Política de turismo, legislação, ano nacional do turismo, EXPO 98
Nota da Comissão de Trabalho para o Turismo junto do Comité Central do PCP
22 de Maio de 1997

 

1. Estamos praticamente no início da "época alta" do turismo, precisamente a um ano da nauguração da Expo 98, e assisti-se à quase paralisia da Secretaria de Estado do Comércio e Turismo. As únicas iniciativas do Governo nesta matéria são discursos de circunstância, frases feitas, afirmações contraditórias com objectivos anteriormente anunciados.

Praticamente nenhum dos compromissos do Governo ou medidas concretas foram cumpridas ou concretizadas até ao momento. A nova Legislação para o sector (Lei Hoteleira e das Agências de Viagens) continua por publicar. Abandonam-se instrumentos de planeamento (Plano Regional de Ordenamento Turístico do Algarve) e abre-se caminho ao não cumprimento de Planos Regionais de Ordenamento existentes. O Ano Nacional do Turismo que agora termina salda-se por um claro fracasso. As Regiões de Turismo continuam a não ver as suas funções clarificadas e os seus poderes reforçados. A promoção turística e, designadamente, a sua articulação com a Expo 98 é praticamente inexistente.

2. Do pacote legislativo já várias vezes anunciado e do conteúdo dos textos preparatórios que se conhecem há razões para expressarmos desde já as nossas dúvidas, preocupações e discordâncias, designadamente por:

- Consagrarem uma pseudo descentralização de competências para as autarquias em matéria de licenciamento e aprovação de empreendimentos turísticos, já que a estas estruturas só são conferidos poderes para licenciar tais projectos em perímetros urbanos ou zonas abrangidas por Planos de Pormenor quando é conhecido que os grandes empreendimentos turísticos, em geral, se situam fora desses limites e a maioria das autarquias não têm Planos de Pormenor executados e aprovados. Fora deste quadro as aprovações ficam, como até aqui, sob a responsabilidade da Direcção Geral de Turismo.

Mais, mesmo as mitigadas atribuições conferidas às autarquias, para as quais não se previu sequer o reforço dos meios técnicos e financeiros para as poderem executar, ficam ainda sempre sujeitas a pareceres da tutela para além de não lhe serem atribuídos poderes sancionatórios o que significa não disporem de mecanismos para fazer cumprir as decisões tomadas.

- Serem atribuídas responsabilidades às autarquias em matéria de fiscalização e licenciamento de estabelecimentos na área da restauração, sem simultaneamente se cuidar da atribuição dos meios técnicos e financeiros para que as mesmas possam cumprir com rigor e seriedade as responsabilidades atribuídas.

- Serem criadas novas figuras, "Conjuntos Turísticos", "Turismo de Aldeia", "Casas de Campo" cujo conteúdo e forma tem de ser devidamente clarificado a fim de impedir a utilização indevida de dinheiros públicos desvirtuando o carácter que têm de assumir como novas formas de alojamento turístico.

- Consagrarem uma nova valorização dos chamados "Projectos Estruturantes" com uma redução do valor anteriormente atribuído ao montante do investimento (10 milhões de contos) o que pode indiciar o incentivo a um novo ciclo de crescimento do imobiliário turístico, em desrespeito pelos Planos de Ordenamento do Território existentes, da Reserva Agrícola e Ecológica, abrindo caminho para o crescimento da oferta paralela de alojamento associada à especulação imobiliária.

- Confirmarem uma clara desvalorização das Regiões de Turismo em todo este processo já que não lhes são atribuídas novas e acrescidas competências na área do planeamento, aprovação e licenciamento de empreendimentos turísticos.

3. Pela dimensão financeira e pelo seu impacto potencial no reforço da importância de Portugal como destino turístico a Expo 98 não pode deixar de estar no centro das políticas de promoção turística do País para 1998.

