Intervenção do Deputado
Lino de Carvalho
Declaração política sobre a TAP
25 de Janeiro de 2001
Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
Nós bem avisámos. Esta é seguramente uma frase justa a propósito dos acontecimentos da TAP e da parceria com a Swissair.
Avisámos, fundamentadamente, que o Governo insistia em fazer embarcar a TAP e os interesses nacionais num avião com destino incerto.
O Governo, teimosa e irresponsavelmente, fechou-se a todas as críticas, reflexões e propostas que insistentemente formulámos, como o fizeram, igualmente, os trabalhadores e as suas estruturas, com espírito construtivo, para que todo o processo fosse reavaliado.
O Governo e o PS não podem vir agora alegar surpresa quanto ao decurso
dos acontecimentos. Porque os sinais de que a SairGroup e a Swissair estavam
a reequacionar a sua estratégia de alianças e participações
não é de agora.
Ainda em Novembro passado tinha havido uma outra reunião do Conselho de Administração do SairGrupo onde a questão esteve na ordem do dia.
O Governo e o PS sempre desvalorizaram o conjunto de informações. E sempre consideraram que a privatização com venda de 34% do capital da TAP e a parceria com a Swissair estava certa e segura. Vê-se!
A verdade é que o processo foi incompetentemente conduzido desde o início.
A verdade é que o primeiro e errado passo dado nesta matéria, e que condicionou todos os restantes, foi a opção tomada em Março de 1998, de se iniciar o processo de integração da TAP na Swissair, com a migração do sistema de reservas, antes do desenvolvimento de quaisquer outros contactos com outros eventuais parceiros que pudessem apresentar propostas alternativas concretas eventualmente encerrando mais benefícios para a TAP e para o País. Isto é começou-se exactamente pelo que devia ser o fim da linha.
A verdade é que tendo a TAP sido avaliada, para efeitos de privatização,
em Julho de 1998, num valor que andava entre 85 e 90 milhões de contos
o Governo decidiu, pouco tempo depois, fixar o valor entre 48 e 54 milhões
de contos para corresponder ao valor unilateralmente proposto pela Swissair,
em Outubro de 1998, de 60 milhões de contos.
A verdade é que havendo outras soluções alternativas o Governo e o Conselho de Administração fecharam as portas à possibilidade de desenvolver e aprofundar essas hipóteses, apesar dos estudos e pareceres dos serviços especializados da TAP que demonstravam as desvantagens da aliança com a Swissair/Qualiflyer, aliás, um dos factores, reconhecido pelo próprio Conselho de Administração, para o reinicio dos maus resultados financeiros da TAP.
E se a justificação desde sempre avançada pelo Governo era a necessidade de dinheiro fresco que a Swissair garantiria a verdade, também, é que já lá vão quase dois anos desta união de facto, o SairGroup, na prática, gere a TAP de acordo com os seus interesses estratégicos e, até ao momento, nem um tostão entrou. Bem pelo contrário, os prejuízos acumulam-se e agravam-se.
A verdade é que logo que foi abandonada pela Swissair, a pedido do Governo
português, a hipótese de acordo com a Portugália e a integração
desta no Qualiflyer caiu por terra um dos pressupostos estratégicos que,
segundo o Governo, justificaria a parceria com a Swissair.
Nada disto fez reflectir o Governo
A sucessão de acontecimentos com a TAP e as notícias, confirmadas, da redefinição pelo SairGroup, da sua estratégia de participações e alianças, vêm, além do mais, pôr a nú fragorosamente, o ridículo das conclusões da Comissão de Inquérito que o PS, com o apoio do Presidente da Comissão, fez aprovar.
Ouvimos, agora, o Ministro Jorge Coelho reconhecer que a estratégia
do Governo foi errada, afirmar que, existem outras alternativas e que o Governo
até pode encontrar soluções imediatas para responder à
grave crise financeira que a TAP atravessa de novo.
