Projecto de Lei nº 56/X
Cria o passe social intermodal na Área Metropolitana do Porto
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A população da Área Metropolitana do Porto nunca teve a possibilidade de aceder a um verdadeiro título de transporte colectivo de natureza intermodal que lhe garantisse condições acrescidas de mobilidade mesmo com os meios existentes.

A desertificação crescente da cidade do Porto, centro urbano polarizador determinante nas deslocações pendulares casa – trabalho, o afastamento cada vez mais acentuado entre os locais de trabalho e de residência, a utilização crescente de vários meios de transporte colectivo, públicos e privados, tornam cada vez mais inaceitável a inexistência de um passe social intermodal disponível para centenas de milhar de pessoas que vivem e trabalham nesta região do País.

Conhece-se a experiência da Área Metropolitana de Lisboa onde o passe social intermodal constitui o título de transporte mais usado desde que foi criado em 1977, há mais de 27 anos. Com a criação deste passe, os utentes do transporte colectivo da Área Metropolitana de Lisboa passaram a dispor de um sistema tarifário mais racional e simplificado que permitiu a vastas camadas da população, especialmente às de maior carência económica, acréscimos significativos de mobilidade para usufruir de direitos de cidadania, no trabalho, no lazer e na ocupação dos tempos livres.

Na Área Metropolitana do Porto são conhecidos alguns exemplos pontuais, bem localizados, de passes combinados entre dois operadores. É o caso do passe combinado estabelecido entre a Sociedade de Transportes Colectivos do Porto (STCP) e a CP, limitado apenas a algumas ligações, é também o caso de passes combinados, em certas rotas específicas, entre a STCP e alguns operadores privados.

Com a entrada em funcionamento da primeira linha do metro ligeiro de superfície (m. l. s.) da Área Metropolitana do Porto, a Administração da Empresa do Metro acordou com a STCP e a CP o lançamento de um título de génese intermodal, mas cujo preço elevado lhe retira a natureza social Para além disso, face à inexistência de alternativas, tal título é na prática obrigatório mesmo para aqueles que só necessitam de utilizar o serviço de um único daqueles meios de transporte. Prevê-se mesmo que, ainda a partir do último trimestre deste ano, este título intermodal possa começar a articular o metro ligeiro de superfície, com algum do serviço regional da CP, com toda a rede da STCP e com o serviço prestado em certas linhas por algumas empresas privadas, ainda que, no caso destas, em número muito limitado.

Ao contrário das experiências referidas dos “passes combinados” que, apesar de muito limitados, são disponibilizados a preços médios acessíveis e com alguma preocupação social, o tarifário introduzido com a entrada em funcionamento das primeiras linhas do m. l. s. está longe de poder ser considerado compatível com os níveis de vida de uma parte muito significativa dos utentes actuais e futuros.

Para além do metro ligeiro de superfície (cuja importância será crescente com as próximas ligações a Gaia, à Póvoa de Varzim, à Trofa e a Vila do Conde, todas elas incluídas na 1ª fase da obra), – da CP e da STCP, há também um número muito significativo de operadores privados que intervêm na oferta de transporte existente na Área Metropolitana do Porto.

A criação de um passe social intermodal terá assim, obrigatoriamente, de atender a esta realidade, motivando a participação do maior número de operadores, públicos e privados, na oferta desta nova modalidade tarifária.

Uma outra questão a ponderar tem a ver com a delimitação das áreas geográficas a abranger pelo passe social intermodal e, bem assim, com a definição do respectivo zonamento. Só o simples facto do metro ligeiro de superfície prever a ligação com a Trofa, Vila do Conde e Póvoa de Varzim mostra bem que a delimitação geográfica da incidência de um passe social intermodal nesta região terá que considerar concelhos que se situam significativamente distanciados do que é designado por coração da Área Metropolitana.

Por isso, só o estudo aprofundado, quantitativo e qualitativo, das mobilidades com origem nas mais diversas origens, incluindo, a título de exemplo, Santa Maria da Feira, ou Paredes e Penafiel – estes dois municípios servidos aliás com o serviço suburbano da CP e nem sequer pertencentes à Área Metropolitana do Porto – poderá determinar e fundamentar opções credíveis e sustentadas de definição global da área de incidência e de delimitação do zonamento.

Seja como for, a criação de um passe social intermodal não pode em caso algum determinar um aumento geral de preços e tarifas, sendo certo que terá sempre que prever modalidades especiais mais favoráveis para idosos, crianças e jovens/estudantes, não devendo, nestes casos, limitar o seu pleno uso a determinados dias de utilização por parte dos beneficiários.

Deverá competir à Autoridade Metropolitana de Transportes a realização dos estudos necessários para a apresentação de propostas de zonamento, para a determinação de preços e tarifas, e ainda para a definição de regimes especiais a criar para o passe social intermodal.

