Pensamos não errar se
dissermos que a questão da construção de uma alternativa
democrática à política de direita e aos sucessivos governos
que desde há 20 anos a impõem ao país se encontra seguramente
entre as que mais mobilizaram o interesse, as interrogações e
atenção do colectivo partidário em toda a fase inicial da preparação deste
nosso Congresso, e mesmo já antes dela se ter iniciado.
É inteiramente natural que assim tenha sido. Desde logo, porque,
com esta ou com outra formulação, a alternativa democrática é
desde há muito um objectivo político crucial do nosso Partido e
um ponto de unificação política dos múltiplos e
diversificados combates que travamos, não de uma forma separada
ou desconexa, mas de uma forma articulada e coerente com os
nossos outros objectivos de maior dimensão histórica como são
a conquista de uma democracia avançada para Portugal e a construção
de uma sociedade socialista. Mas também e sobretudo porque os dados políticos
emergentes das últimas eleições legislativas — traduzidos
pelo elemento fundamental de à derrota do PSD se ter seguido a
continuação da política de direita por um governo do PS —
apelarem imperativamente a uma nova abordagem do problema da
alternativa democrática e sobretudo do caminho para a alcançar.
É óbvio que, quando falamos de alternativa democrática, falamos
de duas coisas inseparáveis mas, apesar de tudo, de diferente
natureza. Falamos de uma nova política, de um política de
esquerda, de uma política alternativa. E falamos de uma
alternativa política, isto é de uma alternativa no plano das
soluções de governo. Sem uma nova política, pode haver
variantes nos arranjos parlamentares e governativos, mas não
há a alternativa política por que lutamos. Em
contrapartida, sem uma alternativa no plano das soluções
governativas, a nova política que defendemos é uma bandeira justa
e essencial que pesa na evolução da situação nacional mas
não ganha nem a dimensão nem a eficácia de política de Estado.
No quadro do regime constitucional em que intervimos, a concretização
da alternativa democrática — entendida como a de uma
solução governativa empenhada em realizar uma nova política
— tem decisivamente que ver com as instituições, com a
orientação, o peso e influência relativa das diversos partidos
e com a correlação de forças existente entre eles.
É aqui que, em grande medida, fica desde logo definida a exigência,
a dimensão, a complexidade, e porque não dizê-lo as
dificuldades, da luta por uma alternativa democrática.
A abordagem constante da Proposta de Resolução Política parte
de três pressupostos essenciais e incontornáveis: o primeiro
é que o claríssimo enfeudamento do PS à política de direita
não é um episódio conjuntural mas o culminar de toda uma trajectória
e uma opção consolidada e estruturante da sua orientação e
programa político; o segundo é que, em consequência,
seria pura perda de tempo e pura ilusão ter qualquer esperança
de um próximo ou voluntário abandono pelo PS da política de direita;
o terceiro, em consequência dos dois anteriores, é que a construção de uma
alternativa democrática só será possível com uma sensível alteração
da correlação de forças concretizada através de uma grande
e marcante ampliação da influência social, política e
eleitoral do PCP.
A Proposta de Resolução Política redesenha e enriquece assim
a ideia fundamental — que nunca esteve esquecida nas nossas
análises anteriores — de que a luta pela alternativa
não pode repousar nas expectativas sobre um eventual diálogo e
entendimento entre forças políticas, mas tem antes de se
concentrar na tarefa central e prioritária do reforço do PCP
como elemento decisivo e determinante de uma futura viragem política.
E estas tarefas e objectivos claramente indissociáveis — reforço
do PCP e construção da alternativa — exigem a firme
compreensão de que a sua realização depende não de receitas
mágicas ou de «golpes de asa» de efeitos instantâneos e
milagrosos, mas de uma visão rasgada de um processo de avanço
do PCP que seja sustentado por progressos e êxitos em múltiplas
direcções de trabalho.
E nessas direcções de trabalho adquirem uma importância primordial
o reforço da presença e intervenção do PCP na sociedade
portuguesa, da sua organização, iniciativa e acção política,
forjando laços mais profundos com os trabalhadores e com todos
os cidadãos que aspiram a outro rumo para Portugal ; o reforço
da contribuição dos comunistas para o fortalecimento dos
movimentos e lutas de massas e das organizações sociais e
também a sua contribuição para que a movimentação social expresse
e dê força a um movimento social de reclamação por uma nova política; a
dinamização pelo PCP de um vasto movimento de debate e acção
comum com correntes e sectores democráticos e organizações sociais, com
todos os cidadãos que rejeitam o pântano das sombrias alternâncias
e que querem dar corpo a um esperançoso sobressalto de indignação,
de novas ideias, de construção de um futuro diferente; a dinamização
da CDU- valioso espaço de entendimento e trabalho solidário dos
comunistas com o PEV, a ID e milhares de independentes; uma renovada
capacidade de comunicação do PCP com a sociedade portuguesa; e como
grande eixo unificador da nossa intervenção uma constante e
audaciosa afirmação do valor das propostas e do projecto do PCP
e da sua aptidão para o exercício de responsabilidades governativas.
A luta por alternativa democrática exige ao mesmo tempo uma
batalha sem tréguas contra tudo o que é fomentado e está
organizado para manter duradouramente a política de direita e os
interesses do grande capital — desde a separação, na
leitura da realidade, entre os problemas sociais e as suas causas
e responsáveis políticos até ao descrédito da «política» para supremo
beneficio e impunidade das ideias dominantes ; desde as pressões para o
isolamento dos cidadãos pela via da descrença na acção colectiva até aos
atentados ao pluralismo em favor da propaganda de uma pretensa «bipolarização»
entre o PS e o PSD.
E, neste quadro da vasta batalha de esclarecimento que nos cumpre
travar, longe de qualquer atitude de recriminação, encontramos
as formas adequadas de confrontar os eleitores com as
responsabilidades das suas opções.
E isto porque devem a si próprios uma interrogação todos aqueles portugueses
que na hora dos votos pensam no PS, no PSD ou no PP, mas depois,
na hora das aflições, no intervalo entre eleições, é no PCP
que pensam, é para o PCP que se voltam e é com o PCP que contam
para a solidariedade e a luta em defesa dos seus interesses.
E essa serena interrogação só pode ser sobre qual é a lógica
de continuarem a votar nos responsáveis pela política de que
depois amargamente se queixam, e de, não votando no PCP lhe
estarem a retirar a força que melhor lhe permitiria ajudar os
seus interesses e aspirações.
A alternativa democrática é certamente uma urgência nacional.
Mas o que a pode fazer passar de esperança a realidade será a
nossa firme determinação de por ela lutarmos o tempo que for
preciso.