Declaração de Jerónimo
de Sousa, Candidato à Presidência da República |
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Ao Presidente da República cabe um importante papel na garantia e promoção da coesão social o que não dispensa o contributo de um forte Sistema Público de Segurança Social como instrumento de redistribuição da riqueza produzida avaliando, em cada momento, se os preceitos constitucionais estão a ser cumpridos e, desde logo, “o direito de todos à segurança social”, o direito de protecção “de todos os cidadãos na doença, velhice, invalidez, viuvez e orfandade, bem como no desemprego e em todas a situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade de trabalho”. E, igualmente, avaliar se o Estado está a cumprir o seu papel primordial no que respeita à sua incumbência constitucional de “organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social unificado e descentralizado com a participação das associações sindicais e outras organizações representativas dos trabalhadores e das associações representativas dos demais beneficiários”. Ao Presidente da República não cabe fazer leis. Mas cabe-lhe a indeclinável tarefa de assegurar a salvaguarda do cumprimento do espírito e da letra da Constituição da República. E, deve fazê-lo. Uma das formas é através das prioridades que assume no exercício de uma magistratura de influência junto dos agentes políticos, sociais e culturais e da sociedade em geral fomentando uma reflexão sobre o presente e o futuro da segurança social: se a evolução verificada nos aproxima ou nos afasta do cumprimento dos direitos constitucionalmente consagrados e sobre os modelos que devem ser adoptados para salvaguardar a sua sustentabilidade financeira no respeito pelos direitos no presente e para o futuro. Não são, por isso, indiferentes os conteúdos e natureza das diversas alterações que têm vindo a ser produzidas no âmbito da segurança social, nomeadamente as alterações à lei de bases de segurança social e as alterações efectuadas nos critérios de atribuição de prestações sociais. Como, igualmente, não são indiferentes as políticas executadas de financiamento do sistema de segurança social e na salvaguarda da sua sustentabilidade financeira. Tarefa de todos. Tarefa dos trabalhadores através das suas contribuições e tendo em vista a sua protecção em várias situações de risco, das entidades patronais e do próprio Estado obrigado que está a garantir o financiamento dos regimes pouco ou nada contributivos. Também não podem ser subalternizados ou ignorados, os impactos das políticas macro-económicas na sustentabilidade financeira da segurança social. Deles resulta a perda de valiosas e decisivas receitas necessárias ao seu equilíbrio presente e futuro e que são exemplo: a redução dos períodos contributivos dos trabalhadores em resultado da crescente precariedade laboral; da saída precoce do mercado de trabalho em resultado das reestruturações e das privatizações; do fecho e deslocalizações de empresas e do desemprego, cujo elevado crescimento tem custos altíssimos para o sistema de segurança social. Ao Presidente da República cabe-lhe, por isso, no âmbito das suas competências específicas estar atento e avaliar a evolução da situação nacional e da coesão social que resultam das políticas que são realizadas, aferindo as suas consequências e, quando necessário, dar públicos sinais da sua opinião sobre o sentido das propostas que lhe são apresentadas pelo Governo e pela Assembleia da República. Considero que, a sustentabilidade financeira do Sistema de Segurança Social não será defendida e garantida se, sobre ele continuar a ser exercido uma forte pressão para o aprofundamento de medidas e soluções de orientação neoliberal, por parte do poder político, que visam colocá-lo ao serviço do capital financeiro e do grande patronato. Uns pressionam o poder executivo e legislativo com vista ao magno objectivo de privatização das partes mais rentáveis da segurança social, especialmente através da introdução de tectos contributivos/ plafonamento para efeitos de reforma e a partir do uso das contribuições dos trabalhadores para, assim, alargar o mercado de negócio especulativo dos Fundos Privados de pensões. Outros pretendem a redução das contribuições para a segurança social considerando-as um custo demasiado elevado para as empresas. Este caminho constitui um real perigo para a sustentabilidade financeira da segurança social. Por outro lado é importante reter, que, hoje, a dívida do patronato à segurança social representava no fim do primeiro semestre deste ano, três mil e duzentos milhões de euros, ou seja 2,4% do PIB. Verba que tem enormes consequências negativos na sustentabilidade