Caber-lhe-á também estabelecer as fórmulas de repartição das receitas, necessariamente em função dos níveis de oferta de cada operador.

De igual maneira competirá à Autoridade Metropolitana de Transportes a responsabilidade de estabelecer níveis de indemnizações compensatórias que permitam o estabelecimento de preços finais compatíveis com os níveis de vida da população da Área Metropolitana do Porto, que tenham em conta a natureza pública do serviço de transportes colectivos e o seu carácter eminentemente social.

A Autoridade Metropolitana de Transportes, governamentalizada na sua génese e constituição, não tem até agora dado as respostas que a realidade cada vez mais exige. É tempo de, também aqui, acelerar processos, promover o debate, retirar as sínteses que permitam aumentar a mobilidade de todos os que trabalham e vivem na Área Metropolitana do Porto

É bom que haja a sensibilidade para reconhecer que a criação de mais e novas modalidades de transporte, só por si, não determinará a opção dos utentes pela utilização do transporte colectivo. Há que estabelecer e criar outras condições. E, entre estas, está certamente o preço dos bilhetes em geral e a existência de passes sociais intermodais, em particular.

Uma política que motive a utilização crescente do transporte colectivo e o abandono do transporte individual tem de facto que ter na génese a oferta de preços e serviços acessíveis. Assim, aumentará claramente o número de utentes, com reflexos empresariais necessariamente positivos. Para já não falar nas consequências ambientais – com reflexos também económicos – que uma diminuição sensível de utilização do transporte individual certamente determinaria.

Por forma a dar resposta às necessidades crescentes de mobilidade da população, para dar sentido e salvaguardar objectivos sociais que devem presidir a uma política de transportes colectivos, os Deputados do PCP abaixo assinados apresentam o seguinte projecto de lei:

 

Artigo 1.º

Criação

 

É criado o passe social intermodal como título a utilizar nos transportes colectivos que operem na Área Metropolitana do Porto.

 

Artigo 2.º

Validade

 

  1. O s passes sociais intermodais previstos na presente lei são válidos em todos os operadores de transportes colectivos públicos e concessionados, tal como em todos os operadores privados de transportes colectivos que operem na zona geográfica definida nos termos do artigo seguinte.
  2. A validade dos passes sociais intermodais definida nos termos do número anterior é extensível à utilização dos parques de estacionamento associados a interfaces da rede de transportes colectivos.

 

Artigo 3.º

Âmbito

 

  1. O sistema de passe social intermodal da Área Metropolitana do Porto, para além dos municípios que a integram, pode abranger outros que, no todo ou em parte, não se encontrem nessa área geográfica.
  2. Compete à Autoridade Metropolitana de Transportes a definição completa da área geográfica de utilização do passe social intermodal num prazo máximo de 120 dias após a aprovação da lei.

 

Artigo 4.º

Delimitação de Zonas

 

  1. Compete à Autoridade Metropolitana de Transportes a definição dos zonamentos do passe social intermodal, num prazo máximo de 60 dias após a definição completa da área geográfica de utilização nos termos do n.º 2 do artigo anterior.
  2. Sem prejuízo do número anterior, a área geográfica de cada Município abrangido pelo sistema de passe social intermodal deverá integrar sempre uma única zona.

 

Artigo 5.º

Regime de preços

  1. Sem prejuízo do carácter social do regime geral de preços do passe social intermodal, é criado um regime especial, a preços mais reduzidos.
  2. Têm acesso ao regime referido no número anterior:

    a) Os cidadãos com idade até 24 anos, desde que não aufiram rendimentos próprios.

    b) Os cidadãos com idade a partir de 65 anos ou em situação de reforma por invalidez ou velhice.

  3. Compete à Autoridade Metropolitana de Transportes a apresentação de propostas de preço para o passe social intermodal a ratificar pela Junta Metropolitana do Porto e pela tutela competente.

 

Artigo 6.º

Repartição de receitas

 

  1. A repartição de receitas do passe social intermodal será proporcional à repartição do número de passageiros vezes quilómetro, transportados pelos operadores, e terá em conta o meio de transporte.
  2. Compete à Autoridade Metropolitana de Transportes estabelecer anualmente os valores da repartição de receitas, devidamente actualizadas, para o que promoverá os inquéritos e estudos necessários.

 

Artigo 7.º

Indemnização compensatória

 

  1. Aos operadores referidos no artigo 2.º será atribuído anualmente uma indemnização compensatória com base numa lógica de rede e tendo em conta as obrigações inerentes à prestação de serviço público
  2. Compete à Autoridade Metropolitana de Transportes a fixação e atribuição da indemnização compensatória, para o que procederá à fiscalização e avaliação do serviço público prestado pelos respectivos operadores.

 

 

Artigo 8.º

Entrada em vigor

 

A presente lei entra em vigor com a lei do Orçamento de Estado posterior à sua aprovação.

 

 

Assembleia da República, em 6 de Maio de 2005