Intervenção de Jerónimo
de Sousa, Candidato à Presidência da República |
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(…) Uma candidatura para travar um firme e decidido combate ao candidato da direita, Cavaco Silva e impedir a concretização dos velhos projectos dos partidos da direita de apropriação da Presidência da República. É hoje muito evidente que a direita depois de anos de acção governativa de adulteração do regime democrático, de ataque às suas conquistas e aos direitos sociais do povo português pensa que chegou a hora de ir mais longe nesse ajustar de contas com Abril e a sua Constituição. Temos chamado à atenção e denunciado os insistentes apelos e ataques que os mais destacados representantes da direita, dos partidos e dos apoiantes e responsáveis da candidatura de Cavaco Silva, têm feito nestes últimos meses contra a Constituição da República e da campanha que desenvolvem para responsabilizar a Lei fundamental do país de todos os males que atravessam a sociedade portuguesa. Não são apenas os apelos à subversão do sistema semi-presidencialista, agora também com o contributo de um novo e dedicado adepto, o fundador do PSD, Pinto Balsemão. Apelos que têm subjacente a perspectiva da eleição do seu candidato para a Presidência da República. São também as descabidas fundamentações para conceder ao próximo presidente da República uma legitimidade, como dizem, “acima do sistema”, e os apelos à subversão do Estado Democrático plasmado na Constituição. Para estes destacados representantes da direita e da sua candidatura o país deixou de ser viável sem uma ruptura com a Constituição da República e sem uma reformulação profunda do Estado. Destacados representantes a quem se juntou agora, depois de meses de silêncio, Paulo Portas que na sua primeira intervenção pública, depois de deixar o governo vem defender também uma nova Constituição e ao mesmo tempo expressar o seu apoio a Cavaco Silva. Só não vê quem não quer ver que há meses que a “nata” dos apoiantes de Cavaco Silva ligados às direcções dos partidos da direita e aos grandes grupos económicos e da alta finança preparam o terreno para a criação das condições para desencadear a exigência da remoção daquilo a que chamam os “bloqueios constitucionais” ao desenvolvimento do país. Querem uma Constituição nova, sem garantias e sem direitos para quem trabalha. Querem uma Constituição nova para impor uma democracia mutilada nas liberdades, direitos e garantias do povo. Querem o Estado de Abril despojando das suas funções sociais que garantem a concretização do direito à saúde, ao ensino, à segurança social ao povo português ou a existência de direitos laborais aos trabalhadores. Cavaco Silva que no passado governativo acusou as instituições que lhe exigiam o respeito pela legalidade democrática de “forças de bloqueio” veio no seu primeiro debate penitenciar-se, afirmando que se for eleito será na Presidência uma “força de desbloqueio”. Cavaco Silva parece restar sempre no lugar errado da legalidade democrática nesta história dos bloqueios. O que é que Cavaco Silva quer desbloquear? São também os “bloqueios constitucionais” de que falam Manchete, que Portas ou dos barões do Conselho Consultivo junto da direcção do PSD? Mas não são apenas os sectores mais revanchistas da direita política e da direita dos negócios e do grande capital, é já abertamente o próprio partido do candidato da direita, o PSD, que o propõe formalmente na Assembleia da República com a sua proposta de reformulação das funções do Estado no âmbito da Lei do Orçamento de Estado para 2006. É evidente que não é uma proposta que pensassem poder aprovar já, mas não quiseram deixar de dar um sinal e fazer coro com os objectivos da direita revanchista e retrógrada projectando desde já a sua intenção de concretização num futuro da subversão do Estado Democrático. Não se trata de uma proposta qualquer. É uma proposta que visa iniciar um processo de transferência alargada das funções sociais do Estado e de outras funções, inclusive das áreas da segurança e soberania, para o sector privado. Proposta que não expressa ainda toda a dimensão da ofensiva que se prepara contra o Estado Democrático de Abril, mas é uma proposta suficientemente inquietante e que a concretizar-se atingiria profundamente os interesses do nosso povo e dos trabalhadores portugueses. Proposta que, por exemplo, se fosse aprovada transferiria no imediato toda a rede pública do Pré-Escolar (creches e jardins de infância) para o sector privado e social. A mesma possibilidade na área da saúde de privatização
da gestão da rede dos Centros de Saúde e de cuidados de
saúde na rede hospitalar. Trata-se de uma primeira proposta a caminho do Estado mínimo ultraliberal, para o qual os trabalhadores continuarão a pagar impostos e o grande capital e os grandes interesses a comer directamente à mesa do orçamento que passará, se não exclusivamente, em grande medida, a financiar apenas os seus negócios e indirectamente as suas empresas alimentadas pelo orçamento do Estado com lucros sempre garantidos à custa da saúde, da educação, da segurança social dos portugueses. Para por marcha este plano de perversão a direita precisa de um Presidente não só condescendente com tal projecto, mas empenhado em o concretizar e defender. Querem um presidente capaz de subverter pela prática da sua acção e intervenção política a Constituição da República. Solução que tem, certamente, a inspiração de dez anos de governo de Cavaco Silva. Dez anos de governação autoritária e de sistemático afrontamento à matriz constitucional no que diz respeito, particularmente, à sua organização