Declaração Política sobre o Código
do Trabalho
Intervenção da Deputada Odete Santos
27 de Março de 2003
Senhor Presidente
Senhores Deputados:
Está prestes a chegar ao fim a operação empreendida pelo Governo contra a Constituição laboral nascida com Abril, e gerada nas duras lutas dos trabalhadores portugueses contra o fascismo.
A operação Código do Trabalho foi conduzida ao novo estilo texano do Governo.
Proclamando a necessidade de modernização da legislação, para ser conseguido mais investimento e mais emprego.
Brevemente foi desmistificada a operação “choque e pavor” do Ministro Bagão Félix.
O encerramento de fábricas aumentou, aumentou a deslocalização de empresas, procedeu-se a despedimentos colectivos à revelia da lei, tudo contando com o beneplácito da inércia dolosa do Ministro que deixou cair a pasta de Ministro do Trabalho para sobraçar os dossiers da globalização capitalista.
A máscara da modernização caiu para mostrar a carcassa de uma dama envelhecida que não consegue disfarçar a idade adiantada.
Caída a máscara, a operação Código mostrou-se como era.
Uma operação tosca visando restrições aos direitos liberdades e garantias dos trabalhadores, quando não o seu aniquilamento.
A coberto da crise mundial e das tentativas de destruição do direito internacional, a operação Código pretendeu nesta fase final passar sem rumor, docemente, convindo aos seus autores um agendamento apressado.
A obra que se encontra na parte final, contém soluções técnico- jurídicas que suscitarão perplexidade seguida de sorrisos, quando não de uma sonora gargalhada.
Quando não a aflição dos aplicadores do direito.
Um exemplo emblemático temo-lo numa das bandeiras do Ministro já
sem a pasta que lhe foi atribuída: a da pseudo-criminalização
da exploração do trabalho infantil. O que se fez foi baixar a
moldura penal e tornar quase ininteligível os requisitos do crime.
Contra as malfeitorias do Código, entre as quais de distinguem os ataques
aos direitos colectivos dos trabalhadores, há barreiras importantes:
• A barreira da resistência e da luta.
• A barreira da Constituição laboral de Abril e do direito
internacional que faz parte do direito português .
O Código viola o direito à negociação colectiva através da tentativa de imposição a trabalhadores filiados livremente num Sindicato, de contrato colectivo de trabalho celebrado por outro Sindicato sem qualquer representatividade. Por Sindicato amigo do patrão que obtém contrato colectivo por entre apertos de mão e palmadinhas nas costas.
E com isto se viola também o direito à liberdade sindical.
Ao mesmo tempo, infringem-se Convenções da OIT ratificadas por Portugal
Percebe-se em tudo isto a saudade daqueles países, como a Venezuela, em que os Sindicatos amigos dos patrões do petróleo obstaculizam a luta dos trabalhadores em defesa do regime constitucional nascido de eleições.
Mas também aqui a nossa Constituição laboral impõe uma barreira intransponível.
Tem de render-se, Senhor Ministro!
Sabemos como as organizações de trabalhadores lhe causam uma verdadeira alergia, Senhor Ministro sem pasta!
Daí que, num assomo de arrogância e agressividade, e mesmo à última hora, numa proposta, a maioria deu o dito por não dito quanto às Comissões de Trabalhadores. E, tal como o PCP teve oportunidade de denunciar na Comissão, veio desdizer-se, negando o que tinha afirmado: afinal o que consta da lei das Comissões de Trabalhadores não vai continuar em vigor.
Senhor Presidente
Senhores Deputados
Não pode caber nesta intervenção, o recenseamento de todas as malfeitorias da operação Código- “ Choque e pavor”.
Muitas das denunciadas no debate na generalidade confirmaram-se, às vezes com agravamentos.
Como acontece relativamente ao direito à greve. Através de uma disposição destinada a facilitar a substituição de grevistas.
Mas não pode deixar de referir-se:
• Que através da caducidade das convenções colectivas de trabalho sem que outra esteja em vigor, se fazem caducar direitos dos trabalhadores, violando-se desta forma, à luz do recente acórdão do Tribunal Constitucional sobre rendimento social de inserção, o princípio da confiança no Estado de Direito Democrático.
E não pode deixar de referir-se:
• Que ficam em risco os trabalhadores com salários em atraso, pois rejeitadas as propostas do PCP fica sem se saber que regime irá ser adoptado.
Ficou-se a saber, e confirmou-se:
• Que o Governo não respeita a Convenção da OIT
sobre protecção do salário
• Que o Código configura uma total precarização da
vida do trabalhador, quer através do alargamento da Contratação
a termo, quer através da mobilidade funcional e geográfica, quer
através da violação do preceito constitucional sobre proibição
dos despedimentos sem justa causa.
E não por pudor- que o não tem- mas por receio da censura constitucional, a maioria retirou uma proposta com que legalizaria o lock-out.
A maioria não poderá contar com o apagamento desta página negra da sua história.
Terá a mesma sorte de todas as tentativas de tripudiar sobre os direitos liberdades e garantias dos povos.
Porque a prova da solidariedade entre os direitos dos trabalhadores e os direitos liberdades e garantias dos cidadãos, está feita.
Marcham a par e passo. São direitos humanos.
E, parafraseando Gedeão, para os direitos humanos não há poderes que os domem.
Para os trabalhadores, com a sua força organizada, não há ventos que não prestem, nem marés que não convenham.
Disse.