O falecimento de António Borges Coelho, destacado intelectual, homem vertical, solidário, homem de causas e de luta pela liberdade, pela emancipação social, por um Portugal democrático, de progresso e de justiça, constitui uma importante perda.
António Borges Coelho foi, tomando os versos de Brecht, um homem que interveio ao longo da vida levantando a bandeira dos “condenados da Terra”, daqueles que tinham sido arredados para as notas de rodapé dos compêndios da história.
O seu primeiro contacto com o PCP é estabelecido ainda na sua vila natal, mas é através dos colegas da Faculdade de Direito de Lisboa que integra o MUD Juvenil, tendo sido membro da sua comissão executiva e participado na campanha presidencial de Norton de Matos. Por fim, integra as fileiras do PCP em 1949.
Foi funcionário do Partido Comunista Português na clandestinidade. Foi preso, passou na prisão do Aljube por duras sevícias, que enfrentou com grande coragem até ao julgamento. Condenado a dois anos e nove meses de prisão, acaba por cumprir seis anos e meio no Forte de Peniche. A decisão de Borges Coelho de se desvincular do PCP já depois de reconquistada a liberdade não o impediu de manter um posicionamento de estreita colaboração com o Partido e a sua actividade.
Já em liberdade continuou os trabalhos que tinha iniciado no Forte de Peniche e escreve “As Raízes da Expansão Portuguesa”, livro que foi apreendido das livrarias e que o levou a ser submetido a novos interrogatórios pela PIDE. No ano seguinte publicou “A Revolução de 1383”. Destaca-se também a sua “História de Portugal”, bem como a visão que nos dá sobre “Os Lusíadas” e Luís de Camões.
O seu labor de um “operário das Letras” foi constante e está expresso na poesia, no teatro, no ensaio e na História, a sua paixão.
António Borges Coelho, apesar de ter sido sujeito a injustiças e discriminações, teve uma notável intervenção académica e foi um dos mais distintos intelectuais do nosso tempo.
Borges Coelho “trouxe a Arraia-Miúda para a história”, a visão não só dos dominantes mas também dos dominados e explorados, chamando também a atenção para o facto que a “História não é uma linguagem matemática”, “que nela cabem várias texturas, que é uma sinfonia composta de vários sons e tocada em vários instrumentos, num resultado em que o todo é mais que a soma das partes, mas em que para perceber essa mesma História não se pode reduzir tudo ao barulho dos tambores”.
É de grande valor a contribuição que deu, pelo seu exemplo e pelos seus trabalhos na procura da verdade histórica, para a luta do povo português. O seu exemplo de uma vida dedicada à cultura e ao pensamento e a sua visão histórica são particularmente importantes numa altura em que, face à promoção de forças e projectos reaccionários, se impõe a afirmação dos valores de Abril.