Intervenção do deputado
João Amaral

Apresentação do Programa
da Presidência Portuguesa da União Europeia

5 de Janeiro de 2000



Sr. Presidente,
Srs. Deputados,
Sr. Primeiro-Ministro,
Srs. Membros do Governo:

O essencial das preocupações e posições do PCP quanto à presidência portuguesa foram expressas, neste debate, na pergunta feita pelo meu camarada Agostinho Lopes e na intervenção do meu camarada Honório Novo.
A intervenção do Governo, como se esperava, pouco adiantou. A presidência portuguesa da União Europeia foi apresentada ao Plenário da Assembleia da República de Portugal depois de ter sido apresentada aos outros países da União Europeia, às instituições europeias e depois das várias conferências de imprensa que a tiveram por objecto. Estava tudo dito, da parte do Governo, quando aqui chegou.
Os problemas que trouxemos a este debate foram essencialmente dois: primeiro, o de saber qual a relevância que os interesses nacionais e a sua defesa tiveram, e têm, no desenho que o Governo fez da presidência portuguesa; segundo, o de saber se os objectivos traçados para a presidência portuguesa, pelo Governo, configuram ou apontam para a necessária mudança de rumo que, na nossa opinião, deve sofrer o processo de construção europeia. A resposta que o Governo dá às duas questões deixa-nos profundamente desiludidos.
É preciso ser claro e pôr em evidência aquilo que resulta do discurso governamental.
Por um lado, não há qualquer questão ou tema dos considerados prioritários pelo Governo que seja directamente ditado pelo interesse nacional. O Governo assume que a escolha de temas e prioridades decorre da lógica e das necessidades de afirmação europeia e nunca da ponderação de interesses nacionais directos.
Por outro lado, o rumo que o Governo aponta para a presidência portuguesa é de uma mera continuidade de objectivos e o seu aprofundamento na direcção da construção de uma espécie de superpotência europeia vocacionada para as guerras da competição global.
Sinal claro e triste deste posicionamento do Governo é dado pela ausência da expressão "justiça social", na fraseologia com que enroupa a presidência portuguesa, e no papel apagado e secundário que é atribuído às expressões "desenvolvimento equilibrado" e "coesão económica e social".

A tese com que o Governo justifica as posições que assume para a presidência portuguesa pode resumir-se na ideia de que, para si, a defesa dos interesses portugueses assegurar-se-ia pelo aprofundamento da construção europeia. Mais Europa seria, para o Governo, automaticamente, a resposta para os problemas do País. Não é verdade! É evidente e certo que, se na Europa se acentuassem as tendências nacionalistas das grandes potências, tal traduzir-se-ia num grave prejuízo para países como Portugal, como é evidente e certo que, se essas tendências nacionalistas se convertessem num dirigismo institucional, num directório, tal seria igualmente desastroso para Portugal.
Mas não basta combater essas tendências e afirmar "mais Europa" para defender os interesses de Portugal, é preciso que se afirmem duas linhas essenciais de política na Europa para que isso suceda. Primeiro, é preciso que a Europa redireccione as suas políticas, erigindo em objectivos essenciais a coesão económica e social e a justiça social.

Não se trata só de mais Europa, trata-se, sim, fundamentalmente, de melhor Europa, de um novo rumo para a Europa, que a torne no que ela não é hoje, ou seja, num coeso espaço social de progresso e paz.

Segundo, é preciso que a Europa assuma a diversidade dos interesses nacionais que a compõem como uma mais-valia e que assuma o respeito dessa diversidade como a via única para o processo de construção europeia.
É a ausência destas perspectivas políticas como perspectivas determinantes e conformadoras que, na nossa opinião, condena a presidência portuguesa aos olhos dos portugueses.

Portugal perde mais esta oportunidade. Perde-a quando se cinge à gestão da coisa europeia e esquece o interesse nacional, perde-a quando privilegia temas institucionais e subalterniza a coesão, perde-a quando prefere a lógica da supereuropa e subestima os valores humanos da justiça e da dignidade do trabalho.

Da parte do PCP, acompanharemos com atenção o desenvolvimento das iniciativas que marcam a agenda da União Europeia, com a convicção de que só haverá melhor Europa se os interesses dos países que a compõem forem respeitados, designadamente os de Portugal, e quando for uma Europa social, de justiça, progresso e desenvolvimento equilibrado de todos os países que a compõem e, portanto, também de Portugal.
O que os portugueses e as portuguesas esperam de nós, PCP, é precisamente que sejamos capazes de assumir estes objectivos como os grandes objectivos de Portugal na construção europeia. Este é o mandato que cumpriremos.