Comunicado da Comissão Política do PCP

17 de Abril de 1996

PCP lança campanha contra a flexibilidade e a polivalência

Na sua reunião de 15 de Abril, a Comissão Política do Comité Central procedeu à análise dos aspectos mais relevantes da actualidade política nacional, com destaque para os seguintes pontos.


1. A Comissão Política analisou o debate em curso sobre a regionalização bem como as relações que outras forças partidárias pretendem estabelecer entre este tema e o processo de revisão constitucional.

A este propósito, a Comissão Política entende ser de sublinhar que o PCP de há muito é um firme e activo defensor de uma regionalização democrática, construída de baixo para cima com um papel determinante dos municípios e das populações, e fundamentalmente dotada de competências e atribuições actualmente na esfera da administração desconcentrada do poder central. Neste sentido, e de acordo com esta concepção, após a aprovação na generalidade dos projectos de lei do PCP e do PS sobre a criação de áreas de partida, deve desenvolver-se um grande debate no plano nacional e em cada município até à sua aprovação na especialidade e até à aprovação ulterior de leis de instituição em concreto de cada região.

O PCP entende que o processo de regionalização não deve depender da revisão constitucional e dos seus resultados, denuncia a chantagem do PSD e do PP e os perigos de entendimento destes partidos com o PS para uma revisão acelerada da Constituição que veicule novas lesões aos direitos dos cidadãos e a desfiguração da democracia política através de alterações antidemocráticas dos sistemas eleitorais.

Procurando contribuir para um debate sério desta matéria através de esclarecimentos essenciais sobre a real natureza das suas propostas e posições e da resposta frontal às numerosas falsificações e deturpações circulantes, a Comissão Política do PCP desde já anuncia a realização de uma conferência de imprensa sobre a regionalização na próxima terça-feira, dia 23, às 12 horas.


2.
Reafirmando a importância do tema da criação das regiões administrativas do Continente e o profundo empenho do PCP no seu debate e concretização, a Comissão Política do PCP sublinha entretanto a gravidade e extrema acuidade de outros aspectos da situação nacional, designadamente de natureza económica e social, de grande repercussão sobre a vida do país e sobre as condições de vida e os direitos dos cidadãos.


Neste sentido, é indispensável salientar um facto comprovado pelos dados estatísticos da acentuada desaceleração do crescimento económico no primeiro trimestre e das perspectivas actuais da evolução apontarem para um diminuto crescimento do PIB no ano corrente, na ordem de 1 a 1,5%, que fica muito aquém das optimistas e irrealistas previsões de 2,75% que o Governo apresentou no Orçamento de Estado. Numa autêntica operação de venda da “prata da família” o Governo vai encetar a anunciada privatização do melhor património público empresarial, a começar por aquelas empresas que actualmente dão elevados lucros ao Estado, designadamente a Telecom, a Cimpor e a Tabaqueira.

O caso concreto da Telecom que em 1995 atingiu um lucro líquido de 36 milhões de contos constitui um verdadeiro escândalo. Na segunda fase da privatização que elevará para 49% a percentagem do capital privado, indicia-se já a subavaliação que, a ser concretizada, constitui só por si um esbulho ao Estado de dezenas de milhões de contos e encaminhada para o consórcio liderado pelo Grupo Espírito Santo, grupo que também está interessado na compra.

Inevitavelmente, para além do escândalo económico que tal operação constitui, o capital privado vai tentar a maximização dos lucros a partir do investimento selectivo nas actividades e zonas mais lucrativas, deixando para trás regiões menos desenvolvidas e o encarecimento dos serviços que servem a maioria da população utente. Foi na perspectiva da privatização que se iniciou o assalto aos direitos dos trabalhadores da Telecom. Com a empresa privatizada novas pressões surgirão visando particularmente a diminuição dos postos de trabalho.

O PCP considera que o país está perante uma situação económica e social que se agrava, que nada pode ocultar e não é susceptível de ser ultrapassada com meros remendos pontuais, a exemplo do recente mas já quase esquecido Programa de Acção Imediata para o Emprego. O agravamento da situação económica e financeira da generalidade das empresas portuguesas e o inquietante e dramático desemprego que atinge já, oficialmente, mais de meio milhão de portuguesas e portugueses exigem uma inflexão da política económica.


