidas hoje aqui anunciadas são apenas referências genéricas e não um programa real que ataque este problema com que se depara o nosso país.

Mais do que isso, algumas das referências que fez levantam-nos a dúvida se, em nome da adaptação e das alterações das leis do trabalho, o que está previsto não é ainda mais fragilização e mais precariedade.

 Assim não se responde às novas realidades. Este caminho vai buscar as piores receitas do passado — não apenas do século passado, mas de séculos anteriores — para aplicar às condições de hoje, ali ou acolá, com mais ou aquele elemento de conteúdo tecnológico. Mas esse conteúdo tecnológico é para escamotear a profunda injustiça das relações sociais e das relações laborais.

Já agora, gostaria que o Sr. Ministro nos dissesse o que é que o Governo se propõe fazer em relação a uma questão central. Tem-se falado, e ainda hoje foram apresentadas algumas, de iniciativas que facilitam a comunicação por via electrónica. Evidentemente, a comunicação por via electrónica também dá para alguns trabalhadores com trabalho temporário receberem numa sexta-feira, por SMS, indicação que deixam de ter trabalho na segunda-feira seguinte. Portanto, dá para tudo!

No maior estaleiro do nosso país, os Estaleiros da Lisnave na Mitrena, fomos até confrontados com uma realidade de milhares de trabalhadores dependerem de empresas um pouco atípicas, empresas de vão de escada transformadas em empresas de mala de automóvel, porque é aí que os trabalhadores têm a sua relação contratual com os patrões que lhes pagam no fim da jornada de trabalho as verbas correspondentes a esse dia.

Ora, essa situação coloca uma questão. Muitas vezes se invoca que o Governo não tem instrumentos e que as empresas tem a sua margem de decisão. Mas há um acordo entre a Lisnave e o Estado português, de 1997, que aponta para a ideia de um compromisso de empregar 1339 trabalhadores no estaleiro. A actividade de reparação naval tem crescido extraordinariamente. A Lisnave tem lucros. Sabe quantos trabalhadores tem a Lisnave neste momento? Pouco mais de 400. A GESTENAVE tem também pouco mais de 400.

Portanto, há aqui uma grande margem para que o Governo intervenha de forma a que se cumpra este contrato com o Estado português, para assim responder aos trabalhadores da GESTENAVE e, ao mesmo tempo, intervir de forma a eliminar uma precariedade inadmissível que, nalguns casos, leva a que entre 3000 a 3500 trabalhadores daquele estaleiro trabalhem sem direitos e de forma atípica.

Esta é uma questão central e concreta que pode definir aqui a forma como se tratam os problemas, para além das linhas gerais, umas interessantes e outras sem qualquer interesse, que são extremamente preocupantes, nomeadamente aquelas que perspectivam uma alteração da legislação do trabalho.



 

Jornal «Avante!»
«O Militante»
Edições «Avante!»
Comunic, a rádio do PCP na Internet