económica e à garantia dos direitos sociais e políticos dos trabalhadores portugueses. O que está em marcha é muito mais que a eleição de um homem para a Presidência da República e seria de uma grande ingenuidade não ver a dinâmica revanchista e retrógrada que está por trás da candidatura de Cavaco Silva. Só não vê quem não quer ver que a direita de todos os matizes joga na candidatura de Cavaco Silva a possibilidade de enterrar a Constituição de Abril. Temo-lo dito e reafirmamo-lo, as candidaturas não podem ser avaliadas apenas pelo que afirmam os candidatos, mas também pelas circunstâncias que as rodeiam, os apoios que as suportam e, naturalmente a prática política dos que as protagonizam. (…) Cavaco Silva passou a citar todos os dias, um conhecido político norte-americano, desafiando os portugueses a questionarem-se a si próprios, face às dificuldades do país, sobre o que podem fazer pela pátria, o que podemos fazer por Portugal. O que os portugueses podem fazer por Portugal, por um Portugal com Futuro é com o seu voto derrotar mais uma vez a candidatura da direita e travar o projecto de revanche contra Abril. O que os portugueses podem fazer por Portugal é dizer finalmente basta a anos e anos de políticas de direita de sucessivos governos, incluindo o dele, que à revelia da Constituição da República e contra ela afundam o país e agravam a vida dos portugueses. O que os portugueses podem fazer por Portugal é reforçar a candidatura que protagonizamos de ruptura democrática com estas desastradas políticas, alargando e ampliando a esperança na mudança por uma vida melhor. Mudança que está a ser frustrada pelo actual governo do PS. Em vez do prometido novo rumo, seguem e aplicam as mesmas políticas que têm empurrado o país para a crise. Ainda agora se votou o Orçamento de Estado para 2006 e já se vê com muita clareza o irrealismo das suas projecções e a inadequação das suas propostas e medidas para dar resposta ao fulcral problema da dinamização da nossa economia, do emprego e do melhoramento das condições de vida dos portugueses. Ontem o INE veio confirmar as piores previsões do Banco de Portugal de há duas semanas: Portugal irá encerrar o ano em recessão técnica. Esta evolução confirma infelizmente, por inteiro, as nossas previsões e preocupações de que, com a manutenção da actual política, Portugal dificilmente se libertará de um prolongado ciclo vicioso de estagnação e recessão em que está há muito enredado e o governo tardará a vir dizer-nos que as medidas deste Orçamento ainda não são suficientes para de seguida se apertar mais o cinto aos mesmos do costume e sem resolver os problemas, apenas agravando a vida dos portugueses. Na verdade ainda não passaram quinze dias da aprovação do Orçamento e aí estão novos aumentos da energia que vão ter um impacto muito grande nas pequenas e médias empresas. Não é possível falar em elevar a competitividade da economia portuguesa quando cada vez mais pesam, comparativamente a outros países, os custos da energia, dos combustíveis, dos transportes, do dinheiro. Custos que todos os dias se agravam com a política de preços resultantes da privatização e monopolização dos sectores estratégicos da economia nacional que permitem escandalosos lucros ao grande capital, à custa da generalidade do tecido económico nacional.
O que está em marcha pela mão do governo do PS é uma pura gestão neoliberal da Administração pública com o governo a fazer de comissão liquidatária dos direitos fundamentais dos trabalhadores da Administração Pública. Da Europa, a mesma lógica, a mesma visão: fazer aos mesmos de sempre a factura, sejam os trabalhadores, sejam os países menos desenvolvidos. Também de lá se apresenta a factura. A dos juros mais caros que a ortodoxia monetarista do Banco Central Europeu impôs dificultando a recuperação económica e penalizando ainda mais os rendimentos das famílias. Mas também a dos cortes no Orçamento Comunitário à custa dos países da "coesão", como Portugal e os novos Estados-membro que enfrentam os maiores desníveis em termos de desenvolvimento. A proposta da Presidência britânica mais não faz do que piorar as propostas anteriormente apresentadas pela Presidência Luxemburguesa e da Comissão Europeia, na qual Portugal perdia 15% das transferências comunitárias. Com esta proposta da Presidência britânica de redução do Orçamento Comunitário são novos cortes nos fundos estruturais e de coesão, quando Portugal se vê confrontado com uma concorrência acrescida pelo alargamento e pela liberalização do comércio internacional, no quadro da OMC. Recorde-se que diversos estudos apontam Portugal como o único país dos 15 que perde com o alargamento, ao mesmo tempo que são os países mais poderosos os que mais ganham. Também o que na política europeia se exige: São verdadeiras políticas que promovam a aproximação do nível de desenvolvimento económico-social dos diferentes países, contrariando as actuais políticas neoliberais que têm acentuado as desigualdades. A necessidade do reforço para as verbas da "coesão económica e social", garantindo o carácter redistributivo do orçamento comunitário. Quanto à Política Agrícola Comum (PAC), o que é necessário é uma verdadeira reforma que assegure uma redistribuição equitativa das ajudas entre países e produções, e que apoie a agricultura familiar e os pequenos e médios agricultores. 20 anos após a adesão, demonstra-se que vinte anos de fundos estruturais, sendo significativos, não chegaram para compensar os custos económicos do mercado interno, como se vê pela destruição do nosso aparelho produtivo. (…)
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