do sistema. Consequências que se agravam com o elevado e crescente desemprego. Aos custos pessoais dos que estão nesta situação, acrescentam-se os custos políticos e sociais para o País e para a segurança social, com um duplo problema para a sustentabilidade financeira do Sistema Público. Trata-se da perda de vultuosas receitas resultantes das contribuições dos trabalhadores e das entidades patronais e, simultaneamente, o elevado volume de despesa com o pagamento do respectivo subsídio. O crescimento desta despesa é evidente se verificarmos que em 1980 as despesas com o subsídio de desemprego representavam 0,36% do PIB, enquanto que a previsão para 2006 aponta já para 1,25% do Produto, ou seja, mais que triplicou neste período. Mas há outro factor relevante a contribuir para o agravamento da situação. É a perda de vultuosas receitas para o Sistema de Segurança Social em resultado da dívida do Estado ao Sistema Público. Só entre 1997 e 2005 o Estado acumulou uma dívida à
segurança social de cerca de onze mil setecentos e onze milhões
de euros. Este não é um fenómeno recente. A falta de pagamento do Estado para com estes regimes é muito anterior a 1997. É disso exemplo o período de 1985, 1986 e 1987, com os governos de Cavaco Silva durante os quais as transferências do Estado corresponderam apenas a um terço do era devido à Segurança Social. Igualmente os dados disponíveis mostram existir, ainda, situações de subdeclaração de salários o que representa uma perda de direitos de protecção social para os trabalhadores que assim procedem e igualmente uma perda de receitas para o Sistema. Os dados mais recentes apontam para uma diferença em mais de 30% entre o ganho médio mensal e o valor declarado do salário, a que se junta o efeito negativo da existência de uma economia clandestina que se estima rondar os 23% do PIB. São estas opções e orientações tomadas por diversos governos e por diversos protagonistas que são os principais factores que concorrem para por em causa a sustentabilidade financeira da segurança social a curto, a médio e a longo prazo. Eles constituem o principal perigo para o sistema público de protecção social e não as empoladas consequências da evolução demográfica. Tais opções e orientações têm vindo paulatinamente a desvirtuar os objectivos do sistema de protecção e a diminuir a garantia de uma sustentabilidade financeira ao serviço do aprofundamento dos direitos à segurança social e ao assegurar do seu carácter universal e solidário para as gerações actuais e para as gerações futuras. Enquanto diminuem em Portugal os níveis de protecção social relativamente à generalidade dos Países da União Europeia (bem traduzida no facto de Portugal ser um dos países que menos atenua o risco de pobreza por via das vertentes das funções sociais do Estado), o Sistema Público de Segurança Social é cada vez mais usado como amortecedor das políticas neoliberais em prejuízo do aprofundamento da protecção social. Isto é, o que verificamos é o progressivo desvirtuamento das finalidades do Sistema de Segurança Social à custa da fragilização dos direitos dos trabalhadores, seja nas diversas situações de risco e de carência de meios de subsistência ou de capacidade de trabalho, seja pela imposição do aumento da idade legal de reforma, seja à custa da manutenção de baixas pensões e de reformas ou ainda como está a acontecer à custa de uma adequada protecção à função social da maternidade-paternidade e da família. Desvirtuamento, ainda, nas opções políticas que são tomadas e dirigidas aos grupos sociais mais vulneráveis e em risco ou já em situação de pobreza em relação aos quais se privilegiam cada vez mais medidas de carácter assistencialista em prejuízo da adopção de medidas com base na promoção dos direitos, no diagnóstico e prevenção precoce das situações de risco de pobreza na adopção das adequadas medidas de prevenção e apoio. Também nesta matéria, as marcas distintivas da minha candidatura relativamente a todas as outras podem ser confirmadas pela clarificação do papel que o Presidente da República deverá desempenhar na salvaguarda e aprofundamento dos direitos em matéria de segurança social expressos na lei magna do País. Desde logo na defesa e apoio a urgentes medidas imprescindíveis à garantia da sustentabilidade financeira da segurança social, na base de uma mais justa repartição das responsabilidades e em função da riqueza criada do rendimento nacional disponível. As medidas que defendo vão no sentido da afectação ao sistema público de segurança social de uma taxa a incidir sobre as transacções financeiras realizadas na bolsa, bem como a criação de uma nova contribuição das empresas para a segurança social com base no seu valor acrescentado bruto. Estas medidas permitiriam não só manter o actual leque de medidas de protecção como alargar as possibilidades do Sistema Público no cumprimento do seu papel no aprofundamento dos direitos de protecção social. No que diz respeito ao aprofundamento dos direitos apoiaria, igualmente, propostas que visem o restabelecimento da universalidade do direito ao abono de família e ao complemento de dependência revalorizando o seu papel no apoio à família e na salvaguarda dos direitos das crianças e jovens. Não apenas por razões de principio e de justiça,