Ora, precisamente a um ano da inauguração da Expo 98, o PCP expressa a sua preocupação pela declarada inexistência de um programa integrado de promoção turística que garanta a vinda à xposição dos milhões de visitantes previstos e, mais do que isso, que assegure que a vinda à Expo 98 não se esgote em si mesma mas seja um veículo para a promoção turística do País e para a permanência e visita a outros locais da oferta turística nacional. Como as críticas recentes que têm vindo a público, designadamente na reunião dos Comissários dos vários países, confirmam.

Quando os operadores preparam já os pacotes turísticos para 1998 não se conhe- cem, da parte do Governo e dos órgãos de si dependentes, como o ICEP, nenhu- mas iniciativas junto dos operadores turísticos internacionais que, em tempo útil, atraiam para o País os fluxos turísticos que a Expo 98 pode e deve impulsionar.

Já se conhecem, neste momento, operadores que a partir de Madrid organizam excursões à Expo 98 partindo da capital espanhola de manhã e regressando à noite para continuarem em ... Espanha.

Não há nenhuma campanha direccionada para os 4,7 milhões de portugueses residentes no estrangeiro.

Não há pacotes turísticos organizados que assegurem que, para além da Expo 98, os visitantes consumam o resto das suas férias no nosso País.

Nestas circunstâncias e a não ser urgentemente alterada esta situação, a Expo 98 corre o risco de não ter os visitantes que espera ou, no mínimo, o turismo nacional e as diversas Regiões de Turismo do País não beneficiarem desses fluxos turísticos e ao invés ser a Expo 98 a beneficiar da frequência de visitantes provenientes da actividade turística regular.

4. Estamos no final do chamado Ano Nacional de Turismo acontecimento que tipifica a forma como este Governo, com recurso a operações de propaganda, procura esconder a natureza da sua política e a sua manifesta incapacidade para solucionar os problemas de governação que enfrenta.

De facto, esta iniciativa anunciada pelo Primeiro Ministro em finais de Novembro de 1995 nos Açores, só em Julho de 1996 (oito meses depois) teve decisão em Conselho de Ministros, com início para um mês antes, isto é em Junho.

A única iniciativa concreta consistiu na criação de uma Comissão de Honra com 40 elementos presidida pelo próprio Primeiro Ministro iniciativa à qual se somou um conjunto de intenções dispersas constituídas por um mero somatório de iniciativas correntes, muitas das quais da responsabilidade das Regiões de Turismo.

O Ano Nacional de Turismo salda-se assim por um estrondoso fracasso constituindo em si mesmo um bom exemplo do descrédito da política que este Governo tem vindo a realizar para o sector.

5. Entretanto o intitulado Programa de Acções de Intervenção Estruturante no Turismo (PAIET), recentemente publicado, limita-se a ser um repositório de lugares comuns, mera recuperação requentada de textos já conhecidos (Programa do Governo, Grandes Opções do Plano) sem tradução, até ao momento, em medidas práticas, em nenhum programa calendarizado e financeiramente quantificado de acções. São páginas de Diários da República cheias de palavras a que não correspondem nenhumas políticas concretas.

6. No plano das relações de trabalho e da formação profissional, assiste-se por parte do Governo a importantes cortes destinados à valorização da mão-de-obra e, perante a sua passividade, ao crescente recurso por parte do patronato ao emprego de mão-de-obra sem qualificação e sem direitos, à redução dos postos de trabalho, à intensificação dos níveis de exploração dos trabalhadores, contribuindo toda esta situação para a desvalorização da nossa oferta turística.

7. Neste contexto, pela nossa parte consideramos, de facto, que a actividade turística pelo peso que tem vindo a assumir no contexto da economia nacional representa hoje um papel de considerável importância a exigir medidas em elação à disciplina da oferta de alojamento, à sua planificação no plano regional, à defesa do património ambiental, paisagístico e histórico, à clarificação do papel das estruturas representadas pelas Regiões de Turismo, à política de promoção externa e interna dos nossos produtos turísticos, aos mecanismos de financiamento de apoio a esta actividade, em suma, a exigir uma outra e dinâmica actuação governativa.