O Sector Têxtil e Vestuário continua a ter um peso decisivo na economia portuguesa. Segundo dados de 2003, representa 16,3% das exportações portuguesas (28,4% em 1993), 7,3% das importações (9,8% em 1993), 26,7% do emprego (28,5% em 1994) e 12% do volume de negócios (15,4% em 1994) da Indústria Transformadora.
Em 2004 estavam registados 212552 postos de trabalho num universo de aproximadamente 8 mil empresas, a generalidade das quais pequenas e médias empresas, muitas em regime de subcontratação, concentradas em algumas das regiões desfavorecidas do País, o que aumenta a sua vulnerabilidade. Globalmente, a fileira do têxtil e vestuário envolve em Portugal, de forma directa ou indirecta, cerca de 1 milhão de pessoas.
1. Considerando que, no quadro do Acordo do Têxtil e Vestuário de 1995 no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), a partir de 1 de Janeiro do corrente ano se liberalizou totalmente o comércio internacional do sector;
2. Considerando que essa liberalização integra, desde Dezembro de 2001, o comércio dos produtos têxteis e do vestuário produzidos na República Popular da China que, nessa data, se tornou membro da OMC;
3. Considerando que os dados estatísticos fornecidos pelo Sistema Integrado de Gestão de Licenças (SIGL) mostram que há, a partir de 1 de Janeiro, uma evolução significativa nas importações com origem na China, registando-se aumentos preocupantes e, sobretudo nas categorias de produtos que maior sensibilidade representam para a indústria nacional (categorias: 4 – t-shirts; 5 – camisolas de lã; 6 – calças; 7 – blusas de senhora; 12 – meias) acrescente-se que, para várias categorias têxteis, o volume das importações já autorizadas a partir da China chega a ser 7 vezes superior às importações têxteis correspondentes realizadas em 2004, e que, para quase todos os produtos, os preços já baixaram abruptamente, em alguns casos com reduções superiores a 50%;
4. Considerando «que esta situação pode ser agravada por
importações de outros destinos, nomeadamente da Índia e
Paquistão, nossos principais concorrentes nos têxteis-lar;
5. Considerando que dados provisórios relativamente a Janeiro e Fevereiro
passados mostram que os pedidos de licenças triplicaram face às
importações reais verificadas no período homólogo
de 2004;
6. Considerando que, nos termos do «considerando» (9) do Regulamento (CE) N.º 138/2003 do Conselho de 21 de Janeiro de 2003 «Entre as modalidades e condições de adesão da China à OMC, o parágrafo 242 do relatório do Grupo de Trabalho, que faz parte integrante do Protocolo de Adesão da China à OMC, prevê uma cláusula de salvaguarda específica, aplicável até 31 de Dezembro de 2008, relativa às importações para um país membro da OMC de produtos têxteis e de vestuário originários da China e abrangidos pelo Acordo sobre os Têxteis e o Vestuário (ATV).»;
7. Considerando que, nos termos do N.º 2 do Artigo 1º desse Regulamento
se estabelece, sobre Medidas de salvaguarda especiais para a China:
«1. Se, devido a uma perturbação do mercado, as importações
na Comunidade de produtos têxteis e de vestuário originários
da China e abrangidos pelo ATV ameaçarem impedir a boa evolução
das trocas comerciais desses produtos, essas importações podem,
durante um período que termina em 31 de Dezembro de 2008, ser sujeitas
a medidas de salvaguarda específicas, nas seguintes condições:
a) A Comissão, a pedido de um Estado-Membro ou por sua própria iniciativa, encetará consultas com a China, tendo em vista atenuar ou evitar uma tal perturbação do mercado. (...)»;
8. Considerando que as Cláusulas de Salvaguarda não serão, certamente, a «salvação» dos têxteis portugueses, até pela sua natureza temporária, mas poderão ter, na actual conjuntura, um efeito amortecedor não negligenciável sobre os impactos negativos de um «choque de importações» e ganhos de tempo na tomada de outras urgentes e necessárias medidas relativamente à competitividade do sector no mercado interno e externo;
9. Considerando as manobras dilatórias que se vão sucedendo na União Europeia, onde a Comissão:
a) na sua Comunicação de 22 de Outubro de 2004 (doc. 13679/04),
afirmou pretender emitir antes do final do ano (de 2004) as orientações
(guidelines) que contivessem «os procedimentos e critérios que
tenciona seguir, em conformidade com os regulamentos pertinentes aprovados pelo
Conselho, com vista à aplicação das cláusulas de
salvaguarda, em particular da cláusula de salvaguarda específica
do sector têxtil constante do Protocolo de Adesão da China à
OMC» (idem REPER);
b) em fins de Janeiro veio informar que só durante o mês de Fevereiro
de 2005 é que o faria; c) em 11 de Março o seu porta-voz para
as questões comerciais, veio anunciá-las mas só para os
próximos meses, e que estas declarações sucessivas são
feitas na base de que as cláusulas de salvaguarda deverão ser
accionadas como «um último recurso»;
10. Considerando que estas posições da Comissão Europeia resultam não só das posições de Estados-Membros mais liberais, como o Reino Unido, a Dinamarca e a Suécia, como também de outros Estados-Membros bastante interessados no acesso ao mercado chinês, fazendo do sector têxtil (e de outros) moeda de troca para as outras suas exportações, inclusive de equipamentos para o sector têxtil;
11. Considerando que um dos argumentos usados pelo porta-voz da Comissão era o facto de, até 11 de Março, nenhum dos Estados-Membros ter feito qualquer pedido formal para o accionamento das Cláusulas de Salvaguarda;
12. Considerando que outros países com peso relevante no comércio internacional dos têxteis e vestuário já foram avançando, como a Turquia, com o accionamento das medidas de salvaguarda junto da OMC, e outros como os EUA, têm declarado a sua intenção de fazê-lo;
13. Considerando que as prováveis consequências da liberalização referidas, que agravam as resultantes decorrentes de diversos acordos bilaterais negociados pela União Europeia, se fazem num contexto económico já de grandes dificuldades, entre as quais uma persistente anemia económica interna e externa, uma paridade euro/dólar que tem agravado drasticamente a perda da competitividade dos nossos produtos e os processos, que prosseguem, de deslocalização de empresas do sector, em particular para alguns dos novos Estados-Membros e candidatos à adesão;
14. Considerando que as medidas a tomar de nada servirão se não acontecerem de forma preventiva antes do encerramento de empresas, da destruição de milhares de postos de trabalho e do aprofundamento da perda de quotas de mercado;
A Assembleia da República resolve, nos termos do N.º 5 do Artigo 166.º da Constituição da República Portuguesa, recomendar ao Governo:
1. O pedido formal urgente junto da União Europeia do accionamento da
cláusula de salvaguarda nos termos do Artigo 10.º A aditado ao Regulamento
(CEE) N.º 3030/93 relativo ao regime comum aplicável às importações
de certos produtos têxteis originários de países terceiros.
2. Que sejam tomadas um vasto e integrado conjunto de medidas que permitam responder
no curto, médio e longo prazos, em termos económicos e sociais,
às dificuldades conjunturais e estruturais que atravessa o sector do
têxtil e do vestuário.
Assembleia da República, 16 de Março de 2005