1. As declarações da Sorbonne, Bolonha, Praga e Berlim visam
condicionar o ensino superior aos interesses do grande capital financeiro, bem
como a progressiva privatização do ensino superior público.
2. O seu objectivo é que as elites intelectuais e técnicas tão
necessárias ao desenvolvimento e bem-estar das populações
coincidam com as elites económicas, ou seja que o acesso ao conhecimento
seja um privilégio dos ricos.
3. A estratificação do Ensino Superior a que insidiosamente conduz
o “Processo de Bolonha” reflecte uma recusa em fornecer a formação
integral que prepare o cidadão para assumir uma posição
consciente no controlo da economia e, ao mesmo tempo, que lhe dê cultura
e capacidade profissional para as tarefas do desenvolvimento.
4. Com a implementação deste “processo”, os que
apenas venham a concluir o primeiro ciclo e que serão aqueles com menos
poder económico, só terão acesso aos conhecimentos técnicos
básicos que lhes permitam servir os interesses do grande capital. Ficará
para os outros, para os que tiverem poder económico para passar ao segundo
ciclo, o acesso à formação integral, à Cultura e
à Ciência.
5. Assim, a serem implementados no quadro político actual os princípios
enunciados nas declarações da Sorbonne, Bolonha, Praga e Berlim,
será de esperar que o acesso a cada grau seja economicamente condicionado,
em vez de o ser pelas reais aptidões e competências dos estudantes
que a eles tentem aceder. Será de esperar que, de todos que completem
o primeiro ciclo com «um nível de habilitações apropriado
para ingressar no mercado de trabalho Europeu», apenas regressem ao Ensino
Superior para a obtenção do segundo grau os filhos dos ricos.
Apesar das sucessivas declarações dos ministros europeus da educação
serem sempre omissas no que se refere ao financiamento, pelos indícios
que sobejamente temos nas nossas instituições de Ensino Superior
público dos custos de inscrição e frequência das
agora chamadas pós-graduações, será de esperar que
os custos para a larga maioria dos estudantes sejam proibitivos.
6. Mantém-se e agrava-se assim a limitação do acesso
ao ensino superior, em particular aos seus ciclos mais avançados, tornando-os
apenas uma prerrogativa de uma cada vez mais reduzida percentagem de estudantes.
7. Existe assim uma séria consequência de discriminação
classista no acesso aos graus mais diferenciados do ensino superior. A discriminação
económica é a mais inaceitável das injustiças, no
que respeita ao ensino. Daí que o financiamento do ensino como direito
universal seja um assunto crucial e pungente.
8. O aparelho escolar que é dos mais importantes serviços públicos
de um Estado, é chamado, pelas declarações dos Ministros
da Educação da Europa, a melhor servir a competição
económica capitalista, formando mais adequadamente os trabalhadores para
essa economia e condicionando e estimulando o consumidor.
9. Com a anunciada implementação do “Processo de Bolonha”
subsistirá e agravar-se-à a massificação da ignorância.
Haverá uma reconversão, seleccionando segundo critérios
de classe, a fracção do conhecimento que é para ser massificado
e aquela que é para ser elitizada.
10. Da forma e no contexto em que é concebida, a estratificação
em ciclos, e em especial as reciclagens de que os trabalhadores ficarão
mais dependentes ao longo de toda a sua vida permitiram, também, acelerar
a privatização do ensino. Quanto mais os cursos forem estratificados,
mais fácil se tornará o “fabrico” de tais pacotes,.
11. Apesar da declaração de Praga (2000) proclamar o Ensino
Superior como “ bem público “, o “Processo de Bolonha”
contém os ingredientes bastantes para configurar a destruição
da escola pública e da sua vocação e ambição
democráticas. E o empobrecimento do conteúdo e missão do
ensino superior.
12. Nestas condições, as declarações da Sorbonne,
Bolonha, Praga e Berlim são, como matéria de facto, uma verdadeira
declaração de guerra do Fundo Monetário Internacional,
do Banco Mundial e da Organização Mundial de Comércio ao
sistema de ensino superior europeu, a pretexto de uma «optimização
do mesmo, por forma a responder aos desafios da globalização».
13. Com estas declarações pretendem os eurocratas que o ensino
continue ao serviço da burguesia, e cada vez mais ao serviço das
suas novas prioridades. Denotam um redobrado esforço de reestruturação
e de adaptação do aparelho do ensino às novas realidades
capitalistas.
14. Em Portugal este processo avançou num quadro de profundo desrespeito
pela participação dos professores, estudantes, funcionários
e instituições. A subserviência do Governo Português
face àqueles objectivos, tem Estado patente na política desenvolvida
para o ensino superior. Desta forma aprofunda-se a elitização,
diminui a qualidade do ensino e da investigação, descaracteriza-se
o ensino superior Português e reduz-se claramente a soberania do nosso
sistema educativo e do nosso País.
15. Mas o Ensino Superior deverá adaptar-se a outras realidades. Às
perspectivas que se abrem de uma sociedade onde todos os cidadãos tenham
o seu lugar, em que os direitos de cada um sejam considerados, em que o bem-estar
de todos possa ser assegurado.
16. O ensino superior na Europa deve bater-se por contrariar esta tendência.
Primeiro, assumindo os custos de formação integral dos estudantes
em todos os ciclos de ensino. Segundo, assumindo para todos os que pretendam
ultrapassar o primeiro grau mas que para tal não tenham capacidade económica,
a criação de condições de vida dignas e independentes,
sem agravamento da situação económica do agregado familiar.
Terceiro, reivindicando o financiamento a que tem direito como serviço
público que é, sem descurar formas complementares de financiamento,
nomeadamente auto-financiamento.
17. O ensino superior público deve pugnar sempre, em qualquer ciclo
de ensino, por programas curriculares estruturantes que preparem os seus formandos,
não só para a vida produtiva, mas também para a cidadania
plena e intervenção transformadora na sociedade.
Assim, o Encontro Nacional do Partido Comunista Português sobre
a situação na educação, reunido em Lisboa a 23 de
Outubro de 2004:
1. Exige uma profunda reconfiguração do ensino público
Português que habilite os estudantes a serem os criadores de um país
avançado, consciente, democrático e soberano e considera que para
tal, é fundamental um ensino ligado à vida, que ensine a questionar,
a duvidar e a partilhar.
2. Considera que o ensino superior deve formar seres integrais, muito para
além da mera coisa económica, conjuntural e imediatista, coisificada,
sem dignidade e sem perspectiva. Considera que o ensino superior deve ajudar
a emancipar, deve vincular-se a uma economia de sentido diferente, o que implica
um treino e educação muito para além do aprender a fazer,
mecanicista e tecnológico, e obriga à mais elevada cultura integral
do indivíduo.
3. Considera que o denominado “Processo de Bolonha” é um
instrumento da contra-reforma neoliberal do ensino superior público contra
os reais interesses e bem-estar do povo Português e, por isso, alerta
para os perigos e graves consequências da sua implementação
em Portugal e apela ao seu combate.
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