Jerónimo de Sousa
Mensagem de Ano Novo por um Mundo melhor, de Paz e Progresso
Lisboa, 1 de Janeiro de 2006

 


No início deste novo ano desejo transmitir aos trabalhadores, ao povo português e, naturalmente, aos militantes do PCP e aos apoiantes da minha candidatura à Presidência da República, uma renovada mensagem de esperança e de confiança.

Uma esperança que não repousa no atentismo, que não delega, pelo contrário resulta, das capacidades e responsabilidades que, cada um individualmente e todos como um colectivo feito povo, temos na transformação do país e do mundo em que vivemos.

Uma esperança que não ficando à espera e transformando-se em acção, trabalho e luta tem na minha candidatura um colectivo de mulheres, homens e jovens determinados em levar por diante a colossal tarefa de fazer dessa esperança e do sonho colectivo a nossa realidade e a vida do nosso povo.

Uma mensagem de esperança, de determinação e de confiança que não esquece, pelo contrário nasce e parte da realidade do país e do mundo em que vivemos e que, para alguns, é cada vez mais difícil de enfrentar pois é resultado da sua acção, das suas políticas e ideologias.

No começo de mais um ano, deste início do Século XXI, o mundo em que vivemos é cada vez mais marcado por uma profunda e violenta contradição entre o potencial de desenvolvimento encerrado nas capacidades humanas, sociais, científicas e técnicas da humanidade e a incapacidade do sistema em resolver as mais profundas e gritantes desigualdades, em erradicar, ou no mínimo diminuir, a amplitude de fenómenos que configuram uma autêntica catástrofe social que empurra para as fronteiras entre a subsistência e a morte imensas massas da população mundial.

Assinala-se neste período um ano sobre a terrível catástrofe que assolou no início de 2005 vários povos do continente asiático, o chamado Tsunami. Os “media” assinalaram justamente o sofrimento de então e a luta actual daqueles que ainda não refizeram a sua igualmente justo e necessário relembrar (e cito, de 2005, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) que a cada 3 segundos desta minha declaração morre uma criança no mundo por razões evitáveis – o que, a título de curiosidade, e à escala do tsunami asiático, corresponderia a termos assistido este ano a 36 fenómenos equivalentes. É justo e necessário relembrar os mais de dois mil e quinhentos milhões de seres humanos que sobrevivem com menos dois dólares por dia; os mil milhões de pessoas que não têm acesso a água potável; os dois mil e seiscentos milhões de homens, mulheres e crianças que não têm acesso a saneamento básico, os dois milhões de portugueses que vivem na pobreza; ou ainda os 115 milhões de crianças que por não terem acesso à educação básica serão possivelmente condenados à pobreza e à exploração. É um autêntico dilúvio social que inunda de morte e pobreza países asiáticos, africanos e latino-americanos e as camadas mais pobres da população em todo o mundo. Mas esta catástrofe não é inevitável, não é imprevisível. Pelo contrário é fruto de políticas que aplicam os dogmas da globalização capitalista e a ideologia assente na exploração e na injusta distribuição da riqueza mundial, expressa de forma elucidativa no facto de 40% da população mundial deter apenas 5% dos rendimentos mundiais ou de os 500 homens mais ricos do mundo deterem hoje rendimentos equivalentes aos de 416 milhões de pessoas. Só em Portugal os 10% mais ricos dispõem de 30% do rendimento nacional, enquanto que os 10% mais pobres dispõem de apenas 2% desse mesmo rendimento.

Ideologia, políticas e políticos que confrontados com os limites do sistema capitalista, ensaiam respostas de força às crescentes contradições e prováveis explosões sociais. Respostas essas assentes na guerra, na militarização das relações internacionais e na adopção de medidas que sustentadas num falso combate ao real problema do terrorismo, apostam numa deriva securitária que empurrando os povos para uma falsa dicotomia entre liberdade e segurança tenciona condicionar e mesmo criminalizar todos aqueles que usando da liberdade e dos direitos e garantias conquistados com décadas de lutas sociais libertadoras exigem e lutam hoje por uma ruptura com este sistema retrógrado e com estas políticas.

Mas aqueles que, em nome da democracia e da segurança colectiva, prosseguem tais políticas são os mesmo que já não conseguem esconder a sua face antidemocrática, militarista e mesmo obscura. São os mesmos que não conseguem explicar porque na sequência da chamada guerra contra o terrorismo o mundo está hoje mais inseguro, mais perigoso, mais injusto. São os mesmos que não podem, ou não querem, explicar porque por cada dólar gasto em ajuda ao desenvolvimento são gastos 10 dólares em despesas militares.

