Projecto de Lei n.º 25/X
Altera o regime jurídico dos inquéritos parlamentares
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Preâmbulo

 

A efectivação do direito constitucional e legal dos Deputados à constituição de comissões parlamentares de inquérito encontra-se desde há mais de dois anos praticamente bloqueada. Esta situação anómala põe em causa um dos mais importantes mecanismos de intervenção do Parlamento, e evidentemente das oposições, na fiscalização dos actos do Governo, que, como se sabe, constitui uma das mais importantes funções dos parlamentos democráticos.

Esta situação, que derivou fundamentalmente da imposição de decisões por parte das maiorias parlamentares existentes ao tempo da VIII e IX Legislaturas que conduziram à inutilização da conclusão de inquéritos em curso, por via da recusa de conclusões propostas pelos relatores ou por via do impedimento da realização de diligências indispensáveis, tem de ser rapidamente ultrapassada, sob pena de o Parlamento se ver privado de um instrumento essencial da sua actividade, em violação da Constituição e da Lei.

A questão que está sobretudo em causa é a da efectividade do exercício do direito potestativo de constituição de comissões parlamentares de inquérito. Sendo certo que nenhuma maioria pode ser coagida no seu sentido de voto quanto à resolução de constituir comissões de inquérito, a Constituição atribui a um certo número de Deputados o poder de impor tal constituição, independentemente da vontade da maioria. Acontece porém que esse direito potestativo pode ser posto em causa – e deixar na prática de existir – se se permitir que a maioria, apesar de não poder obstaculizar a criação da Comissões de Inquérito, possa impedir a realização das diligências ou de audições que se revelem necessárias para que o inquérito possa chegar a algum apuramento dos factos que constituem o seu objecto. E na verdade, isso aconteceu, pondo em acusa os inquéritos parlamentares e conduzindo à situação de impasse que importa ultrapassar.

A Constituição da República, no n.º 4 do artigo 178º, dispõe que as comissões parlamentares de inquérito são obrigatoriamente constituídas sempre que tal seja requerido por um quinto dos Deputados em efectividade de funções, até ao limite de uma por Deputado e por sessão legislativa. Esta imposição constitucional encontra-se vertida no regime jurídico dos inquéritos parlamentares (artigo 4º da Lei n.º 5/93, de 1 de Março, alterada pela Lei n.º 126/97, de 10 de Dezembro).

Por esta via se estabelece que a decisão de constituir uma comissão parlamentar de inquérito não fique inteiramente nas mãos da maioria, podendo os Deputados da oposição impor, dentro de certos limites, a realização de inquéritos parlamentares.

Acontece porém que, em certos casos, a constituição obrigatória da comissão de inquérito pode não ser suficiente para que o inquérito seja realizado nos termos visados pelos proponentes. Com efeito, dependendo a realização de quaisquer diligências investigatórias de deliberação da comissão parlamentar constituída, a qual funciona segundo a regra da maioria, é sempre possível que uma maioria interessada em obstaculizar a realização de um inquérito parlamentar possa atingir esse objectivo, recusando que algumas diligências sejam efectuadas ou impedindo a prestação de depoimentos, inutilizando na prática o alcance do direito potestativo.

Na verdade, quase nada poderá restar do direito de impor a constituição de uma comissão de inquérito se depois essa mesma comissão, deliberando por maioria, funcionar como obstáculo à realização do próprio inquérito. Desse modo, deixando afinal nas mãos da maioria os termos da realização concreta de um direito próprio da oposição, é esse mesmo direito que pode ser frustrado, apesar da sua expressa consagração constitucional.

Assim, de forma a evitar situações de violação da Constituição, indesejáveis para a democracia e desprestigiantes para o próprio Parlamento, impõe-se consagrar, a par do direito de impor a constituição de uma comissão de inquérito, o direito dos respectivos requerentes a solicitar os depoimentos e requerer as diligências que considerem necessários para a realização do inquérito sem que estes fiquem dependentes da decisão da maioria.

Só por essa via será possível retirar consequências práticas, ao abrigo de quaisquer maiorias, de um direito constitucional cuja consagração teve por motivações fundamentais a protecção dos direitos da oposição e a dignificação do instituto dos inquéritos parlamentares.

Por outro lado, o PCP retoma uma proposta constante do seu projecto de revisão constitucional de 1997 que visa atribuir a cada um dos membros de uma comissão de inquérito o direito de requerer e obter os elementos que considerem úteis ao exercício das suas funções. É que não faz sentido que, existindo um direito constitucional e regimental dos Deputados a requerer e obter do Governo ou dos órgãos de qualquer entidade pública os elementos e as informações que considerem úteis para o exercício do seu mandato (artigo 156º, e) da Constituição e artigo 5º, n.º 1, l) do Regimento), o exercício deste direito individual fique condicionado a uma deliberação maioritária quando o Deputado em causa seja membro de uma comissão de inquérito e os elementos solicitados se relacionem com o seu objecto. A pertença de um Deputado a uma comissão de inquérito não pode conduzir a uma redução dos seus direitos individuais.

Nestes termos, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projecto de Lei:

 

 

Artigo único

 

É aditado o artigo 4º B à Lei n.º 5/93, de 1 de Março, alterada pela Lei n.º 126/97, de 10 de Dezembro (Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares), com a seguinte redacção:

 

Artigo 4º B

(Direitos potestativos)

 

1. Os subscritores de inquérito parlamentar requerido ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 2º, têm a faculdade de solicitar os depoimentos e requerer as diligências que considerem necessários para a realização do inquérito, tendo em conta o seu objecto, os quais não carecem de deliberação da comissão parlamentar correspondente.

 

2. Os membros das comissões parlamentares de inquérito têm o direito individual de requerer e obter os elementos que considerem úteis ao exercício das suas funções.

 

 

Assembleia da República, 6 de Abril de 2005