3.
Porém, o Governo PS encontra como caminho a restrição e a ofensiva aos direitos dos trabalhadores, inclusive a direitos históricos dos trabalhadores portugueses visados na sua proposta de lei sobre desregulamentação dos horários de trabalho, das profissões e das carreiras profissionais pela via da polivalência. A gravidade e o alcance da proposta de lei sobre flexibilização e polivalência constituem uma rampa de lançamento para outras medidas gravosas que o Governo quer levar por diante, como demonstram as declarações do Secretário de Estado do Trabalho.

A Comissão Política do PCP sublinha e saúda o facto de muitos trabalhadores que confiaram o seu voto ao PS, na esperança da mudança e da reparação da justiça social, afirmarem o seu repúdio pela proposta de lei do Governo e o de terem participado na jornada nacional de luta do passado dia 11 de Abril convocada pela CGTP-IN. As greves, particularmente dos transportes, as concentrações e manifestações em diversos pontos do país envolvendo milhares de trabalhadores, o número de pareceres que estão a chegar à Assembleia da República, constituem uma prova de que cada vez mais se alarga o esclarecimento, a consciencialização e a mobilização em defesa de horários de trabalho dignos, e pelas 40 horas sem flexibilidade e polivalência, de repúdio por uma proposta de lei que tenta colocar o Estado contra direitos fundamentais dos trabalhadores.

A valorização e dignificação do trabalho, dos trabalhadores e dos seus direitos como condição determinante de um desenvolvimento e de um progresso social autênticos para Portugal, constituem um elemento essencial do projecto político, da orientação e da identidade do PCP.

A gravíssima ofensa aos direitos laborais que esta proposta de lei do Governo representa, justifica por isso que o PCP tenha decidido desenvolver uma campanha nacional própria de esclarecimento e alerta aos trabalhadores e a todos os portugueses sobre este novo ataque ao seus direitos e sobre a necessidade de erguer uma vasta frente social e política contra a sua aprovação e concretização. Esta campanha será sustentada por um conjunto de materiais de informação e esclarecimento (folhetos, cartazes, faixas, autocolantes), uma audição parlamentar, iniciativas de debate e divulgação de posições do PCP e acções de contacto com os trabalhadores e as populações. Desenvolver-se-á nas próximas semanas sob o lema “flexibilidade e polivalência não podem ser lei! e terá também uma expressiva inserção nas celebrações próximas do 25 de Abril e do 1º de Maio, através de um forte apelo do PCP ao exercício activo e democrático da cidadania — “defende os teus direitos!» — como componente essencial do património vivo da Revolução de Abril e justificação plena, constitucionalmente fundamentada, para uma vigorosa oposição à proposta de lei anti-social do Governo.


4.
A Comissão Política do PCP considera de importância assinalável duas iniciativas do Grupo Parlamentar comunista. Ao agendar para amanhã, quinta-feira, a discussão do projecto de lei sobre a idade de reforma das mulheres aos 62 anos, o PCP procede à urgente reparação de uma medida socialmente injusta cometida pelo PSD que, durante o consulado cavaquista, aumentou a idade da reforma para 65 anos sem considerar as dificuldades acrescidas, e os sacrifícios a que as mulheres trabalhadoras estão sujeitas.

Também a interpelação ao Governo sobre a crise social, agendada para 24 de Abril, constitui um acto não só de preocupação e sensibilidade social, mas de empenhamento do PCP de trazer à ordem do dia as grandes questões que inquietam os portugueses.

Enquanto PS, PSD e PP encenam, com especial frenesim e artificialismo, uma coreografia política em que ultimatos, ameaças, chantagens, criação de pretensos factos políticos, troca de cartas e oferta de pactos, visam sobretudo escamotear a identidade, no essencial, das políticas que defendem, o PCP prossegue, serenamente, mas com firmeza e combatividade, a sua acção de oposição de esquerda à política de direita e a sua intervenção construtiva para mudanças positivas na vida nacional, ambas centradas nos problemas mais vivos do povo e do país, e sempre olhando os cidadãos, não como assistentes da “política-espectáculo”, mas como protagonistas essenciais da defesa dos seus interesses, da conquista de uma vida melhor, e de uma nova política para Portugal.


5. Finalmente, a Comissão Política do PCP apela aos trabalhadores e a todos os democratas no sentido de uma massiva participação nas jornadas comemorativas do 25 de Abril e do 1º de Maio, afirmando a sua forte disposição de defenderem os seus interesses e direitos e de defenderem o património dos grandes valores progressistas da liberdade, da democracia e da justiça social que aquelas duas celebrações fortemente projectam para a actualidade da vida nacional.

A Comissão Política do Comité Central do PCP