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A proposta de lei enviada pelo Governo à
Assembleia da República, já em pleno período estival, visando
a rápida alteração da Lei de Bases do Sistema Educativo,
constitui uma iniciativa particularmente desadequada, cujo
sentido pouco responsável tem vindo a tornar-se mais evidente
nas últimas semanas.
A Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) é o
documento legislativo fundamental, concretizador dos princípios,
valores e orientações de política educativa democrática
consagrados na Constituição. A sua discussão decorreu há uma
década num quadro muito alargado, envolvente de todos os
protagonistas da área educativa e da opinião pública em geral,
que culminou com a sua aprovação através de um consenso
político muito alargado alcançado na Assembleia da República.
Por isso não pode deixar de ser considerado como muito negativo
o facto de o Governo não ter promovido qualquer avaliação
séria e de conjunto da Lei de Bases do Sistema Educativo e sem
qualquer debate prévio ter tentado precipitar alterações
pontuais, mas com profundas implicações.
É de lamentar a negligência do Governo quanto
à realidade e às exigências pedagógicas do ensino. Em
relação às alterações à LBSE propostas respeitantes ao
sistema de graus académicos e ao sistema de formação inicial
de professores, não tendo sido criados os requisitos de
financiamento, de estrutura curricular e de duração dos cursos,
de qualificação científica e pedagógica do corpo doente, é
evidente que o que verdadeiramente move o Ministério da
Educação é o propósito economicista do encurtamento e
embaratecimento da formação inicial de professores. Este
propósito surge nitidamente consubstanciado em dois pontos: na
tentativa de redução dos cursos de bacharelato para dois anos
(o que constitui um recorde europeu) e das licenciaturas para o
ensino para quatro anos; e no apontar para o desenvolvimento de
um perfil profissional generalista, abrangente do 1º, 2º e 3º
ciclos, em que o professor apesar de não dispor de
especialização para nenhum ciclo de ensino pode, sem tal
especialização, ser convocado para ministrar aulas em qualquer
um deles.
A Comissão Nacional do Ensino Superior do PCP reclama que o Governo
retire a proposta de alterações da Lei de Bases do Sistema Educativo de modo
a repor condições favoráveis para um alargado debate em torno dessa legislação
básica, para a adequada ponderação de eventuais alterações, e o estabelecimento
de consensos alargados. E saúda vivamente os estudantes do ensino superior,
das universidades e das ESE's, que vêm dando passos no sentido de ultrapassarem
os factores de divisão provocados pela iniciativa legislativa do Ministério
da Educação e de estabelecerem uma convergência positiva em torno de uma reivindicação
que a todos deve unir - uma formação de professores de qualidade para um ensino
de qualidade.
A Comissão Nacional do Ensino Superior do PCP
vem afirmar a sua postura básica sobre o seguinte conjunto de
questões:
- a formação inicial de professores de
qualidade constitui uma questão de importância crucial
na abordagem do problema da qualidade da educação e do ensino e
do sucesso escolar no nosso país; isto liga-se com os
requisitos formais (currículos, duração de cursos) e com as
condições mínimas que todos os estabelecimentos de ensino
superior em que tenha lugar essa formação inicial deverão
possuir no que respeita a financiamento, ao corpo docente e à
efectiva qualidade científica e pedagógica dos cursos que
ministram;
- o grau de licenciatura deve ser
considerado no futuro o requisito mínimo para o ingresso na
profissão docente, desde a educação pré-escolar até ao
ensino secundário;
- a indispensável qualificação e
valorização profissional de todos os docentes,
independentemente do nível ou grau em que ensinem, deve ser
acompanhada pelo desenvolvimento da especialização de
professores para cada ciclo, a par do estabelecimento dos
requisitos objectivos em que a sua mobilidade possa ter lugar;
- a avaliação e a melhoria das formações
ministradas no ensino superior, quer nos politécnicos quer
nas universidades, estabelecimentos públicos e privados,
constituem um objectivo fundamental em relação a todo o
sistema. Os requisitos no que respeita aos currículos, à
duração dos cursos, à qualidade do corpo docente, à
avaliação do ensino, devem ser os únicos factores que
determinam a capacidade de um estabelecimento do ensino superior,
universitário ou politécnico, atribuir graus académicos aos
diferentes níveis.
A Comissão Nacional do Ensino Superior do PCP
relembra as propostas relativas à rápida expansão da
educação pré-escolar pública e gratuita, à melhoria do
ensino obrigatório e à urgente preparação do alargamento da
escolaridade obrigatória para 12 anos, e sublinha as acrescidas
necessidades que elas colocam no terreno da formação de
docentes.
A Comissão Nacional do Ensino Superior
sublinha também a necessidade de serem dados passos no sentido
de um único grau inicial no ensino superior, independentemente
da natureza da instituição que o confere, desde que estejam
salvaguardados limiares universalmente aplicáveis quanto ao
acesso, à escolaridade mínima, qualificação do corpo docente,
e reconhecimento do estabelecimento de ensino. E liga a adopção
desta medida com a perspectiva, há muito defendida pelo PCP, de
integração do ensino politécnico e do ensino universitário
num único sistema de ensino superior, em cujo seio coexistam,
sem injustas discriminações, diferenciadas formas de
aprendizagem, de conteúdos e de percursos escolares.
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