Proposta de Lei n.º 136/VII e Proposta de Lei n.º 138/VII, sobre, respectivamente, o regime geral de recrutamento e selecção de pessoal e o regime de duração e horário de trabalho na Administração Pública
Intervenção do deputado Rodeia Machado
21 de Janeiro de 1998

 

Senhor Presidente,
Senhores Membros do Governo,
Senhores Deputados,

A matéria que hoje vamos discutir no Plenário da Assembleia da República, tem como base dois pedidos de autorização legislativa do Governo, assente na discussão feita em mesas negociais com os sindicatos da Função Pública.

Foram necessários muitos anos de luta dos trabalhadores da Administração Pública para que o Governo, se senta-se à mesa das negociações, e aceita-se negociar matérias, que desde há muito são reclamadas com inteira justiça quer pelos trabalhadores, quer pelas suas estruturas representativas, mas o Governo não respeitou, em nosso entender, nem os prazos ali acertados, nem os compromissos ali assumidos, em relação a muita da matéria negociada.

Já tivemos oportunidade de aqui o afirmar, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, e voltamos hoje aqui a fazê-lo, reafirmando quer o Governo do Partido Socialista não tem cumprido os calendários propostos em sede de mesas negociais e existem matérias, nomeadamente das ajudas de custo, que sofreram um enorme retrocesso, para já não falar da integração do pessoal a recibos verdes, cujos resultados práticos são hoje praticamente nulos.

Os concursos não avançaram. ou se avançaram foram fora do prazo que o Governo a si mesmo impôs.

É uma desorientação completa, ou má-fé perfeitamente institucionalizada, sendo que a segunda é mais credível que a primeira.

Nos pedidos de autorização legislativa, que hoje aqui discutimos o Governo actuou de forma semelhante, ou seja, nas propostas de lei formulou os parâmetros dessas mesmas autorizações, mas não enviou à Assembleia da República, os projectos de diploma que entretanto negociou com as estruturas representativas dos trabalhadores.

Com efeito, desde há muito que o Governo do Partido Socialista apresentou aos Sindicatos uma versão final de Projecto de Decreto-lei sobre o Regime Geral de Recrutamento e Selecção de Pessoal para os quadros da Função Pública, bem como o Regime de duração e Horário de Trabalho.

Aliás o Governo foi mesmo ao ponto de afirmar para os meios de comunicação social, com grande pompa e circunstância, a redução de horário e recrutamento de pessoal, enquanto à Assembleia da República, aos deputados sonegou a informação necessária, a quem lhe vai dar essa mesma autorização legislativa. É inacreditável, mas é a realidade.

Por tudo isto, tivemos necessidade de por via não oficial, procurarmos obter os textos dos projectos-lei em causa, e é sobre eles que iremos fazer uma análise tão circunstancial quanto possível.

Quanto ao primeiro o 136/VII, entendemos que deveria, desde já ser aceite, como principio, que na área do recrutamento e concretamente dos concursos internos o acesso de funcionários ou trabalhadores que a qualquer título exerçam funções, nos organismos ou serviços à mais de um ano no serviço. Este principio permitiria resolver grande parte das situações dos trabalhadores a recibo verde, já que esta é uma situação que justificadamente nos preocupa, porque apesar da aprovação do Decreto-Lei 145/97, a questão está longe de ser resolvida.

Podemos mesmo afirmar que a admissão para a Administração Pública de milhares de trabalhadores, com contratos a prazo, indicia que a precaridade é para continuar.

Quanto à Proposta de Lei 138/VII, existem princípios que deveriam ser lavados à prática em toda a sua verdadeira extensão, ou seja, a uniformização da semana dos 5 dias de trabalho, e tal não é liquido na proposta de Decreto-lei.

Por outro lado o Governo anunciou, com pompa e circunstância a semana dos 4 dias, mas à custa de redução salarial, com a qual não estamos de acordo, e vai ao ponto de afirmar que a mesma será realidade, quer haja ou não acordo sobre esta matéria.

Senhor Presidente,
Senhores Membros do Governo,
Senhores Deputados,

Qualquer alteração no horário de trabalho da Função Pública terá forçosamente que ter em atenção dois princípios fundamentais:

Em primeiro lugar, reduzir o tempo de trabalho sem reduzir o salário, já de si desajustado da realidade da União Europeia, e em segundo lugar permitir uma melhor organização da Administração Pública, que conduza à eliminação do emprego precário.

Queremos reafirmar aqui, que o Grupo Parlamentar do PCP, se oporá frontalmente às soluções já enunciadas pelo Governo, pois na prática o que aconteceria, é que esta redução levaria a breve prazo a uma desregulação laboral e a uma maior precariedade de emprego na Função Pública.

O que aconteceu na Bélgica, deve servir como ponto de reflexão, e não como exemplo a seguir.

Outra das situações identificadas como negativas é a não aceitação do principio do suplemento de trabalho nocturno. Existem carreiras profissionais na função pública que só são previsíveis com recurso a trabalho nocturno, e essas deveriam ser objecto da consagração desse princípio, quer pela sua perigosidade quer pela sua penosidade.

Esperamos que o Governo seja sensível, a estes e outros aspectos que consideramos serem necessários analisar em sede de discussão de especialidade, permitindo alterações em concreto que levem a uma significativa melhoria da legislação proposta.

As propostas de lei e consequente autorização legislativa agora em apreciação podem ser um passo significativo para o edifício legislativo, do estatuto do pessoal da Administração Pública, desde que correctamente aplicadas, sendo que para isso o Governo do Partido Socialista se mostre disponível a algumas alterações consideradas pertinentes e justificadas.

Da nossa parte, manifestamos aqui, a total disponibilidade do Grupo Parlamentar do PCP para discutir, analisar, e contribuir para a melhoria destas propostas de lei, assim o Governo o faça no mesmo sentido.


Disse.