Como ainda há pouco tempo o mesmo Ministro afirmava exactamente o contrário
e criticava o PCP, registamos a sua mudança de posição,
mas esperamos que, de facto, não seja mais uma declaração
vazia de conteúdo para procurar silenciar ou atenuar as críticas
à actuação cega do Governo e das Administrações
da TAP.
É que já se perderam, pelo menos, dois anos neste processo sem nenhumas vantagens para o País.
Mas já agora, Senhor Ministro, tenha em atenção, na reunião que afirma ter pedido ao SairGroup, que este está - como, aliás, já está há bastante tempo - a equacionar o fim do Qualiflyer e/ou a sua integração na aliança OneWorld o que tornaria, em definitivo, a aliança com a TAP como algo que, de todo em todo, não nos interessaria com o privilégio dado à Ibéria, nesta aliança, para o controle do mercado ibérico.
E agora?
Agora exige-se que o Governo e, em particular, o Senhor Ministro do Equipamento
Social e o Primeiro Ministro prestem contas ao País e apresentem soluções
alternativas, sólidas e credíveis, que viabilizem o futuro da
TAP, o emprego dos seus trabalhadores e o interesse nacional. Foi, para isso,
que o PCP requereu a presença urgente, do Ministro Jorge Coelho, na Assembleia
da República.
A TAP, empresa pública, companhia de bandeira, com a sua autonomia e imagem próprias, é necessária a Portugal e às comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo. É um instrumento de soberania e de afirmação externa do País.
É tempo do Governo parar com a corrida para o precipício em que envolveu a TAP, suspender o processo de privatização, reflectir sobre todo o dossier e reabrir negociações com outras hipóteses de alianças estratégicas.
Para uma solução que garanta o futuro da TAP e os interesses dos trabalhadores e do País contem com o PCP. Mas não para novas soluções, precipitadas e obscuras, que mantenha a TAP no caminho do precipício, vendendo-a a rastos de barato ao primeiro que apareceu.
Disse.
(...)
Sr. Presidente,
Agradeço a V. Ex.ª e também aos grupos parlamentares o
terem-me disponibilizado tempo para poder responder, o que farei pela ordem
das perguntas que me foram dirigidas, cuja matéria, em alguns casos,
se cruza.
O Sr. Deputado Francisco Louçã perguntou-me - aliás,
esta questão já havia sido suscitada há pouco pelo Sr.
Deputado Manuel Queiró - se há ou não contrato e se, em
caso afirmativo, há normas através das quais o Governo pode ser
ressarcido. A este propósito, o que posso responder, de acordo com o
que conheço do processo e dos documentos entregues à comissão
de inquérito, é que há acordos celebrados com a Swissair
sobre a integração do sistema de reservas, sobre as rotas, sobre
as tarifas, sobre revenue management, sobre distribuição de acordos
em certos aeroportos. Porém, não tenho conhecimento de que tenham
sido entregues à comissão de inquérito acordos, no verdadeiro
sentido da palavra, contendo cláusulas de ressarcimento.
De qualquer modo, Srs. Deputados, deixo aqui este desafio ao Governo, ao Sr.
Deputado Manuel dos Santos e ao Partido Socialista: se existem tais acordos
contendo tais normas de ressarcimento para o Estado português, então,
entreguem-nas, com carácter de urgência, à Assembleia da
República.
De qualquer modo, acho que o Sr. Deputado Manuel dos Santos já deu
a resposta em parte. Não sei se repararam que, quando o Sr. Deputado
Manuel dos Santos procurou responder a essa questão, não falou
em normas existentes em acordos mas, sim, em lei geral, em lei internacional.
Portanto, suspeito que a resposta implícita foi dada pelo Sr. Deputado
Manuel dos Santos, quanto a esta questão.
Sr. Deputado Miguel Coelho, percebi a sua dificuldade e, aliás, a sua
contenção e a sua menor certeza em comparação com
a que revelou em sede da comissão de inquérito.