O ano que agora finda foi profícuo em provas de que aqueles que sempre lutaram em Portugal e em todo o mundo contra a guerra e o militarismo tinham razão e que aqueles que em Portugal e no Mundo colaboraram e apoiaram a guerra estão hoje derrotados, ética e politicamente, e a braços com embaraços e “desculpas” de mau pagador. Àqueles que hoje, na Europa e também em Portugal, sacam da cartola o reaccionarismo para desviar as atenções das conivências e apoios, àqueles que sobrevoam o globo com prisioneiros transportados para centros de tortura e bombardeiam civis no Iraque com napalm e fósforo branco, ou ainda que fecham os olhos ou apoiam as atrocidades contra povos como o Palestiniano ou o povo Saharaui. A esses apenas dizemos que a realidade está a provar o lado em que cada um está. Com muita serenidade combateremos firmemente os ataques que a nós são dirigidos, porque esses são combates que ao longo da história sempre soubemos travar ao lado daqueles que mais sofrem com a exploração e a guerra e que, nos mais diversos movimentos sociais, prosseguem a luta por um outro Portugal democrático e soberano, de justiça social e por outro mundo possível de paz e progresso para todos os povos.

Nas próximas eleições de 22 de Janeiro os trabalhadores e povo português serão também chamados a fazer esta escolha. A escolha entre aqueles que falando de democracia apostam na restrição das liberdades, direitos e garantias e aqueles que vêm na liberdade, na solidariedade e na justiça social os eixos centrais da resolução dos conflitos e dos principais problemas da humanidade. A escolha entre aqueles que em Portugal apostam na guerra, no militarismo, na submissão do nosso país aos interesses das grandes potências e no fortalecimento ou criação de bloco político-militares e aqueles que respeitando e defendendo a letra e o espírito do grande pacto nacional que é a nossa Constituição defendem para Portugal uma política externa independente dos interesses imperialistas que busque uma nova ordem mundial assente na paz, na cooperação, no progresso, na preservação do planeta em que vivemos, com a infinita riqueza e diversidade das suas faces natural e humana. Uma política de relações internacionais do nosso país que defendendo a soberania e a independência da nossa pátria contribua para a dissolução de obsoletos blocos político-militares e contrarie a tendência de transformação da Europa numa nova potência imperialista armada que em articulação com os EUA visa prosseguir uma política de exploração dos povos do mundo e a adopção de medidas que configuram autênticas regressões civilizacionais e democráticas.

E a situação no continente em que o nosso país se insere demonstra bem como vale a pena lutar. O ano de 2005 ficará marcado para a história como o ano em que os povos da Europa travaram o passo à tentativa de institucionalização do neoliberalismo, do federalismo e do militarismo na Europa. Cabe agora ao nosso povo, em cooperação com os demais povos da Europa, prosseguir a luta contra a tentativa em curso de por via da política de factos consumados instituir aquilo que foi derrotado nas urnas, e de avançar na batalha por um outro rumo para a União Europeia que exige primeiro que tudo uma ruptura com os dogmas que presidem à actual chamada “construção europeia”.

Brecht escreveu “que nada seja tido por natural neste tempo de confusão sangrenta, de desordem ordenada, de arbitrariedade sistematizada, de humanidade desumanizada, para que nada disto se mantenha”.

Os desafios colocados hoje aos trabalhadores e povos do mundo são grandes e de grande responsabilidade. A história prova que a ideologia e as políticas dominantes não são inevitáveis. Por não o serem são hoje alvo de uma tenaz luta por parte daqueles que não perdem a esperança e seguem determinados os trilhos da paz e do desenvolvimento solidário e sustentável. São hoje mais visíveis os exemplos de que há saídas para a actual situação e de que apesar das dificuldades e do enorme esforço colectivo que será necessário fazer para inverter as actuais tendências negativas é possível avançar rumo a mundo mais justo, mais fraterno, democrático e de paz.

Como referi no compromisso da minha candidatura “Alguns dos que têm lutado pela transformação do mundo utilizam a palavra utopia. Literalmente, essa palavra significa algo que não tem lugar nem tempo. Não é essa a nossa concepção. Temos um lugar e um tempo. Somos profundamente deste país, e somos do planeta que partilhamos com toda a humanidade. Somos do tempo presente, e somos, com os homens, mulheres e jovens do povo a que pertencemos, parte integrante do futuro. É em nome deste lugar e da esperança e da luta por esse futuro que fazemos o nosso caminho comum”

Tenho grande confiança na capacidade dos povos de tomar nas suas mãos a construção do presente e do futuro da humanidade. É por isso que, apesar das dificuldades, com muita esperança desejo a todos um Ano Novo melhor.