Sobre o Plano Nacional de Emprego

Declaração de Jerónimo de Sousa
Membro da Comissão Política do PCP

7 de Abril de 1998

1. O que qualquer governo verdadeiramente interessado em responder aos graves problemas do desemprego deveria fazer, era começar por realizar uma avaliação objectiva da sua dimensão e das causas reais e estruturais da sua existência.

Ora, o lançamento de mais um Plano Nacional de Emprego, com pompa e circunstância, sem abordagem desses aspectos, denuncia à partida o seu carácter, no essencial, propagandístico, sem prejuízo de algumas medidas pontuais que poderão minorar algumas situações mais dramáticas de desemprego.

Pior, o Governo, pela voz dos seus ministros, continua a dar como verdadeira a evolução da taxa de desemprego quando é por todos sabido (inclusive referido por departamentos oficiais) o carácter virtual dos valores desse índice publicado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) para 1996 e 1997.

O facto de esse nível de desemprego só ser possível pela contagem de 41 mil e 71 mil «novos» activos agrícolas em 1996 e 1997, na sua maioria identificados como pequenos e médios agricultores, como empregos reais!

Mais grave ainda, o próprio documento de apresentação do Plano, na análise que faz da situação no mercado de emprego, passa por cima daquela anomalia (?!) estatística da evolução recente do emprego/desemprego em Portugal. O documento atreve-se até a falar de «uma moderação do emprego terciário» quando, segundo os próprios dados oficiais, o emprego no sector dos serviços cresceu 0.7% em 1995, 0.6% em 1996 e desceu 1% em 1997!

Isto é, o Governo começa por se recusar a aceitar a real e estrutural dimensão do desemprego em Portugal.

2. Outra questão que deveria ser prévia ao lançamento de um novo Plano, se a seriedade dos propósitos enunciados se sobrepusesse à vontade de fazer propaganda, seria uma rigorosa quantificação e avaliação qualitativa dos numerosos planos que nos últimos anos foram lançados por sucessivos governos. Pelo menos, fazê-lo relativamente aos planos da ex-ministra do Trabalho, Maria João Rodrigues, e a criação de mais 100 mil postos de trabalho até 1999, previstos no Acordo de Concertação Social de 1996!

3. Mas o mais grave é que o conteúdo substantivo do Plano Nacional de Emprego corresponde à concretização das receitas neoliberais decididas pela Cimeira Europeia sobre o Emprego (que, aliás, repetiu pela enésima vez, com novas formulações, o chamado Livro Branco de Delors). Receitas que, no fundamental e em síntese, se traduzem no levantamento de obstáculos ao bom funcionamento do mercado de trabalho (ou a eliminação da rigidez do mercado de trabalho), e no abaixamento dos custos de força de trabalho.

No meio de um denso nevoeiro, surgem dois objectivos fundamentais e complementares:

uma mão-de-obra «flexível», «disponível», adaptável às necessidades das empresas, com medidas sobre o trabalho parcial, trabalho temporário, contratos a prazo, do regime jurídico de férias, que se traduzirá num novo acréscimo da precariedade do trabalho;

uma mão-de-obra barata — medidas para o abaixamento dos custos não salariais (o que significa reduzir as contribuições para a Segurança Social) e os incentivos financeiros para as empresas.

Objectivos que se traduzirão em novas dádivas ao grande capital e uma nova desregulamentação das relações laborais.

A inutilidade daquelas políticas e medidas, enunciadas e concretizadas por diversos governos, é suficientemente evidenciada pela manutenção de elevadas taxas de desemprego em Portugal e na Europa, sem que o flagelo mostre tendência para se esbater.

4. O novo Plano serve ainda de cortina de fumo para o prosseguimento das políticas pelo Governo PS, elas sim, geradoras de desemprego. Devem, em particular, destacar-se:

as políticas que se traduzem na crescente desigualdade de distribuição do rendimento nacional, favoráveis aos detentores do grande capital e desfavoráveis aos que vivem de salários, pensões, rendimentos de actividade por conta própria, etc., restringindo o mercado interno;

as políticas nacionais e comunitárias que se traduzem na ruína de sectores produtivos nacionais, na agricultura, nas pescas, na indústria;

as políticas de apoio à aquisição e fusão de empresas, resultando em reestruturações empresariais responsáveis por novos e volumosos despedimentos;

as políticas de convergência nominal, no caminho para a União Económica e Monetária (UEM) e a Moeda Única (MU), responsáveis por políticas orçamentais e outras, cerceadoras do investimento e do crescimento económico que o País necessita e que é possível.

O novo Plano Nacional de Emprego, mesmo considerando as medidas avulsas de conteúdo positivo, designadamente no plano da formação, não será a resposta que os trabalhadores e o País necessitam para responder ao direito constitucional do trabalho com direitos. É antes, um plano de gestão do desemprego.