Situação da Empresa de Cabos Eléctricos Ávila
Intervenção do deputado António Filipe
14 de Janeiro de 1998

 

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,

Desde Outubro de 1997 que os 230 trabalhadores da empresa de Cabos Eléctricos Ávila não recebem salários. Desde 2 de Dezembro que a empresa cessou a sua laboração por responsabilidade da gerência, numa situação típica de lock-out. Também desde há várias semanas que os trabalhadores permanecem nas instalações da empresa, em luta pelo pagamento dos salários a que têm direito e pela manutenção dos seus postos de trabalho.

Aqui desta tribuna, quero antes de mais, exprimir a total solidariedade do PCP para com a luta que os trabalhadores desta empresa têm vindo, corajosamente, a travar, e reafirmar publicamente a disposição do Grupo Parlamentar do PCP de, aqui nesta Assembleia, desenvolver todas as iniciativas que possam contribuir para superar a situação que se vive nos Cabos Ávila e para encontrar soluções de permitam o regresso desta empresa ao seu normal funcionamento. Nesse sentido, a realização de uma audição parlamentar sobre esta questão, ontem decidida na Comissão Parlamentar de Trabalho por proposta do PCP é um primeiro passo com que nos congratulamos. Esperamos que esta audição contribua de alguma forma para superar a difícil situação que a empresa Cabos Ávila e os seus trabalhadores de momento atravessam.

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,

A empresa Cabos Ávila é a unidade industrial nacional mais antiga no fabrico de cabos eléctricos. Emprega 230 trabalhadores. Tem um impacto social significativo no concelho em que se insere. Apesar das inegáveis dificuldades por que tem passado nos últimos anos, a empresa dispõe presentemente de encomendas que viabilizam a sua laboração.

A cessação de actividade dos Cabos Ávila, por atitude deliberada e inaceitável da gerência, não pode manter-se por mais tempo, sob pena de poder vir a ter consequências irreversíveis para o futuro da empresa e dos respectivos postos de trabalho. Presentemente, a fábrica dispõe de encomendas que não estão a ser cumpridas devido à inactividade laboral a que os seus trabalhadores têm sido forçados. Os equipamentos da empresa deterioram-se em cada dia que passa, por falta de manutenção, podendo a curto prazo tornar-se inoperacionais. A sobrevivência dos Cabos Ávila passa, sem qualquer dúvida, pelo rápido regresso à laboração.

O Estado português é o maior credor dos Cabos Ávila. Detém cerca de 75% dos créditos sobre a empresa. Assume uma posição determinante na respectiva assembleia de credores. Não pode encolher os ombros perante a situação que os seus trabalhadores estão a viver.

É urgente que o Governo, através do Ministério da Economia, tome decisões relativas à gestão dos Cabos Ávila que ponham termo de imediato à paralisia desta empresa, que permita o regresso ao trabalho em condições de normalidade, que assegure o pagamento dos salários e subsídios que desde Novembro são devidos aos trabalhadores.

A questão dos Cabos Ávila não é uma querela familiar a dirimir entre parentes. É uma questão política e social em que o Governo tem responsabilidades que não pode deixar de assumir. Não estão em causa eventuais zangas de família ou conflitos de interesses de herdeiros. O que está em causa acima de tudo é a sobrevivência de uma empresa importante para o sector de actividade e para a região em que se insere. O que está em causa acima de tudo é também a subsistência dos postos de trabalho de que dependem 230 trabalhadores e as suas famílias, que estão na situação dramática de não receberem salários desde o passado mês de Outubro. Perante uma situação destas, estando o Estado português na posição de credor maioritário, não pode o Governo lavar as mãos como Pilatos. Impõe-se uma tomada de posição urgente, no sentido de dotar os cabos Ávila com uma gerência que dê garantias de competência e de empenho sério na viabilização da empresa.

Em todo este processo, os trabalhadores dos Cabos Ávila têm assumido uma posição de enorme coragem e dignidade, apesar das calúnias de que têm sido alvo. Toda a acção desenvolvida pelos trabalhadores ao longo destas últimas semanas, com enormes sacrifícios pessoais, tem sido determinada por objectivos inteiramente justos. Nunca os trabalhadores puseram em causa a liberdade de circulação na empresa, fosse de quem fosse. O que os trabalhadores fizeram - e muito bem - foi impedir que matérias primas indispensáveis à laboração da fábrica fossem retiradas das instalações por pessoas estranhas à empresa, o que a verificar-se, inviabilizaria no imediato o regresso da fábrica à laboração e a conclusão de trabalhos que ficaram em curso.

O que acontece é que os trabalhadores dos Cabos Ávila estão sem receber desde Outubro e lutam pelos salários a que têm direito. O que acontece, também, é que os trabalhadores dos Cabos Ávila foram confrontados com a paralisação da empresa e lutam para regressar ao trabalho. O que acontece, ainda, é que os trabalhadores dos Cabos Ávila foram confrontados com uma gestão ruinosa e lutam para que essa situação seja alterada, em nome dos superiores interesses da empresa onde trabalham e onde querem continuar a trabalhar.

A grande maioria dos trabalhadores dos Cabos Ávila, trabalham há longos anos nesta empresa, tendo-lhe dedicado a maior parte das suas vidas. Nos últimos anos, diversas delegações do PCP e do seu Grupo Parlamentar visitaram esta fábrica, tendo recebido de diversas gerências que precederam a actual, testemunhos de grande apreço para com a dedicação e a competência destes trabalhadores. É preciso que, neste momento difícil, estejamos com eles, na defesa do seu direito ao trabalho e na exigência do pagamento imediato de todos os salários que lhes são devidos. É preciso que, neste momento, também o Governo esteja à altura do sentido de responsabilidade de que os trabalhadores dos Cabos Ávila têm vindo a dar provas, e assuma de imediato as suas responsabilidades na viabilização da empresa.