Debate sobre as opções do Governo para o sector marítimo-portuário e para a logística
Intervenção de José Soeiro
13 de Janeiro de 2006
Sr. Presidente,
Sr. Presidente,
Srs. Ministros,
Sr. Secretário de Estado,
Sr. as e Srs. Deputados:
O Governo acaba de nos informar que, oportunamente, iremos discutir nesta Câmara, com profundidade, as questões da estratégia logístico-portuária. Só faltou uma coisa no discurso, Sr. Ministro: faltou o anúncio de mais 50 000 ou 100 000 postos de trabalho!…
Foi uma falha!…
E só por isso, Sr. Ministro, é que não dou 20 valores ao Governo! Fico-me pelos 18 valores…
Não, não é demais. Não se preocupem! É em propaganda. Tiveram 18 valores em propaganda.
Eu dava 20 valores, se tivesse sido com mais 50 000 postos de trabalho, mas assim temos de ficar pelos 18 valores.
Às vezes pergunto-me, Sr. Ministro, se temos um Governo ou se temos uma comissão de eventos.
Porque temos de «tirar o chapéu» aos eventos que o Governo tem marcado, e só por isso também é que não acompanho a ideia das «obras faraónicas». Acho que tem havido apenas «discursos faraónicos»… Faltam as obras!
De facto, o Governo tem tido uma táctica interessante, que é a de procurar distrair o País, anunciando, sempre para a frente, qualquer coisa. Sempre para a frente! Já vamos em 15 anos de investimentos.
Isto, com mais um «anito», chegamos aos 50 anos de investimentos e nem sei quantos milhões de euros…!
É… «animamos a malta!… O problema é a realidade do País, Sr. Ministro. Este é que é o problema! E aí creio que o Governo tem motivos para reflectir, porque as coisas têm vindo a agravarse.
O País não está melhor, está pior. As receitas parecem estar mais a agravar a doença do doente do que a dar-lhe o tratamento de que ele precisa.
Isto é que é preocupante!
Por isso, gostaria de frisar alguns aspectos. O Sr. Ministro diz que é um discurso pessimista, um discurso negativista.
Sr. Ministro, é uma coisa recorrente. Conheço esse discurso há quase 30 anos, feito por sucessivos governos do PS, do PSD e do CDS, que falam sempre para o futuro, sempre para o futuro!…
E o presente, Sr. Ministro? E os desempregados do presente? E o desenvolvimento do presente?
Não, não! Falamos para o futuro.
Por isso quero dizer-lhe, Sr. Ministro, que quando nos anunciou aqui, há tempos, que o Governo iria trazer a esta Câmara planos estratégicos e que iria discutir e debater com a sociedade, por forma a encontrar consensos, devo dizer-lhe que na altura dei o beneficio da dúvida ao Governo. Achei que sim, que era uma linha coerente discutir, procurar trazer propostas bem fundamentadas e abrir efectivamente o debate, sobretudo quando se trata de definir estratégias para muitos anos. Mas, Sr. Ministro, até aqui, o que temos visto é a procura de apresentar os planos como factos consumados. E quando não se vai ao encontro daquilo que o Governo quer, somos imediatamente acusados de não termos espírito patriótico nem visão futurista, nem um discurso inovador.
Mas — e passo a referir aspectos concretos e, em primeiro lugar, a Ota — a verdade é a seguinte: com quem é que o Governo discutiu, para além da sessão que nos fez (até quase que nos enviou um cartão de embarque para entrarmos no voo específico do novo aeroporto), e onde é que está no Programa do Governo e no Programa do Partido Socialista a Ota como local adequado à implantação do novo aeroporto?
Porque a questão de fundo não é haver ou não a necessidade de um novo aeroporto para Lisboa. A questão fundamental é a de saber se os estudos existentes apontam ou não outros caminhos e se o facto de aparecerem inclusivamente algumas vozes especializadas a dizerem que a Ota pode ser uma solução e de essas mesmas vozes, em estudos concretos, não apontaram outros caminhos como soluções primeiras. Porque então — e temos de o dizer — venham lá os estudos que demonstram o contrário; faça-se um estudo e ouçam-se as pessoas quanto às localizações. Mas não se diga é que esta é a localização, e agora «provem lá que isto é viável!». Este é outro tipo de discurso, é outro tipo de opção.
Pensamos que deveria, pelo peso que tem e pelos custos que tem… É porque outra das ideias que procuram fazer circular é a de que não tem custos para o País, mas tem custos para o País, sim! E se as opções forem as erradas, então, os custos serão acrescidos.
Ora, não temos essa visão da estratégia que o Governo nos anunciou. Isto porque o Governo trouxe agora a promessa de um novo plano estratégico. Já tivemos a proposta do plano estratégico ferroviário e a proposta do plano estratégico rodoviário revista, portanto, temos promessas de planos estratégicos e até temos uma promessa de um projecto estratégico integrado. Só que isto não se compagina com factos consumados, Sr. Ministro. É necessário discutir-se primeiro qual é a estratégia global e depois, então, veremos se é do aeroporto, se é desta plataforma ou de outra que precisamos para responder a estes desafios.