mas porque numa altura em que tantas preocupações se colocam
em relação à diminuição da natalidade
é fundamental a adopção de medidas que se insiram
de facto na promoção do papel do Estado no apoio às
famílias e às crianças e jovens. Visem o aumento da idade legal dos trabalhadores e o aumento da idade de reforma dos 65 para os 67 ou 68 anos. E porquê? Porque o aumento da esperança de vida, constituindo uma nova e importante aquisição do ser humano, deve significar o direito de opção de cada trabalhador chegar à idade de reforma de procurar na sua situação de reformado uma ocupação que corresponda às suas necessidades e expectativas nesta nova fase da sua vida, mas nunca a imposição do prolongamento do seu trabalho profissional. Porque deve ser assegurado o aprofundamento dos direitos adquiridos ao longo de uma vida de trabalho em matéria de idade de reforma. Esta posição que assumo visa também ir ao encontro do sentimento e preocupação expresso por mais de 100 mil portugueses e portuguesas na campanha “Não ao aumento da Idade da Reforma” que o partido que me apoia tem vindo a desenvolver. Tal como nenhum órgão de soberania pode ficar indiferente ao expressivo protesto que tem vindo a ser manifestado pelos trabalhadores da Administração Pública que não só rejeitam frontalmente o aumento da sua idade de reforma como a perigosa e errada mistificação dos supostos privilégios destes, quando o que está é causa em baixar os níveis de protecção social dos trabalhadores do sector público e privado. Igualmente, afirmo a minha discordância em relação à proposta de alteração dos critérios de atribuição do subsídio de desemprego tal como foi apresentada pelo actual Governo aos parceiros sociais. As razões são claras: Porque a redução das elevadas despesas com esta prestação
social não pode ser feita a custa da redução da
protecção social dos desempregados e através de
engenharias legislativas que pretendem exclui-los de receber esta Ou a criação de desempregados de segunda através da diferenciação no período de concessão em relação aos jovens trabalhadores. A necessária redução dos elevados custos do desemprego para a segurança social devem ser assegurados através de políticas dirigidas ao crescimento e desenvolvimento económico e do emprego. Com aquela medida do que se trata é de dar mais um novo e perigoso passo na tentativa de reduzir artificialmente o desemprego e as despesas com o subsídio de desemprego na base da exclusão ou da redução das condições de acesso. Por último, desejo manifestar e clarificar a minha opinião de oposição em relação à actual Lei de Bases da Segurança Social aprovada em 2002. E porquê? Porque os únicos fundamentos para alteração à pressa de uma Lei com dois anos de existência, foram a imposição dos tectos contributivos/ plafonamento das contribuições. Uma medida que lesa gravemente a sustentabilidade financeira da segurança social e igualmente vem reduzir o papel do Sistema Público de Segurança Social, a favor da criação e reforço de um Sistema Complementar e um Sistema de Acção Social. Com a direita na Presidência da República, nomeadamente com Cavaco Silva, o caminho estaria mais aberto à utilização do “rolo compressor das orientações neoliberais”. Seguramente que o candidato Cavaco Silva não esqueceu o seu grande objectivo lançado pelos seus Governos de “Menos Estado Melhor Estado” cujos resultados estão bem à vista na falta de coesão social e nos baixos níveis de protecção social relativamente à União Europeia. Somos uma candidatura que afirma a necessidade de um novo rumo para o país e um projecto que queremos alicerçado nas mais profundas aspirações e legítimos interesses dos trabalhadores e do povo, respeitador de Abril e dos seus valores de democracia, desenvolvimento e justiça social. Somos uma candidatura que se distingue não só pelo reconhecimento
desses direitos sociais dos trabalhadores e do povo português
que a Lei fundamental consagra, mas uma candidatura que assume activamente
a sua defesa como direitos intrínsecos à própria
democracia.
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