Sr. Deputado, a questão é a de que, tal como eu próprio
- ambos integrámos a comissão de inquérito! -, o senhor
sabe que, por exemplo, há cartas enviadas por outro possível parceiro
nas quais este considera surpreendente que as negociações consigo
próprio tenham sido rompidas abruptamente sem que tenha sido possível
o encontro entre o Presidente da Air France e o Presidente da TAP para negociarem
e que, tendo inquirido a razão para o corte abrupto das negociações,
não foram obtidas respostas.
Os Srs. Deputados sabem que, ainda ontem, o Sr. Ministro Jorge Coelho afirmou
na televisão que, afinal, tem outras alternativas e que a Air France
até é uma dessas hipóteses… Agora, já é,
há 15 dias não era! Há 15 dias, tudo era certezas em relação
à confiança no acordo com a Swissair! Tantas certezas, Srs. Deputados,
que os senhores subscreveram aquela conclusão «brilhante»
do relatório da comissão de inquérito, segundo a qual a
opção pelo Qualiflyer é a que melhor defende os interesses
da TAP. Vê-se! Vê-se o que está em cima da mesa!
Respondendo agora ao Sr. Deputado Manuel Queiró, faço uma precisão:
não é verdade que o Estado não possa injectar capital na
TAP. Aliás, ainda hoje, respondendo a esta questão, a Comissão
Europeia confirmou algo que nós próprios temos vindo a afirmar,
ou seja, que nesta fase do processo, independentemente do futuro, o Estado português
é accionista da TAP e, enquanto accionista, pode perfeitamente intervir
e injectar capital na TAP, sem necessidade de apoio prévio da Comissão
Europeia.
Portanto, há formas de resolver esta questão, Sr. Deputado.
A nós também não nos interessa uma outra parceria mas,
sim, que se encontrem as melhores soluções para salvaguardar a
TAP como empresa nacional, bem como o futuro dos seus trabalhadores e o interesse
da transportadora, que é, também, a imagem externa do País.
Sr. Deputado Álvaro Amaro, nunca vi tal, mas a verdade é que,
neste momento, já temos a Swissair a mandar na TAP, a decidir sobre a
sua estratégia e o seu sistema de organização interna,
a controlar o sistema de reservas - basta a qualquer cidadão aceder ao
sistema de reservas da TAP para verificar que entra no sistema de reservas da
Swissair, que é o primeiro a aparecer -, sem ter transferido para a TAP
um tostão que fosse e sem, sequer, se ter envolvido nesse processo.
Sr. Deputado Manuel dos Santos, convém conhecer a realidade. Primeiro,
os salários não foram pagos devido ao anúncio público
da parceria com a Swissair; o Sr. Deputado devia saber - se não sabe
informo que os salários foram pagos com a venda das acções
da Equantum!
Foram pagos com a venda das acções da Equantum que, na altura,
foi necessário efectuar e para a qual havia outros parceiros também
disponíveis para essa operação de tesouraria.
Srs. Deputados, a Swissair rompe os acordos? É capaz de o fazer. Por
causa de notícias publicadas em jornais? Não, Sr. Deputado! Tenho
aqui o comunicado do Conselho de Administração da Swissair, no
qual se pode ler que o Conselho de Administração da Swissair,
tirando os acordos com a Swissair, a Cross Air e a Sabena, não tem, neste
momento, na ordem do dia, até nova consideração, novas
participações e aquisições. Esta questão
será revista em próximas reuniões, e logo se verá!
Portanto, apesar de todas as certezas de que este seria o melhor caminho,
está visto que não era assim!
O PS e o Governo deveriam ter tido em conta a proposta que apresentámos,
de forma insistente, designadamente em sede de comissão de inquérito,
no sentido de que, face à informação que todos tínhamos
deste processo, o Governo deveria parar para reflectir de forma a encontrar
a melhor solução para servir os interesses da TAP, dos seus trabalhadores
e do País, coisa que irresponsavelmente não fez!