Em relação a esta matéria, gostaria de ter algumas respostas concretas, tal como em relação ao TGV gostaria também de uma resposta simples.
Tem-se procurado criar a ideia de que o TGV Lisboa-Porto é a «panaceia para todos os males» das ligações Lisboa-Porto, mas, Sr. Ministro, é ou não verdade que o Alfa Pendular também responde aos problemas do CO 2 , à economia de vidas que se perdem nas estradas, ao investimento e aos ganhos em tempo, ao contrário do que se tem procurado fazer? Porque o que se tem dito é: «Isso foi um desastre!».
E, de facto, foi um desastre a forma como foi conduzido o processo da ligação Lisboa-Porto, mas não se ode dizer que não têm custos 5 000 milhões de investimento numa nova linha de TGV, que ainda não se sabe como se articula sequer com a rede convencional, que ainda não se sabe como vai entrar nos grandes pólos urbanos de Lisboa e do Porto, que não se sabe como vai articular-se com todas as outras coisas que os senhores vão dizendo que é «estratégia». E como não se sabe, se o Sr. Ministro nos puder dizer, agradeço que nos diga então quais são as soluções concretas que já estão aprovadas e em que estudos se fundamentam. Diga-nos, portanto, que gastar 1300 milhões para acabar a linha do Norte e assegurar ganhos em tempo, e, sobretudo, economia de recursos que faziam falta para modernizar as nossas linhas convencionais do Algarve, do Alentejo, do Norte, do Douro…
Como vê, Sr. Presidente, só temos de felicitar esta Assembleia e o Sr. Presidente por tomar esta iniciativa, embora com tempo insuficiente para discutir os grandes problemas que estão na mesa.
(…)
Sr. Presidente,
Sr. Ministro,
V. Ex.ª disse que veio anunciar coisas para o uturo. Naturalmente, está no seu direito, tal como nós o estamos quando pensamos que é necessário precisar e aprofundar o debate sobre as decisões tomadas. Porque não basta decidir, é preciso decidir bem e é preciso que estejamos convictos das boas decisões que possam estar a ser tomadas. E isso, naturalmente, exige debate.
Sr. Ministro, em relação à Ota o problema não é o da construção de um novo aeroporto para Lisboa, pois pensamos que é necessário equacionar essa possibilidade. O que entendemos é que, neste momento, nada justifica tanta correria, tanta pressa como aquela que tem animado o Governo, porque a pressa é má conselheira.
Pensamos que uma reflexão séria sobre as diferentes possibilidades não se faz a partir do estudo de impacte ambiental, porque então podíamos ir buscar factos muito atrás, em que os estudos, apesar de reconhecerem, por exemplo, ser Rio Frio uma solução melhor, apontavam para custos maiores. Portanto, não pode ser colocado na balança apenas o custo ambiental, há outros custos. E todos os custos, no seu conjunto, é que determinarão efectivamente qual é a localização ideal para o novo aeroporto.
Ora, o que pretendemos é uma discussão, porque vemos toda a gente insatisfeita pela forma como têm vindo a ser anunciadas decisões.
Em relação ao TGV o que está também em causa é a oportunidade de investimentos. E não se diga que se não tivermos TGV somos um país da retaguarda, virado para o passado, etc. Porque, então, Sr. Ministro, o que é a Suiça? E a Irlanda? E a Inglaterra? E a Suécia? E a Noruega? São países atrasados, subdesenvolvidos?
Julgo que esse é um argumento que não pode ser aceite.
O que dizemos é que a prioridade, neste momento, deveria ser a de investir numa ligação para Madrid e na modernização na rede convencional de transporte de passageiros e de mercadorias, porque é assim que podemos, de facto, retirar da estrada as tais dezenas de milhares de camiões que diariamente aí são obrigados a circular e que estão na origem de muitos dos problemas que se diz querer resolver com o TGV.
Em relação à Linha do Norte, Sr. Ministro, a argumentação dos 5 minutos não colhe, porque se é verdade que se gastaram 800 milhões de euros para ganhar 5 minutos, não é menos verdade que se se continuar o investimento, com os 1300 milhões de euros que faltam, poderemos ter um ganho efectivo de tempo. Era isto o que estava previsto, mas se os investimento ficarem a meio não o obteremos.
No entanto, Sr. Ministro, deixe-me lançar uma ideia que me ocorre quando ouço falar tanto neste problema: efectivamente, se a Linha do Norte for modernizada, não se justifica o TGV. O TGV custa muito mais dinheiro a qualquer passageiro e o tempo que se ganha é mínimo em relação ao comboio pendular. E é isto que o Governo pretende: criar uma Linha do Norte má para obrigar, amanhã, as pessoas a recorrerem ao TGV. E é isto que não aceitamos! Invista-se prioritariamente nas redes convencionais que precisam de ser modernizadas e, aí sim, todos ganhamos!
Não é verdade que o TGV não custe dinheiro ao País, que é lucrativo. Não! A exploração operacional do TGV, sem as infra-estruturas, pode ser rentável para quem efectivamente ganhar a aposta da exploração.
Mas o investimento nas infra-estruturas custa dinheiro ao País e é por isso que dizemos que 5000 milhões de euros, Sr. Ministro, não é prioridade.